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MAS QUE NADA…PPP PRA NÓS É OUTRA COISA

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MAS QUE NADA…PPP PRA NÓS É OUTRA COISA
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Por ALEXANDRE SARATT* Muito se fala, se discute e se compreende (?) sobre o papel vital e estratégico da Educação para a formação social e econômica de uma sociedade moderna, democrática e desenvolvida à plenitude. Cabem muitos exames, considerações e perspectivas nesse temário, através das mais distintas óticas e vieses, desde a afirmação de concepções progressistas, científicas e emancipatórias até aquelas cuja serventia e finalidade buscam assegurar manutenção e perpetuação de um sistema e estado de coisas desigual, excludente, violento e ainda assim estranhamente funcional. Nesse ínterim cabe fazer um pequeno recorte temporal, espacial e conjuntural para tratar de analisar - à guisa de conclusão - o que se procede no Estado do Rio Grande do Sul e sua educação pública, objeto de profunda, radical e contínua reforma educacional e que, no momento, se defronta com dois aspectos seminais: a gestão democrática e as parcerias público-privadas, as ditas PPPs. Para fins desse texto, vamos nos deter na última e pretendemos voltar à baila com a primeira temática em tempo hábil e oportuno. A sigla PPP que reconhecemos e damos âmbito e valor é bem diferente: nada relacionadas à ideia de privatização e mercantilização da Educação, mas pelo contrário remete àquela força-motriz que está no âmago da escola democrática, a do projeto político-pedagógico autônomo e construído histórica e socialmente. É com base nesse princípio e conquista do conjunto do movimento educacional que podemos e devemos fazer a contraposição e enfrentamento a essa excrescência civilizatória que representam as PPPs sob a direção e hegemonia do neoliberalismo. Aqui se prevê uma passagem pura e simples de estruturas s funcionamento de escolas da rede pública estadual para a gestão - leia-se exploração e lucratividade - por parte de empresas privadas. Sequer se cogita a construção de novas escolas sob algum regime especial de concessão, é entrega oura e simples de patrimônio predial e gestão funcional dos educandários. É preâmbulo de uma privatização ainda mais aguda e completa: a da docência e do modelo pedagógico, alinhando a escola, os educadores e educandos à um projeto intencionalmente pobre e precário em seus métodos, processos e objetivos, cujas finalidades se conectam à dominação e doutrinação no terreno mental e ideológico e à preparação de mão-de-obra minimamente treinada, obediente e resignada para um mundo do trabalho desregularizado, turbulento e intermitente. Sob as premissas das PPPs da mercancia a educação pública como Direito e Dever constitucionais, com os respectivos acessos, oportunidades e responsabilidades, se esvai em sangria desatada. É importante sublinhar que tal fenômeno não é algo isolado ou extemporâneo, mas sim se serve num movimento geral e concatenado envolvendo diversos entes estatais, sociais e políticos e que na conjuntura atual se articulam para confrontar as experiências e iniciativas que se fundamentam em outros propósitos e compromissos. O caso do Rio Grande do Sul do Governador Eduardo Leite, uma espécie de Átila das privatizações, está articulado com aquilo em curso em outros estados, notadamente com o Paraná de Ratinho Júnior, com São Paulo de Tarcísio ou as Minas Gerais de Zema. Portanto, não é algo fortuito, é projeto de sociedade e de poder, de presente e de futuros. Reafirmamos e reivindicamos: PPP para nós só serve a de um tipo, a que institui o primado da democracia, da cidadania, dos direitos e deveres humanos e sociais, da sustentabilidade ambiental e da promoção da razão, da ciência e da humanidade como fatores de desenvolvimento, emancipação e liberdades. Não à privatização das escolas públicas estaduais do Rio Grande do Sul, Educação não é mercadoria, Pessoas não são coisas! *Diretor do Cpers, da CNTE e da CTB Foto:  Divulgação Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.    

