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Por que questionar o racismo estrutural numa hora dessas?

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Por que questionar o racismo estrutural numa hora dessas?
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De MOISÉS MENDES* O sociólogo Muniz Sodré (foto) disse em entrevista à Folha, nesse domingo, que não há racismo estrutural no Brasil. A tese está em seu novo livro, O fascismo da cor (Vozes). Mexeu numa vespeira, porque o racismo estrutural está presente em quase toda a argumentação antirracista há muito tempo. Muniz Sodré é um dos grandes do pensamento brasileiro, e parte das suas reflexões tem foco na cultura negra. Atira no conjunto de argumentações defendidas por Silvio Almeida, advogado, professor, pesquisador, ativista do movimento negro, especialista em direitos humanos. Formado em direito e filosofia, autor de Racismo Estrutural (Editora Jandaíra), de 2019, Almeida é negro e ministro de Direitos Humanos de Lula, depois de quatro anos de domínio branco e fascista nessa área no governo de Bolsonaro. Por que questionar o conceito de racismo estrutural numa hora dessas? É uma pergunta inevitável. A direita e a extrema direita vão se divertir. A contestação acadêmica de Muniz Sodré vai, com certeza, parar nos tribunais, como base para argumentações jurídicas ao alcance de gente das estruturas racistas. Publico abaixo dois trechos. No primeiro, um trecho de entrevista da Silvio Almeida à Folha em 26 de novembro de 2020. Depois, um trecho da entrevista de Muniz Sodré. Este é o trecho de Silvio Almeida: “O Brasil é um país que se organizou de forma especialmente hostil contra a população negra. Isso pode ser visto desde a violência presente nas relações cotidianas até no escárnio e negacionismo demonstrado pelas mais altas autoridades da República quando se referem ao tema. O racismo não é uma questão pontual ou um efeito da “desorganização social”, mas é o próprio modo de ser da sociedade brasileira. O assassinato de João Alberto Silveira Freitas, um homem negro, nas dependências do supermercado Carrefour (no dia 19 de novembro de 2020), não foi o primeiro caso de violência racial em circunstâncias parecidas. Mas o fato de ter ocorrido no Dia da Consciência Negra e no ano marcado pelos protestos contra o assassinato de George Floyd nos EUA permitiu que se pudesse atentar de modo mais detalhado para a repetição de elementos comuns nesses casos de violência, algo que reforça a existência de uma estrutura racista. (…) E se ainda não bastasse, as mais altas autoridades da República resolveram negar a existência de racismo no Brasil. Há mais do que desrespeito nessas afirmações. Existe a vocalização de um pacto pela morte, uma vez que a negação do racismo é um salvo conduto para que negros e negras continuem sendo assassinados sem que ninguém assuma a responsabilidade. O Brasil não é um país seguro para pessoas negras. E é importante não apenas que o mundo saiba disso, mas que sejam criadas estratégias que tratem o racismo em toda a sua complexidade”. Abaixo, o trecho da entrevista de Muniz Sodré em entrevista à Folha nesse domingo, 19 de março de 2023: “O conceito de estrutura (para definir racismo estrutural) é um conceito complexo. Primeiro, tenho que advertir que não tenho nada contra falar em racismo estrutural, porque acho que, do ponto de vista político, é bom, é fácil. Dá um ancoramento para a ideia de racismo aqui no Brasil. Mas eu digo que ele não é estrutural. Parto de coisas simples, como a frase do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, quando ele disse que, no Brasil, as estruturas são feitas para não funcionar. Ele está falando da estrutura jurídica, da estrutura econômica, e é verdade. As estruturas aqui são feitas para não funcionar. Por que a única a funcionar seria o racismo? Acho que o racismo funciona exatamente porque ele não é estrutural. Minha visão é que o racismo que existia no Brasil estava consolidado e ligado à escravatura. Portanto, a estrutura escravista existia. Há um livro do historiador Jacob Gorender em que ele mostra a estrutura existente na escravidão. Outros ensaístas, como Alberto Torres, mostram que era uma estrutura que funcionava. O Brasil se sustentou na escravidão, foi ela que fez a acumulação primitiva [de capital] aqui e foi a coisa mais bem-organizada neste país. Mas isso acabou com a Lei Áurea. Ao contrário do que acham alguns amigos meus escritores negros, a Abolição não foi uma farsa. Ela efetivamente acabou com a sociedade escravista e, portanto, acabou com a estrutura escravista, mas não acabou com o racismo. São duas coisas diferentes. (…) Ele é institucional (o racismo). Defino no livro o que é estrutura. É um termo muito preciso na sociologia e na filosofia. O conceito pressupõe uma totalidade fechada de elementos interdependentes. Você pode falar, por exemplo, da estrutura jurídica: a doutrina do direito se reflete nos tribunais, no processo penal, nas leis. Isso é estrutural”. *Jornalista em Porto Alegre. Foi colunista e editor especial de Zero Hora. Escreve também para os jornais Extra Classe, Jornalistas pela Democracia e Brasil 247. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim). Imagem: reprodução. Publicado originalmente no Blog do Moisés Mendes. As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia. Para receber os boletins e notícias direto no seu Whatsapp, adicione o número da Rede Estação Democracia por este link aqui e mande um alô

