Justiça

Os recados do ato do 8 de janeiro

Destaque

Os recados do ato do 8 de janeiro
RED

Por RUDOLFO LAGO* do Correio da Manhã Nas entrelinhas do ato em memória do 8 de janeiro de 2023, diversos recados puderam ser lidos. Há quem afirme que estavam na Praça dos Três Poderes somente pouco mais de mil pessoas. É possível que o número possa ter sido um pouco maior, mas não muito. Em seu discurso, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma admissão velada de que não havia muitas pessoas. Fica claro que a atual capacidade do PT de arregimentar militantes, no novo tempo das redes sociais, não é mais tão grande quanto já foi no passado. E, para alguns, pode ter havido uma falha na articulação do ato, no sentido de mantê-lo mais partidário, mais um ato do governo Lula, do que uma manifestação institucional dos poderes.     Poderes Uma impressão reforçada pelo fato de não estarem presentes os demais chefes de poderes, para além do próprio Lula, chefe do Executivo. No fundo, os problemas verificados reforçam as falhas do governo na sua comunicação. O ato é, no fundo, estratégia de comunicação.   Marketing Um observador da área chegou a comentar que o grande problema é que "continuam confundindo marketing eleitoral com comunicação de governo". Assim, a troca de Paulo Pimenta por Sidônio Palmeira talvez não resolva. Sidônio foi o marqueteiro de Lula em 2022.   Interferência de Janja será contida? Atos se iniciaram com um discurso de Janja | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil   Ainda no campo da comunicação, chamou a atenção que os atos de quarta no Palácio do Planalto tenham se iniciado com o discurso da esposa de Lula, Janja da Silva. Ela foi a primeira falar, por volta das 9h30, na solenidade de entrega do relógio do século XVII que foi destruído por um vândalo e do vaso de porcelana restaurado após se partir em 180 pedaços. Janja não é uma autoridade da República. Não tem cargo no Executivo ou em qualquer outro poder. Ainda que seja legítimo que ela expresse suas posições políticas, sua presença ali abrindo os atos de quarta passou a ideia de que ela continua tendo forte influência na comunicação.   Disputa Há uma disputa interna na comunicação do governo. Janja conseguiu o controle das redes sociais. No episódio da cirurgia que Lula fez para drenar uma hemorragia intracraniana, toda e qualquer informação precisava passar pelo seu crivo. Sidônio pediu autonomia. Terá?   Recados Na parte improvisada do discurso, Lula acabou passando um recado importante aos setores mais radicais de esquerda do PT, os que são mais revolucionários e mais avessos à opção de avanço pela solução democrática. Lula deixou claro que não é seu caminho.   Sem operários "À frene da Revolução Russa ou da Revolução Cubana, não havia nenhum operário", disse o presidente, referindo-se às vitórias comunistas de 1917 e de 1959. "Só a democracia é tão poderosa para permitir que um torneiro mecânico sem diploma se torne presidente".   Centrão Na sequência da troca de Pimenta por Sidônio, Lula fará outras mudanças. E o ponto central é como conseguir ampliar seus apoios para o centro. Sendo mais explícito, para o Centrão. E um dos problemas que Lula enfrenta é a resistência a isso no seu próprio partido.       *Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congresso em Foco e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade Publicado originalmente no Correio da Manhã Foto de capa: Ato e discurso de Lula passaram diversos recados | Rudolfo Lago/Correio da Manhã Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