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NOVA COONLINE 48, COM JUCA KFOURI

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NOVA COONLINE 48, COM JUCA KFOURI
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Por JOSÉ ANTÔNIO VIEIRA DA CUNHA* Os jogos de apostas desenfreadas, os patrocínios aos clubes feitos por bets irregulares, que inclusive contaminam a mídia esportiva, mais a cartolagem corrupta, eis aí um coquetel perfeito para prejudicar o futebol brasileiro, na leitura do jornalista Juca Kfouri. Em uma rica conversa com o grupo virtual Nova Coonline, integrado por 25 jornalistas residentes em diferentes estados, o jornalista esportivo discorre também sobre o momento do jornalismo e a necessidade de regulação das mídias e das plataformas digitais. Ácido crítico da influência das casas de apostas no esporte brasileiro, o jornalista disse lamentar que 100% dos programas esportivos e 80% dos jornalistas desta área são hoje patrocinados pelas bets. Ele questiona, sem rodeios: “O Galvão Bueno precisa ser garoto propaganda de casa de apostas? O Renato Portalupi precisa ser garoto propaganda de casa de postas? Não percebem o quanto isso põe em risco a credibilidade deles?” Kfouri considera o descontrole das casas de apostas uma verdadeira farra de boi, mas não acredita que vá continuar por muito tempo. O problema maior, salienta, “é a manipulação de resultados, o que não está acontecendo só no futebol”. Colunista do UOL e da Folha de S. Paulo, Kfouri disse lamentar que, com a expulsão nos estádios dos excluídos, “não temos mais torcedores, temos clientes, e o marketing dos clubes se orgulha muito disso”. Para ele, é necessário mudar o modelo de negócio adotado pelos clubes em geral, pois “não sabem tratar, usufruir desta paixão dos torcedores e transformá-la em recursos financeiros”. Kfouri também conversou sobre a regulamentação das mídias, debate que considera estar em um estágio muito equivocado no Brasil, a ponto de classificá-lo como uma discussão absurda. “Hoje as grandes empresas de jornalismo precisam de regulação, senão o Google come pela perna, o Facebook come pela perna, o Musk come pela perna. Então, trata-se agora de uma defesa nacional, quando antes isso era considerado censura. E, no seu entender, esta regulação da mídia deve ser feita pela sociedade, não pelo governo, “pois a sociedade tem o direito de ter uma defesa contra a mentira”. Em certo momento do encontro, o profissional comenta porque não quer atuar na política e explica por que abriu mão de fazer as biografias de Pelé e do Dr. Sócrates. No enceramento da conversa com o grupo de jornalistas de origem gaúcha, Juca Kfouri fez questão de homenagear profissionais oriundos do Rio Grande do Sul “que fazem parte da minha vida”. Entre eles, citou Divino Fonseca, J. B. Scalco, Ruy Carlos Ostermann, João Saldanha, Luis Fernando Verissino, Paulo Santana e Jorge Escosteguy. https://youtu.be/8AZTyBOOvcU?si=sxrone-A-QjnKXNq Foto: Imagem de arquivo pessoal Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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PORTO ALEGRE ELEIÇÕES

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PORTO ALEGRE ELEIÇÕES
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Por NAIA OLIVEIRA* Às vésperas das eleições municipais me proponho a compartilhar meu sentimento de desgosto com a cidade de Porto Alegre, que realmente já foi alegre, mas atualmente causa tanta tristeza. É constante o som de motosserras! Já ouvi esse barulho fatídico na praça em frente onde moro, em situações nas quais intervi, pedindo aos que estão utilizando tal máquina e agredindo esses seres vivos o plano de manejo, para que tivessem um mínimo de racionalidade. Invariavelmente não sabem do que se trata. Também sinto uma dor profunda quando leio informações sobre as agressões que nossos parques estão sofrendo e a quantidades de áreas desmatadas, ferindo inclusive animais silvestres, para construções de condomínios de luxo. Aqui surge uma pergunta: quem são os compradores? O que me deixa mais impactada, é que todos sabemos que o VERDE (árvores, gramíneas...) é a mais elaborada tecnologia para combater o aquecimento, que a crise climática vem nos impondo. Na linha da abordagem do