Meio Ambiente

Medidas para contenção de mudanças climáticas são insuficientes

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Medidas para contenção de mudanças climáticas são insuficientes
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Relatório do IPCC propõe evitar emissão de gases efeito estufa Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), das Nações Unidas, divulgado nesta segunda-feira (20), aponta que o ritmo e a escala das medidas tomadas até agora, assim como os planos anuais, são insuficientes para lidar com as mudanças climáticas. O documento alerta que são necessárias medidas mais ambiciosas e mostra que, "se agirmos agora, ainda é possível garantir um futuro sustentável e habitável para todos". O IPCC foi criado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (ONU Meio Ambiente) e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) em 1988. A proposta é fornecer avaliações científicas regulares sobre a mudança do clima, suas implicações e possíveis riscos futuros, além de propor opções de adaptação e mitigação. O painel tem 195 países membros, entre eles o Brasil. “Em 2018, o IPCC destacou a escala sem precedentes do desafio de limitar o aquecimento a 1,5 °C. Cinco anos depois, o desafio é ainda maior devido ao aumento constante das emissões de gases de efeito estufa”, aponta o relatório. Para se chegar a esse índice de 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais, é necessário reduzir pela metade as emissões globais até 2030. “A queima de combustíveis fósseis e o uso desigual e insustentável de energia e terra por mais de um século causaram um aquecimento global de 1,1°C acima dos níveis pré-industriais. Como resultado, eventos climáticos extremos ocorreram mais frequentes e intensos que têm gerado impactos cada vez mais perigosos para a natureza e as pessoas em todas as regiões do mundo”, aponta o documento. Aditi Mukherji, uma das autoras do relatório de síntese, diretora do Instituto Internacional de Gestão da Água (IWMI, pela sigla em inglês), aponta que a justiça climática é crucial, pois aqueles que menos contribuíram para a mudança climática são afetados desproporcionalmente. Ao todo, 93 pessoas contribuíram com o documento. “Quase metade da população mundial vive em regiões altamente vulneráveis ​​às mudanças climáticas. Na última década, o número de mortes em decorrência de inundações, secas e tempestades foi 15 vezes maior em regiões altamente vulneráveis”, disse, em nota, Mukherji sobre o relatório. Para alcançar as metas de contenção das mudanças climáticas, o IPCC propõe ações que visam reduzir ou evitar a emissão de gases efeito estufa, como o acesso à energia e a tecnologias limpas, eletrificação de baixo carbono e estímulo ao transporte público. “Os benefícios econômicos para a saúde humana derivada apenas da melhoria da qualidade do ar seria aproximadamente a mesma, ou talvez até maior, do que os custos de reduzir ou evitar emissões.” Matéria publicada originalmente pela Agência Brasil. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil Para receber os boletins e notícias direto no seu Whatsapp, adicione o número da Rede Estação Democracia por este link aqui e mande um alô.

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EDUCAÇÃO E CIDADANIA: Sobre acolhimento e respeito em ações afirmativas

