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Opinião

Tensionamentos pós-eleitorais: pode haver golpe?

Tensionamentos pós-eleitorais: pode haver golpe?

Eleições 2022 por RED
23/11/2022 19:55 • Atualizado em 25/11/2022 00:35
Tensionamentos pós-eleitorais: pode haver golpe?

Não reconhecimento público da derrota por parte de Bolsonaro, além de falas e ações de seus apoiadores dão tom de golpe, mas especialista diverge sobre clima para sustentação desse quadro.

No último domingo, 20, foi divulgado pela imprensa um áudio do então Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU),  Augusto Nardes, expondo a possibilidade de um golpe militar no Brasil após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. Direcionado a produtores do agronegócio, o áudio afirma que “está acontecendo um movimento muito forte nas casernas. É questão de horas, dias, uma semana que vai acontecer um desenlace bastante forte na nação, imprevisíveis”.

O então Ministro do TCU, Augusto Nardes – reprodução da internet.

Apesar de citar literalmente a palavra “golpe”, este não é o primeiro ato antidemocrático que vem ocorrendo por parte de apoiadores de Bolsonaro. Desde a sua derrota nas urnas, protestos trancam estradas, bolsonaristas acampam em frente ao quartéis e agridem apoiadores do presidente eleito Lula. Além disso, pessoas ligadas ao atual governo sugerem intervenções sem embasamento constitucional. “É notável que parcela da sociedade ainda resiste ao resultado das eleições…As instituições estão sendo testadas”, avalia Manuel Domingos, historiador, professor e especialista na área das Forças Armadas.

No áudio de Nardes, além dele relembrar que nos anos 1980 conversou com os ditadores Ernesto Geisel e João Figueiredo e criou um grupo para “se contrapor” a “toda essa transformação” que “acabou acontecendo no Brasil” (se referindo a democratização), ele ainda cita que Jair Bolsonaro teria reavivado o movimento conservador e que o presidente estaria tratando uma doença grave de pele, mas logo estaria recuperado para “enfrentar o que vai acontecer no país” e afirma que que há um sentimento de que a situação atual acabará convergindo em “um conflito social na nação brasileira”.

Apesar do autor do áudio afirmar haver possibilidade de conflito, não há evidências concretas sobre a articulação do golpe no Brasil. Nem mesmo a informação de doença grave se confirma, uma vez que no último dia 18, o ex-ministro Braga Netto (PL-MG), tranquilizou apoiadores do presidente Jair Bolsonaro sobre o estado de saúde do chefe do Executivo, informado que o presidente está recuperado da erisipela, uma infecção na pele que causou uma ferida na perna e que logo estaria de volta ao Planalto.

Para Domingos, apesar dos fatos que vêm ocorrendo após segundo turno representarem um constante tensionamento na transição e um problema grave para o próximo governo, não há clima para uma “aventura golpista”: 

“Essa resistência é alimentada por segmentos institucionais. Não creio que estes setores tenham capacidade de afrontar a grande maioria dos brasileiros e a opinião internacional. Não vejo possibilidade de êxito em uma aventura golpista.”

Ainda que o principal pedido dos protestos seja de intervenção militar, as Forças Armadas não tem se posicionado formalmente nem contra, nem a favor. Mas Domingos problematiza essa falta de posicionamento:

“No que diz respeito às Forças Armadas, os comandos foram postos em cheque. Se não tomarem atitude, o perigo é a insubordinação se espalhar. Há oficiais da ativa em plena militância. As fileiras poderão ficar descontroladas. Passou da hora de os generais com posição hierárquica elevada se imporem. Do contrário, ou serão cúmplices do golpismo,  para não dizer protagonistas, ou serão desmoralizados”.

Bloqueio em estrada de SC – divulgação PRF.

Lênio Streck, jurista, professor e advogado, também comentou recentemente para o site da RED sobre o papel das Forças Armadas pós-eleições. Além disso, comentou para esta matéria sobre o apoio que Nardes, no papel de Ministro do TCU, afirma, também no áudio vazado, ter aos protestos que vêm ocorrendo pelas ruas do país:

“A imprensa democrática tem de mandar para o ministro Nardes, do TCU, os vídeos de caminhões e praças incendiadas e os 18 bloqueios. Para vermos como ele explica seu apoio aos atos que, pela voz do coordenador da PRF, Cristiano Vasconcelos, são terroristas. Terroristas. E perguntar para o ministro por qual razão, motivo ou circunstância um magistrado faz áudio apoiando atos antidemocráticos taxados pela própria PRF como terroristas.”

Procurado pela Folha de São Paulo, Nardes afirmou que o áudio de fato é dele, mas que foi enviado a um grupo de amigos em conversa privada e que a intenção não foi a de criar “nenhum tipo de tumulto”, mas sim fazer uma análise “dentro da democracia e da liberdade de expressão” e justifica alguns termos, dizendo não se tratar de golpe militar, mas das manifestações que vem ocorrendo em frente aos quartéis. Ainda na segunda-feira, 21, o então ministro fez um pedido de afastamento das funções por motivos médicos. 

Na terça-feira, 22, o Partido dos Trabalhadores (PT) protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma notícia-crime contra Augusto Nardes pedindo investigação por pelo menos cinco crimes após o vazamento do áudio que supostamente articula para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Já nesta quarta-feira, 23,  a Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou requerimento para Nardes explicar declarações golpistas. O pedido foi feito pela deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e subscrito por parlamentares do PT.


Matéria de Gisele Agliardi.

Imagem destacada de reprodução.

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