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Soberania Digital: Economia Solidária, Software Livre e Cultura Digital na Construção do Cooperativismo de Plataformas
RED
Por EVERTON RODRIGUES*
A memória das experiências passadas é a semente do presente, orientando-nos a projetar e colher um futuro justo. Refletir sobre nossas vivências anteriores nos oferece a oportunidade de aprender com elas, reconhecer limites, erros e acertos, além de sistematizar esse conhecimento para construir um futuro mais consciente e planejado.
No limiar do século XXI, durante o 1º Fórum Internacional de Software Livre (2000) e o 1º Fórum Social Mundial (2001), emergiu no Brasil o debate sobre a soberania na produção e no uso de tecnologias livres, em oposição aos monopólios e às patentes de grandes corporações nacionais e transnacionais. Este debate foi impulsionado pelo movimento do software livre, com o objetivo de reduzir a dependência tecnológica e superar o controle exercido por grandes corporações, como Microsoft e Apple. Esse ambiente de produção de ideias e tecnologias foi nutrido e potencializado pelas experiências dos Governos Populares em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul, que projetaram para o mundo a perspectiva da participação popular na gestão pública, especialmente por meio da experiência do Orçamento Participativo.
A intersecção entre os movimentos do Fórum Internacional de Software Livre e do Fórum Social Mundial, acompanhado de um ambiente de governança participativa, possibilitou a adoção do software livre em todas as esferas da gestão pública na cidade de Porto Alegre e no Estado do Rio Grande do Sul. Em 2002, com a eleição de Lula para a Presidência da República, a experiência construída nos governos populares de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul ganhou escala nacional, com a adoção do software livre nas instituições do Estado brasileiro. Essa iniciativa transformou-se em uma referência mundial na criação e no uso de tecnologias livres, softwares públicos e na gestão segura de dados e informações.
No 6º Fórum Internacional de Software Livre, realizado em 2005, foi estabelecida uma associação entre o movimento de software livre e o movimento das sementes crioulas, com base no diagnóstico de que ambos os movimentos lutam contra o monopólio de patentes exercido pelas grandes corporações (seja no campo da informação ou no agronegócio). Ambos defendem a diversidade, a autonomia e o conhecimento livre e acessível a todos os povos.
Enquanto o movimento de software livre busca garantir a liberdade no uso, compartilhamento e reconhecimento dos verdadeiros autores dos códigos, enfrentando o sistema de propriedade intelectual e de patentes que beneficia apenas alguns, o movimento das sementes crioulas combate a apropriação privada da vida por meio de modificações genéticas, que transformaram as sementes em patentes das corporações transnacionais.
A síntese que unificou essas lutas foi a percepção de que as corporações da área da tecnologia da informação manipulam o bit na criação de softwares proprietários, enquanto as corporações do agronegócio manipulam o gene para se apropriar da reprodução das sementes e da vida.
Como símbolo dessa integração de lutas, foi distribuído um quilo de arroz Oryza glaberrima (uma variedade africana trazida pelos negros escravizados como forma de resistência e soberania alimentar), produzido por agricultores quilombolas do Rio Grande do Sul.
Com o avançar das edições dos Fóruns Sociais Mundiais, consolidou-se uma importante aliança entre o movimento de software livre e os princípios da economia solidária. Identificou-se a necessidade de construir sistemas associativos, cooperativos e autogestionários para a defesa do conhecimento livre.
Nesse contexto, foram estabelecidas parcerias criadores de plataformas de software livre para o desenvolvimento de sistemas de comércio eletrônico voltado aos empreendimentos da economia solidária. Esse ambiente também fomentou o surgimento das primeiras cooperativas de tecnologia da informação no Brasil, que passaram a oferecer suporte e a desenvolver plataformas livres para a difusão de informações e para o comércio eletrônico.
Embora muitas iniciativas de comércio eletrônico tenham surgido e ainda funcionem, é evidente que enfrentam diversas dificuldades. Entre elas, destaca-se a falta de conscientização sobre a importância de consumir produtos oriundos de economias sustentáveis e a carência de criação e suporte em tecnologias livres voltadas para o e-commerce. Além disso, pesam a inexistência de uma legislação específica para a Economia Solidária, as elevadas cargas tributárias e a complexidade envolvida na gestão administrativa e financeira de cooperativas no Brasil. Diferentemente de grandes empresas capitalistas, que priorizam o lucro e frequentemente usufruem de isenções fiscais concedidas pelo governo, as cooperativas solidárias, infelizmente, não recebem nenhum tipo de benefício tributário.