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EDUCAÇÃO E CIDADANIA: Sobre acolhimento e respeito em ações afirmativas
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De JOÃO CARLOS SALLES* 1. Devemos sempre renovar nosso compromisso com uma sociedade democrática. Passada a mais inclemente tormenta, sendo possível agora um diálogo com o governo federal, importa refletir e continuar a defender os valores universitários mais essenciais e permanentes. Afinal, um outro mundo é possível, mas nenhum valerá a pena em nosso país sem uma universidade pública e inclusiva, capaz de realizar, de norte a sul, ensino, pesquisa e extensão de qualidade. Estivemos juntos e misturados no combate aos desmandos vários de um governo tirano. Não fomos cúmplices dos absurdos que o obscurantismo mais completo nos quis impor. Agora, após uma vitória tão significativa, não podemos ser cúmplices de nenhum rebaixamento de nossos sonhos. Qualquer o governo, nossa medida é o bem comum – uma luta, pois, constante e de longa duração, que nos leva a resistir na tormenta e na calmaria contra toda e qualquer limitação de nossos sonhos deveras utópicos. Nada deve arrefecer, por exemplo, nossa defesa da universidade como espaço autônomo. Chova ou faça sol, é nosso dever, por exemplo: Combater a separação entre excelência acadêmica e compromisso social, uma vez que afirmar apenas o compromisso social ou apenas a excelência acadêmica, como dimensões separadas, é diminuir o brilho de nossa gente, que pode e deve iluminar com seu talento o espaço específico da vida acadêmica, produzindo ciência, cultura e arte; Combater a separação entre ciência básica e ciência aplicada, que se amesquinha inclusive na separação entre os interesses da ciência, da tecnologia e da inovação, por um lado, e os dilemas das humanidades Reafirmar, por outro lado, a ligação entre todos os níveis de ensino – contra, portanto, a oposição (enviesada e perigosa) entre educação básica e educação superior. Afirmar a universidade como parte de um projeto de nação e, portanto, como um projeto que nos coloca a todos em linha de conta, tendo todas as nossas instituições padrões de qualidade comensuráveis. Sim, no ambiente da universidade pública e contra interesses privatizantes, cabe insistir, nossa luta é sem trégua. Mesmo neste momento de clareira, de abertura, após tenebrosa noite, muitos são os riscos. Assim, precisamos estar preparados para o conflito (como sempre estivemos), mas também para a sutileza, como nunca podemos deixar de estar. Escapamos do escabroso, do abjeto. Pulamos a fogueira e, todavia, caímos no Brasil, no Brasil ele mesmo, digamos assim, com suas ambiguidades e sutilezas, com suas melhores esperanças e suas violências as mais ordinárias. Deixado a si mesmo, nosso país é assustador: excludente, autoritário, mal letrado – e isso é assim, que fique claro, em todo o Brasil, retrógrado tanto no Sul quanto no Nordeste, embora de maneira diversa e aparentemente oposta. Pensando no contexto da política e da cultura institucionais, é obviamente conservador e pode ser também retrógrado o cenário em que podemos operar, ao falarmos de conhecimento, de igualdade, de combate a preconceitos. Continuamos, pois, a viver a paradoxal situação de uma cultura rica, em diversas dimensões e por toda parte, mas situada em um espaço público primitivo, tosco, de sorte que a experiência da vida pública em nosso país tem amarras concretas, tanto simbólicas quanto práticas. Desse modo, a abertura de um semestre letivo, sempre carregada de esperanças, é mais que oportuna para refletirmos sobre os laços internos entre educação e cidadania. Farei isso, então, de duas maneiras. A primeira, bastante breve, em considerações gerais sobre a relação entre essas duas dimensões. Em segundo lugar, discutirei a importância do aprofundamento das ações afirmativas, que as traduzem, refletindo sobre uma possível ambiguidade que pode afetar e pôr em risco o significado mais profundo de nossas políticas de inclusão, que não podem se afastar do duplo desígnio de enriquecimento do processo educacional e de aprofundamento da cidadania. 2. O pensamento liberal clássico costuma ver a educação como condição de cidadania. Concede inclusive que esta talvez seja a única obrigação a ser arcada pelo Estado, que deveria custear a educação básica, como se o Estado firmasse então um compromisso com o cidadão futuro. Daria a esse futuro cidadão as condições de exercer seus direitos de escolha nos limites de uma democracia formal e representativa. Não recusemos a importância dessa ideia. Todavia, ela é insuficiente e mesmo perigosa em sua insuficiência. Por meio dela, cidadãos abstratos se formam para exercer um poder de escolha, reconhecendo sua unidade na matemática do voto ou na celebração de um título acadêmico. O indivíduo, tomado no abstrato e em função do seu futuro exercício de cidadania, teria compromisso apenas com a defesa de seus valores já familiares e interesses individuais. E a educação, supondo um laço comum entre idênticos, poderia assumir a mera tarefa de reproduzir distorções e sublimar exclusões, e não a tarefa de reinventar a ligação entre os contratantes do pacto social. Importa-nos afirmar o outro lado da equação, ou seja, pensar a cidadania como condição da educação. O cidadão, tomado agora não como um ente abstrato cuja formação tão só permitiria uma participação mais esclarecida em um debate eleitoral, tem agora concretude, cor, história, gênero, idade, classe, raça. Sua vida pública não se limita a uma participação eleitoral anódina, mas carrega, também em palavras, também em sua formação, as marcas de sua instalação social, de modo que a educação, assim pensada, não mais deve encobrir diferenças nem sublimar exclusões. Por isso mesmo, é mais que oportuno pensar as tarefas da educação e as tarefas da cidadania, lembrando que a produção de uma unidade cívica, caso esconda uma diversidade social perversa, é mera dominação; e a produção de uma unidade pela educação, caso apague uma diversidade cultural rica, é mera catequese, adestramento. Pensar, em conformidade com uma nova matriz, a conjunção entre educação e cidadania, é restabelecer um solo utópico para um projeto de nação, no qual a universidade pública, por exemplo, não se restrinja à função instrumental de formação técnica para o mercado. Ao contrário, ao associarmos os dois termos, estamos também ligando o presente ao passado, a parte ao todo, o interesse eventual do poder aos desígnios mais elevados da liberdade. E recolocamos, enfim, para nossas escolas e faculdades, a tarefa especial de constituição de um espaço de iniciação à vida comum, no qual o processo de formação de pessoas e o processo de produção do conhecimento guardam analogia profunda com a produção democrática da sociabilidade. Sigamos, pois, à luz o espírito de uma conjunção estreita entre educação e cidadania, para o segundo e bem mais extenso momento de nossa reflexão, cujo tema mais específico é o significado e a importância das ações afirmativas no solo de uma sociedade como a nossa, marcadamente excludente e autoritária. 