aquecimento, é assustador a invasão na cidade das placas fotoluminosas. Não só elevam a temperatura, mas causam alto gasto de energia, e com a luminosidade deixam os pássaros estressados e perdidos no importante ciclo noite-dia das suas curtas vidas. Podem interferir inclusive no sono de moradores que tenham a infeliz proximidade de suas janelas. Há outras placas que estão me causando estranheza, são as com nome das ruas, que agora trazem juntamente anúncios de propaganda. Venho observando que o trânsito em Porto Alegre apresenta uma agressividade advinda de uma situação que vou caracterizar como “tudo pode”, ou seja, parar na contramão, desrespeitar faixas de pedestres, interromper o trânsito, subir nas calçadas, inclusive atravessar sinal vermelho... Venho pensando se a explicação está na liberação do uso de carros para os aplicativos como Uber e outros. Citando o trânsito, é preciso contemplar a situação das ruas e avenidas, são tantos os buracos e com tal profundidade que parecem crateras. Já as calçadas estão em um estado de precariedade que as pessoas têm que caminhar com a máxima atenção para não levarem tombos e sofrerem sérios ferimentos. Nossa cidade de alegre passou a ser triste. Além disso está feia e insalubre, nociva para a saúde dada à exposição ao lixo que se espalha e que acarreta altas possibilidades de doenças para população. Impossível não comentar a situação assustadora dos fios de eletricidade e operadoras de telefonia pendurados nos postes que enfeiam e amedrontam a população. Como eleitora não quero a continuidade dessa situação, quero uma cidade que volte a ser alegre, bem cuidada e para se morar em condições que garanta a qualidade de vida, sem medo de inundação com o sistema de proteção das cheias ganhando manutenção para funcionar.   *Socióloga e ecofeminista. Foto: Reprodução/Redes Sociais e Divulgação/PDT- RS Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.    

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A febre do marketing digital como ameaça à democracia

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A febre do marketing digital como ameaça à democracia
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Por ROSANA PINHEIRO MACHADO*, colunista convidada do UOL A febre do marketing digital, especialmente no Instagram, não é apenas um problema econômico, mas também acarreta consequências imediatas e futuras para a democracia. Não à toa, a figura desestabilizadora de Pablo Marçal surgiu com força nas últimas eleições: ele é uma caricatura desse universo. Com razão, as bets têm sido alvo do governo e da mídia, pois o Brasil é hoje o maior consumidor desse mercado, que drena uma parte significativa da renda das classes mais baixas. No entanto, há um silêncio ensurdecedor sobre um fenômeno da mesma família, que promete transformar pessoas em milionários via esquemas piramidais. Sem regulamentação e ignorada pelas autoridades, essa atividade, conquistando corações e mentes de quem é seduzido pela promessa de uma vida laboral mais flexível e bem pega em um país de empregos precários. Não se trata de algo marginal. Estimativas preliminares de nosso laboratório indicam que uma em cada quatro pessoas da população economicamente ativa no Brasil está tentando, de algum modo, empreender ou ganhar visibilidade no Instagram. Muitas sentem que não há alternativa senão se promover na plataforma, enquanto milhões de pessoas na precariedade buscam formas de gerar renda extra, investindo em tráfego pago e mentorias de qualidade duvidosa, estando vulneráveis a esquemas e premiações fraudulentas. Greyce, mulher negra da favela do Rio, mãe de dois filhos, teve o corpo fraturado pelo ex-parceiro que tentou matá-la. Hoje diarista, sente dores e reclama de estar acima do peso. Não quer emprego CLT e sonha faturar no digital. Nos últimos anos, investiu "dinheiro que não tem" e seu FGTS em mentorias. No seu 'quadro dos sonhos', como os mentores ensinam, está uma viagem à Disney com os filhos. Como centenas de milhares de pessoas de baixa renda que nosso laboratório acompanha, Greyce não cresce no digital. Mas, influenciada pelo 'mindset milionário', segue sonhando e se culpa pela riqueza e corpo fitness que não tem. Durante muito tempo, alguns