A reeleição de Lula sob pressão

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Por JEFERSON MIOLA*

As pesquisas mostram uma tendência persistente de desaprovação e perda de credibilidade do governo Lula.

Esta tendência ganhou maior tração em dezembro passado devido ao desgaste com a ofensiva desinformativa da extrema-direita sobre o PIX.

No entanto, o início desse processo desfavorável ao governo teve início bem antes. Diferentes pesquisas, inclusive aquelas contratadas pelo governo, há muito mostravam que a lua-de-mel da população com o governo começou acabar precocemente, a partir de agosto de 2023, com apenas oito meses de mandato.

derrota impactante da esquerda na eleição municipal de 2024 pode ser entendida como reflexo desse fenômeno. Houve deslocamento de eleitores tradicionalmente lulistas em direção a candidaturas bolsonaristas, antipetistas e oposicionistas.

Isso ocorreu mesmo com os resultados bastante positivos da economia, como o crescimento do PIB acima das melhores previsões, o aumento do emprego e da renda, e a reconstrução acelerada das políticas públicas destruídas no período fascista-militar com Bolsonaro.

A pesquisa Quaest publicada em 5/6 permite enxergar esta realidade em perspectiva. O índice de desaprovação do governo [vetor verde do gráfico] que em agosto de 2023 era de 35%, alcançou 57% em maio de 2025, ao passo que a aprovação [vetor laranja], situada no patamar de 60% em agosto de 2023, desabou para 40% em maio de 2025:

Esse processo não teve um desenvolvimento linear. Alternou algumas conjunturas de pequenas oscilações e consolidou a piora de trajetória a partir de dezembro.

O governo perdeu aprovação nos segmentos tradicionalmente eleitores do presidente Lula e do PT, como o eleitorado feminino e do Nordeste, pessoas não-brancas, de baixas renda e escolaridade e beneficiários do Bolsa Família:
Fossem outros os tempos, com todas as realizações desse terceiro mandato, Lula certamente teria índices de aprovação próximos aos 87% de quando deixou o Planalto em 2010.

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A realidade, no entanto, é outra. E no mundo inteiro, não só no Brasil.

A paciência com governos recém eleitos dura pouco, e predominam expectativas de mudanças rápidas para aplacar a barbárie social e existencial causada pelo neoliberalismo. Isso ainda é agravado em contextos de polarização ideológica e de grande confrontação política.

Hoje as pessoas já não se contentam com o que o governo oferece como se contentavam no passado, porque acumulam décadas de espera de melhoria real da vida que não nunca chega.

Diferentes pesquisas mostram que agosto de 2023 foi o mês em que os índices favoráveis ao governo Lula atingiram o maior patamar [60%] e os desfavoráveis tiveram a menor pontuação [35%]. Representou o fim do ciclo de namoro pós-eleitoral.

A partir daí, a tendência foi constante em dois sentidos: [1] do aumento da desaprovação, que atingiu 57% em junho/25, e [2] de queda da aprovação, que ficou situada em 40% [Quaest].

Apesar do crescimento do PIB dentre os maiores do mundo, a percepção das pessoas é menos otimista, porque o desempenho da economia não se reflete em mudança estrutural da situação de vida difícil da imensa maioria da população brasileira [mais de 70%] que sobrevive com até dois salários mínimos no mês.

O sentimento de insatisfação com as dificuldades da vida cotidiana prepondera sobre o sentimento de satisfação, como mostram os dados da Quaest:

Com o governo Lula o salário mínimo voltou a aumentar acima da inflação, o desemprego atingiu o nível mais baixo da história e a renda dos mais pobres aumentou via trabalho, emprego e benefícios sociais.

Isso tudo, no entanto, não é capaz de modificar substancialmente o mau humor que no fundo é mais em relação ao sistema [capitalismo/neoliberalismo] do que com o governo de turno, que acaba sendo depositário da frustração e indignação das pessoas, por motivos compreensíveis.

O salário mínimo necessário para uma família de quatro pessoas, que segundo o DIEESE deveria ser de R$ 7.638,62 em abril/25, é cinco vezes menor.

Só para comprar os alimentos da cesta básica, o trabalhador que sobrevive com um salário mínimo de R$ 1.518 gasta em média cerca de R$ 683, quase a metade, afora os demais gastos com moradia, remédios, vestuário, transporte de péssima qualidade etc.

O governo criou linhas de crédito consignado no setor privado. Porém, segundo a Serasa, 70 milhões de brasileiros –42% dos adultos do país– estavam inadimplentes em abril.

Isso significa que milhões de famílias estão cronicamente endividadas não para aumentar o patrimônio ou adquirir bens duráveis, mas para custear o consumo básico e cotidiano, uma vez que sobram dias do mês depois do fim de um salário absolutamente irrisório.

O desalento e a descrença no futuro marcam gerações ameaçadas de viverem em condições materiais piores que as de seus antepassados.

A situação econômica positiva do Brasil não consegue aplacar o mal-estar difuso de grandes parcelas da população, na sua maioria pobre, que leva uma vida invivível e privada de condições mínimas de dignidade enquanto a oligarquia dominante fica ainda mais obscenamente rica parasitando o Estado.

O governo Lula, por mais significativo que seja o processo de reversão da catástrofe herdada do bolsonarismo, acaba sendo destinatário desse sentimento de decepção que é catalisado pela extrema-direita.

Faltam pouco menos que 16 meses para a eleição de 2026. Não é muito tempo, mas ainda é um tempo viável para o presidente Lula reverter a persistente perda de popularidade e de credibilidade e se reeleger.


Originalmente publicado em seu blog.

*Jeferson Miola é jornalista.

Foto de capa: Evaristo SA/AFP 

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Respostas de 2

  1. Presumo que ainda há, uma maldade da Quest em relação a desinformação continua nesses ultimos meses. Basta ver na campanha de 2022, quando essa mesma empresa de pesquisa, passou o ano todo estimulando a desaprovação da campanha de Lula.
    Parece-me proposital esse objetivo.

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