Ciência e Tecnologia

WhatsApp brasileiro: agência deve trocar app mensageiro por versão própria

Destaque

WhatsApp brasileiro: agência deve trocar app mensageiro por versão própria
RED

Objetivo é melhorar segurança e evitar vazamentos. A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) deve deixar o WhatsApp de lado e começar a se comunicar através de um aplicativo de mensagens próprio (e brasileiro). A portaria que torna obrigatório o uso do UNA, como o app foi batizado, será assinada nesta segunda-feira (13) pelo presidente da ABDI, Ricardo Cappelli. A iniciativa é semelhante à estratégia já adotada pelo Exército brasileiro, visando melhorar a segurança e evitar vazamentos. ABDI deixará o WhatsApp de lado O “WhatsApp brasileiro” foi batizado de UNA e possui uma tecnologia de criptografia parecida com o app de mensagens próprio usado pelo Exército; Segundo a Folha de São Paulo, a licitação para a compra foi feita no segundo semestre de 2024 e a iniciativa ganhou força nos últimos dias; Quando a portaria for assinada por Cappelli, todos os funcionários da agência deverão se comunicar internamente pelo UNA. Por que ABDI optou pela troca? O aplicativo é uma resposta da ABDI para os vazamentos constantes de comunicações internas governamentais via WhatsApp. Segundo o presidente da agência, em agosto do ano passado, o “Brasil está absolutamente exposto”. A iniciativa ganhou força nos últimos dias, diante das mudanças de moderação de conteúdo da Meta, dona do WhatsApp. Em uma publicação no X, Cappelli citou a “soberania” brasileira como justificativa. Ele já havia publicado, em ocasiões anteriores, sobre a falta de “neutralidade das redes”, mencionando que outros países, como China e Rússia, também já pararam de usar ou criaram regras para as redes sociais estadunidenses. A iniciativa espera tornar a comunicação brasileira mais independente e segura em relação aos vazamentos e à arbitrariedade de empresas estrangeiras. Caso a experiência seja bem-sucedida, outros órgãos do governo podem aderir ao UNA.     Notícia publicada originalmente em Olhar Digital.   Foto de capa:  Mojahid Mottakin/Shutterstock) Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.        

Artigo

Mudar a política econômica!