influenciadores temiam se posicionar politicamente por receio de perder seguidores, recorrendo a códigos sutis, como cores ou símbolos nacionais, para sinalizar suas inclinações ao bolsonarismo. No entanto, com o bloqueio das redes de Marçal, a maioria absoluta dos influenciadores revelou seu apoio ao candidato, aproveitando a oportunidade para viralizar. Se, há dois anos, escrevi aqui no UOL que 88% dos influenciadores demonstravam alinhamento com Bolsonaro, hoje esse número até perdeu relevância: o apoio a seu "filho mais poderoso", Pablo Marçal, é hegemônico no campo. O mundo dos influenciadores digitais promove um único estilo de vida conservador, focado em casas e carros de luxo, corpo fitness, modelo de família tradicional, fé cristã e busca incessante por riqueza. O casamento heterossexual entre a mulher virtuosa e o homem de valor é visto como uma forma importante de investimento. Evidentemente, o conservadorismo é uma expressão legítima em uma democracia, mas quando se torna uma doutrina única, aí temos um problema político. Na busca pela "mentalidade milionária", mentores e líderes espirituais pregam que quem não apoia essa jornada por riqueza - amigos, vizinhos ou até familiares - deve ser deixado para trás. Influenciadores compartilham como foram desacreditados, mas persistiram sozinhos até alcançar o sucesso. O subtexto é claro: conexões do passado são obstáculos; apenas a nova família nuclear pode apoiar esse estilo de vida focado no crescimento. O coletivo se torna inimigo. A consequência é o fomento ao hiperindividualismo. Conceitos como solidariedade, comunidade, diversidade e sororidade desaparecem. O discurso dominante reforça que o sucesso é fruto apenas de esforço individual: quem se esforça vencerá. Essa narrativa alimenta o mito de que "Eu enriqueci, então você também pode". Junto a isso, enquanto milhões buscam empregos dignos e acesso à universidade, emerge uma narrativa dominante que rotula as instituições de ensino tradicionais como ultrapassadas e irrelevantes para a "vida real". O abandono da CLT virou um mantra, tratado como símbolo de status: direitos trabalhistas são agora vistos como sinônimo de pobreza, tédio e fracasso. "Deixe a CLT e compre minha mentoria digital" - a lógica por trás dos cursos que ensinam a vender cursos. Na jovem democracia brasileira, o ensino formal e os direitos trabalhistas são conquistas coletivas essenciais e formadoras de uma moralidade política. A população deve lutar por maior acesso à universidade e a empregos decentes, mas estamos testemunhando o discurso dos coaches, guiado por interesses próprios, rejeitar pilares fundamentais da cidadania e do desenvolvimento de qualquer país. Se não há espaço para vozes divergentes, progressistas ou de esquerda nesse ambiente, onde está a pluralidade tão essencial à democracia? Empreender em redes sociais, ao invés de fomentar diversidade, está estreitando os horizontes de possibilidades, num movimento antidemocrático e reacionário. A esquerda não deve ter vergonha dos verbos "empreendedor" e "prosperar". É legítimo que Dona Maria queira empreender vendendo doces nas redes, deseje conforto material para sua família e se autodenomine empresária. Afinal, o Brasil tem humilhado, explorado e estigmatizado Marias e Greyces. A expressão "CEO de MEI" apenas destila preconceito. O questionamento que precisamos fazer é: que valores éticos de empreendedorismo e prosperidade queremos fomentar numa democracia? *Rosana Pinheiro Machado é antropóloga com mestrado e doutorado na UFRGS e atualmente é Professora Titular na School of Geography, College of Social Sciences and Law, University College Dublin (UCD), Irlanda. É diretora do laboratório Digital Economy and Extreme Politics (UCD DeepLab), onde coordena o projeto internacional Flexible Work, Rigid Politics, que investiga - por meio de etnografia e ciência dos dados - o link entre trabalho precário e política autoritária no Brasil. Texto originalmente publicado no portal do UOL com o título de O efeito Marçal: Como promessas do marketing digital minam nossa democracia Foto da capa: Sozialcoaching - Limani Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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CARTA DE EMANCIPAÇÃO NACIONAL. – UM DOCUMENTO AINDA ATUAL –

