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Flávio Dino e a sucessão (II)

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Flávio Dino e a sucessão (II)
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Por J. CARLOS DE ASSIS* Escrevi ontem que, a meu ver, do ponto de vista moral, o melhor candidato à sucessão de Lula em 2026 – caso ele próprio não seja candidato à reeleição -, é o ministro Flávio Dino, do STF. O ministro se destacou, no ano passado, como o grande paladino da luta contra a corrupção do Congresso, o qual, através das infames emendas parlamentares, tentou roubar do povo, nesse ano, mais de R$ 50 bilhões. Nem todo esse dinheiro chegou às mãos da “quadrilha” parlamentar que tentou desviá-lo dos cofres públicos, sem qualquer transparência, justamente porque o ministro tratou de bloquear parte dele exigindo esclarecimentos essenciais para sua rastreabilidade. Dessa forma, insurgindo-se contra um Legislativo que, mesmo formado por maioria de direita e extrema direita, mostrou que ele não tem poder absoluto no País. Isso deu ao Brasil a esperança de que, a despeito de toda a degradação que afeta praticamente todas instituições, ainda há salvação por parte da ação individual de personalidades que não têm medo de enfrentar os poderosos. Dino deu provas de que é uma delas. E diferente dos que combatem a corrupção demagogicamente, sem provas, como é o costume no Brasil, está mostrando sua efetivação com acompanhamento em tempo real pela sociedade. Entretanto, combater a corrupção não é tudo que interessa à sociedade brasileira neste momento. Precisamos de manter o ritmo de desenvolvimento econômico que o presidente Lula sustentou em 2024, enfrentando poderosas forças conservadoras, especialmente do “mercado financeiro” rentista. É fato que sem a ação dessas forças a performance da economia poderia ter sido ainda melhor que o aumento do PIB de 3,5%. Mas elas impuseram um retardo do nosso potencial de crescer. O que tem travado o crescimento econômico brasileiro a taxas “chinesas” e “indianas” é o arcabouço fiscal de Fernando Haddad que limita o déficit primário a 0,25% do PIB. Um déficit maior, similar ao déficit de 3% admitido na área do euro pelo Banco Central Europeu, colocaria o País entre os de maior crescimento do mundo, quando se somam os efeitos sobre o crescimento do aumento ocorrido em 2024 do emprego, do salário mínimo e da massa salarial. É nesse ponto que vejo uma segunda contribuição essencial ao Brasil de Flávio Dino, esta direcionada para a questão econômica. O ministro não se submeteu ao fetiche da “meta fiscal” com orçamento quase estacionário, estabelecido pelo “arcabouço” de Haddad. Diante da tragédia de meados do ano no Rio Grande do Sul e das posteriores queimadas nos demais biomas brasileiros, ele autorizou o Governo a “furar” a meta fiscal do “arcabouço” e baixar medidas provisórias para mobilizar os recursos federais necessários para enfrentar suas consequências. Isso enfureceu o “mercado financeiro”, que exige déficit zero ou, no máximo, de 0,25% do PIB no orçamento primário. É uma meta absolutamente incompatível com a era dos desastres climáticos extremos, que exigirão aumentos cada vez maiores, ao ritmo dos desastres climáticos inevitáveis, nos cortes no orçamento primário, onde são computados seus custos. Se a meta fiscal for cumprida, o Estado Social , que inclui os demais custos de interesse do povo pobre, vai desaparecer para acomodar as despesas dos desastres climáticos extremos. Flávio Dino demonstrou, como a maioria do povo brasileiro, grande sensibilidade diante dos desastres no sul e das tragédias das queimadas, ao tomar a iniciativa de que o Governo fure a meta fiscal do “arcabouço”, para cobrir seus custos. Sem isso, o presidente Lula correria o risco legal de um impeachment similar ao que ocorreu com Dilma, embora em circunstâncias diversas. Entretanto, do ponto de vista da economia em seu conjunto, e não apenas quanto a seu efeito legal de proteger o mandato de Lula, a medida provisória de Flávio Dino terá de ser complementada. A meu ver, ele está mais apto a fazê-lo do que qualquer outro candidato a