Destaque

Mudar a política econômica!
RED

Por PAULO KLIASS* Faltam 21 meses para o primeiro turno das próximas eleições presidenciais. Isso significa que já se passaram 27 meses desde que Lula chegou à frente de Bolsonaro no pleito de 2022. Os tempos da política obedecem a critérios e sensações que nem sempre correspondem ao que está registrado nos calendários oficiais. Mas há um fato inescapável que deveria chamar a atenção de todos os que estamos preocupados com o afastamento que o governo vem promovendo em relação às suas promessas de campanha.  A realidade nua e crua é que já se foi mais da metade do terceiro mandato de Lula. As pesquisas de opinião são quase unânimes em apontar grandes dificuldades enfrentadas pelo governo em termos de sua popularidade e de seu nível de aprovação pela maioria da população. É bem verdade que ainda estamos muito distantes da próxima disputa presidencial. No entanto, os cenários apresentados pelas enquetes apontam que a eventual vitória de Lula 4.0 não vai ser um “passeio”, como se diz no linguajar da política. Existem uma série de dúvidas e incertezas que rondam o quadro, tornando ainda mais difícil a busca de respostas. Afinal, Lula será mesmo candidato? Bolsonaro permanecerá inelegível até o momento de definição das candidaturas oficialmente? Haverá espaço político e eleitoral para a eterna tentativa de uma “terceira via”? Apesar de tais incógnitas, o calendário não fica parado com o intuito de aguardar tais definições. E os elementos associados à percepção de que a maioria da população não está “compreendendo” ou “recebendo” todo o esforço realizado pelo terceiro mandato começa a ganhar adeptos na Esplanada. As recentes mudanças na equipe de comunicação parecem apontar para esse caminho equivocado. De acordo com tal interpretação, o problema estaria na incompetência profissional dos responsáveis por comunicar. E não na esfera da política, uma vez que o governo não tem muitas novidades positivas para oferecer e, assim, obter uma reversão das atuais percepções negativas a seu respeito. “A economia vai bem, mas o povo vai mal” Ora, mas então, Paulo, você está ignorando os “resultados excelentes” que as políticas públicas estão proporcionando para a maioria da população? Veja, em especial, os números da economia. O Brasil está bombando! Pois é, esta é a primeira contradição a ser enfrentada. É verdade que os dados mais recentes relativos ao desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) estão superiores àquilo que era aguardado pelo próprio governo e pelos agentes do financismo. Além disso, as estatísticas oficiais que o IBGE coleta a respeito dos níveis de desemprego e de ocupação da força de trabalho também apontam para melhorias positivas. Ora, então como se explica a persistência de dificuldades em melhorar os indicadores de percepção da maioria da população a respeito do próprio governo? Uma forma de abordar o tema é recorrer aos ensinamentos da saudosa mestra de todos nós, a economista e professora Maria da Conceição Tavares. Ela tem sido muito citada, quando foi atribuída a ela a ideia de que o povo não come PIB. A importante reflexão serve também para explicar o desconforto dos responsáveis pela economia à época da ditadura militar que se instalou depois do golpe de 1964. Em plena vigência do milagre econômico, a resposta popular não era lá muito satisfatória. A ponto de o Presidente General Medici se sair com a famosa “a economia vai bem, mas o povo vai mal”, uma espécie de sincericídio, ao reconhecer o fracasso das propostas capitaneadas pelo Ministro Delfim Netto a partir de 1970. De qualquer forma, o importante a reter é a frase de Conceição Tavares, em entrevista concedida em março de 2014 e ainda não submetida ao contexto do estelionato eleitoral que significou a nomeação de Joaquim Levy no ano seguinte para o Ministério da Fazenda no começo do segundo mandato de Dilma Roussef. Ela então afirmou que (...) “Ninguém come PIB, come alimentos.” (...) A comparação com a situação atual da economia brasileira pode se revelar bastante útil para efeitos de análise. Ao que tudo indica, não basta o PIB registrar possivelmente um crescimento superior a 3% para o ano passado, quando os números oficiais forem oficialmente divulgados pelo IBGE. Por mais que tal performance seja superior às estimativas iniciais do governo, do Banco Central (BC) e do povo do financismo, o fato é que ela está muito aquém das reais necessidades do País, depois de 6 anos de destruição e desmonte que foram representados pelo período Temer e Bolsonaro. A sensação de melhoria não chegou ao bolso do povo. Com relação aos índices de desemprego, a melhoria efetivamente verificada esconde, por trás da frieza dos números, algumas questões metodológicas da apuração do fenômeno e da verificação da capacidade real dos rendimentos recebidos. As informações divulgadas pela mais recente PNAD Contínua do IBGE revelam que estaríamos sob a vigência da menor taxa de desocupação da série histórica. Em novembro de 2024 ela foi de 6,1% do total da População Economicamente Ativa (PEA), inferior inclusive aos 6,3% verificados no final de 2013.   Desemprego - Taxa de desemprego (2012/24) Além disso, as informações relativas ao rendimento real médio dos trabalhadores ocupados também demonstram uma melhoria. Ainda que não tenha sido atingido o patamar recorde de 2020, o fato é que os dados expressam uma maior remuneração de quem tem algum posto de trabalho assalariado.   