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CARTA DE EMANCIPAÇÃO NACIONAL. – UM DOCUMENTO AINDA ATUAL –
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Por LINCOLN PENNA* "A vida do povo brasileiro torna-se cada vez mais insuportável, pelas dificuldades e sofrimentos que lhes são impostos. As populações das cidades e do campo, realizadoras da riqueza nacional, não dispõem dos mais indispensáveis meios de subsistência, moradia e cultura, compatíveis com a dignidade humana. A indústria nacional é impedida de desenvolver-se, em consequência da ação nefasta dos trustes e monopólios norte-americanos, aos quais são concedidos, cada dia, maiores privilégios. O comércio exterior, inteiramente submetido aos interesses desses trustes, está estrangulado. A produção agrícola continua sujeita aos processos atrasados e rotineiros, e a debater-se em crescentes dificuldades de escoamento. As imensas riquezas estão inaproveitadas para o progresso do país, sendo, ao contrário, levadas para o estrangeiro, em proveito exclusivo dos mesmos trustes. Contra o nosso povo praticam-se frequentemente toda sorte de violências e arbitrariedades. A Constituição brasileira é desrespeitada, mormente em seus dispositivos que garantem os direitos dos cidadãos e as franquias democráticas. Os desmandos das autoridades são uma prática de todo instante. As virtudes criadoras de milhões de brasileiros, tão ricas e fecundas no campo da cultura, são desencorajadas e tolhidas. Todo o valioso patrimônio nacional nas letras, nas artes, e nas ciências, está desamparado e submetido a um intenso processo de aviltamento. A corrupção e o descalabro administrativo aprofundam-se cada vez mais, fazendo surgir por toda a parte as mais escandalosas negociatas. O governo não pode fugir à responsabilidade por todas essas calamidades que afligem e fazem sofrer o povo, ainda mais agravadas pelos golpes sucessivos contra a soberania nacional, diretamente atingida com acordos e tratados lesivos aos interesses do país. O crescente ânimo de luta que tem sempre caracterizado o nosso povo através de sua história, é expresso hoje pela ação única de milhões de brasileiros, confiantes nos destinos de nossa pátria que terá certamente um futuro de progresso pacífico de bem-estar e felicidade em entendimento amistoso com todas as nações. As memoráveis campanhas patrióticas que temos vivido integram-se no poderoso movimento de emancipação nacional. Surgem todas as condições para que o povo empreenda a grande jornada emancipadora. A bandeira da mais ampla unidade está assim desfraldada. Com base nessa unidade, todas as forças democráticas de nosso povo são concitadas, acima dos horizontes partidários e concepções particulares de cada um, para a realização do grande esforço comum, capaz de emancipar economicamente e politicamente nossa querida Pátria da crescente dependência de interesses estrangeiros a que está submetida, e capaz de conduzi-la pela estrada do progresso. A defesa da indústria nacional e a criação da indústria pesada constituem condição básica para a conquista da independência econômica. Para isso são indispensáveis: a nacionalização das fontes de energia elétrica hoje em mãos dos monopólios estrangeiros; a radical modificação da política financeira e cambial do governo, abertamente voltada contra a industrialização, o aproveitamento intensivo de nossos recursos minerais; e uma adequada reforma agrária capaz de assegurar a criação de um amplo mercado interno, com a eliminação das condições de miséria e atraso em que vive a nossa população rural. Impõe-se a nacionalização da distribuição do petróleo, hoje em poder da Standart Oil, bem como a vigilante defesa de nossas jazidas. Não é mais possível tolerar a continuação da pilhagem das nossas reservas de manganês, monazita e outros minérios, por parte dos trustes norte-americanos. É dever impreterível dos patriotas a salvaguarda da soberania nacional, atingida pela ratificação do Acordo Militar Brasil-Estados Unidos e tantos outros tratados antinacionais, que abrem as portas do Brasil a missões colonizadoras militares, econômicas e administrativas, visando implantar sua tutela em nosso território. Não devemos consentir na continuação