Neste período, também percebemos o crescimento e a consolidação dos sistemas produtivos e de comercialização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Com mais de 40 anos de existência, o movimento está presente em 24 estados brasileiros, organizando 185 cooperativas, 1.900 associações e 120 agroindústrias, sendo uma das principais forças da agroecologia e do cooperativismo solidário no Brasil. Atualmente, o MST organiza cerca de 400 mil famílias assentadas e outras 70 mil em acampamentos. Essas famílias fazem sua produção chegar aos grandes mercados consumidores por meio de feiras, das compras públicas realizadas por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), de uma potente rede de Armazéns do Campo espalhados pelo Brasil, de uma série de lojas virtuais e do abastecimento a cozinhas solidárias e comunitárias. O MST tornou-se uma importante referência na construção de sistemas agroalimentares agroecológicos, fundamentados na produção e comercialização associativa e solidária.
A primeira década do século XXI também viu nascer outras experiências importantes, baseadas na economia solidária e que integraram o software livre como fundamento da sua organização tecnológica. Como exemplos, destacam-se o Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo, fundado em 2005 no âmbito do Programa Cultura Viva, do Ministério da Cultura, e a Cooperativa de Comércio Justo e Consumo Consciente – GiraSol, fundada em 2006. Ambas as experiências tiveram origem nas práticas de democracia participativa e no Fórum Social Mundial.
O Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo foi gestado, em Porto Alegre, a partir de uma ampla parceria entre a OSCIP Guayí, o Sindicato dos Servidores do Judiciário Federal (SINTRAJUFE), o Clube de Mães do Bairro Cristal, lideranças comunitárias e os Orçamentos Participativos dos Bairros Cristal e Cruzeiro. Desde sua concepção, o Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo assumiu a Economia Solidária e o Software Livre como princípios organizadores de sua prática. O Ponto de Cultura concebeu desde o início sua estruturação como Incubadora Cultural e Tecnológica de empreendimentos e iniciativas do território e funciona até hoje como espaço de difusão do software livre em todos os processos produtivos e de fruição. Tornou-se referência nacional como espaço que interconecta, em todas as suas iniciativas, os princípios da economia solidária, do software livre, da cultura digital, da permacultura e da gestão democrática e compartilhada para o desenvolvimento do território.
Esta experiência foi projetada e ampliada entre 2006 e 2010 com a implantação dos projetos Casa Brasil, uma iniciativa do Governo Federal que, em parceria com a Secretaria Nacional de Economia Solidária, fortaleceu a integração da economia solidária com o software livre. As ações das Casas Brasil promoveram formações, debates, cursos online e presenciais, encontros e conferências durante as feiras de economia solidária, além de reflexões nos Fóruns de Software Livre e nos Fóruns Sociais Mundiais. Também foi o berço para a organização da Rede dos Pontos de Cultura no Rio Grande do Sul, na qual o Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo teve forte protagonismo, desempenhando o papel de coordenação da Rede por muitos anos.
A Cooperativa GiraSol, por sua vez, foi criada por um conjunto de ativistas sociais que vivenciaram as experiências da gestão pública nos governos populares em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul, sindicalistas, servidores públicos e profissionais liberais que queriam construir uma ferramenta de consumo de alimentos saudáveis que conectasse produtores e consumidores. Ao buscar a superação dos monopólios de produção e comercialização das grandes corporações e cadeias de supermercados, a Cooperativa GiraSol assumiu a economia solidária, a agroecologia, o conhecimento livre, a luta contra a transgenia e os agrotóxicos como princípios de sua experiência.
Em 2017, a Cooperativa iniciou uma experiência bem-sucedida de criação de uma loja virtual, ancorada nas plataformas livres WooCommerce e WordPress, a partir de uma parceria com ativistas do software livre. Essa experiência permitiu que a Cooperativa fosse pioneira e uma das principais operadoras da alimentação saudável em Porto Alegre durante a pandemia de Covid-19. Nove dias após o decreto de isolamento social, a GiraSol ampliou a loja virtual para atender toda a cidade de Porto Alegre.