Rendimento real médio dos trabalhadores ocupados (2012-2024) Com relação ao fenômeno do desemprego, permanece desde sempre uma questão ainda não solucionada pelos institutos oficiais. Trata-se de um grave problema metodológico, que tende a subestimar a efetiva taxa de desocupação existente no interior da força de trabalho. Quando o pesquisador indaga se a pessoa procurou emprego ao longo dos últimos 30 dias, a resposta “não” pode esconder um desempregado que desistiu de procurar um posto de trabalho no período apontado. Seja pelo fato de que buscar emprego custa dinheiro, seja pelo fenômeno que as pesquisas chamam de “desalento” - a pessoa desiste de buscar uma vaga depois de tantas tentativas infrutíferas anteriores. Esta é uma das razões pelas quais as pesquisas de desemprego realizadas pelo DIEESE, por exemplo, exibem índices bem mais elevados do que os oficiais. Infelizmente, por problemas de falta de financiamento, as pesquisas feitas pelo órgão mantido pelo movimento sindical foram descontinuadas e apenas a enquete realizada no Distrito Federal permanece atualizada. Assim, os números mais recentes mostram um desemprego de 15% na região de Brasília, número bem superior aos levantamentos do IBGE. Abandonar a armadilha da austeridade fiscal. No que se refere à evolução dos rendimentos, há também outros fatores que merecem ser levados em consideração para entender o aparente paradoxo da baixa percepção por parte da população. Ocorre que as médias quase sempre ocultam a disparidade dos valores internos dos conjuntos apurados. Assim, por exemplo, o Brasil vive um processo significativo de aprofundamento da informalidade e da precariedade no chamado “mercado de trabalho”. As reformas trabalhistas promovidas durante os governos Temer e Bolsonaro não foram revertidas e as pessoas seguem trabalhando em jornadas extenuantes para auferir remuneração muitas vezes até inferior a um salário mínimo. O recente movimento contra a escala 6x1, por exemplo, reflete bem essa situação. As análises mais recentes a respeito da persistência da inflação também devem ser observadas com cautela. O argumento sempre levantado pela turma da ortodoxia e pelo financismo é de que a inflação superou a meta oficial e isso deveria servir como argumento para aumentar ainda mais a taxa de juros. Ocorre que os principais fatores da alta de preços mais recente não podem ser equacionados por meio da elevação da SELIC, pois não têm nada a ver com uma suposta inflação de demanda. O economista David Deccache explica bem o mecanismo e aponta para necessidade de outras medidas para resolver a questão. Seria o caso, por exemplo, de enterrar de vez a política de preços da Petrobrás, que insiste em atrelar os preços dos derivados internos às flutuações do óleo bruto no mercado internacional. Ou ainda promover a volta da política de estoques reguladores para lidar com choques de oferta de alimentos. Por outro lado, o fato é que a alta de preços tem prejudicado muito mais a capacidade de consumo e de sobrevivência da população de menor renda. E são estes setores justamente os mais atingidos pela política de austeridade fiscal até o momento. Estes são os exemplos da redução paulatina do abono salarial, as maiores dificuldades de acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) e redução do ritmo de valorização real do salário-mínimo. Ou seja, trata-se dos setores que asseguraram a apertada vitória de Lula na última eleição e que parecem estar sendo abandonados pelas políticas públicas de sua equipe. Economia: é preciso mudar para vencer em 2026. Já com relação ao mercado de divisas e a formação da taxa de câmbio, o governo deveria deixar a postura de mero espectador. Considerar que a relação entre o real e dólar norte-americano pode ser solucionado como ocorre coma dinâmica do mercado da batatinha ou do tomate na feira é um grave equívoco. Trata-se de um espaço onde predominam interesses de grandes conglomerados financeiros e que se orientam, na maior parte das vezes, por interesses especialmente especulativos. Assistir de forma passiva à formação do “preço do câmbio” somente partir da livre ação das forças de oferta e demanda permite a persistência desses movimentos altistas que provocam efeitos inflacionários imediatos e futuros. É fundamental atuar para demonstrar a tais agentes que o governo não vai tolerar esse tipo de ação que só provoca prejuízo à maioria da sociedade e à economia brasileira. Finalmente, o governo precisa mudar urgentemente essa fixação liberaloide com metas suicidas de austeridade fiscal. A melhora nos índices de aprovação do governo também depende fundamentalmente da retomada de políticas públicas e de investimentos do Estado. Parece ter ficado evidente, ao longo destes primeiros dois anos de governo sob a égide do austericídio, que a contenção de despesas orçamentárias tem impedido o governo de deslanchar um plano de desenvolvimento econômico, social e ambiental. É preciso abandonar de vez o compromisso com as metas de zerar o déficit fiscal primário ou mesmo de obter superávit nos próximos exercícios. Assim, esse conjunto todo do quadro social e econômico poderia ajudar a compreender o aparente paradoxo. Seja na forma de “a economia vai bem, mas o povo vai mal” ou na forma de “o povo não come PIB, como alimentos”, o fato objetivo é que a reversão da atual conjuntura exige mudanças efetivas na condução da política econômica. Não basta mudar apenas a comunicação. É necessário ter políticas públicas de conteúdo (e seus resultados) para comunicar e divulgar.       *Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal. Foto de capa: Reprodução Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