3. A conjugação entre um acolhimento compassivo e um autêntico respeito comporta imenso desafio teórico e, sobretudo, político. Não por acaso, pode parecer mesmo contraditória, como se ocultasse um oxímoro e uma armadilha a ligação entre ‘concernir’ e ‘respeitar’. Pretendemos analisar a ligação entre esses conceitos em uma situação que amiúde os solicita como complementares, qual seja, a dos processos de aprendizagem e de formação. A experiência que temos em mente não se dá fora dos marcos das instituições acadêmicas, mas a benção de aparente racionalidade no interior da academia não suprime uma perigosa ambiguidade presente em tais termos. Pretendemos, assim, mostrar tal ambiguidade na implementação de ações afirmativas na educação superior (em particular, no caso do Brasil), quando os termos da equação, então tornados indicadores concretos, nos permitem levantar diversas questões. Por exemplo: Como o processo de aprendizagem pode não significar um aprofundamento da servidão? Servidão dos alunos aos mestres, das escolas aos poderes constituídos, do espírito criador ao ranço da repetição? Como transformar em política o que pode subverter o segredo aparentemente comum a toda política, qual seja, o de preservar e reproduzir os privilégios anteriores com o máximo de sutileza? Por outro lado, como a instituição pode ser subversiva em relação a si mesma, sabendo evocar e criar condições para que cada estudante esteja na posição de julgar posições e comportamentos por si mesmo, ou seja, de seu lugar, levando ao centro a contribuição de seu lugar próprio, que deixa então de ter a marca de um lugar natural? Um traço do processo de subordinação que tolhe o processo de aprendizagem reside na redução do aprendizado a um processo isolado, valendo o coletivo tão só pela estatística. Faz parte então de um modelo de combate, de uma perspectiva utópica da aprendizagem, criar condições para que cada estudante seja legião, ou seja, para que nele transpirem os movimentos sociais, as forças da história. Por outro lado, faz parte desse mesmo modelo, um tanto paradoxalmente, criar condições para que cada estudante esteja em linha de conta com todos os recursos da linguagem e tenha pontes para culturas que não são diretamente a sua. A construção da justiça, acreditamos, não sendo vista como externa, depende da capacidade coletiva de harmonizar essas medidas desejavelmente desarmônicas, compreendendo que a aparente placidez da vida institucional pode ocultar formas profundas e violentas de tradução de conflitos sociais. 4. Para analisar a tensão efetiva entre “concernir” e “respeitar”, tomaremos um modelo ideal, o das condições de uma comunicação desimpedida. Enquanto modelo descritivo, ele pode ser tão artificial quanto a afirmação contrafactual de que todos somos iguais em direitos. Por outro lado, como modelo normativo, ele não deixa de ser necessário, assim como é necessária a afirmação reiterada de nossa igualdade. A tensão presente entre os termos, bem como entre a natureza descritiva ou normativa do modelo, fica mais clara quanto levamos em conta uma experiência particular, a saber, a da implantação de ações afirmativas na universidade pública brasileira. Nosso objetivo é, portanto, ler as implicações desse modelo abstrato como guia desafiador e instável na implementação de ações políticas concretas, de modo que o acolher não se torne uma forma de condescendência que mantém a subordinação, nem o respeitar seja uma mera formalidade, que acaba por suprimir a emergência de novos valores e conteúdos. Ora, quais são os traços essenciais (cada qual necessário e, em conjunto, suficientes) de uma comunicação desimpedida? Em instituições como as acadêmicas e sobretudo em experiência de ensino, nas quais os conflitos podem e devem ser resolvidos pela palavra, são condições ideais de argumentação: (i) a igualdade de direitos de quantos argumentem; (ii) a igualdade potencial de compreensão; (iii) o reconhecimento da alteridade potencial ou efetiva; e (iv) a crença comum na eficácia da linguagem. A justificação desses traços é relativamente simples. Não a detalharemos aqui. Basta dizer que tal justificação, em suma, lembra-nos que (1) o autoritarismo é infenso ao debate, (2) dificuldades individuais devem ser superadas coletivamente, (3) o mérito se constrói como uma experiência coletiva e não como um privilégio eventualmente oriundo de alguma desigualdade e, enfim, (4) a linguagem é necessária para a experiência democrática de convencimento e a construção da sociabilidade. O maior desafio das instituições é tornar realidade um modelo tão próximo da utopia. O modelo, porém, pode servir como um guia, sendo aplicável a políticas amplas e ao dia a dia, inclusive no espaço da sala de aula. O modelo tem por base um processo de procura de convencimento não unilateral, ou seja, todos devem, em última instância, estar em condições de convencer e de serem convencidos. Aqui, convencer significa trilhar um caminho que todos devem poder seguir, caso diante das mesmas evidências e recursos. O modelo de comunicação torna-se um modelo de encontro. Ele não retira a prerrogativa do professor, não transforma o professor em um simples aluno, mas visa a renovar a autoridade do professor no exercício do ensino. O professor, assim, não tem uma autoridade formal; e o ensino não pode se reduzir a uma catequese. De certa forma, o modelo valoriza a experiência da aprendizagem ao valorizar a experiência prévia dos agentes (nada passivos) envolvidos no processo, e nos lembra uma imagem de Martin Buber: Quando, seguindo nosso caminho, encontramos um homem que, seguindo o seu caminho, vem a nosso encontro, temos conhecimento somente de nossa parte do caminho, e não da sua, pois esta vivenciamos apenas no encontro. Essa descrição do encontro coloca o desafio de valorização plena da alteridade, que está na base do modelo de comunicação ideal. Esse modelo, para nos valermos de uma analogia adicional, valoriza a contribuição inusitada que resulta de nossa abertura para o outro, que não pode ser tratado como uma massa informe, a ser moldada em conformidade com padrões que pouco têm a ver com sua natureza e história. Permitam uma analogia. O ofício da formação de pessoas parece-nos mais semelhante à arte de esculpir obras em madeira. O barro aceita quase tudo – a começar do ser humano. A argila (e até o mármore) permite curvas ou linhas retas, mas a madeira não é assim passiva, e costuma resistir de um modo sempre único, como reagem as