presidente. É que deve ter percebido, de alguma forma, que o déficit fiscal efetivo que resultará dos gastos acima da meta fiscal vai pressionar a demanda global real, e se não houver aumento equivalente do lado da oferta haverá inflação. Portanto, o futuro Presidente terá de estimular o incremento dos investimentos e da produção, e admitir aumento também de importações, para equilibrar de forma dinâmica o aumento da oferta com o da demanda. Com isso, pode-se estabilizar os preços e a inflação, compatibilizando o aumento do PIB com os efeitos na demanda e da oferta da economia com os desastres climáticos extremos. Contudo, há uma condição para isso, e é nesse ponto que o futuro presidente, como acontece com Lula, enfrentará seu maior problema: para estimular o aumento da produção, o Banco Central terá de reduzir a taxa de juros básica (Selic), que ele tem mantido em níveis extravagantes. A Selic elevada estimula o capital a migrar do setor produtivo para o setor financeiro especulativo, cuja remuneração é maior que seus resultados operacionais. E daí, sim, pode resultar inflação, por duas vias: por essa ultima, acima mencionada, e porque a Selic, que é usada para combater a inflação, tem o efeito inverso de provocá-la, por ser estimada antes do aumento oficial dos preços. A combinação de todos esses fatores que conciliem demanda e oferta real, estabilidade inflacionária e aumento do PIB implicará um tremendo esforço de negociação do futuro presidente com o Congresso, que terá de curvar-se às exigências de moralidade, por um lado, e de mudanças profundas no sistema fiscal e monetário no sentido de um novo “arcabouço fiscal”. Este será o grande desafio para o presidente, qualquer que seja ele. Se for Flávio Dino, acho que já deu um passo nesse sentido.         Leia também Flávio Dino e a sucessão. *J. Carlos de Assis é jornalista, economista, doutor em Engenharia de Produção, professor aposentado de Economia Política da UEPB, e atualmente economista chefe do Grupo Videirainvest-Agroviva e editor chefe do jornal online “Tribuna da Imprensa”, a ser relançado brevemente. Foto de capa: Wilson Dias/Agência Brasil Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democraca.    

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Como era doce meu golpismo

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Como era doce meu golpismo
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Por ANGELO CAVALCANTE* Vivemos tempos estranhos... Muito estranhos!A democracia não se consolida mas também e, paralelamente, não há espaço para golpes, sobretudo, golpes típicos e assentados em quarteladas tão ao estilo vil, servil e latinoamericano dos anos de 1960/1970. O que isso, contudo, quer dizer? Quer dizer que a direita está indefesa, quieta e respeitosa aos preceitos e determinações constitucionais? Nada disso... Como se diz, com essa direita quando não estamos em golpes e ditaduras é que ela está preparando golpes e ditaduras. Todos vimos... Por bem pouco, Bolsonaro não marcha orgulhoso e triunfante sobre Brasília com o cadáver de Lula sendo arrastado pelo _Rolls-Royce_ presidencial e sobre as mãos uma bandeja de prata com o cocoruto de Alexandre de Moraes. Parte desse quadro distópico é a abjeta visão dos gramados e arvoredos da Esplanada dos Ministérios entupidos por uma malta de ogros e _orcs_ afiliados ao fascismo brasileiro e, entre brados e lágrimas, urrando ensandecida: " _mito, mito, mito.._ ". Felizmente essa desgraça não apeteceu... Ao menos essa, por enquanto, não se deu! De outro modo, *o golpismo é a principal instituição política do Brasil*! Essa tragédia está entranhada, internalizada e posta no cotidiano, no subliminar e na subjetividade da própria vida política nacional. Como dizem nossos irmãos religiosos, é " _orar e vigiar_ "! O filósofo francês Michel Foucault, em devastadora crítica ao poder e às suas nuanças de controle, ensina: " _vigiar e punir_ "!. Pois sim, enquanto a lástima do próximo golpe não chega, vamos "brincando" de democracia... E no arrebol desse 2025, os primeiros levantamentos para o pleito de 2026 estão sendo elaborados. O tradicional e