Justiça

Pântano orçamentário chega às universidades

Destaque

Pântano orçamentário chega às universidades
RED

Por RUDOLFO LAGO* do Correio da Manhã Há 16 anos, um escândalo envolveu a Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), ligada à Universidade de Brasília (UnB). À época, o advogado Melillo Dinis foi uma das pessoas designadas como interventor, enquanto o escândalo descredenciava a fundação junto ao Ministério da Educação. Agora, nova determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino no sentido de conferir mais transparência e rastreabilidade às emendas parlamentares ao orçamento põe novamente a Finatec e outras organizações de apoio a universidades no alvo. Melillo agora é integrante do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), um dos autores das ações que questionam as emendas e movem as decisões. Retorno "É triste e impressionante que tudo isso retorne de novo", comenta Melillo ao Correio Político. "É preciso parar esse ciclo sem fim que acontece por essa inexplicável intenção do Congresso em não dar transparência à forma como destina os recursos públicos". Finatec Como interventor na Finatec, Melillo atesta não ter à época encontrado maiores irregularidades na fundação. "Mas veja o enorme prejuízo que esse escândalo anterior causou", observa. "A insistência em não dar transparência não permite que se separe o joio do trigo". MCCE quer identificação do parlamentar Comissão de Orçamento: MCCE quer responsabilização | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil     Ainda neste mês de janeiro, o MCCE deverá concluir uma proposta no sentido de vir a obrigar a identificação e a responsabilização do deputado ou senador na destinação da emenda. A ideia é que o parlamentar seja obrigado a colocar o seu CPF como responsável ao fazer a destinação. De modo a que, caso haja irregularidade, ele venha a responder por ela como parte. Em princípio, o MCCE iria se reunir nesta segunda-feira (13), mas o encontro foi adiado em consequência da morte do ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Marcelo Lavenére. Ele foi um dos fundadores do MCCE. Nova reunião será marcada. Ficha Limpa O MCCE tem expertise na formulação desse tipo de proposta. A Lei da Ficha Limpa foi um projeto de iniciativa popular proposto pelo MCCE em 1997 e aprovado em 2013. Mais especificamente, de autoria de um de seus integrantes, o ex-juiz eleitoral do Maranhão Márlon Reis. Rosa Weber Melillo rebate a ideia de que esteja havendo extrapolação de Flávio Dino nas medidas que vem tomando. "Dino não está fazendo nada fora da decisão original de Rosa Weber", afirma. Foi ela, hoje aposentada, quem determinou o fim do chamado orçamento secreto. Ignorou "O problema é que o Congresso ignorou solenemente a determinação de Rosa Weber. E em parte também o governo", observa Melillo Dinis. "Foi o fato de a decisão ser solenemente ignorada que fez o MCCE e outras instituições recorrerem ao Supremo". Descontrole Para Melillo, esse é o problema: o descontrole nos mecanismos de repasse dessas verbas públicas. Num nível crescente, cada vez maior. "Não é possível que hoje mais de 70% dos recursos de investimentos de alguns ministérios seja oriundo de emendas parlamentares".       *Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congresso em Foco e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade   Publicado originalmente no Correio da Manhã Foto de capa: Finatec, da UnB, foi alvo de investigação há 16 anos | Raquel Aviani/UnB Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.    

