Por CARLOS EDUARDO BELLINI BORENSTEIN*
A denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) impactará a sucessão de 2026. Com a denúncia, os movimentos em favor da anistia dos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro no Congresso Nacional devem enfrentar obstáculos. Também poderá perder força a articulação em favor de uma mudança na lei do Ficha Limpa.
Como consequência, a possibilidade de Bolsonaro conseguir reverter sua inelegibilidade é cada vez menor. A provável ausência do ex-presidente na disputa tem o potencial de intensificar o debate sucessório sobre 2026 no campo da direita. A antecipação dessa discussão poderá levar ao aumento das divergências internas no campo conservador, já que temos uma pulverização de pré-candidatos à direita.
A denúncia da PGR contra Jair Bolsonaro traz novamente para a agenda o tema da defesa da democracia, o que ajuda o presidente Lula (PT). Entretanto, os desafios de Lula no campo econômico, principalmente a inflação, continuam desafiando o governo. Caso o governo não consiga responder positivamente a agenda econômica, o tema da defesa da democracia pode perder fôlego até 2026.
Entretanto, confirmando a condenação de Jair Bolsonaro – e sua eventual prisão – a rejeição do ex-presidente poderá aumentar, beneficiando Lula. Porém, o capital político de Bolsonaro entre o chamado bolsonarismo raiz não deve ser impactado. Os bolsonaristas tendem a continuar insistindo na narrativa que o ex-presidente é alvo de uma “perseguição política”. Também é possível que manifestações em favor de Bolsonaro ocorram com objetivo de manter seu núcleo mais radical mobilizado. No dia 16 de março, por exemplo, está convocada uma manifestação contra Lula.
Mesmo sem Jair Bolsonaro no jogo, Lula permanece com desafios no enfrentamento com a direita. A partir da impossibilidade de Bolsonaro em ser candidato, os setores econômicos dominantes devem trabalhar nos bastidores em favor da construção de um candidato “mais moderado”. Isso pode ocorrer em função do desgaste que cerca o núcleo mais radical do bolsonarismo. Porém, tensões podem ocorrer no campo conservador, gerando uma divisão interna, já que nem toda direita abraça a cartilha do bolsonarismo raiz.
Assim, a denúncia contra Jair Bolsonaro deixou o cenário sucessório de 2026 mais indefinido. Além da provável ausência de Jair Bolsonaro – e de um candidato natural no campo da direita – a candidatura de Lula à reeleição enfrenta desafios importantes.
Além das questões econômicas, o governo enfrenta uma desconexão com a realidade. Não por acaso, Lula tem a mais baixa aprovação de seus três mandatos. Neste terceiro mandato, Lula tem feito menos política. Opta por dialogar preferencialmente com a esquerda. Afastou-se perigosamente do centro, comprometendo a frente ampla que o elegeu nas eleições de 2022. Lula também ainda não conseguiu construir uma marca para o terceiro mandato, limitando-se a reproduzir o legado de seus dois primeiros governos.
O núcleo-duro do governo despreza que a correlação de forças do governo Lula 3 é distinta dos governos Lula 1 e 2. Além do poder político e orçamentário do Congresso, temos uma direita enraizada em diretórios partidários e nas redes sociais. O conservadorismo tem obtido sucesso na chamada “guerra cultura”, impondo valores como a defesa do empreendedorismo, a redução do Estado na economia e a pauta moralista liderada pelas igrejas pentecostais.
Mesmo com todos esses problemas e o fato da desaprovação ao governo superar a aprovação, Lula permanece competitivo e, de acordo com as últimas pesquisas, travaria uma acirrada disputa com as alternativas do campo conservador se as eleições de 2026 fossem realizadas hoje.
Ou seja, Lula resiste mais uma vez à narrativa historicamente utilizada sobre o suposto “fim” de sua carreira política. Lula, que mudou após as derrotas de 1989, 1994 e 1998 para vencer em 2002 e 2006; e se metamorfoseou em meio a disputa política e jurídica com a Lava Jato para voltar ao poder em 2022, enfrenta talvez seu mais duro teste. O presidente, além de estar diante de uma correlação de forças adversas, precisa se adaptar ao Brasil que surgiu após 2013. Hoje temos uma sociedade mais complexa e um eleitor mais crítico e menor fiel, que não se satisfaz somente com a nostalgia do passado.
*Carlos Eduardo Bellini Borenstein, Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Bacharel em Ciência política (ULBRA-RS). Especialista em Ciência Política (UFRGS). Tem MBA em Marketing Político (Universidade Cândido Mendes).
Foto de capa: Andre Borges/EPA-EFE/REX/Shutterstock