metódico Datafolha vai revelando ensaios de pesquisas eleitorais para o "combate nas trevas" (cf. Gorender) de 2026 e o resultado é o esperado... Lula, " _paruano_ ", um lúcido e atento senhor de 80 anos é, disparado e sem concorrentes, a principal escolha do povo brasileiro. Mas repara... Não há concorrente para Lula; some-se Tarcísio de Freitas, Ratinho Junior, Caiado, Gustavo Lima, João Mineiro e Marciano, Roberta Miranda, Felipe e Falcão, Luciano Hulk, Tony Stark ou a Curupira das matas e florestas brasileiras que não dão um candidato ao ponto de alterar a mão pesada de Luís Inácio sobre as eleições do ano que vem. O adversário possível e com algum peso político e eleitoral seria Jair Bolsonaro e que, como se bem sabe, está fora, excluído de qualquer pleito político, dada a sua pétrea e irrevogável inelegibilidade. Não é mole... Sem direitos políticos, Jair não pode disputar uma vaga no conselho de pais da escola de sua filha fleumática. Sujo e malcheiroso feito "pau de galinheiro" sua defesa, por sinal, uma boa banca de juristas, nem de longe, consegue explicar a morte de setecentos mil cidadãos brasileiros pela covid-19, um combinado de imprudência, imperícia e incompetência sob o comando do ex-capitão. Do mesmo modo, não traduz a rasgada fraude da carteira de vacinação do ex-presidente; como também, não diz " _a_ " sobre o escancarado tráfico de jóias árabes e conduzido pelo _staff_ de Bolsonaro com, é claro, sua ampla e discreta anuência. Pois bem, 2025 é, como se diz no meu bom nordeste de guerras, o " _amola facas_ " para 2026. Ainda assim, nessa " _neverland_ " e que é o Brasil, tudo - *ABSOLUTAMENTE TUDO* - pode acontecer; em consonância com o parafraseio de certo alemão de nome Karl Marx: " _tudo o que é sólido se desmancha no ar_ ". Por essas bandas... É mais ou menos assim! Ao fim, esse breviário é, sobretudo, para alertar aos progressistas, aos brasileiros efetivamente comprometidos com o paradeiro, os rumos e destinos dessa sofrida pátria de que 2026 começou e tudo importa, tudo sugere, soma e se combina para o imenso conflito do ano que vem e que promete ser das maiores batalhas de nossas vidas. Sabem por quê? Porque o ódio não tem coração, não tem olhos ou limites e se justifica em si mesmo; para o específico caso brasileiro, se explica na repulsa dada e aberta ao ideal de um Brasil justo, igualitário e soberano.       *Angelo Cavalcante_ - Economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Itumbiara. Foto de capa: Poderes, em Brasília | Foto: Joedson Alves-Agência Brasil Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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Deverão ser dois meses sem orçamento

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Deverão ser dois meses sem orçamento
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Por RUDOLFO LAGO* do Correio da Manhã complicadas no xadrez político. Mas provavelmente muito mais urgentes. O ano de 2025 começou sem que o país tenha orçamento.   Carnaval Lula interrompeu na segunda-feira (6) as férias do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Mas não deverá conseguir que os dois primeiros meses do ano acabem mesmo sem a Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada. A expectativa é de aprovação só depois do carnaval.     Março A terça-feira de carnaval cairá este ano no dia 4 de março. Isso significa que, em janeiro e em fevereiro, o governo só fica autorizado a usar 1/12 do valor total previsto, impedido de qualquer alteração por alguma situação emergencial, como enchentes como as do ano passado.   Relator está no sertão da Bahia e só volta em fevereiro Coronel está em área com pouco sinal de internet | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil   O relator da LOA deste ano, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), é do município de Coração de Maria, próximo de Feira de Santana, distante cerca de 110 quilômetros de Salvador. Uma cidade com menos de 30 mil habitantes. Sua intenção é ficar por lá e pelos demais municípios da sua base eleitoral, onde o sinal de internet e de telefonia costuma ser mais raro, até o fim do recesso parlamentar e o retorno do Congresso no dia 3 de fevereiro. Na reunião que Lula teve com Haddad na segunda-feira, cogitou-se a ideia de tentar um contato para que Coronel voltasse mais cedo. Mas muito provavelmente de pouco adiantaria: não depende só dele.   