das restrições à nossa liberdade de comércio externo, impostas pelo governo norte-americano, e defendemos a ampliação do intercâmbio comercial, pelo imediato restabelecimento de relações com todos os países do mundo, inclusive com os países do Leste Europeu e da Ásia, o que permitirá o alívio de nossas dificuldades econômicas. No âmbito interno pugnamos por amplas e efetivas medidas que ponham termo ao insuportável e constante encarecimento da vida, proporcionando aos que vivem do trabalho melhores e mais humanos níveis de remuneração e de existência. Impõe-se do mesmo modo a defesa da cultura nacional ameaçada, o estímulo ao pleno florescimento das ciências, da literatura, das artes, e o amparo à indústria cinematográfica nacional. A luta pelas liberdades e em defesa dos direitos fundamentais do homem, inscritos na Constituição, é parte integrante e inseparável do histórico movimento da emancipação nacional. Sem a completa emancipação do Brasil não teremos assegurada a plena liberdade. Conclamamos finalmente todo o povo brasileiro – industriais, funcionários, intelectuais, operários, profissionais liberais, camponeses, comerciantes, militares, estudantes, donas de casa e magistrados – a manifestar o seu apoio a este patriótico movimento, nascido sob o signo da mais ampla unidade de vontades e anseios, para a conquista da emancipação nacional." Pela Presidência: General Edgard Buxbaum, deputado, Campos Vergal, general Felicíssimo Cardoso, general Artur Carnaúba, deputado Paulo Couto, deputado Tarcilo Vieira de |Melo (secretário geral), deputado Euzébio Rocha (tesoureiro geral), general Leônidas Cardoso (Procurador). 1955. A longa Carta da Liga de Emancipação Nacional (LEN) difundida cerca de um ano após o suicídio de Vargas e já em pleno processo eleitoral daquele ano, guarda uma atualidade com o que se passa hoje, ressalvadas as circunstâncias e peculiaridades no que concerne à economia nacional, sobretudo as referências ao quadro internacional marcado por uma relação pela polaridade entre EUA e URSS, pilares da Guerra Fria de então. Existe, porém, uma questão que se mantém a demandar a nossa atenção dentro das prioridades que têm crescido na medida em que não se tomam as providências necessárias para atendê-las. Refiro-me à indústria nacional e ao seu progressivo sucateamento já previsível há 70 anos, tempo imediatamente anterior ao advento do chamado neoliberalismo, ou seja, à ascensão do setor financeiro em grande parte responsável pela secundarização das atividades produtivas. Contudo, a lógica que presidiu esse documento permanece válido, porquanto a despeito da desagregação do sistema socialista mundial amparado na URSS a nova versão da velha Guerra Fria se orienta na direção de nações que buscam lutar por suas autonomias nas relações internacionais a resistirem a pressões do grande capital presentemente transnacional, pois não mais ancorado como durante o imediato pós-guerra nos EUA. O exame do conteúdo da Carta sugere muitas leituras, mas cabe assinalar dois significativos traços: (1) a amplitude de seu alcance a buscar reunir um conjunto variado da sociedade brasileira, destacadamente os segmentos militares, que ainda se encontravam fortemente vinculados a teses nacionalistas, muitos dos quais tiveram participação na Campanha da Petrobras; e, (2) o caráter vibrante presente nos argumentos a sustentarem esse projeto nacional-desenvolvimentista e grandemente calcado na definitiva conquista de nossa independência. São pontos que dentre outros propiciam um bom balanço para que continuemos a descortinar perspectivas mais promissoras para o nosso povo. A LEN foi fechada no primeiro ano do governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira. Na edição de 14 de junho de 1956, o jornal Imprensa Popular vinculado ao então Partido Comunista do Brasil estampou em sua primeira página em letras garrafais: “Serve ao Imperialismo Americano o fechamento da Liga da Emancipação”. E no corpo dessa edição destaca os vários pronunciamentos indignados de parlamentares contrários a essa decisão que violava os dispositivos constitucionais. Para não parecer que essa reflexão se encontra presa a um viés meramente panfletário, isto é, quando a ideologia empobrecida pelo