Vazio

O Torturador Le Pen

Destaque

O Torturador Le Pen
RED

Por LENEIDE DUARTE-PLON*, de Paris Na guerra da Argélia, o tenente torturava a domicílio Jean-Marie Le Pen, falecido dia 7 de janeiro, foi o responsável pela organização da extrema-direita francesa em um partido, o Front National (Frente Nacional), fundado em 1972 por personagens de passado tenebroso, como ele próprio. Com seu desaparecimento, a França perde um supremacista branco, islamofóbico, antissemita, homofóbico e ex-torturador na Guerra da Argélia. Em 21 de abril de 2002, os franceses descobriram com estupefação que Le Pen disputaria o segundo turno das eleições presidenciais com Jacques Chirac, com a exclusão, totalmente inesperada, do socialista e primeiro-ministro Lionel Jospin. O resultado do primeiro turno caiu como um raio, causando um dos maiores traumas da história recente do país. No segundo turno, graças a uma frente republicana formada para combater o fascismo, Chirac venceu com 82,21% dos votos. Contei a participação ostensiva do ex-tenente neofascista em atos de tortura a domicílio durante a Guerra da Argélia, no meu livro “A tortura como arma de Guerra-da Argélia ao Brasil”, finalista dos Prêmios Jabuti e Biblioteca Nacional, de 2017. Punhal providencial denunciou o torturador Entre os dois turnos da eleição de 2002, a jornalista Florence Beaugé voltou a fazer novas revelações no jornal Le Monde sobre a Guerra da Argélia, desta vez envolvendo um tenente que tinha o apelido de Borniol e era o chefe de seção de uma das companhias de combate. Alguns anos antes, ele tinha pertencido, assim como o general Paul Aussaresses – chefe dos esquadrões da morte na Guerra da Argélia – à Juventude Universitária Católica (juc). Esse tenente, não era outro senão Jean-Marie Le Pen, que posteriormente fez carreira política e fundou o Front National. Descrito por Paul Aussaresses em seu livro Services Spéciaux - Algérie 1954-1957 como “bastante turbulento”, o tenente Le Pen “gostava de extravasar sua energia procurando brigas em locais chiques de Argel”. Pelo Le Monde, a França tomou conhecimento de que o então tenente Jean-Marie Le Pen, engajado voluntariamente na Guerra da Argélia, era um torturador notório, tendo mesmo inaugurado uma espécie de tortura a domicílio durante a Batalha de Argel, em 1957. Na véspera do segundo turno, em 4 de maio de 2002, o jornal revelou como os paraquedistas franceses invadiram a casa do independentista Ahmed Moulay, situada na casbá (casbah em francês), no centro de Argel. Era dia 3 de março de 1957 e os militares queriam nomes de pessoas ligadas à Frente de Libertação Nacional (FLN). Moulay foi torturado diante de sua mulher e dos seis filhos do casal. Os militares franceses eram dirigidos por um homem alto, louro, a quem chamavam de tenente. O chefe de família foi morto a bala, mas um comunicado dos militares anunciou que ele fora abatido ao tentar fugir. Aconteceu que durante a invasão da casa do independentista, um dos paraquedistas deixara cair seu punhal. Mohamed, um menino de 12 anos, filho de Ahmed Moulay, guardou a arma. Nela estava inscrito o nome do proprietário: jm le pen, 1er rep. Mohamed teve a sagacidade de esconder o punhal no quadro de luz e quando os paraquedistas voltaram no dia seguinte para procurá-lo, revistaram a casa toda mas não o encontraram. O garoto ficou em silêncio e escondeu posteriormente o punhal em local mais seguro. Algumas semanas mais tarde, a família Moulay viu na primeira página dos jornais argelinos a foto do tenente louro sendo condecorado pelo general Massu. Seu nome: Jean-Marie Le Pen. Na reportagem do Le Monde de 2002, que reconstituiu a passagem de Le Pen pela Argélia, outros combatentes