Emendas O grande nó é a questão das emendas orçamentárias. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino suspendeu a liberação de mais de R$ 4 bilhões de emendas. E repasses para ONGs. O Congresso não aceita os termos de Dino. E Dino não abre mão deles.   Transparência Flávio Dino entende que falta transparência na destinação das emendas. Quer essas questões resolvidas. E o Congresso bate o pé no sentido de afirmar que cumpriu todas as exigências legais. O impasse impede a definição do que estará na lei orçamentária.   LOA A LOA precisa definir exatamente qual é o montante de recursos para as emendas orçamentárias e para cada tipo de emenda. É a lei orçamentária que autoriza os repasses. Sem clareza sobre as regras, tudo fica travado. Sem acerto, ninguém se arrisca.   Congresso O impasse, assim, pode fazer o Congresso adiar a apreciação. Mas isso também acaba por gerar um prejuízo para o próprio Congresso. Sem orçamento aprovado, o governo, limitado pela regra de usar a cada mês 1/12, também fica impossibilitado de liberar emendas.           *Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congresso em Foco e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade Publicado originalmente no Correio da Manhã Foto de capa: Lula e Haddad não conseguiram destravar orçamento   Ricardo Stuckert/PR Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

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Políticos e jornalistas revivem 8 de janeiro: dia entrou para história

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Políticos e jornalistas revivem 8 de janeiro: dia entrou para história
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Por GILBERTO COSTA*, AGÊNCIA BRASIL O conjunto de invasões e depredações nos prédios da Praça dos Três Poderes em Brasília na tarde de 8 janeiro de 2023, um domingo, chocou pela violência protagonizada por manifestantes bolsonaristas, mas não surpreendeu a todos os personagens que, por razões de ofício, acompanham o cotidiano institucional da capital federal, como jornalistas e políticos. Naquele dia, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) recorda-se que estava em sua casa em São Luís, depois de ter ido à Assembleia de Deus, onde atua como professora de escola bíblica dominical, quando viu uma mensagem em grupo de Whatsapp com imagens de destruição em Brasília. “Eu falei: gente, isso aqui não pode ser verdade. Isso é uma montagem, não é verdade”, contou ao programa Caminhos da Reportagem, da TV Brasil, com participação da Agência Brasil. Brasília (DF) 06/06/2023 Senadora e relatora da CPMI do golpe, Eliziane Gama. Foto: Lula Marques/ Agência Brasil Assustada, a parlamentar foi à casa de sua mãe onde a televisão estava transmitindo a barbárie ao vivo. “Eu fiquei estarrecida. Levei minutos para acreditar no que estava vendo”, diz se recordando da multidão subindo a rampa do Congresso Nacional, quebrando vidros do prédio e ocupando um pedaço do Senado Federal, onde cumpre mandato há cinco anos. O impacto foi revivido quando na segunda-feira seguinte (9), de volta de São Luís, Eliziane Gama encontrou “um ambiente desolador, de guerra” no Senado. “Parecia um filme de terror: o prédio totalmente escuro, [com] o chão totalmente molhado, [e] as vidraças destruídas. Você não conseguia caminhar dentro do Congresso Nacional.” Ainda pasma com a voracidade destrutiva dos invasores, a senadora revela que a possibilidade de distúrbio ainda que absurda estava no horizonte. “O que ocorreu era algo que a gente vigiava, que a gente dizia que não pode acontecer, mas a gente nunca parou para pensar e dizer que isso vai acontecer.” Na opinião de Eliziane Gama, que foi relatora da CPMI do 8 de janeiro, tudo que se viu foi semeado durante anos por Jair Bolsonaro quando ocupava a Presidência da República (2019-2022) e atentava contra a democracia. “Ele questionava o