Comunicação e Mídia

Grave

Destaque

Grave
RED

Por MANUELA D'ÁVILA*, no Instagram O anúncio de Zuckerberg não é o mero anúncio de uma nova política de moderação de conteúdo da empresa Meta. O que ele anuncia é um dos maiores fatos políticos - senão o maior - desse tempo em que vivemos.   Eu pesquiso no doutorado as políticas de regulação da internet no mundo e a relação disso com as ideias de liberdade norte-americanas. O que Zuckerberg diz, com todas as letras, é que a liberdade defendida pela extrema direita, as ideias de Trump e Musk, serão as suas e de sua empresa. Ideias que ameaçam instituições e democracias. Ideias de violência e tortura.   Para isso, Zuck operará em parceria explícita com o governo dos Estados Unidos. É o Velho excepcionalismo americano: a ideia de um povo predestinado a salvar todos os povos. O custo disso testemunhamos com as guerras promovidas por esse Império, o que mais guerreou da história.   O anúncio soa mesmo como uma declaração de guerra ao mundo. Ele menciona China e América Latina e ao se referir a regulação europeia, refere-se a Alemanha, protagonista da construção da regulação daquela região. Ao mencionar o X como sua referência, ele menciona a rede cujo proprietário opera direta e explicitamente ameaças a vida democrática de diversas regiões do planeta.   É um fato imenso. Não errem tentando colocá-lo no âmbito da “internet”. Não imaginem que se trata de algo afeito a comunicação ou moderação de conteúdo. Não subestimem acreditando que pode ser resolvido pelas secretarias de comunicação dos governos. Essa é a agenda central da geopolítica do nosso tempo. Só uma resposta institucional organizada poderá nos permitir enfrentar essa ameaça.   Acesse aqui o vídeo da fala de Mark Zuckerberg   *Manuela D'Ávila é  jornalista, escritora e política brasileira, atualmente sem partido. Em 2004 foi eleita a vereadora mais jovem da história de Porto Alegre, deputada federal pelo Rio Grande do Sul entre 2007 a 2015, deputada estadual de 2015 a 2019 e candidata a vice-presidente da República na eleição de 2018. Foto: Legenda: Meta doa $1 milhão de dólares para fundo inaugural de de Trump - Crédito: Redes Sociais Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

Comunicação e Mídia

Moraes enquadra Meta após empresa acabar com checagem de fatos

Curtas

Moraes enquadra Meta após empresa acabar com checagem de fatos
RED

Publicado originalmente no MEIO* No dia seguinte à decisão da Meta de encerrar a checagem de fatos e remover restrições de conteúdo sobre temas como imigração e gênero, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes afirmou que as redes sociais só continuarão a operar no país se respeitarem as leis. “As redes sociais não são terra sem lei. No Brasil, só continuarão a operar se respeitarem a legislação brasileira. Independentemente de bravatas de dirigentes irresponsáveis das big techs”, disse em resposta à decisão da dona do Instagram e do Facebook. Durante a cerimônia que marcou os dois anos do 8 de Janeiro, Moraes afirmou que as plataformas digitais contribuíram para disseminar discursos de ódio e movimentações golpistas, que culminaram nos ataques de 2023 em Brasília. A responsabilização das redes é tema de um julgamento no STF iniciado em 2024. (g1) Mais de 60 entidades, centros de pesquisas universitários e coletivos ao redor do mundo assinaram uma carta aberta contra o fim da checagem de fatos nas plataformas da Meta. No documento, os pesquisadores reforçam a necessidade de uma regulação nas redes sociais que “priorize os direitos humanos e a segurança digital”. E afirmam que as mudanças propostas por Mark Zuckerberg colocam em riscos grupos vulnerabilizados e representam um retrocesso de anos de esforços globais para promover um ambiente digital mais democrático. (Estadão) Para a ganhadora do prêmio Nobel da Paz Maria Ressa, a decisão da Meta significa que “tempos extremamente perigosos” estão chegando para o jornalismo, a democracia e os usuários de redes sociais. Segundo a jornalista e autora filipino-americana, isso levará a um “mundo sem fatos”, o que seria “adequado para um ditador”, refutando a alegação de que o afrouxamento na moderação é uma questão de liberdade de expressão. (Guardian) O alinhamento da Meta – dona do Facebook, Instagram, Threads e WhatsApp – com o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, provoca temores no Palácio do Planalto e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de retrocesso no enfrentamento das fake news. “Essa decisão não auxilia a democracia e o respeito à diversidade. É um retrocesso para a humanidade”, diz um ministro do TSE ouvido pela coluna de Malu Gaspar. Nas eleições de 2024, a Meta assinou um memorando com o TSE prevendo a adoção de medidas para combater notícias falsas, mas a nova política da empresa coloca o acordo em risco. (Globo) Com as novas diretrizes, caso um usuário de uma plataforma da Meta se sinta ofendido por uma publicação homofóbica ou contra imigrantes, por exemplo, ele precisará acionar os tribunais para remover o conteúdo. Desde a mudança nas regras de moderação feita na terça-feira, a empresa deixou de excluir de forma proativa posts homofóbicos, transfóbicos e xenófobos. Especialistas avaliam que a mudança deve provocar uma alta de ações judiciais. (Folha) * O Meio é uma newletter gratuita, enviada diriamente aos assinantes. Faça sua inscrição no site. Não custa nada: www.canalmeio.com.br Foto da capa: Mark Zuckerberg, no centro, ladeado pelo presidente eleito dos EUA Donald Trump, à direita, e Elon Musk, à esquerda. Crédito: Evan Vucci/David Zalubowski/Alex Brandon/AP

