Da REDAÇÃO
A Proposta de Emenda à Constituição nº 27/2024 (PEC 27/2024) está em tramitação na Câmara dos Deputados e propõe a criação do Fundo Nacional de Reparação Econômica e de Promoção da Igualdade Racial (FNREPIR). A iniciativa visa reparar desigualdades históricas sofridas pela população preta e parda no Brasil, promovendo o acesso a oportunidades econômicas, educacionais e sociais.
O que é a PEC 27/2024
De autoria do deputado Damião Feliciano (União-PB), a PEC propõe um novo capítulo na Constituição Federal para instituir o FNREPIR como instrumento permanente de promoção da igualdade racial. O fundo será gerido por instituição financeira federal, com natureza privada, e terá um conselho consultivo com participação da sociedade civil.
Com previsão inicial de R$ 20 bilhões, o FNREPIR será abastecido com recursos do Orçamento da União, doações internacionais e outras fontes legais. O aporte anual da União será de pelo menos R$ 1 bilhão, sem estar sujeito ao teto de gastos.
O objetivo é garantir recursos permanentes para políticas públicas voltadas à população preta e parda, incluindo ações nas áreas de educação, cultura, formação profissional, inclusão produtiva, empreendedorismo e proteção de comunidades quilombolas e periféricas.
Uma dívida histórica
A proposta surge como resposta a uma omissão histórica: após a abolição da escravidão, em 1888, o Estado brasileiro não ofereceu nenhum programa estruturado de reparação ou integração dos ex-escravizados. Negros libertos foram lançados à marginalização social, sem acesso à terra, à educação pública, à formação profissional ou a políticas de proteção social.
Enquanto isso, imigrantes europeus, asiáticos e do Oriente Médio recebiam incentivos materiais para se estabelecer no país. Estados como São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Espírito Santo subsidiaram a chegada de milhares de estrangeiros com promessa de terra, moradia, ferramentas e apoio logístico.
É importante reconhecer, contudo, que esses imigrantes também enfrentaram condições duras. Enfrentaram fome, doenças, precariedade e isolamento cultural. Muitos chegaram endividados, sofreram abusos de fazendeiros e passaram anos em situação de vulnerabilidade até conseguir alguma estabilidade. A adaptação ao Brasil envolveu perdas emocionais, trabalho intenso e barreiras linguísticas. Mas diferentemente dos negros libertos, esses grupos contaram com o suporte do Estado e políticas estruturadas para sua instalação.
Abandono, repressão e exclusão dos negros
A população negra, mesmo após a abolição, foi alvo de repressão sistemática. Comunidades quilombolas foram invadidas, suas terras desapropriadas e seus direitos ignorados. A Constituição Federal só reconheceu o direito à propriedade das terras quilombolas cem anos depois da abolição, em 1988. E mesmo assim, até hoje grande parte dessas terras segue sem homologação definitiva, em disputa judicial ou ameaçadas por grilagem e desmatamento.
Além disso, os negros libertos foram criminalizados pela pobreza. A Lei da Vadiagem, de 1890, permitia a prisão de pessoas sem emprego ou “meios honestos de vida” — uma ferramenta para punir a informalidade e manter o controle racial. O mesmo Estado que negava acesso ao trabalho digno, à terra e à educação, impunha a obrigação de trabalhar sob risco de prisão.
A desigualdade que persiste
Os efeitos dessa desigualdade histórica estão presentes até hoje. Segundo dados da PNAD Contínua 2022:
- Pretos e pardos representam 71,5% dos brasileiros analfabetos.
- 35,4% das pessoas brancas entre 18 e 24 anos estavam no ensino superior, contra apenas 22,4% dos pretos e 25,2% dos pardos.
- Pretos e pardos representam 70% dos brasileiros com renda domiciliar per capita inferior a meio salário mínimo.
- A renda média mensal dos brancos foi de R$ 3.099, enquanto a de pretos foi de R$ 1.764 e a de pardos, R$ 1.893.
As políticas de ação afirmativa começaram a ser implementadas no Brasil apenas no século XXI. A Lei nº 12.711/2012, conhecida como Lei de Cotas, passou a vigorar em agosto de 2012 e garante reserva de vagas em universidades federais para estudantes pretos, pardos, indígenas e de baixa renda. Já a Lei nº 12.990/2014, em vigor desde junho de 2014, estabelece cotas raciais no serviço público federal, com reserva de 20% das vagas em concursos para candidatos negros.
A exclusão educacional, a desigualdade de renda e o acesso tardio a políticas públicas específicas são heranças diretas de um sistema que marginalizou a população negra por gerações.
Tramitação e próximos passos
A PEC 27/2024 foi considerada admissível pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e está em análise por comissão especial presidida pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ) e relatada por Orlando Silva (PCdoB-SP). Para ser aprovada, a proposta precisa do apoio de 308 deputados e 49 senadores em dois turnos de votação em cada Casa.
O que muda com o FNREPIR
Se aprovado, o Fundo Nacional de Reparação e de Promoção da Igualdade Racial poderá financiar programas de acesso à educação, empreendedorismo, cultura negra, inclusão produtiva, formação profissional e apoio a comunidades quilombolas e periferias urbanas. Mais do que uma medida orçamentária, a PEC 27/2024 simboliza um passo concreto em direção à justiça histórica e à equidade racial.
Ilustração da capa: PEC da Reparação – Ilustração gerada por IA ChatGPT
Tags:
PEC 27/2024, FNREPIR, reparação histórica, igualdade racial, política pública, negros no Brasil, imigração europeia, justiça racial, abolição, quilombolas, educação e renda, cotas raciais.





Uma resposta
Concordo com essa emenda a CF! Os negros foram libertos após trabalharem pra desenvolver o país sem direito algum, é hora de reparar esse erro grave cometido pelas instituições oficiais, antes tarde do que nunca.