palavras. A madeira não se deixa torcer de qualquer jeito. A forma nela não brota de um silêncio prévio, e texto algum nasce mesmo de uma página em branco. Insidiosa, sua matéria se aninha, sugere, antecipa, guarda linhas de força, a memória dos nós, os acasos, as cicatrizes do tempo. A madeira permite ousadias ou condena o artesão a repetições. E só o verdadeiro artista lhe arranca formas inusitadas e nela adivinha o destino implacável de anjo ou demônio, antes oculto e indefinido. O artista sim consegue despertar a forma mais secreta e restituir significados, levando-nos a ver com autêntica surpresa desenhos antes adormecidos. A analogia aplica-se a nosso modelo e a todo ofício da expressão e da formação humana – esse esforço que não se reduz à palavra, mesmo encontrando nesta um especial exemplo. De certa forma, ao refletirmos sobre ações afirmativas, estamos também refletindo sobre a luta pela expressão no barro, na madeira, em sons, em cores, corpos e, especialmente, na palavra; enfim, sobre a luta pela afirmação da linguagem e, de modo mais específico, pelo direito à palavra e sobre as relações íntimas e deveras ambíguas entre a conquista da linguagem e suas promessas de liberdade. 5. Ações afirmativas são instrumentos permanentes de construção da sociabilidade. Elas ultrapassam a mera reparação individual ou a reposição do valor de um grupo, constituindo sobretudo um meio de longa duração de invenção possível da humanidade. Por isso, mais que abençoarem uma comunidade com uma solução, elas nos confrontam com muitas medidas em aberto. Vejamos o caso da universidade pública na sociedade brasileira. A sociedade brasileira é estruturalmente desigual e arraigadamente autoritária. Nesse contexto, a universidade pública começa no início do século passado como um projeto das elites, mal contemplando em cursos menos valorizados camadas da população condenadas a alguma espécie de subserviência. Não por acaso, o número de vagas era relativamente pequeno, sendo flagrante então o déficit de vagas no ensino superior – déficit, aliás, que ainda é significativo, mesmo após a grande expansão de vagas e criação de novas universidades nas duas últimas décadas. A Universidade Federal da Bahia, por exemplo, não chegava a 20 mil alunos nos anos 90. Agora, o número de discentes de graduação e pós-graduação já é superior a 50 mil. Todavia, mesmo após um tal salto e com o esforço das universidades para que a exclusão vivida fora do ambiente universitário não seja vivenciada em nosso meio, preserva-se a desigualdade em nosso ambiente. Notável, porém, é o número de estudantes em vulnerabilidade. Cerca de 70% dos alunos da UFBA têm renda familiar mensal per capita de até um salário mínimo e meio. E desses estudantes em vulnerabilidade, cerca de 50% deles têm renda familiar mensal per capita de menos de meio salário mínimo. Nesse contexto, sem o extremo esforço por oferecer moradia, alimentação e acesso a material escolar, não se pode pedir que os estudantes possam corresponder ao mínimo padrão de qualidade acadêmica. Além disso, é preciso ter em conta outro déficit, qual seja, o fato de que esses estudantes (tendo muita vez sua herança cultural negada) vivem uma privação sistemática de acesso aos bens de cultura, estando afastados da capacidade de valorizar até mesmo sua própria herança e de ter domínio sobre outros meios de expressão na linguagem. As formaturas oferecem um bom exemplo do ritual de passagem que estamos vivendo. Estudantes se formam acompanhados de seus pais, que muitas vezes estão pisando pela primeira vez no território de uma universidade. Esse ritual é emocionante, dá a entender em cada caso que uma página pessoal e social está sendo virada. Esse ritual, porém, pode também ser ilusório, muito em conformidade com os procedimentos sutis de discriminação próprios da sociedade brasileira, que costumava ser descrita pela ideologia dominante como uma espécie de democracia racial – quando, ao contrário, nossa sociedade é marcada por um racismo estrutural, ora bastante explícito, ora violentamente sutil. A população majoritariamente negra em nossas cadeias e a violência das estatísticas são suficientes para mostrar a face explícita da violência racial. Por outro lado, a imagem de um convívio cordial estava dada na inexistência de uma clara separação dos espaços destinados a brancos ou a negros, por exemplo. A exclusão havia e continua a haver, sem dúvida. Clubes recusavam filiação, empregos exigiam o que chamavam de “boa aparência”, e prédios residenciais separavam elevadores “sociais” de elevadores de “serviço”, de modo que a discriminação social ficava acobertada por uma separação aparentemente neutra de funções. Outra maneira sutil de discriminar, tornando invisível a presença, se dá com a exigência de fardas para empregadas e babás em condomínios. Sua presença nos espaços estaria autorizada por sua negação. Negros ou pardos (ou pessoas flagrantemente pobres) só estariam nesses lugares por suas funções e não como pessoas. A farda seria uma espécie de manto de invisibilidade. Aqui, podemos lembrar uma historieta do Padre Brown, do inteligente conservador G. K. Chesterton. Padre Brown descobre o mistério de alguém que teria aparecido morto, quando, por seu próprio testemunho ao telefone pouco antes de ser assassinado, não havia ninguém com ele. Simplesmente, ele não considerava o empregado fardado do correio um alguém. Dado tamanho contexto de exclusão, é preciso aplicar o modelo ainda com mais força, de modo que as diferenças de acesso à linguagem, o reconhecimento da alteridade, o respeito à diferença e a afirmação da igualdade possam se dar mesmo em condições tão extremas e desiguais. Caso contrário, não se levando em conta esse quadro de discriminação, o acesso ora propiciado a camadas amplas pode mitigar a dor, mas não superar, nem de longe, a grave desigualdade. A segregação, afinal de contas, com suas sutilezas, pode bem ser traduzida em profissões de distintos “apelos e relevâncias”, de distinta acolhida no mercado ou no imaginário. Pessoas passam a ser concernidas pela efetividade das ações afirmativas, sem que estejam sendo plenamente respeitadas. Em sendo assim, até os diplomas distribuídos fartamente podem se transformar em mantos de invisibilidade e boa parte da ascensão social pode ainda ser feita pelo elevador de serviço. 