Entre março de 2020 e dezembro de 2023, a loja virtual da GiraSol processou 21.240 pedidos com entrega domiciliar, comercializando mais de 150 toneladas de alimentos agroecológicos oriundos da reforma agrária e da agricultura familiar. Neste mesmo período, a loja física da GiraSol realizou 56.100 operações de venda, comercializando mais de 260 toneladas de alimentos agroecológicos. Somando os dois canais de venda, foram comercializadas mais de 400 toneladas de alimentos agroecológicos provenientes da reforma agrária e da agricultura familiar.
Além dos processos comerciais, a Cooperativa GiraSol executou dois importantes programas de ajuda humanitária, com doação de cestas básicas de alimentos agroecológicos e da agricultura familiar. Em 2021, durante a pandemia, foram entregues 4.300 cestas, totalizando 98,9 toneladas. Em 2024, durante o período mais intenso das enchentes no Rio Grande do Sul, a Cooperativa GiraSol entregou 1.700 cestas de alimentos, totalizando 42,5 toneladas. Juntando as duas ações, a GiraSol comprou da reforma agrária e da agricultura familiar mais 140 toneladas de alimentos saudáveis e fez a doação para mais de 6.000 famílias em situação de vulnerabilidade.
Desde 2020, a Cooperativa GiraSol adquiriu e distribuiu quase 600 toneladas de alimentos agroecológicos provenientes da agricultura familiar e da reforma agrária.
A partir das políticas públicas da SENAES de fomento às Redes de Cooperação Solidária, o Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo e a Cooperativa de Comércio Justo e Consumo Consciente – GiraSol se uniram à construção da Rede de Economia Solidária e Feminista (RESF), que, desde 2012, vem articulando mais de 300 empreendimentos econômicos solidários, organizados em 24 redes locais distribuídas por 11 estados brasileiros, incluindo Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Goiás, Bahia, Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Pará. Essa articulação em rede possibilitou a replicação da experiência da loja virtual da Cooperativa GiraSol para a Rede Xique Xique de Comercialização, no Rio Grande do Norte. Em 2017, a RESF iniciou o debate sobre a necessidade de articular as diferentes experiências de lojas virtuais e físicas organizadas pela rede em um ambiente de marketplace. Esse desejo, no entanto, não prosperou devido à extinção da política pública de economia solidária pelo governo Bolsonaro.
Esta exitosa jornada de parceria entre o movimento de software livre e o movimento da economia solidária sofreu importantes retrocessos nos últimos anos. Mesmo com experiências bem-sucedidas de comércio eletrônico, no desenvolvimento de produtos e serviços baseados em conhecimentos livres, e na organização de redes de cooperação solidária, essa perspectiva não avançou de forma ampla, devido à falta de uma política pública robusta que coloque a tecnologia livre no centro de uma estratégia de desenvolvimento sustentável e solidário. O desenvolvimento de tecnologias livres para dar suporte às diferentes redes, cadeias produtivas e empreendimentos econômicos deve ser articulado com o desenvolvimento de uma tecnociência solidária, capaz de impulsionar novos arranjos produtivos e de serviços mediados por códigos-fonte livres de monopólios. Nessa perspectiva, a retomada dos Programas Nacionais de Incubadoras Populares e Tecnológicas e o fortalecimento da economia solidária nos Institutos Federais de Educação podem representar um espaço importante para a retomada da aliança entre economia solidária e software livre, visando o desenvolvimento de tecnologias livres para o fomento ao cooperativismo.
Nos últimos anos, o debate sobre a conexão entre tecnologia e cooperativismo vem ganhando notoriedade, especialmente pelas experiências do cooperativismo de plataforma, no segmento de transporte, com a criação de aplicativos para motoristas, mototaxistas e cicloentregadores. No entanto, a maior parte dessas experiências carece do cuidado elementar em relação à propriedade dos códigos-fonte desses aplicativos. Torna-se urgente a retomada do debate e da aliança entre a economia solidária e o software livre para o desenvolvimento de plataformas livres dos monopólios das grandes corporações, sob o risco de cooptação e apropriação de nossas iniciativas pelo capital.
O grande desafio da atualidade é superar a "servidão aos algoritmos", onde plataformas digitais baseadas em Inteligência Artificial se transformaram em verdadeiras instituições intocáveis, que destroem as instituições públicas, controlam horários, tarefas e avaliações, condicionam subjetividades, manipulam entendimentos e promovem desinformação, tudo isso sem transparência ou fiscalização e com amplo apoio social.
