Internacional

O Imperialismo Democrata, o Voto Castigo em Trump e o Escroque Reconduzido ao Poder

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O Imperialismo Democrata, o Voto Castigo em Trump e o Escroque Reconduzido ao Poder
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Por BRUNO LIMA ROCHA* Como observamos em outros momentos, os limites de governos liberal democratas com tímidas políticas de corte social-democrata estão cada vez mais visíveis. No caso dos EUA, para seu público doméstico, o Partido Democrata perdeu onde jamais perdera desse jeito, de forma tão escancarada: no voto sindical. A central estadunidense AFL-CIO, não tirou apoio para Kamala Harris. Tampouco tiveram prévias na interna, sendo Biden candidato para a reeleição por uma canetada. No início do governo Obama - no primeiro semestre de 2009 - a Superpotência vivia a dor de cabeça pós "farsa com nome de crise" da quebradeira do sistema financeiro através da especulação imobiliária e a venda de derivativos tóxicos. Ocorreram então dois fenômenos. Barack Hussein (sim, Hussein, de origem paterna, um economista queniano com família islamizada) tentou promover uma inflexão econômica e deixou como legado, além da criação de empregos precários (tal como Biden), o ObamaCare, um sistema de saúde menos cruel. No plano de repressão interna, seus oitos anos foram campeões de deportação de imigrantes ilegais (mais de 85% de origem latino-americana) e também, construiu a nova política imperial da Lawfare, o famigerado Projeto Pontes, que deu origem na Lava Jato. Com essa ferramenta e acessórios, obteve vitórias importantes contra nós, nosotros y nosotras da América Latina: junho de 2009, golpe de Estado em Honduras; junho de 2012, golpe de Estado no Paraguai e abril de 2016, golpe de Estado no Brasil. Tem mais, em novembro de 2015 Mauricio Macri ganha na Argentina alimentado por uma Operação de Lawfare, através de um operador sionista e da CIA, o procurador Alberto Nisman. Curiosamente este apareceu "suicidado" em janeiro daquele mesmo, em seu apartamento em Puerto Madero, Buenos Aires capital. Democrata ou Republicano, o Império é imperialista com os outros, especialmente com o chamado Sul Global. E a projeção de poder para a América Latina não para. A diferença é que os estadunidenses, incluindo o voto afro-americano e latino, resolveram punir ao Partido Democrata por sua timidez e platitude elitista. A "punição é o sofrimento coletivo" elegendo novamente um escroque, criminoso e canalha para sentar na cadeira de presidente do país que ainda é o mais poderoso do mundo.   *Bruno Lima Rocha  é jornalista, cientista político e professor de relações internacionais; é membro do ICCEP / O Coletivo, editor do programa Oriente Médio em Revista, colunista. Foto de capa: Reprodução/Agência Brasil Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