processo da eleição, colocava em xeque a vulnerabilidade da urna eletrônica. Então, essa coisa de criar uma instabilidade do processo democrático, ele automaticamente criou um colchão de condições para que o movimento mais extremista brasileiro chegasse ao que nós acompanhamos no 8 de janeiro.” Assinatura de Bolsonaro O 8 de janeiro tornou-se uma data na qual as pessoas costumam lembrar onde estava, e o que estavam fazendo quando receberam a notícia de impacto, como aconteceu nas transmissões do primeiro pouso do homem na lua (1969), do acidente fatal de Ayrton Senna (1994) ou do choque dos aviões contra as Torres Gêmeas do World Trade Center em Nova York (2001). Como aconteceu com a senadora, a jornalista e escritora Bianca Santana lembra-se vivamente onde estava quando soube dos incidentes: tinha aterrissado em Brasília vindo de São Paulo naquela tarde de domingo. Ainda estava no avião quando começou a receber mensagens no celular indagando se tinha chegado bem. Curiosa, começou a pesquisar no aparelho o que estava acontecendo. Uma amiga a buscou no aeroporto da capital federal e a levou direto para casa. “A gente decidiu ficar recolhida. Nem saiu para comer.” Para Bianca Santana, a intentona que viu inicialmente pela tela do celular “tinha uma assinatura muito forte.” Ela rememora que Jair Bolsonaro instigou a balbúrdia, esvaziando a credibilidade do sistema de votação. “Ele anunciou inúmeras vezes que não aceitaria o resultado das urnas.” Para ela, o ex-presidente “o tempo todo colocou em xeque a confiança da população no processo eleitoral. Isso já é um processo de tentativa de golpe.” Brasília (DF), 11/09/2024 - Leandro Demori no programa DR com Demori. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil Na opinião do jornalista Leandro Demori, que apresenta o programa Dando a Real com Leandro Demori, na TV Brasil, os sentimentos contra a democracia foram provocados por Jair Bolsonaro antes mesmo de chegar ao poder. “Na eleição de 2018, [Bolsonaro] já havia aventando a possibilidade de fraude eleitoral, a pauta do voto impresso, e [a ideia] que o sistema não era seguro. Isso tudo acaba desembocando no 8 de janeiro.” A jornalista Juliana Dal Piva, autora do livro O Negócio do Jair: a história proibida do clã Bolsonaro, avalia que o ex-presidente “criou uma narrativa em cima de uma mentira e foi intensificando essa mentira” com o passar do tempo, especialmente nos dois últimos anos de mandato, e apesar da disseminação de falsidades ”se recusava a admitir que ele não tinha prova.” Ela lembra que Bolsonaro “foi eleito e reeleito [para] vários mandatos como deputado federal [total de seis mandatos] e como presidente da República pelo sistema eletrônico de votação.“ Golpe encenado Ter atos contra a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva era esperado pelo senador do Randolfe Rodrigues (PT-AP). “Eu sabia que eles não aceitariam pacificamente o resultado das eleições de 30 de outubro de 2022. Eu tinha consciência disso. Então, para mim, não foi surpresa.” Ele, no entanto, admite o estarrecimento com a falta de iniciativa das forças de segurança para proteger os prédios públicos. “O que eu não esperava era a negligência coordenada e organizada para permitir que eles acessassem as sedes dos Três Poderes - os terroristas daquele dia. Mas quando eu os vi invadindo o Congresso Nacional, o meu sentimento naquele momento é que tinha um golpe de Estado em curso.” Randolfe Rodrigues, que é formado em História, diz que temeu um desfecho semelhante ao do Chile nos anos 1970, quando o presidente Salvador Allende foi cercado no Palácio de La Moneda pelas tropas lideradas pelo general Augusto Pinochet. “Eu tive receio daquele Brasília - 8 de janeiro ser um 11 de setembro chileno de 1973.” Brasília (DF) 11/04/2024 Senador Randolfe Rodrigues. Foto: Lula Marques/ Agência Brasil A possibilidade de haver um novo golpe de Estado no Brasil era tão aventada que os roteiristas da produtora Porta dos Fundos criaram dois esquetes humorísticos simulando a mobilização de militares para fazer uma nova intervenção golpista. “Havia já, né, essa sombra do golpe. Ela já estava presente