palavreado comum se opõe a uma dada realidade centrado apenas em suas concepções, vale citar um trecho do livro do economista Celso Furtado. Trata-se de “O Mito do Desenvolvimento Econômico”, editado em 1974, já em plena hegemonia da etapa neoliberal. Senão vejamos: O traço mais característico do capitalismo em sua fase atual está em que ele prescinde de um Estado, nacional ou multinacional, com a pretensão de estabelecer critérios de interesse geral disciplinadores do conjunto das atividades econômicas. (...) a expansão dessas economias depende, fundamentalmente das transações internacionais, e estas estão sob o controle das grandes empresas ... (pp. 34-35). A exemplificação do que ocorreu no governo de Juscelino (1956-1960), ocasião em que o nacional-desenvolvimento incrementou um crescimento econômico atrelado a investimentos externos que comandaram parte dessa política na qual o dado nacional passou a figurar em plano subsidiário à expansão, só fortalece o registro feito por Furtado. Creio ser oportuno não apenas lembrar e fazer circular a Carta de Emancipação Nacional, fundadora de um movimento que não obteve continuidade por razões que escapam o objetivo desse artigo, mas refazê-la para que a luta pelo direito de nosso povo de usufruir condignamente o fruto de seu trabalho e das riquezas e recursos que possuímos seja alcançada. E isso só acontece com a conscientização e a mobilização organizada dos que mais padecem pelo estado ainda dependente no que diz respeito ao controle de nosso potencial, mesmo que em grau não tão subalterno como naqueles tempos de grande euforia interrompido pelo golpe de 64. *Doutor em História Social; Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON); Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos). Foto: Centro de Memória Sindical Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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JOGADOR COMPULSIVO É QUESTÃO DA SAÚDE PÚBLICA. FUNÇÃO DO GOVERNO É REGULAR OS JOGOS ONLINE

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JOGADOR COMPULSIVO É QUESTÃO DA SAÚDE PÚBLICA. FUNÇÃO DO GOVERNO É REGULAR OS JOGOS ONLINE
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Por CARLOS WAGNER* No período analógico, os jogos ilegais foram o berço do crime organizado, imaginem o que acontecerá na era digital Poucas coisas irritam mais um veterano repórter estradeiro do que ver velhas notícias publicadas nas manchetes dos jornais nos dias atuais como se fossem novidades. No final do mês de setembro teve enorme repercussão na mídia nacional a declaração da deputada e presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, 59 anos, em relação às “bets”, como são conhecidas as casas de apostas online: “Subestimamos os efeitos nocivos e devastadores. É como se tivéssemos aberto as portas do inferno”. O comentário da experiente deputada foi feito por conta da divulgação, pelo Banco Central, de que em agosto os beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em apostas online. via Pix. E da informação da Confederação Nacional do Comércio (CNC) de que 1,3 milhão de brasileiros ficaram inadimplentes no primeiro semestre de 2024 por causa das apostas online. As portas do inferno, referidas pela deputada Hoffmann, não foram abertas agora. Foram abertas em 30 de abril de 1946, quando o então presidente da República, general Eurico Gaspar Dutra, assinou o Decreto-lei 9.215, proibindo os jogos de azar no Brasil e fechando os cassinos. Os brasileiros não deixaram de apostar com a proibição dos jogos. Continuaram, e a consequência foi que do jogo do bicho nasceu o crime organizado no país. O fato é o seguinte: os brasileiros apostam até em “campeonato de cuspe a distância”. Estes R$ 3 bilhões apostados pelos beneficiários do Bolsa Família são um grão de areia na praia frente ao montante que é gasto em jogos legalizados e clandestinos diariamente no Brasil. São muitos bilhões. Uma quantia que ninguém sabe a sua totalidade. Na década de 80 e até o início dos anos 90, foquei a minha carreira de repórter em esmiuçar o mundo dos grandes bicheiros do Brasil, em particular do Rio Grande do Sul. Comecei a investigação jornalística destruindo a lenda de que o bicho seria a única atividade honesta no país