Eleições

Identitarismo, minorias e derrotas eleitorais

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Identitarismo, minorias e derrotas eleitorais
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Por LUIS FELIPE MIGUEL* A Folha publicou charge de Laerte sobre as eleições nos Estados Unidos. Mostra um grupo de defensores de “minorias” com cartazes em defesa de suas pautas — mulheres, negros, LGBTs e pregadores da liberação da maconha. Na frente deles, um apoiador de Kamala Harris, um homem branco provavelmente de meia idade, diz, irritado: “Viu o que vocês fizeram?” O recado é claro: a crítica à deriva identitarista é errônea. Tanto serve para apresentar uma desculpa fácil para a derrota, um bode expiatório, quanto faz com que lutas emancipatórias importantes, como as vinculadas ao combate ao sexismo, racismo e homofobia, sejam secundarizadas. Colocada a questão desta forma, Laerte tem razão. Mas, ao mesmo tempo, nessa charge (ao contrário, inclusive, de outros trabalhos seus) ela parece reduzir toda a crítica a essa caricatura. É um estratagema que vem sendo utilizado por parte da esquerda que está incomodada com a crescente oposição ao identitarismo — como se essa oposição representasse uma nostalgia da velha política que hierarquizava unilateralmente as agendas e desprezava as lutas contra múltiplas formas de opressão social: a postura do “esperem, que o socialismo vai resolver isso” (sendo “isso” a dominação masculina, o racismo etc.). Claro que não há sentido em voltar atrás na visibilização e na autonomização das múltiplas agendas emancipatórias. Mas é possível (e necessário) criticar o “identitarismo” sem recusar a relevância das lutas contra as opressões vinculadas a diversos marcadores de identidade existentes no mundo social. O primeiro ponto, que precisa sempre ser reiterado, é este: o “identitarismo” criticado não é a luta que tantos grupos travam por direitos, por respeito, por dignidade. Essa luta é essencial e faz parte de qualquer projeto de sociedade renovada. O “identitarismo” é uma maneira específica de enquadrá-la que, em resumo: Faz de cada identidade uma “essência”, negando o caráter histórico e conflitivo de sua fixação; Recusa a possibilidade de diálogo e construção coletiva, isolando cada um em seu grupo fechado e reificando o pertencimento a esse grupo; e Objetiva uma acomodação na ordem (neo)liberal, com a abertura de nichos de privilégio para uns poucos integrantes do grupo dominado e a evasão de qualquer enfrentamento mais sério com as estruturas do capitalismo. (Estou falando aqui do identitarismo sério, por assim dizer, não dos muitos picaretas e oportunistas que surfam na onda com suas performances lacradoras e “epistemologias” de ocasião, interessados apenas em promoção pessoal e monetizações de um ou outro tipo.) É claro que a causa da derrota de Harris (ou de Boulos, mas aí a discussão seria mais complexa) não foi o identitarismo. O verniz identitário, porém, permite que uma candidatura se coloque como “progressista” sem tocar em questões centrais vinculadas à economia política, à exploração do trabalho ou ao colapso climático, por exemplo. O resultado é um apego desproporcional a pautas de nicho, que alimentam as batalhas culturais de uma parcela diminuta da classe média com formação universitária — e nada mais. O que me leva ao segundo ponto: a charge de Laerte dá a entender que a campanha de Harris realmente concedia voz às reivindicações dos grupos representados no protesto. Será? Pode ser bacana receber o apoio de Beyoncé, que chega em seu jatinho particular e encarna a mulher negra “empoderada”, mas o que isso serve à mão de obra superexplorada, em grande medida feminizada e racializada, das grandes empresas — algumas delas, aliás, que ostentam a diva pop como garota propaganda? Isso reforça a posição da extrema-direita, que parece tratar de questões urgentes – ainda que só apresentando respostas ilusórias. Como disseram alguns analistas da política estadunidense, Trump avançou no eleitorado latino, mesmo com seu racismo inequívoco, porque o tratou como trabalhadores, ao passo que os democratas tendiam a tratá-lo como grupo identitário. Sim, o problema da campanha de Harris não foi seu excessivo identitarismo. Foi a ausência de um projeto capaz de falar, minimamente que fosse, à multidão de perdedores da “América”. Trump falou a eles — mentiras, mas falou. Mas os democratas tentaram mascarar sua falta de qualquer projeto transformador com os atributos identitários da candidata. A charge de Laerte, aliás, não coloca nenhum trabalhador no conjunto de grupos a serem representados pela candidatura de Harris. (Também não há referência à questão ambiental nos cartazes levantados, muito menos à questão palestina.) É significativo — a deriva identitária serve ao apagamento da luta de classes. Mas sem ela, isto é, sem o combate ao império cada vez mais avassalador do capital sobre todo o mundo social e também natural, qualquer avanço nas pautas emancipatórias será superficial e ilusório, qualquer democracia será pífia e a destruição do planeta, imparável. *Luis Felipe Miguel é doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), professor titular livre do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Autor, entre outros livros, de Democracia e representação: territórios em disputa (Editora Unesp 2014), Foto de capa: Charge de Laerte publicada na edição de 7 de novembro de 2024 da Folha de S. Paulo. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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Eleição de Donald Trump

