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Opinião

Dilligenza dovuta non c’é in Bento

Dilligenza dovuta non c’é in Bento

Artigo por RED
09/03/2023 11:31 • Atualizado em 10/03/2023 09:30
Dilligenza dovuta non c’é in Bento

De ADELI SELL*

“Dilligenza dovuta”, isto é, prévia e devida diligência ou “due dilligence” não há em Bento Gonçalves. “Non c’é in Bento”, para ser entendido por alguns.

A velha Colônia Dona Isabel dos primeiros imigrantes era um ermo e laborar nas roças era duríssimo. Se plantando, dava para comer e viver. E “la nave” ia para frente. Afinal, tinham vindo para “fare la mérica”.

Trocaram o nome pelo de um gaudério que não passa de um mito, perdedor dos seus propósitos, com uma biografia pouca digna para ser um herói: Bento Gonçalves.

Com o passar dos tempos, a cidade passa a ser referência na indústria moveleira, a partir de derrubadas de matos sem limites.

Bento tem – ninguém duvida – uma bela marca no enoturismo e na boa gastronomia. Quem não gosta de um bom vinho ou de uma espumante de qualidade regando uma boa comida típica? Mas é preciso não esquecer do outro lado da moeda.

E por nossa luta pela Memória, todos os episódios da vida cotidiana são resgatados.

Em passado recente, tivemos o triste episódio contra o Ministro da Suprema Corte, Luiz Fux, que – sob ameaças – deixou a cidade sem ter podido falar. E isso que é um liberal dos quatro costados. Um escárnio que agora fazem de tudo para esquecer. Como querem esquecer a campanha que fizeram contra pessoas e uma marca de vinhos pela cesta presenteada ao atual presidente Lula. Outro escárnio.

Esquecendo o velho nome, o da princesa que assinou a lei da libertação dos escravos, Bento Gonçalves, nome de quem era senhor de escravos com discurso republicano e abolicionista, está no mapa por praticar trabalho análogo à escravidão nos dias atuais.

Correram para dizer que era um “terceiro”, o tal “gato” baiano, mas se esquecem de olhar para si e para a ética que se exige das empresas, ou seja, se você contrata tem que saber da “dilligenza dovuta”, traduzindo “pesquisa devida e prévia” ou ainda na língua “universal”, “due diligence”.

Vá e consulte as páginas das três vinícolas contratantes do terceiro/gato. Escondido, consegui achar numa um Código de Ética. Proteção de dados pessoais encontrei, mas não de forma adequada com a lei. Uma delas dá destaque ao que seria uma política de compliance, dando ênfase aos princípios ESG (Environmental, Social and Governance, traduzido em Ambiental, Social e de Governança). Chega a falar que tratam de “mitigar riscos”. Outra fala até dos ODS ( Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU, a terceira fala em Sustentabilidade ambiental. Isto é, usa-se maquiagem como base para ter aparência de legitimidade ética. É como as empresas que fazem “greenwashing”, ou seja, pintam ou lavam tudo de verde para parecer sustentável.

Não desdenho que possam realizar atividades nas áreas sociais, ambiental e de governança. Mas a forma como os sites se apresentam já é um indicativo que mais interessam as notas dos vinhos e espumantes e todo o modelo de enoturismo que montaram, engolindo o complexo de pessoas, empregados, famílias produtoras, nós os consumidores – que se tornaram secundários.

A Alemanha tem uma Lei de Vigilância que deve abranger todas as atividades da empresa, e na Noruega há o Ato de Transparência. Empresas da área da moda que praticamente tudo terceirizam tiveram suas marcas manchadas e detonadas nas redes sociais por uso de trabalho análogo à escravidão . Boicotes existiram e há grandes possibilidades de boicote a estas três marcas. Duas delas são mais populares e talvez terão menos desgaste, mas há outra que terá imensas dores de cabeça a perturbar seus executivos.

Mas como este tipo de empresariado é em regra geral covarde, tende a não aprender com seus graves erros. Seria o grande momento de uma reengenharia e de governança, para entrar de cabeça nas adequações legais, em empunhar a bandeira ESG. Poderão até chamar seus apaniguados das entidades “master”, porém deste mato não sai coelho. Caminham até ali, no velho estilo pró-forma.

Somente uma consultoria independente e ousada pode mudar a cadeia da uva e do vinho, colocá-la na modernidade.

Quando dos episódios da deriva, vizinhos largando veneno no ar e prejudicando seus parreirais, chiaram. Mas não se engajaram em nenhuma ação contra o uso dos venenos.

O que farão agora?

Para o bem do Rio Grande do Sul e do setor vitivinícola quem não os ajudaria? Mas a pergunta é: querem ser ajudados?


*Escritor, professor e bacharel em Direito.

Este artigo é o primeiro da série “Dossiê Bento Gonçalves”, composta por 10 artigos inéditos de Adeli Sell que serão publicados diariamente.

As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.

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