Por J. CARLOS DE ASSIS* .
A consternação generalizada diante da morte do Papa Francisco
acentua que há no mundo uma escassez sem precedentes de líderes com capacidade de sensibilizar a opinião pública para a busca de objetivos humanísticos. As sociedades contemporâneas se tornaram indiferentes aos ideais de solidariedade, de justiça social e de proteção aos marginalizados, que estão sendo esmagados pelo materialismo capitalista.
Entre os líderes mundiais, poucos conquistaram respeitabilidade universal para atacar simultaneamente, com a força de sua voz, problemas tão inquietantes e complexos como os da fome, das mudanças climáticas provocadas por ação humana, das desigualdades sociais, dos preconceitos de cor e de gênero, assim como o problema secular da guerra entre as nações, gerando matanças e levas de imigração.
O Papa fez isso. E com uma credibilidade crescente, conquistada pelo exemplo. Preencheu, de alguma forma, o espaço vago deixado por políticos tradicionais. Estes, ou se tornaram indiferentes diante das mazelas sofridas pelos povos, ou transformaram a política num instrumento para vantagens pessoais, ou tentam se firmar perante a opinião pública recorrendo ao radicalismo demagógico.
O público está cansado desse jogo pernicioso. E justamente por isso, embora sempre com seu jeito afetuoso e pausado de falar, Francisco fazia uma condenação vigorosa e veemente dos exploradores e manipuladores das multidões, principalmente dos jovens. A estes, em sua primeira viagem ao exterior para a Jornada Mundial da Juventude, no Rio, dirigiu mensagens específicas a fim de não se deixarem manipular.
No vazio moral em que se encontra o mundo, com a busca do dinheiro especulativo superando até mesmo o que o próprio capitalismo predatório de seus primórdios produziu de mal para o meio ambiente e a Humanidade, a palavra do Papa era uma mensagem de esperança. Ele não desistiu de condenar os agressores ambientais, assim como condenava as guerras – todas as guerras, não apenas as da Ucrânia e de Gaza, mas também as africanas, em geral esquecidas pela imprensa ocidental.
Na verdade, Francisco trouxe para a Humanidade especialmente amor, num momento em que desavenças em torno de poder político se transformam em ódio, arregimentando multidões manipuladas por oportunistas. O que ele dizia tocava o coração das pessoas, pois era o que elas queriam ouvir. Sua missão transcendeu largamente a religião. No Brasil, apenas a TV Record, financiada do exterior por evangélicos ricos e, no Brasil, por pobres manipulados por Edir Macedo, não deu a sua morte o destaque que todos os demais canais de televisão deram.
O legado de Francisco será eterno, similar ao de João XXIII, que iniciou o processo de atualização da Igreja Católica. Entretanto, num aspecto, será ainda mais significativo: ele se abriu para a integração com outras denominações religiosas e para todos os segmentos sociais e políticos, exercendo seu poder moral para reaproximar os povos, como foram os casos de Cuba e Estados Unidos, e de Israel e palestinos – ambos abortados pela recaída de seus líderes para posições radicais.
Publicado originalmente na Tribuna da Imprensa online.
*J. Carlos de Assis é jornalista, economista, doutor em Engenharia de Produção, professor aposentado de Economia Política da UEPB, e atualmente economista chefe do Grupo Videirainvest-Agroviva e editor chefe do jornal online “Tribuna da Imprensa”, a ser relançado brevemente.
Foto de capa: Homenagem a papa Francisco, que morreu aos 88 anos um dia após a Páscoa/ Anthony WALLACE / POOL / AFP
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