Por RUDOLFO LAGO*, do Correio da Manhã
Por muito pouco não aconteceu uma grande tragédia internacional no show de Lady Gaga no sábado (3) na Praia de Copacabana. Dois atentados, sem conexão entre eles, poderiam ter atingido a multidão – mais de 2 milhões de pessoas – que foram assistir à performance da diva do pop. É mais um episódio que reforça a necessidade urgente de regulamentação das redes sociais. E mais um episódio a reforçar o espanto quanto ao fato de tal pauta não avançar no Congresso pela resistência de parte dos parlamentares e do lobby das big techs. Os atentados foram todos planejados a partir de uma rede social, o Discord. E pelo menos um deles se encaixa na revoltante onda de “desafios coletivos” pela internet, que vitimou crianças.
Necessidade
“É mais do que urgente a necessidade de regulamentar tudo isso. Ou uma grande tragédia acabará acontecendo”, alerta Marcelo Senise, do Instituto Brasileiro para a Regulamentação da Inteligência Artificial, que deverá ser consultor da Comissão criada na Câmara.
Desafio
Grupos nas redes sociais disseminam diversos discursos de ódio. No caso do show de Lady Gaga, era ódio contra a comunidade LGTB . Que propunham, então, um desafio para dar aos participantes “notoriedade” na internet se produzissem artefatos para explodir no show.
Mortes no “desafios do desodorante” chocaram
Desafios são gincanas macabras via internet | Foto: Joedson Alves/Agência Brasil
Agora, a estupidez reinante nas redes sociais mistura-se ao discurso político, igualmente estúpido, de alguns grupos da extrema direita. Propõem uma espécie de gincana macabra entre os seus participantes. Recentemente, a morte de duas meninas no “desafio do desodorante” chocou. Sarah Raíssa de Castro, de apenas oito anos, morreu asfixiada depois de inalar uma grande quantidade de desodorante no desafio proposto. “Se não existe uma regra clara dizendo o que é certo e o que é errado, e qual é a responsabilidade objetiva de quem dissemina, seja o autor seja a rede, não há como punir ninguém”, avalia Marcelo Senise.
Controle
No caso do show de Lady Gaga, espantou também a Senise o fato de que as polícias ainda não parecem suficientemente aparelhadas para esse assustador mundo novo. O atentado só foi descoberto porque alguém fez um alerta pelo Disque-Denúncia da Polícia Federal.
Enxugar gelo
“No fundo, é um trabalho de enxugar gelo, embora seja vital”, diz Senise. Ele compara aos golpes com bancos. Quando se fecha uma porta, bandidos encontram outras. Mas o sistema bancário digital já teria entrado em colapso se brechas não tivessem sido corrigidas.
Molhados
“Pode ser enxugar gelo. Mas se não começarmos a fazer, não vai demorar muito para que estejamos todos encharcados”, diz Senise. Ele confia que os novos casos acabarão levando à constatação de que não há mais como postergar a regulamentação.
Comissão
Agora, os líderes dos partidos precisam indicar os integrantes da comissão para que o trabalho comece. “É preciso afastar a ideia de que isso cerceia a liberdade de expressão”, diz Senise. “Prevista na Constituição, a liberdade de expressão sempre teve regras e limites”.
*Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congreso e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade.
Publicado originalmente no Correio da Manhã.
Foto de capa: LShow histórico poderia ter virado tragédia | www.ladaygaganow.net