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Opinião

O agro é grande, médio e pequeno negócio

O agro é grande, médio e pequeno negócio

Artigo por RED
02/10/2023 13:00 • Atualizado em 04/10/2023 08:15
O agro é grande, médio e pequeno negócio

De LUIZ RENI MARQUES*

O general Danilo Venturini cumpriu uma tarefa delicada em abril de 1983, quando era ministro extraordinário para Assuntos Fundiários do presidente João Figueiredo, designado para ir a Paramaribo convencer o governo de Suriname a rejeitar uma suposta aproximação e apoio cubano nos segmentos econômico e militar, oferecendo, em troca, ajuda brasileira nesses dois campos. A missão jamais foi confirmada, nem se teve notícia do seu resultado diplomático. Especialistas, no entanto, atribuem ao encontro papel emblemático na definição da estratégia do Palácio do Planalto em investir em medidas que reforçassem e garantissem a segurança nacional. Uma das iniciativas foi estimular a ocupação das áreas de fronteira do país do Sul ao Norte, passando pelo Centro-Oeste, com extensas propriedades rurais destinadas a produzir principalmente para a exportação.

Esses latifúndios tornaram-se símbolos do agronegócio, denominação encampada pela chamada grande mídia, e passaram a ser tratados como se fossem responsáveis exclusivos por essa atividade no país. Muitos pertenciam a empresas de outros setores econômicos. A maior montadora de carros do Brasil na época, a Volkswagen, era proprietária da Fazenda Vale do Rio Cristalino, em Santana de Araguaia, no Pará, também chamada na região como a “Fazenda Volkswagen”, que esteve envolvida em várias denúncias de irregularidades, incluindo a exploração de trabalho escravo. Matérias sobre o assunto podem ser encontradas no Google.

Uma década e meia depois da reunião do general Venturini (falecido em 2015, aos 93 anos de idade) com o chefe do Exército surinamês, Dési Bouterse, copiei a rota pensada pelos estrategistas do último presidente da ditadura militar que governou o Brasil de 1964 a 1985, para fazer a reportagem “A Conquista do Oeste – A expansão da Fronteira Agrícola do Brasil”. Viajei do Alto Uruguai, no Rio Grande do Sul à fronteira de Roraima com a Venezuela, costeando o oeste dos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia, Acre e Amazonas, incursionando ainda pelo Pará. Ao lado de enormes fazendas, também encontrei dezenas de pequenas e médias propriedades dedicadas ao cultivo de soja, milho, arroz, criação de suínos, aves e vacas leiteiras, entre outros produtos que abastecem o mercado doméstico, e uma parte se destina aos mercados internacionais.

O repórter Carlos Wagner percorreu essas regiões inúmeras vezes durante três décadas. Especialista na cobertura de assuntos fundiários, escreveu dezenas de reportagens e um punhado de livros sobre o tema, que lhe renderam alguns dos prêmios mais cobiçados pelos jornalistas. Mantinha contatos estreitos com lideranças do MST (Movimentos dos Agricultores Sem Terra), dos pequenos, médios e grandes produtores, das forças armadas e do governo. Meu amigo, e colega em Zero Hora, ele foi o primeiro jornalista a corrigir esse erro consolidado nos meios políticos e de comunicação, ao afirmar que o agronegócio não é apenas dos grandes produtores, abrangendo a todos os que atuam nesse setor, incluindo os médios e pequenos.

O slogan “O agro é pop, o agro e tech, o agro é tudo”, da Rede Globo, veiculado toda hora na televisão, mostra a importância do agronegócio para a economia brasileira, contudo dá a entender que apenas os grandes fazem parte desse universo. A campanha não deixa clara a participação dos pequenos agricultores e pecuaristas, que empregam alguns milhões de trabalhadores, e são responsáveis, por exemplo, por 70% do feijão, 60% do leite, 35% do arroz, 60% da carne suína e 30% da carne bovina produzidos no país e que consumimos no dia a dia. E ainda são responsáveis por expressiva fatia das exportações, escoando suas safras especialmente por meio do sistema cooperativista.


*Estudou Direito e História. Formado em Jornalismo. Foi repórter em Zero Hora, Jornal do Brasil, o Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, Senhor e Isto É, e correspondente free lancer da Reuters, entre outros veículos de comunicação. Redator e editor na Rádio Gaúcha, diretor de redação da Revista Mundo, professor de Redação Jornalística na PUCRS e assessor de imprensa na Câmara dos Deputados durante a Assembleia Nacional Constituinte. Atualmente edita blog independente.

Foto: Allan Kardec Braga Ramos/Embrapa.

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