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Eleição de Donald Trump
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Por LINCOLN PENNA* Quando estive no exterior em 1968 fui indagado sobre as eleições nos Estados Unidos, que estava em curso. Naquele ano, disputavam a presidência três candidatos, a saber: o republicano Richard Nixon, o democrata Hubert Humphrey e o independente George Wallace. Na ocasião e diante de uma indagação que me fora feito de supetão respondi que eram todos representantes de um sistema eleitoral, cuja escolha dos eleitores de cada estado obedecia menos aos eventuais programas a distingui-los do que o que cada um deles possuía de familiaridade com o perfil norte-americano. Em outras palavras, todos integravam grupos de poder econômico e político. Logo, a opção do eleitor médio, aquele que não segue rigorosamente partidos políticos ou tendências que embalam os debates, costuma prevalecer. Evidentemente, situações de extremas incertezas como os que se passaram por ocasião da Grande Depressão, de 1929 a 1933/34, que emponderou o presidente Franklin Roosevelt, pode vir a dar mais consistência a alguma liderança política. Fora isso, não existiu historicamente candidaturas que questionassem as estruturas do país. As mais progressistas (liberais para os padrões definitórios dos analistas políticos daquele país) sempre foram rejeitadas. Contudo, há os que julgam que exista duas questões que definiriam as diferenças entre os dois grandes partidos que disputam a preferência dos norte-americanos: a política interna, especialmente a de direitos sociais, mais cara aos democratas; e, a política externa, que tem sido sinalizada por um maior intervencionismo também por parte dos democratas. Nessa eleição, em particular, tanto a política interna quanto a externa, com as filigranas de sempre, favoreceram os republicanos. A questão econômica afetou como sempre os mais vulneráveis, e Trump e seus marqueteiros souberam tirar proveito dessa situação fartamente presente ao longo da campanha eleitoral. No que diz respeito à política externa os gastos militares do governo democrata de Biden nos conflitos que têm se efetivado em algumas partes do mundo, particularmente na defesa do governo ucraniano e no reforço para aumentar o poder bélico israelense pesaram no aumento dos gastos públicos e foi bem explorado por Trump. Cabe acentuar as críticas por ele desferidas à manutenção desse poder de dissuasão adotado pelos EUA a sustentar praticamente sozinho os multiplicados arsenais da OTAN, que só se mantém em razão do apoio material e financeiro do mais poderoso parcelo dessa organização criada no imediato pós-segunda guerra mundial. Para os aliados mais tradicionais dos EUA, a volta de Trump cria expectativas quanto aos compromissos diante do crescimento dos BRICS no que respeita e das muitas ameaças de forças extralegais que têm se alastrado em grande parte pelo não reconhecimento de uma das resoluções da ONU, como é o caso da criação do estado da Palestina e o reconhecimento, portanto, esse direito. A adoção de métodos que violam dispositivos próprios à convivência das diferenças, como o recurso a atos violentos por parte de movimentos pró-palestina como o Hamas acabam criando as condições propícias para o incremento da indústria de guerra com o objetivo de manter intacto o domínio do império do capital com sede nos EUA. No caso do Brasil, parte de fundamental importância em todos os níveis da América Latina, a eleição de Trump não deve ser tão mais desastrosa quanto se propala. O que deve acontecer, no entanto, é o isolacionismo que Trump irá certamente adotar em relação aos seus vizinhos americanos. Essa política de restrição à imigração é típica de lideranças autocráticas, por isso mesmo antidemocráticas, que pode excitar os saudosistas nazifascistas que a adotaram para justificar uma política expansionista, apesar da sistemática narrativa isolacionista. É curioso que em sua campanha Trump tenha reeditado e ilustrado o seu slogan “Make America Great Again”, que postou num boné como fizera quando de sua primeira eleição, e que aqui foi imitado pelo candidato à prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal. Assim, ganhou também não só a força das redes sociais como as imagens que a rigor não dizem nada, ou melhor dizem apenas tratar-se da crescente miséria da política exemplificada na ausência de um discurso argumentativo capaz de falar aos corações e mentes daqueles que ainda acreditam basta eleger representantes, cujo retorno às demandas dos representados quase sempre inexiste no que é fundamental.   *Lincoln Penna É Doutor em História Social; Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON); Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos). Foto de capa: Peter Foley / EPA / Lusa Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.    