há muito tempo, né?”, recorda-se o publicitário Antonio Tabet, um dos sócios e roteiristas da produtora. “Falava-se muito disso, havia muitas indiretas, uma comunicação truncada, umas ameaças veladas, e o fato de o governo da época [2019-2022] ser alinhado com ideais e interesses não exatamente democráticos, fazia com que esse assunto fosse efervescente.” Na opinião de Tabet, os esquetes Golpe em Brasília e Golpe no Rio foram dissuasivos de alguns espíritos menos democráticos. “Eu tenho certeza que esses vídeos circularam muito, tem milhões de views cada um deles. E certamente bateu em alguém que queria fazer e que mudou de ideia vendo aquilo.” “O humor informa de uma maneira simpática. Às vezes, uma pessoa assistindo a um telejornal, ela não consegue entender direito como funcionam as instituições, para que servem, o que é isso, qual é o real perigo, o real ridículo disso. O humor vai lá e joga um holofote na cara daquilo”, acredita o roteirista. No dia 8 de janeiro, como que seguindo um roteiro bem ensaiado, milhares de pessoas que estavam acampadas no Setor Militar Urbano em Brasília iniciaram às 13h uma longa marcha até a Praça dos Três Poderes. Às 15h, os golpistas conseguiram subir a rampa do Congresso para invadir e destruir prédio. Vinte minutos depois, outros vândalos derrubaram as grades de isolamento do Palácio do Planalto, subiram a rampa, quebraram os vidros da fachada e entraram no prédio. Às 15h37, iniciaram a invasão do edifício-sede do Supremo Tribunal Federal (STF). A Agência Brasil enviou mensagem, na segunda-feira (6), ao advogado Paulo Bueno, defensor do ex-presidente Jair Bolsonaro, para manifestação, mas não obteve resposta até o momento. O espaço segue aberto. *Ricardo Costa é Repórter da Agência Brasil *Com entrevistas de Ana Passos, Marieta Cazarré, Patrícia Araújo e Thiago Padovan, da TV Brasil Foto da capa: Sedes dos Poderes atacadas por manifestantes pró-Bolsonaro Crédito: © Marcelo Camargo/Agência Brasil Publicado originalmente no site da Agência Brasil Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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Notícia crime contra Sebastião Melo

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Notícia crime contra Sebastião Melo
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Na tarde de ontem (07.01), realizou-se importante reunião para aprovar NOTÍCIA CRIME a ser encaminhada ao Ministério Público Federal, denunciando o pronunciamento antidemocrático do Prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, por ocasião da posse dos vereadores de Porto Alegre. A qualificada peça jurídica, elaborada pela Dra. Antônia Mara Loguercio, Dra. Christine Rondon e o Dr. Ramiro Goulart - com a contribuição de outras importantes lideranças jurídicas, sociais e políticas - foi aprovada por unanimidade, com alguns aperfeiçoamentos. Além da AEPPP-RS e do MJDH, que convocaram a reunião, estiveram representadas diversas entidades jurídicas e de Direitos Humanos - como a ADJC, AJD, ACESSO, AGETRA, FJ-RS, ANADEP, AMPD, ReBEDH-RS, Inst. Est. Pol. Mário Alves - e cinco partidos políticos, PT, PDT, PCdoB, PSOL e REDE. A referida NOTÍCIA CRIME será protocolada hoje, 8 de janeiro - data da fracassada tentativa de golpe, em 2023, contra a Democracia brasileira -, às 15h, no Ministério Público Federal, Sito à Av. Otávio Caruso da Rocha, 700, sala 505. Convidamos a todos e todas que puderem estar presentes para prestigiarem esse ato cívico em defesa da democracia e em repúdio à apologia dos regimes ditatoriais! DITADURA NUNCA MAIS! Sérgio Bittencourt, Presidente AEPPP-RS Jair Krischke, Presidente MJDH Júlio Alt, Presidente CEDH Cristiaine Johann, AMPD e REBEDH-RS Foto: Prefeito reeleito da capital gaúcha defendeu que apoiadores da ditadura ou mesmo do comunismo ou socialismo não devem ser processados. (Foto: Johan de Carvalho/CMPA) Copyright © 2025, Gazeta do Povo Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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Brasil de  classe média? Que país é esse?

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Brasil de classe média? Que país é esse?