porque o dono da banca honrava o seu compromisso para com o apostador. Como se dizia na época: “valia o que estava escrito na aposta”. Conversa fiada. Ocorre que as lotéricas que sorteavam os números pertenciam aos bicheiros. Que faziam os sorteios sem fiscalização do governo ou de qualquer auditor independente. Mais ainda: eles tinham o controle interno dos números mais apostados para se prevenir de surpresas. Na ocasião, publiquei uma reportagem mostrando que os bicheiros construíram a imagem de pessoas honestas, que sempre cumpriam com suas obrigações para com o apostador, graças à ignorância da imprensa, que não sabia o que se passava entre as quatro paredes das casas de apostas. Também fiz uma reportagem quando os bicheiros entraram no negócio das máquinas de apostas e dos bingos. Na ocasião, em uma noite, em Porto Alegre, encontrei uma equipe de psicólogos e outros profissionais de saúde mental circulando pelas casas de apostas. Eram ligados à Organização Mundial da Saúde (OMS), das Nações Unidas, e tivemos uma longa conversa que varou a madrugada e só acabou quando o sol nasceu. Eles tratavam dos jogadores compulsivos. Fui a uma reunião deles com os Jogadores Anônimos, um tipo de irmandade em que pessoas viciadas em apostas compartilham suas experiências para tentar se manter longe do jogo. Entrevistei uma jovem senhora de 25 anos que deixou o marido e um filho e acabou se prostituindo para pagar as dívidas de jogo. Um funcionário público da Receita Federal que vendeu casa, carro e tudo mais para continuar apostando. Um delegado de polícia que acabou aposentado por estar com distúrbios mentais. E por aí afora. Estive em Brasília, no Rio de Janeiro e outros cantos do país, incluindo as fronteiras com o Uruguai e o Paraguai, fazendo reportagens sobre cassinos, casas de jogos de baralho ilegais e outros tipos de jogatina. Em Santana do Livramento, cidade gaúcha separada por uma avenida da uruguaia Rivera, encontrei a então juíza carioca Denise Frossard, que em 6 de outubro completa 74 anos. Em 1993, ela tornou-se notícia nos jornais ao redor do mundo ao colocar na cadeia os 14 maiores banqueiros do jogo do bicho do Rio de Janeiro. Estava de férias em Livramento e tivemos uma longa e produtiva conversa, da qual extraí informações para muitas matérias. A conclusão que se chegou no final dos anos 80 era de que a única maneira que o governo federal tinha para impedir que os jogos ilegais se alastrassem no país e acabassem se misturando com outros tipos de crimes, como lavagem de dinheiro e financiamento do tráfico de drogas e armas, era legalizá-los e garantir que não fossem fraudados. E que os viciados recebessem tratamento médico. Na ocasião, tive uma longa conversa com um psiquiatra que, por conta da OMS, tinha viajado mundo afora se especializando na questão dos viciados em jogo. Sempre começava uma entrevista afirmando o seguinte: “O vício em jogos é um problema de saúde pública”. O governo federal, a Câmara dos Deputados e o Senado podem colocar vários mecanismos para impedir que o jogador compulsivo aposte. Mas ele vai conseguir uma maneira de driblar a lei e apostar. Arrematando a nossa conversa. As apostas online foram legalizadas em 2018 pelo então presidente da República Michel Temer (MDB), 84 anos, que foi sucedido em 2019 por Jair Bolsonaro (PL), 69 anos. Durante o seu mandato (2019-2022), Bolsonaro, seja lá qual tenha sido o motivo, não regularizou as apostas online. O seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 78 anos, em 2023 editou uma medida provisória para a regulamentação das apostas online. Lula e seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, 61 anos, já manifestaram interesse político em regulamentar as apostas. Como disse, a imprensa vem tratando o assunto de maneira superficial. Vejam bem. Se durante o período analógico os jogos ilegais foram o berço de importantes segmentos do crime organizado no Brasil, imaginem o que acontecerá agora, na era digital. Aliás, já está começando a surgir uma grande lavanderia de dinheiro sujo. *Carlos Wagner é repórter. Publicado originalmente no blog Histórias Mal Contadas. Foto: EBC Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

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