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Recados e Lições da Vitória de Donald Trump

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Recados e Lições da Vitória de Donald Trump
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Por CARLOS EDUARDO BELLINI BORENSTEIN* A análise política envolve um esforço de interpretação dos fenômenos conjunturais e estruturais olhando não apenas o presente, mas também refletindo sobre o futuro, a partir da leitura mais realista possível. Neste artigo, em que é analisada a vitória de Donald Trump na eleição presidencial do Estados Unidos, este objetivo será perseguido. Independentemente das nossas preferências políticas, é importante reconhecer que a vitória de Trump representa um fato histórico de grandes proporções. A vitória no voto popular; entre os delegados; e a eleição de maioria na Câmara e Senado pelo Partido Republicano conferem a Trump o status de um dos maiores fenômenos eleitorais da política norte-americana. Números tão contundentes exigem uma análise realista para a compreensão deste fenômeno de repercussão global. Uma primeira observação importante é que a “nova direita” tem obtido sucesso em seduzir parcelas importantes da sociedade. Redutos que no passado pertenciam ao Partido Democrata – e ao conjunto de forças progressistas – vêm passando por uma metamorfose em seu comportamento eleitoral, alinhando-se à direita. Isso tem ocorrido porque a “nova direita” tem conseguido se apresentar como a representante dos anseios de parcelas importantes da sociedade, a partir de uma narrativa antiestablishment, que passa também pelo conservadorismo na pauta dos costumes, a defesa da prosperidade – marcada por um forte engajamento religioso na política, e o entendimento de que a economia no governo anterior de Trump estava em melhor que hoje. De outro lado, desde meados de 2016, quando teve início a ascensão da “nova direita”, as forças de esquerda têm apostado na narrativa do “combate à extrema-direita” e reflexões a respeito da “crise da democracia liberal”. Tais reflexões, repetidas pela campanha de Kamala Harris neste ano, geram um forte engajamento dos formadores de opinião a essas bandeiras, sendo reproduzidas pelo campo progressista mais intelectualizado, mas distante da compreensão do eleitor médio. Outra discussão importante envolve o identitarismo. Essa agenda, mesmo que represente a democratização de setores historicamente ausentes da representação política, também tem demonstrado um efeito eleitoral limitado. Mais do que a clássica explicação de James Carville “É a economia, estúpido”, o ambiente de “guerra cultural”, com o avanço da pauta dos costumes, tem prevalecido sobre o identitarismo progressista, ancorado na estratégia do medo direcionada fundamentalmente aos segmentos mais conservadores. Há, assim, um descompasso entre a agenda escolhida pelas forças progressistas e a percepção que os eleitores têm dessa pauta. Assim, as narrativas que soam como música na intelectualidade progressista são vistas de outra forma por parte significativa do mercado eleitoral. Estamos diante de uma dissonância, em que o discurso do combate à “extrema-direita” está distante da compreensão da sociedade, já que as esquerdas têm sido identificadas como o establishment. A “nova direita”, de outro lado, possui um discurso de fácil entendimento, que simplifica a compreensão da política e do mundo, através de uma comunicação segmentada, curta e direta, principalmente nas redes sociais, explorando a pauta dos costumes. A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos combinado com a vitória da centro-direita nas eleições municipais trazem também importantes desafios para o campo progressista quando olhamos para o Brasil. Embora não haja uma transposição automática do cenário norte-americano para o nosso país, é inegável que a ofensiva da direita coloca à esquerda na defensiva. Neste cenário, seguir ancorado no discurso do combate à “extrema-direita”, estabelecendo reflexões sobre a “crise da democracia”, colocando a pauta identitária no centro da agenda, continuará fortalecendo a estratégia da “nova direita”, que aposta na logica da polarização permanente. Além de abrir seu programa às novas realidades do mercado de trabalho, as forças progressistas terão o desafio de ampliar a Frente Ampla, caminhar para o centro e construir uma agenda que dialogue não apenas com a esquerda, mas contemple o centro. Basta observar os últimos resultados eleitorais de forma realista para constatar que a disputa com a “nova direita”, tendo como norte um programa e a construção política ancorada na chamada esquerda pura, está fadado ao insucesso na atual conjuntura em que o pêndulo se moveu para a direita.     Carlos Eduardo Bellini Borenstein, Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Bacharel em Ciência política (ULBRA-RS). Especialista em Ciência Política (UFRGS). Tem MBA em Marketing Político (Universidade Cândido Mendes). Analista político da Arko Advice pesquisas. Foto de capa:  Agência Brasil  Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