O livro "Tecno-feudalismo: O que matou o capitalismo" de Yanis Varoufakis apresenta uma análise crítica da transformação do capitalismo contemporâneo, sugerindo que ele evoluiu para um sistema denominado "tecno-feudalismo". Varoufakis argumenta que as grandes corporações de tecnologia substituíram os pilares tradicionais do capitalismo mercados e lucros por plataformas digitais e rendas passivas, criando uma nova forma - o feudalismo digital.
Varoufakis argumenta que, ao contrário das expectativas de que as inovações tecnológicas levariam a um avanço progressivo, elas resultaram em um sistema econômico mais desigual e dependente, caracterizado por uma nova forma de feudalismo digital.
Ele sugere que as grandes corporações de tecnologia atuam como novos senhores feudais, controlando recursos, dados e as vidas cotidianas dos usuários.
Varoufakis destaca que os usuários se tornam "servos digitais", fornecendo dados pessoais em troca de acesso a serviços digitais essenciais.
Ele observa que essa transformação resulta em uma concentração de poder e riqueza nas mãos de poucas corporações tecnológicas, ameaçando a democracia e exacerbando as desigualdades sociais.
Varoufakis alerta que o tecno-feudalismo dificulta a ação coletiva necessária para enfrentar desafios globais, como a crise climática, e propõe a necessidade de uma nova abordagem econômica que promova a solidariedade e a justiça social.
A proposta de Varoufakis destaca a importância da solidariedade e da ação coletiva na luta contra as desigualdades exacerbadas pelo avanço tecnológico. Ao enfatizar a necessidade de uma coalizão ampla, ele sugere que somente por meio da união de diversos setores da sociedade será possível enfrentar eficazmente os desafios impostos pelo tecno-feudalismo. “Servos da nuvem, proletários da nuvem e vassalos da nuvem do mundo, unam-se.”
Diante de tudo isso, temos uma oportunidade promissora e desafiadora de promover a convergência e integrar diversas iniciativas produtivas e de consumo de produtos e serviços. Isso pode ser alcançado criando sinergias entre Economia Solidária, Software Livre, Cultura Digital, Cooperativas de Transporte, Cooperativas de Logística, Cooperativas de Consumo, que se articulem com Cooperativas da Reforma Agrária, da Agricultura Familiar e com a Agroecologia. Presupõe-se o fortalecimento de sistemas e conhecimentos como a permacultura, a bioconstrução, a produção de bioinsumos, a difusão das sementes crioulas (sementes livres) e o Biohacking. Essa integração permitirá oferecer alternativas poderosas por meio das diversas interfaces do cooperativismo de plataformas, utilizando plataformas digitais com governança coletiva, em contraste com o modelo tecno-feudalismo de concentração de poder e lucros dominado por grandes corporações.
As tecnologias livres, a cultura digital e a economia solidária desempenham um papel crucial no enfrentamento das mudanças climáticas, oferecendo soluções acessíveis, transparentes e adaptáveis que podem ser implementadas por comunidades e organizações em todo o mundo.
A integração e interconexão de todas as iniciativas por meio do cooperativismo de plataformas livres pode criar poderosas cadeias produtivas e promover autonomia, colaboração, democratização da ciência e da cultura, consciência social e política, além de democratizar a economia, produzindo as bases para o bem viver.
Os princípios de todas os movimentos e iniciativas que promovem envolvimento local, compartilhamento de saberes, conhecimentos e gestão compartilahda e democratica, são essenciais para enfrentar os monopólios que priorizam apenas o lucro e o poder, cujos resultados, que incluem devastação e perda de vidas, estão nítidos diante de nós. Por exemplo, basta olhar para os crimes em Mariana (MG), Brumadinho (MG), São Sebastião (SP) e Rio Grande do Sul, ocorridos em 2015, 2019, 2023 e 2024, respectivamente.
Em Mariana, o rompimento da barragem da Samarco causou a morte de 19 pessoas e o despejo de milhões de metros cúbicos de rejeitos no Rio Doce, afetando comunidades e ecossistemas locais. Em Brumadinho, o rompimento da barragem da Vale resultou na morte de 272 pessoas e em danos ambientais significativos.
Além disso, em fevereiro de 2023, São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, enfrentou deslizamentos de terra que resultaram em 65 mortes, evidenciando os impactos devastadores de desastres naturais exacerbados por ações humanas. As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul entre abril e maio de 2024 resultaram em 183 mortes, 27 desaparecidos e cerca de 806 feridos, atingindo 470 cidades, sobrecarregando as bacias dos rios Taquari, Caí, Pardo, Jacuí, Sinos e Gravataí.
