Por REDAÇÃO
A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (7), a sustação da Ação Penal 1/2025, que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Jair Bolsonaro e outros envolvidos na tentativa de golpe de Estado após a derrota eleitoral em 2022. O placar de 315 votos favoráveis chamou atenção não apenas pelo número expressivo, mas, principalmente, pela origem dos votos: 197 vieram de partidos que compõem a base do governo Lula.
Entre os apoiadores da medida, estão legendas com assento no primeiro escalão da Esplanada dos Ministérios. O MDB, por exemplo, responsável pelos ministérios das Cidades, dos Transportes e do Planejamento, deu 32 votos a favor da blindagem, contra apenas cinco contrários. O PSD, que comanda Agricultura, Minas e Energia, e Pesca, teve 26 votos favoráveis e 11 contrários. Já a União Brasil, responsável por Turismo e Comunicações, entregou 50 votos a favor da suspensão da ação penal, com apenas quatro votos contrários.
O autor do pedido, o deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), é ex-promotor de Justiça e foi alçado à política pelo atual ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB). A iniciativa susta o andamento do processo contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), mas tem efeito simbólico mais amplo: representa uma tentativa direta de deslegitimar o STF no julgamento do caso e criar obstáculos ao processo judicial envolvendo Bolsonaro.
Mesmo partidos identificados com a centro-esquerda, como o PSB e o PDT, deram votos favoráveis à medida. O PSB, que tem o vice-presidente da República e comanda os ministérios da Indústria, Comércio e Empreendedorismo, registrou três votos “sim”, ou seja, 20% da bancada. O PDT contribuiu com dois votos favoráveis entre seus 17 deputados. O PP, que comanda o Ministério do Esporte, alinhou-se em massa: 44 votos “sim” e apenas um “não”. Já o Republicanos, responsável pelo Ministério de Portos e Aeroportos, votou 100% a favor da suspensão — 40 votos.
Analistas jurídicos apontam que a decisão da Câmara é flagrantemente inconstitucional, uma vez que a prerrogativa de julgar ações penais contra parlamentares cabe ao Supremo, não ao Legislativo. Por isso, a expectativa é de que o STF anule a decisão. No entanto, essa provável reversão judicial não diminui a gravidade do ato político nem exime os parlamentares de sua responsabilidade diante da sociedade. Ao tentarem barrar o processo, reforçam a estratégia de normalizar o golpismo como prática aceitável no jogo institucional.
A votação expôs a fragilidade da coalizão que sustenta o governo Lula no Congresso. Sem maioria própria — a esquerda e centro-esquerda têm pouco mais de 130 deputados —, o presidente depende de alianças com partidos do chamado Centrão, que operam com base em interesses imediatos e pouca ou nenhuma fidelidade programática. O Planalto, até o momento, não reagiu publicamente à traição protagonizada por parte de sua base, o que escancara a chantagem estrutural a que o Executivo está submetido.
A dependência do governo de forças que, a qualquer momento, podem se aliar ao bolsonarismo ou se opor ao STF fragiliza a governabilidade e empurra o país para uma crise política permanente. O custo da estabilidade institucional, nesse arranjo, é cada vez mais alto — e quem paga é a democracia.
Para superar essa crise de representatividade no Congresso e construir uma base programática sólida, será necessário que partidos efetivamente comprometidos com a democracia e com o desenvolvimento nacional autônomo e soberano se tornem maioria nas casas legislativas. Isso, porém, só será possível com uma reforma das regras eleitorais que quebre o controle oligárquico sobre os partidos e amplie a representação popular de fato. Um Congresso mais plural, enraizado na sociedade, é a única via para romper o ciclo de chantagem e paralisia.
Enquanto isso não acontece, o governo Lula — como qualquer outro que o suceda — continuará refém das contradições de um sistema que premia o oportunismo e castiga a coerência. O episódio desta quarta-feira é apenas o sintoma mais recente de uma doença mais profunda: a desconexão entre os representantes e os representados.
Foto de capa: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
Respostas de 2
Análise perfeita. O lamentável é o comportamento dos parlamentares da base que se dizem progressistas (principalmente o PT) e que não tomaram ainda a única iniciativa a que podem recorrer na sua condição de minoria no Parlamento: organizar manifestações de rua, para mobilização do povo contra os traidores da democracia responsáveis pelo golpe de 8/1. Note-se que, por parte dos bolsonaristas, houve há pouco tempo uma grande manifestação de rua em Brasília!
“… o governo Lula – como qualquer outro…”
vale dizer Democratas e… Patriotas ?!