Por SOLON SALDANHA*
As motivações dos conflitos permanentes no Oriente Médio são múltiplas e históricas. Seria mais fácil calcular o número de dias nos quais não se teve confronto, no último século, do que aqueles em que houve senão paz ao menos um intervalo entre escaramuças. Isso porque eles são de fato muito menores. Agora, se tem algo que leigos devem enfrentar uma enorme dificuldade de entender é como podem existir tantas instalações militares dos EUA em países árabes, se até os paralelepípedos da minha rua sabem que o país norte-americano está sempre ao lado de Israel. E elas estão lá, tanto que as notícias dos últimos dias confirmaram ataques concretos do Irã a dois desses locais, como forma de represália depois de ter sofrido pesados bombardeios. No total seriam 21 as instalações em dez nações diferentes: Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Egito, Emirados Árabes Unidos, Iraque, Jordânia, Kuwait, Omã e Síria. Oito delas são consideradas permanentes. Essa é a maior presença militar fora de seu próprio território.
Inicialmente se pode dizer que essa situação remonta à Segunda Guerra Mundial, mas apenas foi durante a Guerra do Golfo (1990-1991) que se consolidou a presença dos estadunidenses na região. Foi assim que, depois de expulsar as forças iraquianas do Kuwait, mantiveram as tropas com a desculpa de dissuadir novas agressões. Evidente que assegurar o fornecimento de petróleo sempre foi muito mais importante do que a preocupação com vidas e estabilidade de governos, mas isso jamais é confessado. O segundo momento recente ocorreu na sequência dos atentados de setembro de 2001. A “Guerra ao Terror” – qual guerra não é aterrorizante? – levou à ampliação da estrutura toda, que serviram para invasões ao Afeganistão e ao Iraque. Em 2007 já eram 160 mil militares ianques nas bases, segundo o próprio Departamento de Defesa dos EUA.
Como se vê, a existência de grupos extremistas no fundo é de grande valia para os Estados Unidos, uma vez que legitimam sua presença. Então, o Estado Islâmico (Iraque), os Houthis (Iêmen), o Hezbollah (Líbano) e o próprio Hamas (Palestina) precisam eventualmente ser contidos, mas é duvidoso que pretendam eliminá-los. É do seu mais absoluto interesse que não exista um consenso entre todas as nações árabes e fomentar a cizânia atende isso. Apesar do Pentágono dizer que hoje são “apenas” 40 mil os seus soldados fixos na região, o contingente segue sendo expressivo.
É necessário dizer que todas as bases existentes têm o aval formal dos governos “anfitriões”. A exceção sempre foi a Síria, onde os EUA não se importaram em atuar por anos como invasores mesmo, em função de o Estado Islâmico estar indo além do “aceitável”. Mas, nesse caso, Trump já deu mostras de interesse na normalização das relações ao anunciar o fim de sanções que mantinha contra Damasco, depois da derrubada de Bashar al-Assad. No fundo, toda a região sempre foi dominada por monarquias tirânicas instaladas sobre um imenso mar de petróleo. Então, nunca as coisas são claras e até agressões e suas respostas carregam um tanto de situações surpreendentes.
Um exemplo disso? Depois de ter tido instalações duramente atingidas por bombardeio estadunidense, o Irã informou ao inimigo que iria atacar sua maior base na região, localizada no Catar. Ou seja, evidenciou que seria uma reação muito mais para se justificar internamente e para seus aliados mais próximos do que com objetivo de causar perdas. Tanto que imagens de satélite mostram que aviões e o contingente humano foram retirados do local antes do fato, com os danos sendo apenas materiais. Sobrou como mais “positivo” para o Irã o fato de seus mísseis disparados depois dos primeiros ataques feitos por Israel terem, em parte, atingido o solo inimigo. O alardeado como intransponível “Domo de Ferro” não teve a efetividade esperada. E isso só não causou grande número de mortes porque as cidades israelenses têm centenas de bunkers para os quais a população corre cada vez que ouve sirenes de alerta.
Atualmente os EUA mantêm um total de 128 bases militares ao redor do mundo, algumas inclusive na América Latina. Os “belicosos” russos e chineses também têm as suas. Da Rússia estão na Armênia, Bielorrússia (uma estação de radar), Quirguistão e Síria. Da China, apenas uma, em Djibouti, um pequeno país africano. Esta serve de apoio para operações antipirataria.
*Solon Saldanha é jornalista e blogueiro.
Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades.
Foto de capa: Reprodução