Esses crimes ambientais evidenciam que é uma questão de vida ou morte promover mudanças nos processos econômicos, culturais e políticos que ampliem a transparência, o compartilhamento de saberes, o envolvimento territorial e a gestão democrática na produção e consumo de produtos e serviços, resultantes do "Trabalho Justo, Digno, Solidário, Saudável e Seguro", com proteção das terras, das águas, do ar, das florestas e de todos os biomas: Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pantanal, Pampa e marinho, permitindo-nos agir de forma mais racional e sustentável.
Ao integrar essas iniciativas, o cooperativismo de plataformas com tecnologias sociais e livres, vai desempenhar um papel crucial na construção de uma sociedade mais justa, sustentável e resiliente, capaz de enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas e promover o bem-estar coletivo.
O matemático John Nash, ganhador do Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 1994, superou as ideias de Adam Smith ao demonstrar que a cooperação é mais eficaz do que o individualismo e a competição. Nash introduziu o conceito de que um indivíduo maximiza seus ganhos quando age em benefício próprio e, simultaneamente, em benefício coletivo, considerando as ações das demais pessoas.
Essa perspectiva reforça a viabilidade de modelos colaborativos e cooperativos, como a economia solidária e o software livre, que se mostram mais sustentáveis em comparação às estruturas empresariais tradicionais. Ao combinar tecnologias digitais transparentes com práticas cooperativas, essas abordagens promovem uma economia baseada em autogestão, sustentabilidade e democracia no ambiente de trabalho.
O conceito de Equilíbrio de Nash, da teoria dos jogos, ilustra como a cooperação estratégica pode gerar resultados vantajosos para todos os envolvidos, superando a competição individualista e favorecendo resultados coletivos.
O Equilíbrio de Nash descreve uma situação em que, em um jogo finito, todos os jogadores alcançam um resultado estável e mutuamente satisfatório, levando em conta as decisões dos demais participantes. Nesse contexto, nenhum jogador pode melhorar seu resultado individual ao alterar unilateralmente sua estratégia, desde que as escolhas dos outros permaneçam as mesmas.
Por outro lado, quando cada pessoa age de forma individualista e unilateral, buscando maximizar exclusivamente seus interesses sem considerar os impactos sobre os demais, o resultado frequentemente é desequilibrado: muitos acabam perdendo, enquanto apenas poucos obtém ganhos significativos, como ocorre nos modelos de concorrência extrema.
O livro "Economia Solidária Digital" (https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/noticias-e-conteudo/2024/Agosto/mte-apoia-livro-sobre-politicas-sociais-de-economia-solidaria-digital/livro_economia_digital_solidaria_v2_comprimido.pdf) é uma publicação conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da Secretaria Nacional de Economia Popular e Solidária (Senaes), do Laboratório de Pesquisa DigiLabour e da Fundação Rosa Luxemburgo.
Lançado em agosto de 2024, o livro aborda as possibilidades de articulação entre software livre, economia solidária e economia digital, apresentando exemplos práticos em linguagem acessível. A obra destaca iniciativas que promovem governança democrática, o uso de dados para o bem comum e tecnologias livres geridas por comunidades, aplicáveis em setores como transporte, cultura, tecnologia, cuidados e agricultura familiar.
O principal objetivo desta publicação é servir como material de formação para trabalhadores, servidores públicos e agentes da economia popular e solidária que desejam se atualizar sobre o tema. Além disso, busca fomentar o debate sobre a construção de alternativas no âmbito da economia digital, enfatizando a importância de modelos que priorizem dignidade, sustentabilidade e colaboração.
O esforço da Secretaria Nacional de Economia Popular e Solidária em debater como as tecnologias livres podem potencializar a economia solidária demonstra o compromisso do Governo Lula em transformar o Brasil em uma referência global em Economia Solidária Digital.
Diante disso, é fundamental avançar na constituição de um Grupo de Trabalho entre a SENAES, ativistas e organizações que atuam no movimento de software livre, trabalhadores, empreendimentos, redes e cooperativas de plataforma, a fim de formular uma estratégia para o desenvolvimento de políticas públicas para a Economia Solidária Digital com potencial emancipatório.
*Everton Rodrigues é integrante do Movimento ANTIfascismo e do Time Lula.
Foto de capa: Reprodução
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