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Por PAULO KLIASS* A divulgação de uma pesquisa da Consultoria Tendências a respeito da distribuição da população brasileira em faixas de renda tem merecido um debate a respeito de temas importantes, a exemplo de políticas de distribuição de renda e padrões de consumo em nosso País. A primeira iniciativa coube aos defensores obnubilados do governo Lula, que viram nas manchetes reproduzidas pela grande imprensa uma oportunidade ímpar de tirar uma casquinha nos resultados preliminares apresentados. O mote para uma leitura com tal viés tem sido a apropriação indevida do conceito de “classe média”. A exemplo do que já havia ocorrido em outros momentos depois da vitória do Partido dos Trabalhadores (PT) em 2002, tem início agora um novo debate a respeito do tema. O foco reside na interpretação das pesquisas elaboradas por órgãos públicos e por institutos privados onde se busca identificar a evolução dos perfis de renda da população brasileira. E, assim, surgem os enquadramentos nas conhecidas faixas ou classes A, B, C, D e E. Parece óbvio que tudo passa a depender dos critérios utilizados para definir os limites de cada um destes patamares. A primeira abordagem para utilizar o conceito de “classe média” segundo tal metologia é quase tautológica. Como existiria uma “classe alta” e uma “classe baixa”, os setores que se situam nas faixas intermediárias seriam os que compõem a chamada “classe média”. Ou seja, nem os de cima, nem os de baixo – mas os do meio (sic). A falta de rigor para tal classificação é quase evidente e torna bastante complexo o recurso a tal ferramenta para fins de análise social ou mesmo de política pública. O Brasil e a classe média. Ao longo dos dois primeiros mandatos de Lula, o Brasil experimentou um importante processo de melhoria na distribuição de renda e na redução das desigualdades sociais e econômicas. Para tanto foram importantes um conjunto de medidas de ampliação e aprofundamento das políticas assistenciais (Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada - BPC, por exemplo), bem como a política de valorização real do salário-mínimo. Esse quadro foi bastante potencializado, além disso, pelo crescimento das atividades econômicas de forma generalizada e pela redução do nível de desemprego. Datam deste período as primeiras incursões na narrativa apelando para o conceito de “classe média”. É interessante observar que, mesmo sendo uma coalização dirigida por uma agremiação que traz por título Partido dos Trabalhadores, o governo introduziu o elemento que privilegia a condição de classe média no debate, não se contentando com os aspectos de evolução bastante positiva das condições de vida, de melhoria nos salários e no acesso a padrões de consumo como nunca havia ocorrido anteriormente. Não, o importante era mencionar que boa parte da população agora fazia parte da “classe média”. Fosse lá o que isso significasse. Infelizmente, o que se percebeu menos de duas décadas mais tarde é que essa narrativa, na verdade, cimentava o caminho para a consolidação de um discurso de conteúdo bastante conservador, a favor do empreendedorismo, mesmo entre os muito pobres e os miseráveis. Todos queriam pertencer à classe média e não mais terem um emprego “tradicional” – com horário a cumprir, patrão e normas a obedecer. Há vários registros de um intenso debate realizado a esse respeito, com diversos enfoques e focos de análise. O IPEA foi uma das instituições públicas em que tal discussão se realizou de forma organizada e onde um conjunto de publicações deixaram apontados aspectos relevantes de tal debate. A própria realização de eventos, seminário s e debates no interior do órgão foi fundamental para a localização de alguns nós envolvendo a questão da “classe média” ou da “nova classe média”, como muitos autores reivindicaram a classificação da suposta “novidade”, à época. Classe média: vários conceitos, muita polêmica. Agora, no momento atual, a propaganda oficial e ufanista retoma a tecla de que que o Brasil teria voltado a ser um “País de classe média”. As pessoas continuam a reproduzir de forma acrítica a mensagem, provavelmente sem se dar conta da falta de sentido daquilo que divulgam. Em seu afã compreensível de buscar boas notícias relativas ao desempenho de Lula em seu terceiro mandato, uma parte de sua base de apoio se sai com essa. Mas, afinal, o que significa ser um “País de classe média”? Para os mais cautelosos, aqueles que foram verificar a informação antes de sair compartilhando pelo mundo afora, o que se pode concluir é que se trata de uma mudança marginal, pouco significativa, no padrão verificado nos anos anteriores.   