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Como o novo rei britânico lidará com as dívidas históricas do colonialismo e da escravidão?

Como o novo rei britânico lidará com as dívidas históricas do colonialismo e da escravidão?

Internacional por RED
09/09/2022 17:51 • Atualizado em 09/09/2022 17:52
Como o novo rei britânico lidará com as dívidas históricas do colonialismo e da escravidão?

Antes de ser coroado como Charles III, o então Príncipe de Gales fez declarações reconhecendo o “sofrimento inimaginável” causado em colônias.

O reinado de Charles III como monarca do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte se iniciou oficialmente após seu reconhecimento por parte do Parlamento Britânico, nesta quinta-feira (8/9), pouco depois do falecimento de sua mãe, a rainha Elizabeth II.

No entanto, a coroação do novo rei pode tardar alguns meses, e deve acontecer somente em meados de 2023. Antes disso, Charles terá que enfrentar desafios e dívidas histórias de sua família com respeito, principalmente a temas como o colonialismo e a escravidão promovidos por seus antecessores nos últimos séculos.

Embora o reinado de sua mãe tenha sido marcado pela independência de muitas antigas colônias britânicas na África, Ásia, Oceania e Caribe, não é menos verdade que seu país resistiu como pode em boa parte desses processos, mas se viu incapaz de se impor devido às consequências da Segunda Guerra Mundial, que destruíram boa parte do poder militar do Reino Unido – situação similar ao que aconteceu nas colônias portuguesas e espanholas no início do Século XIX, após a invasão napoleônica à Península Ibérica.

Vítima do colonialismo

A linguista nigeriana Uju Anya, professora da Universidade de Carnegie Mellon, nos Estados Unidos, manifestou no Twitter o sentimento daqueles que vivenciaram o colonialismo britânico na África.

“Se alguém espera que eu expresse alguma coisa além de desdém pela monarca que supervisionou um governo que patrocinou o genocídio, que massacrou e deslocou metade da minha família e cujas consequências aqueles que estão vivos ainda tentam superar, podem continuar a pedi-lo a uma estrela”, afirmou a acadêmica.

Anya afirma ser uma “filha legítima da escravidão e do colonialismo britânico”. Seu pai é nigeriano e sua mãe nasceu em Trinidad e Tobago. Se conheceram em Londres, nos Anos 59, e se casaram. Logo depois, se mudaram para a Nigéria, onde ela nasceu.

“Fico profundamente ofendida com a noção de que os oprimidos e sobreviventes da violência têm de mostrar respeito quando os seus opressores morrem (…) há pessoas em todo o mundo que estão a celebrar a morte desta mulher, não porque sejam vis ou frias, mas porque o seu reinado e a sua monarquia foram violentos, por extensão”, completou Uju Anya.

Índia-Paquistão, Suez e Malvinas

Outro exemplo de que o reinado de Elizabeth II não foi tão anticolonial como se apregoa foi o fato de que o Reino Unido, já durante seu período, continuou alimentando o conflito entre Índia e Paquistão, que levou à divisão da antiga colônia no subcontinente indiano.

Também foi o reinado marcado pela invasão do território do Egito por parte de uma tríplice aliança entre Reino Unido, França e Israel, em 1956, no que ficou conhecida como Guerra de Suez – o conflito terminou graças a uma reação egípcia em aliança com a Síria, dois países terminaram se unindo na República Árabe Unida, que durou entre 1958 e 1962.

O último conflito colonialista promovido pelo Reino Unido durante o período de Elizabeth II aconteceu pertinho do território brasileiro, nas Ilhas Malvinas, conhecida pelos britânicos como Falklands.

Em 1982, militares britânicos e argentinos se enfrentaram pela soberania do arquipélago que fica a cerca de 600 quilômetros da costa do país sul-americano, e mais de 12 mil quilômetros do país europeu. O Reino Unido venceu a guerra, e exerce o controle sobre as ilhas até hoje, apesar das tentativas da Casa Rosada de reaver o território pela via diplomática.

Escravidão

Já a relação do Reino Unido e da Família Real Britânica com a escravidão podem ser considerados ainda mais antigos, por registros que datam desde o início das grandes navegações, quando o comércio de negros escravizados eram uma das principais atividades da Companhia Britânica das Índias Orientais, que dominou o comércio nos mares do planeta entre 1600 e 1874.

Apesar de que o Reino Unido proibiu formalmente o comércio de escravos em 1807, sabe-se que muitos navios ingleses continuaram a atuar nesse ramo durante as décadas seguintes.

Após séculos de caça e genocídio de tribos inteiras no oeste da África, foi justamente o então príncipe Charles, em 2018, quem ofereceu o primeiro pedido de desculpas formal a respeito do tema.

Em uma visita a Acra, capital de Gana, o Príncipe de Gales reconheceu que o colonialismo e a escravidão foram “o capítulo mais doloroso das relações entre os países de Europa e da África (…) o tráfico de escravos foi uma terrível atrocidade, que causou um sofrimento inimaginável e deixou uma mancha que nunca se apagará na história do nosso mundo”.

Agora, caberá ao mesmíssimo Charles III, como monarca, mostrar que a Família Real é capaz de passar das palavras para as ações de reparação àqueles povos que sofreram com a violência por ele mesmo reconhecida.

 

Em GGN

Foto de Charles em visita a Gana, reprodução do Twitter The Royal Family.

Notícia publicada originalmente aqui .

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