argelinos deram testemunho de sessões de tortura dirigidas por ele, em 1957. Jacques Chirac, que tivera apenas 19,88% dos votos no primeiro turno, foi reeleito no segundo turno, em 5 de maio, (com 82,21% dos votos) graças à mobilização dos franceses de todas as tendências contra o torturador Le Pen, que obteve apenas 17,79%. O punhal de Jean-Marie Le Pen foi usado como prova no processo que este fez contra o jornal Le Monde, que revelara sua implicação como torturador na Argélia. A arma em aço temperado mede 25 centímetros e foi fabricada por uma cutelaria alemã, da região de Ruhr. É o mesmo modelo usado pela Juventude Hitlerista e hoje está exposta num museu argelino. Mohamed, o menino de 12 anos que assistiu à tortura do pai pela equipe do tenente Le Pen, morreu em 2012, aos 67 anos. Quando, em 2005, no final do processo contra o general Paul Aussaresses feito por associações de defesa de direitos humanos, o presidente Jacques Chirac retirou do militar a Légion d’Honneur, dizendo-se chocado com as revelações do livro “Services Spéciaux-Algérie 1954-1957” no qual o militar assumira a tortura e as execuções sumárias, o general disse: “Eles me puniram pelo que eu disse e não pelo que fiz.” Chefe do esquadrão da morte em Brasília Em 2008, o general Aussaresses lançou seu segundo livro, Je n’ai pas Tout dit, no qual conta sua experiência de militar e de agente secreto, na Segunda Guerra Mundial, na Indochina e na Argélia. O livro é uma entrevista pingue-pongue ao jornalista Jean-Charles Deniau. No capítulo “Professeur Aussaresses – Le camp d’entraînement des dictateurs” (Professor Aussaresses – O campo de treinamento dos ditadores), ele relata sua ação como adido militar em Brasília, de novembro de 1973 a novembro de 1975. Revela sua amizade com o general João Batista Figueiredo e sua experiência como instrutor de técnicas de interrogatório vindas da Guerra da Argélia, no Centro de Instrução de Guerra na Selva (cigs), em Manaus. Aussaresses escreveu como epígrafe do livro: “Acreditávamos que a Segunda Guerra mundial tinha acabado e que começara a terceira. Chamaram-na Guerra Fria, mas era verdadeiramente uma terceira guerra mundial.” Ao reconhecer mais tarde os militares como ex-combatentes de uma guerra, a França se colocou fora da lei, pois se os “acontecimentos” da Argélia (les événements de l’Algérie) – como era chamada a intervenção militar – fora uma guerra, a tortura e as execuções sumárias são violações flagrantes e inaceitáveis da Convenção de Genebra. E como a tortura é considerada “crime contra a humanidade”, ela é imprescritível, apesar de os militares franceses terem sido anistiados de todos os fatos relativos à Argélia, inclusive a tentativa de golpe da oas contra o general De Gaulle. No Brasil, a anistia também serviu para anistiar militares responsáveis por tortura e desaparecimentos forçados, ambos considerados crimes contra a humanidade e, como tal, imprescritíveis. *LENEIDE Duarte-Plon é Jornalista internacional. Co-autora, com Clarisse Meireles, de Um homem torturado – nos passos de frei Tito de Alencar (Editora Civilização Brasileira, 2014). Em 2016, pela mesma editora, lançou A tortura como arma de guerra – Da Argélia ao Brasil: Como os militares franceses exportaram os esquadrões da morte e o terrorismo de Estado. Ambos foram finalistas do Prêmio Jabuti. O segundo foi também finalista do Prêmio Biblioteca Nacional. Foto: Capa do Le Humanité: O ÓDIO ERA SEU TRABALHO - O fundador da Frente nacional está morto. Racista, anti-semita, anticomunista, ele se dedicou sua vida para a reabilitação de uma extrema direita desqualificada por seu passado colaboracionista. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