Brasil - Distribuição da Renda Domiciliar - 2010/2024   Fonte: Poder 360     A metodologia pressupõe que um coletivo nacional e/ou social se transforma em “País de classe média” quando mais de 50% de sua população puder ser enquadrada nas chamadas “classes” A, B e C de renda. E os dados da pesquisa da Consultoria Tendências apontam que em 2024, ufa!, passamos raspando a trave para os sensacionais 50,1% (sic). Assim, se somarmos os 31% da classe C, com os 14,8% da classe B e ainda com os 4,3% da classe A chegaremos à brilhante conclusão de que não somos mais um País de pobres. Mas será que isso merece mesmo tanta comemoração? Tudo indica que os dados sugerem um pouco mais de cautela. Mas isso pouco importa, pois o que vale espalhar é que somos agora um País de “classe média”. E ponto final! Se formos analisar com um pouco mais atenção os números por trás dos gráficos, o que se percebe é que metade dos domicílios contam com uma renda mensal inferior a R$ 3.400. Afinal, este é o limite para o enquadramento dos pobres (classes D e E). Ora como a média de membros dos domicílios para essa faixa de renda é superior à média nacional de 2,97 pessoas, não estaremos longe de uma renda mensal per capita entre R$850 e R$ 1.100. Ou seja, metade da população do País ainda vive sob tais condições terríveis de remuneração. Ora, uma parcela considerável da famosa “classe C” tampouco pode ser classificada como tendo um padrão de vida e de consumo típico de “classe média”, por mais idealizado que seja o procedimento metodológico realizado. Imaginemos uma família de 4 pessoas, sendo 2 adultos e 2 crianças. Se cada um dos adultos recebesse o equivalente a dois salários-mínimos por mês em 2024, a renda domiciliar seria de pouco mais de R$ 5.600 mensais. Ora, como o próprio intervalo da classe C desta pesquisa varia entre R$ 3.400 e R$ 8.100, percebe-se que esse universo abarca um contingente de domicílios/famílias/pessoas que estão muito longe de qualquer imaginário edílico de pertencimento à “classe média”. Para tanto, basta imaginar o padrão de vida e de consumo deste suposto núcleo familiar com tal rendimento mensal. Após a realização dos gastos mais do que básicos com alimentação, habitação e transporte, que parcela da renda sobraria para a satisfação de itens como saúde, educação, cultura e lazer? As pessoas podem até não serem assalariadas e trabalharem em atividades como motorista de aplicativo ou vendedor ambulante. Trata-se de categorias que o IBGE classifica como “trabalhadores por conta própria”. No entanto, as condições objetivas das respectivas vidas está muito distante de qualquer padrão das chamadas “camadas médias urbanas”, adicionados ao fato de que algumas pesquisas revelam um desejo de seus integrantes de formalizarem suas relações trabalhistas. Ou seja, é bem possível que uma parcela expressiva daqueles que tenham migrado para o modelo o tenham feito por falta de opção. Desta forma, o que se pode concluir é que estamos muito distantes de uma sociedade que possa ser caracterizada como “País de classe média”. Quer seja pela inserção das classes sociais no processo produtivo e de geração. Quer seja pelo nível de remuneração mensal dos agentes sociais envolvidos. Quer seja pelo padrão de consumo e de acesso a bens e serviços públicos essenciais. Quer seja pela proporção dos setores miseráveis e muito pobres no conjunto da população.   Que País é este? As melhorias efetivamente verificadas ao longo do período recente em todos estes quesitos apontam para necessidade de acelerar e aprofundar esse padrão de redução das desigualdades. Mas não basta apenas comemorar de forma irresponsável as mudanças marginais como sendo o coroamento de um processo de ingresso em um outro patamar de uma nova forma de concertação social, onde a generalização do conceito de “classe média” apontasse para uma mudança efetiva e duradoura na qualidade das relações sociais de produção. Afinal, ainda não recuperamos nem mesmo os tempos dos primeiros mandatos de Lula, período em que setores de nossa elite se sentiam incomodados com a ascensão de camadas de baixo da nossa pirâmide da desigualdade. Esse era a época em que se reclamava que os aeroportos estavam lotados, parecendo mesmo rodoviárias. Ou então que a simbologia das cenas e relatos onde trabalhadoras domésticas conseguiam acesso e condições para viajarem para o exterior - os parques da Disney nos Estados Unidos eram os destinos mais procurados. Enfim, independentemente das críticas que se possam fazer aos critérios de definição do conceito ou mesmo de sua utilização para o nosso caso, o fato concreto é que o Brasil de hoje está muito distante de ser um “País de classe média”.     *Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal. Foto de capa: Reprodução/Exame Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.            

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