Bem Estar

O fim dos tempos?

Destaque

O fim dos tempos?
RED

Por PAULO TIMM* O que é o tempo? Simploriamente, um lapso entre dois momentos. Poeticamente, como dizia Machado de Assis, ‘um tecido invisível no qual se pode pintar qualquer coisa...Até o nada. E ainda se perguntava: - “O nada sobre o invisível?”. Ainda assim, no decurso dos milênios  civilizatórios, o tempo tem sido  o espaço da fala, do discurso, através do qual foram se imprimindo denominação às coisas, entretecendo argumentos explicativos sobre suas ocorrências, concertando pactos e impactos, guardando memórias. Discurso, aliás, provém do latim e significa “andar ao redor”, implicando outro. “No discurso somos desviados de nossas próprias convicções em sentido positivo pelo outro. Apenas a voz do outro outorga ao meu comentário, à minha opinião, uma qualidade discursiva”. Pois foi “andando ao redor das coisas e das pessoas” que desenvolvemos, não só a inteligência, mas o processo civilizatório. Humanizamo-nos. Foi o espaço das aquisições milimétricas da racionalidade que nos conduziu ao Sapiens.  “Decisões racionais são construídas a longo prazo”. Requerem concentração, foco e meditação que nos remetem, enfim, à faculdade  do  juízo e ao desenvolvimento frontal do cérebro. “Uma reflexão as precede, que se  estende para além do momento, no passado e no futuro”. Nas sociedades sem escrita, enaltecendo o papel dos anciãos como portadores da memória. Com a escrita, o advento dos escribas.  Para os filósofos, teólogos e cientistas , então, este processo é um verdadeiro calvário, longo e penoso.  Não por acaso, tais criaturas e respectivas instituições foram reverenciadas como detentoras de um saber capaz de orientar as práticas do bem viver. Dos altares xamânicos  às Academias. Hoje, isso acabou. Estamos à mercê de influenciadores digitais quase analfabetos, bonitinhos e ordinários.  Em poucas décadas, vivenciamos um salto qualitativo na sociedade equivalente à Revolução Agrícola, ao Renascimento e à Revolução Industrial. Mudamos não só a tecnologia da comunicação, mas a cultura, rearticulando técnicas e relações de produção, cosmovisão e visão do mundo, instituições e critérios éticos e de afirmação social. Emergiram os “faladores de merda”.Bullshitters...  No mundo da Infocracia o que conta são trocas de informações entre unidades de função que garantem eficiência, dispensando a Política e o Governo, como instâncias éticas, que passam a ser substituídos por Agências de Gestão e Controle. No universo dataísta, a democracia dá lugar a um sistema supostamente isento de valores impulsionado por dados que se ocupam da otimização neutra de resultados. É a vitória definitiva do empirismo experimental que reorientou a Filosofia Moderna desde Hume, para o pragmatismo tão ao gosto dos anglo-saxões.  O filósofo coreano Byun Chul assinala, oportunamente, no livro “ Infocracia – Digitalização e a crise da democracia “ -Ed.Vozes: “A digitalização é, justamente, o que faz erodir o factual. O moderador de televisão Stephen Colbert, (quem colocou em circulação a palavra truthiness (ver-i-dade) comentou certa vez: ‘Eu não acredito em livros. São só fatos. Sem coração’” – pg 87 O tempo extinguiu-se como dimensão da vida cotidiana e excluiu a ordem do discurso que possibilitou a construção da