Artigo

Estado pedagiado

Destaque

Estado pedagiado
RED

Por ADELI SELL* O Rio Grande do Sul não está achando o seu caminho. Enfim, o governador, mesmo ilustrado, não aprendeu que é ao caminhar que se faz o caminho. Voar de helicóptero fez nosso governador não ter os pés no chão. Quem se afasta a estas alturas cria uma fenda abissal entre si e o povo e suas mazelas. Não bastasse nossa crise climática com devastações brutais de regiões do Estado por ventos, chuvas, inundações, o Estado penava de duras secas antes dos dilúvios de 2023-24. No Rio Grande do Sul, as estradas estaduais pedagiadas eram administradas pela Empresa Pública de Rodovias do Rio Grande do Sul (EGR). A EGR é responsável por 630,62 quilômetros de rodovias e 10 praças de pedágio. O governo do Rio Grande do Sul quer lançar uma concessão de novas rodovias pedagiadas, com a previsão de instalação de free flow a cada 20 quilômetros. As estradas que fazem parte da concessão são: RS-128, RS-129, RS-130, RS-135, RS-324, RS- 453. Pasmem, este chamado Bloco 2 fica exatamente quase todo no espaço geográfico devastado pelas águas, o Vale do Taquari, além da região Norte do Estado, mais castigada pelas secas passadas.   O fogo pode chegar aqui Prefeitos, vice-prefeitos, vereadores/as, líderes de entidades empresarias, população em geral estão em palpos de aranha, tastaveando em busca de um caminho. O caminho de uma vida justa, sem atropelos dos poderes públicos. E nestes momentos que pode irromper o perigo que o governador com sua miopia social não enxerga. E isto é perigoso para todos os lados. Vocês estão vendo a fúria do fogo devastando a Califórnia. Olha que o clima aqui está quente, só largar mais um estopim destes e tudo vai para o ar como as colunas de fogo de Hollywood. Cuidado, governador, o senhor pode começar a receber um Manifesto, e se o senhor não tomar uma atitude de aliviar o bolso do povo que circula todos os dias por estas rodovias, o próximo passo nesta busca do caminho, pode ser algo mais bombástico. O senhor que frequentou a Faculdade de Direito em Pelotas aprendeu o conceito de Desobediência Civil, o senhor como prefeito e governador a conheceu uma de nossas formas de desobediências civil, as greves. E o que lhe espera se não mudar de posição será algo bem mais potente. O senhor viu a devastação de nosso Estado, e se o senhor seguir na sua teimosia de cobrar as contas do povo, a força que virá de baixo para cima será mais do que a fúria das águas ou do fogo californiano.         *Adeli Sell é professor, bacharel em Direito. Foto de capa: Divulgação Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