6. No Brasil, superar a pobreza extrema é tarefa antiga e sempre urgente. Entretanto, superar a miséria não é superar a servidão; não constitui por si uma medida do diálogo democrático que temos o dever de desejar. Uma legislação ambiental progressista não garante por si a proteção do meio ambiente, e leis de proteção à diversidade não implicam o fim do preconceito; assim, precisamos querer mais, precisamos retirar do modelo ideal suas consequências mais profundas. Dessa forma, mesmo tendo uma utilidade imediata para orientar políticas públicas imediatas (como quando na UFBA foi preciso decidir em favor das bolsas de assistência estudantil, apesar da elevada dívida com a fornecedora de energia elétrica), nosso modelo pode orientar-nos a decidir por mais e a ter um horizonte pragmaticamente utópico, como se disséssemos com Clarice Lispector: “Liberdade é pouco. O que desejo ainda não tem nome.” Poder articular palavras é, então, abrir um novo campo de direitos. Importa aqui afastar qualquer inocência em relação ao termo ‘liberdade’, que é deveras ambíguo. Alguns podem acreditar livre quem não encontra obstáculos externos à sua realização – um curso d’água que não encontra uma barreira, por exemplo. Para valorizar a liberdade, caberia então apenas desimpedir o que antes enfrentava obstáculos para se realizar. Ora, com isso, estabelece-se uma certa ilusão das origens, como se estas estivessem bem definidas, sem possibilidade alguma de redefinição posterior. Nesse sentido, podemos listar exigências políticas e acadêmicas suscitadas por tal esforço ainda incompleto de construção democrática. Como política, a articulação entre as noções de ‘acolher’ e de ‘respeitar’ à luz de um modelo de comunicação desimpedida leva-nos a algumas consequências, dentre as quais podemos apontar que: as pontes entre a instituição que acolhe e as comunidades acolhidas precisam ter duas direções. Esta é uma consequência de natureza institucional e também epistemológica. Por um lado, as pontes criadas não podem significar um ato de pura catequese, que desconheceria a riqueza prévia de quilombolas, indígenas, comunidades de fundo de pasto, comunidades tradicionais, saberes populares. Por outro lado, o encontro ele mesmo deve agregar valor, de sorte que não cabe ensejar uma mera lógica de substituição e ocupação de espaço, que desconheceria inclusive a existência anterior de procedimentos acadêmicos consistentes de produção de saber. Cabe assim afastar unilateralidades. Ou seja, cabe evitar tanto alguma espécie de dominação eurocêntrica ou etnocêntrica, como também, ao concernir e acolher novas pessoas e novos saberes, estabelecer uma dimensão de respeito mútuo, de modo que o diálogo cultural e epistemológico leve ao acréscimo e cresça pela multiplicação e não opere por simples supressão; a construção de um espaço de diálogo equivale ao exercício de semear liberdades. Esta, uma consideração filosófica ampla. Em exercício de construção deliberada da sociabilidade, liberdade não é simples afirmação do que existia antes do encontro, não é mera reparação ou modo de tornar equivalentes os desiguais. No espaço do encontro, tanto não tem liberdade quem pode fazer qualquer coisa, quanto não a tem quem não pode fazer nada. Sendo o indivíduo uma invenção da linguagem que o articula, tanto sua liberdade não pode ser mera indiferença, quanto nunca será livre a simples afirmação idiossincrática. Ao contrário, é preciso poder inventar coletivamente nossas identidades e idiossincrasias. afirmar positivamente tal modelo ideal, transformá-lo em política pública, implica recusar uma certa ideia individualista de liberdade. Esta, uma consideração também filosófica, mas bem mais específica. No espaço do encontro, a liberdade não pode ser simples obrigação de retorno à origem ou afirmação do que já estava dado, embora posto a ferros. Servidão não pode ser destino. O indivíduo livre deve assim superar as inibições que não são uma marca de natureza; deve ser capaz de fazer a terapia das ilusões que o condenam à servidão por simplesmente estar em sociedade. Se o indivíduo fosse anterior à sociedade, retornar à sua limitação, retornar a um si mesmo, seria como reencontrar o que a vida comum (dada como posterior) teria apagado. Ora, mantida tal ilusão, o indivíduo apareceria como transparente a si mesmo, enquanto o outro seria sempre opaco, além de intransponível obstáculo. O modelo tem então a consequência profunda de nos ensinar que não há verdadeira liberdade sem a possibilidade de um exercício comum da imaginação. a tarefa da implantação de modelos de comunicação não se limita à sala de aula. Esta é, enfim, uma consideração política central. Com tamanho desafio de reconhecimento recíproco e reinvenção, tal implantação de uma cultura profundamente democrática não pode estar restrita a códigos de conduta científica ou acadêmica. Por óbvio, além do exercício específico da educação, seu sucesso depende da sociedade, de contextos que doravante autorizem a expressão plena da linguagem, afastando quaisquer manifestações de autoritarismo e obscurantismo e, sobretudo, combatendo as desigualdades estruturais, sociais, culturais e econômicas, em nosso país, que atravessam sim relações de gênero, classe e raça. 7. Não é previsível o que pode resultar da aplicação de modelos radicais de política pública. Apenas devemos poder querer fazer bem mais do que repetir alguma prosa, do que apenas receber ensinamentos de cuja elaboração não participamos, pois precisamos querer ter condições de elaborar e incluir nossa própria narrativa. Não basta aprender a repetir fórmulas que nos fizeram saber de cor, mas é preciso sim poder expressar inclusive o que pode dissolver tais fórmulas. Pensamos, afinal, com fórmulas para podermos ir além delas; aprendemos de cor muita coisa para podermos ampliar os limites da linguagem. Por assim dizer, queremos poder fazer nossa própria literatura e, ao dominarmos os signos, ser capazes de juntos fazer poesia. É muito talvez, mas está longe de ser tudo. Afinal de contas, fazer política é a arte de nunca nos contentarmos com os abismos. Concluímos, enfim. Em nossa fala, tão somente lembramos tarefas que são as da educação enquanto associada a projetos radicais de cidadania – a saber, criar as condições de organização da experiência por meio de experiências de linguagem que não predeterminem nem consolidem relações de exclusão ou de dominação. A tarefa da educação, que é especialmente a da universidade pública, é afinal prover cada sujeito das condições de exercício pleno de sua subjetividade, e garantir a precedência da palavra, do símbolo, do gesto significativo, sobre todas as formas de poder, de modo que nossa comunicação, sendo desimpedida, expresse uma sociedade na qual sejamos economicamente iguais e nos encontremos de forma democrática, realizando de forma coletiva o vaticínio enunciado outrora por Herder: Quanto mais profundamente alguém descer em si mesmo, na construção e na origem de seus pensamentos mais antigos, mais ele cobrirá os olhos e pés e dirá: eu sou o que eu me tornei. *Professor do Departamento de Filosofia FFCH-UFBA (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia). Imagem em Pixabay. As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.