democracia ocidental com base na Razão Comunicativa. Quem primeiro intui isso talvez tenha sido o inventor do para-raios, Benjamin Franklin, que proclamou alto e bom tom: “Tempo é dinheiro”. Como a vida é difícil e todo mundo precisa de grana, o tempo da reflexão foi substituído pela corrida contra o tempo: O self service do dia a dia, onde tudo já vem pronto para o consumo, com um mínimo de dispêndio de energias físicas e psíquicas. A tecnologia da Sociedade Industrial propiciou a mudança e trouxe consigo o fim do tempo como tempo indispensável à humanização da espécie. Somos, hoje,  máquinas de clicar moradores das  Cidade das Estrelas. Grande livro de ficção, aliás, de Arthur Clarck: “A Cidade e as Estrelas”. Sem tempo para o discurso e para as narrativas, que impunham  o reconhecimento da alteridade, nos fragmentamos como pedaços de um panorâmico espelho quebrado: Cada um por si, Deus (Data) por todos. Entramos no Reino da Informação Digital : A Infocracia. “Chamamos regime de informação, a forma de dominação na qual informações e seu processamento por algoritmos e inteligência artificial determinam decisivamente processos sociais, econômicos e políticos. (...) O regime de informação está acoplado ao capitalismo da informação, que se desenvolve em capitalismo da vigilância ( da era industrial) e que degrada os seres humanos em gado, em animais de consumo de dados” – Byon Chul Han – INFOCRACIA , Digitalização e a Crise da Democracia , pg 7 Vários autores já vinham chamando a atenção para os riscos deste salto no escuro sob os asas do Iluminismo. Karl Marx, crítico implacável deste mundo, há dois séculos já advertia que “tudo que é sólido desmancha no ar”.  Em A Era do Vazio,  Gilles Lipovetsky, aborda o vazio conectado ao individualismo numa era onde a materialidade e a exposição das redes sociais torna o momento fugaz, os relacionamentos esvaziados e a materialidade exaltada.: “O livro trata do enfraquecimento da sociedade, dos costumes e do indivíduo contemporâneo da era do consumo de massa. Ele explora um modo de sociabilização e individualização inédito, que se instituiu a partir dos séculos XVII e XVIII”. N. Luhman, em Entscheidungen in der ‘Informationsgesellschaft’,  assinala, apud Byun cit: “Em uma sociedade da informação, não se pode mais falar de comportamento racional, mas, no melhor dos casos, de comportamento inteligente”. Neste regime de informação, a vigilância e a disciplina rígida de corpos aprisionados da Era Industrial são substituídas pelo controle invisível das vontades individuais, confundidas com afetada liberdade de escolha. O novo sujeito, aliás, “subjétil” - expressão  de Antonin Artaud para definir o processo que vincula e separa o visível do legível, mais tarde retomada por Jean Baudrillard - porque incapaz de perceber a manipulação de que é objeto através dos perfis acumulados nos bancos de dados, supõe-se livre, autêntico e criativo. “Produz-se e se performa”, na ressonância  de suas opiniões através das Redes. Fala para o vazio acreditando protagonizar-se perante o mundo.  Acha-se um “player”  de uma nova democracia: digital. Tudo sob um clima de suposta e salutar  transparência. Não obstante, o novo presídio, cristalino, digital, nada tem de sagrado:  é transparente e iluminado, aprazível”, sem mistérios ou instrumentos de tortura, mas sua invisível  casa de máquinas  urde e tece a dominação contemporânea: é escura e fria.  