Economia

“Empreendedor Carente” e “Empreendedor Moderno”: Pequenas Empresas, Grande Exploração (de si próprio!)

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“Empreendedor Carente” e “Empreendedor Moderno”: Pequenas Empresas, Grande Exploração (de si próprio!)
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Por LUIZ ABERTO DE VARGAS* Segundo estudos do Sebrae, 4,63 milhões de beneficiários do Bolsa-Família, que estão do CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais), têm CNPJ como Microempreendedor Individual (MEI). Isso representa cerca de 30% dos cadastros de MEI. São os “empreendedores carentes”. Mais: 19 milhões que estão no Bolsa-Família se identificam como empreendedores informais. São o alvo dos programas de regularização previstos na Lei Complementar nº 128, de 2008 (conhecida como Lei do Empreendedor Individual), que consistem na inclusão social e o reconhecimento de microempreendedores de baixa renda e seus negócios, com a cobertura de direitos como previdência, incentivos governamentais, entre outros. São os candidatos a sair da informalidade e a ascender, pelo menos, a uma melhor condição de “empreendedores carentes”. De acordo com o IBGE, 30% das MEI não resistem após cinco anos. O estudo “Sobrevivência das empresas” do Sebrae aponta, como um dos motivos para tão alta de mortalidade, o fato de que boa parte dos microempreendedores individuais (42%) terem aberto a empresa por estarem desempregados, sem capacitação suficiente; nem conhecimento, nem experiências anteriores no ramo que escolheram - o que afeta diretamente a sobrevivência do negócio. Muitos abriram o negócio por necesside- e não por oportunidade - e deixarão a vida empresarial sem terem efetivamente a oportunidade de deixarem de ser carentes. Conforme o estudo “Informalidade e Microempreendedor Individual (MEI): Caminhos para a construção de uma cultura empreendedora justa e inclusiva” (Empreender 360)[1], menos de 10% dos empreendedores informais são classificados como “potencialmente produtivos” (dispõem-se a e/ou tem, efetivamente, condições de aproveitar a oportunidade de formalização como uma ferramenta de prosperidade). A maior parte ou subestima a importância da regularização ou vê grandes dificuldades para que seu próprio negócio vá além de um meio de mera sobrevivência. As formalizações sobre os microempreendedores (73,5%) ocorrem pela necessidade de “estar regularizado” – e não por uma efetiva estratégia de prosperidade. Assim, o estudo levanta a hipótese de um “impacto limitado, e até mesmo negativo, para negócios de baixa capacidade produtiva e empreendedores de baixa renda, especialmente os mais pobres”. Em geral, eles não estão maduros e em condições de arcar com os custos para manter o CNPJ: “Na hora de colocar na balança, fica a sensação de que somente a política pública, sem capacitação, informação, capital semente e outros tipos de apoio não é suficiente para diminuir a informalidade e desenvolver pequenos negócios que começaram por necessidade”. Uma das principais razões para o insucesso das políticas de formalização, é o “desfoco do público-alvo representado pela “pejotização” de trabalhadores celetistas – o que reduz o desempenho da política do MEI: uma política desenhada para gerar benefício para trabalhadores não-contributivos