Politica

TSE pede acesso ao inquérito da minuta golpista; CPI no Senado sobre 08/01 não atinge mínimo de assinaturas

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TSE pede acesso ao inquérito da minuta golpista; CPI no Senado sobre 08/01 não atinge mínimo de assinaturas
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O ministro Benedito Gonçalves, corregedor-geral da Justiça Eleitoral (TSE), pediu no domingo, 19, para ter acesso à perícia feita na minuta do golpe, documento que previa impedimento de apuração das eleições do ano passado. O pedido foi feito dentro da investigação do tribunal que apura possível crime eleitoral do ex-presidente Jair Bolsonaro em reunião com embaixadores, em julho do ano passado. O documento foi encontrado na casa do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres.  O PDT pediu que a minuta fosse incluída por Gonçalves na ação de investigação judicial eleitoral (Aije). Para o ministro, pode haver relação entre a reunião com os embaixadores e o texto do documento. A perícia, realizada pela Polícia Federal (PF), buscou identificar as digitais de pessoas que tiveram acesso ao papel. Além do acesso, o Gonçalves pediu ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a inclusão do depoimento de Anderson Torres no inquérito que apura os atos antidemocráticos no dia 08 de janeiro. Pedido de CPI não tem assinaturas o suficiente O requerimento para abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os atos golpistas não teve o número mínimo de 27 assinaturas necessárias no Senado Federal, um terço da Casa. O pedido foi feito pela senadora Soraya Thronicke (União-MS), em janeiro. Na época, o requerimento recebeu 38 assinaturas. Porém, com a posse dos novos parlamentares, perdeu-se a validade. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pediu que os senadores confirmassem a assinatura até sexta-feira, 17. Dos 38, apenas 15 se mantiveram favoráveis a abertura da CPI. Com informações da Agência Brasil e do g1. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil Para receber os boletins e notícias direto no seu Whatsapp, adicione o número da Rede Estação Democracia por este link aqui e mande um alô.

Educação

Novo Ensino Médio prejudica acesso acesso dos estudantes ao Ensino Superior, afirma UNE