Cruel. Os likes a escondem...Aposentou, por vencimento de validade, o Big Brother orweliano de 1984, substituindo-o pelo “Admirável mundo”novo” de Huxley: Não por acaso o turismo cresce enormemente com milhões de pessoas viajando permanentemente de um lado pra outro. A curtição do prazer, da beleza, cada vez mais acessível às grandes massas, do divertimento, do sexo fartamente liberado e disponível na Internet, as drogas, dão um novo sentido à vida das pessoas que, não obstante, sucumbem à depressão, à violência e ao suicídio. Sidarte Ribeiro, em seu livro “O oráculo da noite”- pg 378-, lembra que “medidas da repercussão de rumores no Twitter entre 2006 e 2017 mostram que as postagens mais disseminadas são justamente as mais ficcionais. Robôs em versão algoritmo, ‘almas sem corpo” em plena atividade, já vencem eleições com plataformas extremistas nos Estados Unidos, Inglaterra e no Brasil, através do impulsionamento massivo e automático de memes falsos que contagiam as pessoas até elas acharem que as narrativas mentirosas foram tecidas por elas mesmas. Por excesso de informação e falta de critérios, corremos o risco de perder a confiança no conhecimento acumulado e vivenciar uma nova torres de Babel, um cacarejar de vozes dissonantes sem qualquer possibilidade de harmonização”. O resultado deste processo de compressão do tempo e saudável submissão do Sapiens ao Big Data, gerou o que alguns analistas estão denominando “brain rot”,  eleito, no final do ano 2024 como a expressão do ano, conforme informação do Dicionário Oxford, que destacou ter havido 130 mil buscar pelo verbete no ano que passou. Consta que isso representou um crescimento de 230% entre 2023 e 2024, possivelmente por causa da "preocupação com o impacto trazido por tantos conteúdos de baixa qualidade on-line". Pode ser traduzida como "cérebro podre" ou "podridão cerebral”, remetendo a um antigo provérbio inglês que diz “if is not rotten do not fix it”...O termo teria sido usado, por primeira vez, nos idos de 1854 por Henry Dvid Thoreau no seu livro “Walden”, um baluarte do ambientalismo. Ele já criticava a tendência à simplificação de ideias complexas, que tanto se disseminariam nas Redes Sociais, ao apodrecimento mal cheiroso das batatas. Concluindo: Vivemos, com exceção dos “Engenheiros do Caos” que nos administram, numa referência a este título de Giuliano da Empoli, Ed. Topleituras.com,  uma era de deterioração mental causada pelo consumo excessivo de conteúdos superficiais e pouco desafiadores à inteligência e ao efetivo exercício do juízo entre distintas possibilidades e cenários , principalmente pela subserviência às redes sociais e dependência cada vez maior dos aparelhos celulares, com reflexos sobre a nossa capacidade para construir uma sociedade verdadeiramente democrática. Perseguimos cada vez mais velocidade em nosso cotidiano, subindo cada vez mais alto no que denominamos “qualidade de vida”, morando e trabalhando em arranha-céus competitivos em altura. Vã ilusão. Mais uma de Prometeu... * Paulo Timm é é economista, professor universitário, jornalista e editor Ilustração da capa: Redes Sociais Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