Artigo

A esquerda diante da extrema direita na Europa

Destaque

A esquerda diante da extrema direita na Europa
RED

Por CELSO JAPIASSU* Para enfrentar o avanço da extrema direita, a esquerda precisaria desenvolver uma capacidade renovada de abordar os desafios contemporâneos e apresentar um novo projeto de sociedade que esteja alinhado com as demandas do século XXI. A extrema direita tem avançado nos países da Europa de uma forma que muitos consideram avassaladora. É a onda marrom, como foi chamada. As últimas eleições legislativas foram uma advertência para a ameaça que significou o crescimento de partidos neonazistas, neofascistas e reacionários em geral. Seus apelos de ação contra o que chamam “sistema”, contra a imigração e contra a própria União Europeia têm conquistado o apoio eleitoral de uma classe média perplexa, insegura e atônita pela vivência de uma crise que se arrasta no tempo. O que já foi diagnosticado como a crise do modelo capitalista e a organização da sociedade por ele determinada. Os movimentos de esquerda têm procurado estabelecer estratégias para o enfrentamento com a formação de coalizões e frentes unidas. Na França, nas últimas eleições, uma frente popular uniu as organizações de esquerda e foi bem-sucedida num panorama em que despontava uma quase certa vitória do partido de Marine Le Pen. No Reino Unido, o Partido Trabalhista adotou uma abordagem moderada com um candidato pragmático e uma plataforma de propostas para enfrentar problemas reais da população. E foi igualmente bem- sucedido. Líderes de centro-esquerda, como Rolf Mützenich na Alemanha, alertam que a própria democracia está em risco. Há reconhecimento da necessidade de enfrentar as causas do sucesso da extrema direita, entre elas as questões econômicas e as preocupações com a imigração. Partidos como a Aliança de Esquerda, na Finlândia, o Partido Popular Socialista na Dinamarca e o Partido de Esquerda na Suécia têm se destacado como alternativas à extrema direita. Plataformas Há esforços para manter a grande coalizão entre partidos populares, socialistas e liberais que já governaram a União Europeia, em oposição a alianças com partidos de extrema direita. Partidos de esquerda, como o La France Insoumise, estão defendendo plataformas de cunho social, rejeitando medidas de austeridade e políticas xenófobas e antiecológicas. Os partidos de centro- esquerda passaram a se posicionar firmemente contra os valores da extrema- direita, como a glorificação da violência, xenofobia, homofobia e ultranacionalismo. Há um esforço para denunciar o populismo de direita em todas as suas formas, seja no campo político, laboral ou cultural. Os partidos de centro-esquerda e de esquerda defendem a implementação de programas nas áreas de educação, mídia, saúde mental e apoio às famílias, visando prevenir a radicalização e desradicalizar indivíduos já envolvidos em movimentos extremistas. Buscam o fortalecimento de iniciativas como a Rede de Conscientização sobre Radicalização (RAN) da União Europeia, que permite a troca de experiências e práticas bem-sucedidas entre diferentes países. Investem no financiamento de centros de pesquisa especializados no estudo do extremismo, como o Centro para Pesquisa do Extremismo na Universidade de Oslo, para melhor compreender e prevenir o fenômeno. Alemanha A Alemanha está enfrentando o crescimento da extrema-direita, principalmente representada pelo partido Alternativa para a Alemanha (AfD), através de várias estratégias. Os partidos tradicionais mantêm uma política de não-cooperação com a AfD, recusando-se a formar coalizões ou acordos com o partido de extrema-direita. Após revelações sobre reuniões secretas da AfD com figuras neonazistas, ocorreram protestos massivos em toda a Alemanha, pedindo a proibição do partido. A AfD foi expulsa do grupo de extrema-direita Identidade e Democracia no Parlamento Europeu, em resposta a escândalos recentes e o governo alemão adotou leis mais rígidas sobre porte de armas e controles mais apertados para requerentes de asilo, em resposta a ataques terroristas. Há na Alemanha um esforço para alertar sobre os perigos da normalização de mensagens extremistas na sociedade. Especialistas e acadêmicos estão estudando o fenômeno do crescimento da extrema-direita para melhor compreendê-lo e combatê-lo. Apesar desses esforços, a AfD continua a ganhar força em algumas regiões, especialmente na Alemanha Oriental, onde chegou a vencer eleições estaduais. Isso tem gerado preocupações sobre a eficácia das estratégias atuais e debates sobre como lidar com um partido que, embora extremista, tem conquistado apoio entre os eleitores. A AfD, fundada por antigos oficiais nazistas e se diferencia de outros partidos de extrema direita na Europa pelo seu grau de radicalismo. É o mais extremista entre todos os partidos de extrema-direita na Europa e foi expulsa do grupo Identidade e Democracia no Parlamento Europeu devido a escândalos e posições extremistas. O partido agora faz parte de um novo grupo chamado Europa das Nações Soberanas, considerado ainda mais à direita do que outros grupos de extrema-direita no Parlamento Europeu. A AfD tem sido protagonista de múltiplos escândalos envolvendo a presença de negacionistas do Holocausto, racistas e outros extremistas nas fileiras do partido. Andreas Kalbitz, ex-líder estadual, foi expulso devido a antigas ligações com um movimento juvenil neonazista e Christian Lüth, ex-porta-voz, foi desligado após sugerir que imigrantes deveriam ser mortos “com tiros ou gás”. Maximilian Krah, principal candidato às eleições europeias, fez declarações polêmicas que levaram à sua demissão da comissão executiva federal do partido. Jian Guo, assistente de Krah, foi detido por suspeita de ser “um empregado dos serviços secretos chineses”. Petr Bystron, segundo nome na lista do AfD, foi acusado de aceitar mais de 20 mil euros de uma agência de influência apoiada por Moscou e Siegbert Droese posou em frente ao bunker de Hitler e fez campanha com um carro com placa alusiva ao líder nazista. Em Portugal Em Portugal, onde o partido Chega tem se fortalecido e hoje é a terceira força eleitoral do país, os partidos de esquerda (Partido Socialista (PS), (Bloco de Esquerda (BE), Partido Comunista Português (PCP) Partido Ecologista “Os Verdes”(PEV) e Livre (L), discutem estabelecer uma frente única e procuram demarcar-se clara e constantemente da extrema-direita, reafirmando os valores democráticos e progressistas. Denunciam o populismo em todas as suas formas e recusam estratégias políticas que estigmatizam o diálogo entre correntes centristas. Procura também focar na integridade moral e política, combatendo ofensas à lei e desvios éticos no serviço público. Tem havido debates internos para reavaliar estratégias políticas, como a  conferência nacional do Bloco de Esquerda para discutir as eleições autárquicas e o crescimento da extrema-direita, procurando manter a unidade entre as forças de esquerda e dificultar as manobras extremistas de direita. Comentaristas assinalam que a esquerda atualmente não possui um projeto alternativo bem definido que ofereça uma visão convincente para a construção de uma nova ordem social ou reformas profundas no modelo atual. Para enfrentar o avanço da extrema direita, a esquerda precisaria desenvolver uma capacidade renovada de abordar os desafios contemporâneos e apresentar um novo projeto de sociedade que esteja alinhado com as demandas do século XXI.     *Celso Japiassu é autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).   Foto de capa: Drive/Poder 360 Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.         (mais…)

Mostrando 6 de 5320 resultados
Carregar mais