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Novo Ensino Médio prejudica acesso acesso dos estudantes ao Ensino Superior, afirma UNE
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De Congresso em Foco Criado em 2017 pela Lei 13.415, o Novo Ensino Médio (NEM) foi alvo de inúmeros protestos e mobilizações nesta semana por todo o país. As novas diretrizes de ensino são criticadas, principalmente, por não levarem em conta a situação das escolas públicas brasileiras, o que amplia as disparidades entre o ensino público e o privado, além de prejudicar o acesso dos alunos ao ensino superior. Presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Bruna Brelaz afirma que é preciso abrir “novos diálogos” para se definir o futuro do ensino médio, mais alinhado aos interesses e realidade dos estudantes e do corpo docente. “O Novo Ensino Médio não está conectado ao século 21 e traz um aumento na desigualdade entre público e privado. Oferece um ensino técnico para os mais pobres e mais científico para os mais ricos”, afirmou Bruna ao Congresso em Foco. Um dos principais pontos do NEM é a flexibilização do que o estudante aprende na escola, formado por uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) — onde os alunos estudam matérias básicas como Português e Matemática — que é complementada por um itinerário composto por outras disciplinas com ênfases em áreas de linguagem, matemática, ciências da natureza, ciências humanas ou ensino técnico. No entanto, a oferta dessas outras matérias depende da disponibilidade de cada escola, o que exige recursos e equipe. “O NEM não prepara o aluno para entrar no ensino superior. Os estudantes têm dificuldade para acessar o itinerário completo. Às vezes, tem que mudar de escola, mudar de bairro, para conseguir estudar o que precisa. Os professores dentro desse NEM também tem um trabalho cada vez mais precarizado”, reforçou a presidente da UNE. A reforma do ensino médio não veio acompanhada por uma mudança na maneira que os estudantes são avaliados para entrar no ensino superior, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vestibulares, que continuam apresentando questões multidisciplinares e de diversos assuntos, ao contrário do que é disponibilizado pelo NEM. Na avaliação de Bruna, esse é um dos pontos mais urgentes que precisam ser revistos nas novas diretrizes. A entidade estudantil também defende a revogação completa do NEM, para então um novo modelo ser construído conjuntamente entre governo, alunos e profissionais. O Ministério da Educação (MEC) abriu na semana passada uma consulta pública válida por 90 dias para avaliar e reestruturar a política nacional de ensino médio. A abertura do processo sinaliza que o governo pretende fazer um aperfeiçoamento no NEM, ao invés de seguir para uma revogação completa, como defende a UNE. Com a consulta, o MEC espera dialogar com a sociedade civil, a comunidade escolar, os profissionais do magistério, as equipes técnicas dos sistemas de ensino, os estudantes, os pesquisadores e os especialistas do campo da educação para tomar decisões quanto ao futuro do NEM. “Eu acho que tem condições da gente fazer uma boa conversa com o MEC. Nesse primeiro ano, o foco é diminuir algumas crises que acontecem nas escolas”, destacou Bruna. “A gente deve resolver as pautas emergenciais e dar esse próximo passo para construir a viabilidade de revogação. Essa deve ser uma pauta nossa para que o MEC entenda que a reforma da reforma não vai resolver o problema”, concluiu. Em nota, o MEC afirmou que qualquer tomada de decisão e reavaliação quanto ao Novo Ensino Médio terá como base o “diálogo amplo e democrático” e que a prioridade é a oferta de um “ensino médio público de qualidade”. O ministério reforçou o papel da consulta pública aberta na semana passada, destacando o objetivo de “ampliar e qualificar o debate público”. O ministério também informou que editará uma portaria para recompor o Fundo Nacional da Educação (FNE), reintegrando as entidades e movimentos populares nos processos de discussão, inclusive no que envolve o NEM. “O MEC segue aberto ao debate com estudantes, comunidade escolar, profissionais do magistério, equipes técnicas dos sistemas de ensino, pesquisadores, especialistas do campo da educação e toda a sociedade”, destacou o ministério. Por Caio Matos Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil Para receber os boletins e notícias direto no seu Whatsapp, adicione o número da Rede Estação Democracia por este link aqui e mande um alô.

Geral

Governo relança programa Mais Médicos

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Governo relança programa Mais Médicos
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O governo federal retoma, nesta segunda-feira, 20, o programa Mais Médicos destinado a contratação de profissionais para dar atenção à saúde primária, principalmente em áreas mais pobres. A cerimônia, marcada para às 11h no Palácio do Planalto, teve a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra da Saúde, Nísia Trindade. Com o relançamento, o governo pretende ter cerca de 28 mil profissionais fixados em todo o país. Para isso, serão investidos R$ 712 milhões neste ano. Ainda este mês, um edital com 5 mil vagas será aberto. "Profissionais brasileiros e intercambistas, brasileiros formados no exterior ou estrangeiros, que continuarão atuando com Registro do Ministério da Saúde (RMS)" podem se inscrever nos editais, conforme informado em nota. Os médicos brasileiros formados no Brasil terão preferência na seleção de novos profissionais. Outras áreas como odontologia, enfermaria e assistência social serão incluídas no programa. O Mais Médicos voltou para responder ao desafio de garantir a presença de médicos a cidadãos de municípios mais distantes dos grandes centros e que sofrem com a falta de acesso”, declarou a ministra Nísia Trindade. Novidades O Mais Médicos foi criado em 2013 pela presidenta Dilma Rousseff. Desde então, o programa sofre com o alto nível de desistência e rotatividade dos médicos. Cerca de 41% dos profissionais deixam de participar em busca de capacitação e qualificação, segundo o Ministério da Saúde. O ano de 2022 foi o de maior desistência. "O médico que participa do programa poderá fazer especialização e mestrado em até quatro anos. Os profissionais também passarão a receber benefícios, proporcional ao valor mensal da bolsa, para atuarem nas periferias e regiões remotas", explica a pasta. As mulheres irão receber compensação na licença-maternidade e o homens poderão se afastar por 20 dias. Além disso, o governo quer atrair os médicos e as médicas formadas com ajuda do Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES). Os participantes receberão incentivos para ajudar a pagar a dívida. Revalida No início deste mês foi aplicada a primeira etapa do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituição de Educação Superior Estrangeira (Revalida). A prova serve para revalidar os diplomas dos profissionais que querem atuar no Brasil, estrangeiros ou não. No entanto, o secretario de Atenção Primária do Ministério da Saúde, Nésio Fernandes, disse ao g1 que os médicos estrangeiros receberão um registro médico temporário para atuar no país. Para o presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), José Hiran Gallo, os profissionais formados no exterior precisam validar o seu diploma do Brasil. De acordo com o g1, a primeira versão do Mais Médicos também deixou o Revalida de fora das regras do programa. Assista: [embed]https://www.youtube.com/watch?v=OmcdcnZ0iAo&ab_channel=Lula[/embed] Com informações da Agência Brasil e  Palácio do Planalto Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil. Para receber os boletins e notícias direto no seu Whatsapp, adicione o número da Rede Estação Democracia por este link aqui e mande um alô.

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