Artigo

A cusparada no busto

Destaque

A cusparada no busto
RED

Por SOLON SALDANHA* A atriz Fernanda Torres fez história ao se tornar a primeira brasileira agraciada com o Globo de Ouro. Ganhou na categoria Melhor Atriz Dramática, ao superar a concorrência de cinco atrizes da primeira linha do cinema mundial: Angelina Jolie (Maria Callas), Kate Winslet (Lee), Nicole Kidman (Babygirl), Pamela Anderson (The last showgirl) e Tina Swinton (O quarto ao lado). Venceu por sua atuação impecável em Ainda Estou Aqui, um filme de Walter Salles baseado em livro de Marcelo Rubens Paiva. O anúncio do resultado foi feito pela atriz Viola Davis, durante a cerimônia que ocorreu na noite do último domingo, em Los Angeles (EUA). O livro, originalmente publicado em agosto de 2015, conta a história da família Paiva, relatando as consequências enfrentadas a partir da prisão, tortura e morte do deputado federal Rubens Paiva pela ditadura militar brasileira, em 1971. A figura central, papel vivido por Fernanda, é o da esposa de Rubens, Eunice Paiva. Mãe de cinco filhos, que precisou então criar sozinha, ela se reinventou a partir da dor. Jamais chorou na frente de câmaras, voltou a estudar, se formou advogada e lutou pelo reconhecimento do assassinato do marido até obter a certidão de óbito. O corpo jamais foi recuperado. Marcelo, o escritor da obra, era o único filho homem do casal, que teve também quatro meninas. Inúmeros parlamentares foram cassados em nosso país, pelo arbítrio dos militares. Vários foram presos. Mas Rubens foi o único que, depois de detido, não retornou para casa. Dois bustos com sua imagem existem atualmente, como forma de reconhecimento à figura pública fiel aos seus princípios. Um deles está colocando na frente da antiga sede do DOI-CODI (*), no Rio de Janeiro, onde ele foi torturado e morto. O outro está no Congresso Nacional. Este segundo foi inaugurado exatamente na data da passagem dos 50 anos da ditadura, em 1º de abril de 2014. Durante a solenidade, que foi presidida pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, este lembrou em seu discurso ter sido seu próprio pai, Aluízio Alves, também cassado. E destacou ser muito importante “defender com rigor os ideais da democracia, assim como não esquecer das marcas e dos que se sacrificaram na luta”. Agora, se algo chamou a atenção na inauguração do busto, não foi a presença dos familiares do agraciado, nem as palavras do orador oficial. O então deputado federal Jair Messias Bolsonaro, acompanhado de dois guarda-costas que eram verdadeiros armários – e asseguravam a sua coragem –, se fez presente mesmo sem estar convidado. Falando em voz alta que Rubens Paiva havia recebido o que merecia, se aproximou e deu uma cusparada na escultura, para surpresa e estarrecimento de todos. Talvez devesse ter respondido por falta de decoro, mas isso não ocorreu. Essa impunidade foi fator que favoreceu suas atitudes intempestivas e várias vezes criminosas, ao longo do tempo. Seja na carreira militar, nos mandatos legislativos ou na presidência da República. Agora, ao menos uma certeza se tem ao lembrar disso: ele não está entre os milhões de espectadores que estão transformando este filme em um dos maiores sucessos de bilheteria do cinema brasileiro, de todos os tempos. E, para concluir: ao contrário do que seus seguidores andam espalhando via redes sociais, não houve financiamento público nem apoio via Lei Rouanet para a feitura da obra.   07.01.2025   (*) DOI-CODI é a sigla pela qual ficou conhecido o temido Destacamento de Operações de Informações – Centro de Defesa Interna, um órgão destinado à repressão e subordinado ao Exército Brasileiro, durante a vigência do golpe militar.     *Solon Saldanha é jornalista e blogueiro. Texto publicado originalmente no Blog  Virtualidades.     Foto de capa: Laura Tizzo/G1   Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.      

Artigo

O entrelaçamento de “Ainda Estou Aqui”, Fernanda Torres e o 8 de janeiro na defesa da democracia

Destaque

O entrelaçamento de “Ainda Estou Aqui”, Fernanda Torres e o 8 de janeiro na defesa da democracia
RED