mostra-se insuficiente para regularizar os mais pobres (informais) e distorciva para trabalhadores já formalizados, que passam a contribuir menos, comprometendo uma melhor aposentadoria futura. São os “modernos empreendedores” terceirizados ou que, independentemente do objeto social de suas empresas, adotam novas formas de divisão do trabalho. Em relação a trabalhadores de baixa renda, há evidente pressão das empresas para substituir contratos celetistas por contratos terceirizados, transferindo o custo trabalhista ao prestador, mais frágil economicamente em uma deliberada política de redução de custos pela precarização do trabalho - algo facilmente constatável em processos trabalhistas e que passa desapercebido nas reclamações constitucionais do STF. O futuro provável de boa parte desses “empreendedores carentes” é não sobreviver mais que cinco anos e retornar ao desemprego. Mas a tendência precarizante atinge também trabalhadores de renda mais alta. No teto de faturamento anual do MEI (R$ 81 mil por ano), pode-se pensar na “transformação empreendedora” de um contrato de emprego celetista com um salário entre R$6 mil e R$7 mil para uma “relação de prestação de serviço” com a produtiva desoneração do empresário com todos os custos operacionais, trabalhistas, fiscais e previdenciários. Assim, cada vez mais assistimos médicos, advogados, bancários, vendedores, caminhoneiros e todo tipo de trabalhadores empregados com renda mais alta “livremente optarem” por adentrarem ao mundo empresarial como condição de sobrevivência. O futuro provável de boa parte desses “empreendedores modernos”, se sobreviver aos fatídicos cinco anos, será comprometer a aposentadoria que garantiria sua velhice. Para os empregadores, libertados da “interferência do Estado” nas relações de trabalho, trata-se de um “negócio da China”, com significativa redução de custos indiretos com o trabalho. Os “novos ocupados” (empreendedores carentes) e os “novos liberados da submissão ao contrato de emprego” (empreendedores modernos), agora dedicados a explorarem a si próprios, não têm mais o quê, nem para quem reclamar. Na ótica dos “adeptos do mercado” que monopolizam a opinião pública, são “o Brasil que deu certo”... e são integralmente responsáveis por radioso futuro ou por um (mais previsível) fracasso, já que tudo supostamente dependerá apenas de sua competência e esforço. Para o Brasil, a “estratégia pejotizante” mostra-se um sucesso aparente (78% das empresas criadas em 2023 eram MEI), mas um desastre real (a queda da arrecadação tributária e a queda da produtividade são fatores ocultos que não aparecem nas análises triunfalistas dos “economistas de mercado”) que, logo, será inevitavelmente visível até para quem não vê (ou não quer ver) as consequências sociais das decisões econômicas, jurídicas e políticas. Mas a grande bomba-relógio da verdadeira questão previdenciária (o desmonte do financiamento da Seguridade Social), que passa ao largo de todas as análises, somente explodirá dentro de alguns anos, comprometendo irremediavelmente o futuro do país. Admirável mundo novo! Ainda é tempo de despertar.   *Luiz Aberto de Vargas é Desembargador do Trabalho. Foto de capa:  Divulgação Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.    

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