Por CARLOS EDUARDO BELLINI BORENSTEIN* O entrelaçamento de “Ainda Estou Aqui”, Fernanda Torres e o 8 de janeiro na defesa da democracia A conquista do Globo de Ouro de melhor atriz por Fernanda Torres no filme “Ainda Estou Aqui” representa mais do que uma vitória do cinema brasileiro, da cultura e da arte nacional. Estamos diante de um fato com grande peso histórico. Fernanda Torres foi consagrada como a primeira atriz brasileira a vencer o Globo de Ouro ao interpretar brilhantemente Eunice Paiva – esposa do deputado Rubens Paiva – que travou um enfrentamento com a ditadura militar desde 1971, quando seu marido foi sequestrado, torturado e morto pela ditadura militar. Nos anos posteriores ao sequestro e assassinato de Rubens Paiva pelo regime autoritário, Eunice lutou pelo reconhecimento da responsabilidade do Estado na morte de seu marido. O caso foi investigado pela Comissão Nacional da Verdade, em 2011, que confirmou o assassinato de Rubens Paiva após 40 anos de seu desaparecimento. A conquista do Globo de Ouro ocorre apenas dois dias antes do país celebrar a vitória da democracia contra a tentativa de golpe da extrema-direita ocorrida em 8 de janeiro de 2023. Nesse dia, o país assistia atônito a depredação da Praça dos Três Poderes, tendo como alvo central dos golpistas o Palácio do Planalto e principalmente o Supremo Tribunal Federal (STF). No atual contexto histórico, o presidente Lula, como demonstra o pós 8 de janeiro, é a grande liderança política na defesa da democracia. Além de ter derrotado Jair Bolsonaro nas eleições de 2022, Lula tem sido um ator central na retomada de uma mínima normalidade institucional do país. Apesar dos limites e contradições do governo Lula 3, o presidente tem conseguido retomar o diálogo com o STF e parte dos governadores, o que foi interditado durante os anos Bolsonaro. Mesmo com as divergências existentes na relação com o Congresso Nacional, temos um ambiente de respeito às divergências e busca de construção de consensos mínimos. Lula também tem conseguido viabilizar um governo aliancista, atraindo forças de centro como o PSD e MDB, além de parte da direita democrática organizada no União Brasil e Republicanos. Outro aspecto importante diz respeito ao relacionamento com as Forças Armadas. Mesmo que parte das Forças ainda resistam a Lula, o relacionamento é mais construtivo do que era em 2023. Soma-se a isso o avanço das investigações contra quem tentou realizar um golpe de Estado. Apesar do destaque que parte da imprensa e do governo dá aos números positivos da economia, a grande marca governo Lula 3 passa por uma simbologia política. O que isso quer dizer? Lula tem conseguido, mesmo diante de um cenário bastante complexo, retomar o diálogo institucional. A retomada desse diálogo se conecta com a mensagem do filme “Ainda Estou Aqui”. Mais do que a busca por punição, o grande legado do filme passa por não deixar que o período autoritário seja esquecido ou revisado. A memória desse passado se vincula com os desafios enfrentados pelo governo Lula na retomada da normalidade institucional em meio aos constantes testes a que a democracia brasileira está sendo submetida. Assim, por uma coincidência histórica, o 6 de janeiro de 2025 se entrelaça com 8 de janeiro de 2023, tendo Lula, um dos poucos líderes remanescentes da geração que foi protagonista na luta contra a ditadura militar, em uma posição de destaque na defesa da democracia no campo progressista. Nesta defesa da democracia – que será um embate permanente, já que a extrema-direita, em que a defensiva estratégica, segue ativa no país – a arte, a cultura e o cinema, como demonstra o impacto do filme “Ainda Estou Aqui”, e o Globo de Ouro de Fernanda Torres, também adquire sua centralidade. Não por acaso, a arte, a cultura, o cinema e o conhecimento científico são alvos centrais dos regimes autoritários.           *Carlos Eduardo Bellini Borenstein Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Bacharel em Ciência política (ULBRA-RS). Especialista em Ciência Política (UFRGS). Tem MBA em Marketing Político (Universidade Cândido Mendes). Foto de capa: Divulgação; Eduardo Simões/Arquivo pessoal. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democraca.        

Mostrando 6 de 5297 resultados
Carregar mais