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Patacoada da Marinha do Brasil ou a sobrevida dos golpistas

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Patacoada da Marinha do Brasil ou a sobrevida dos golpistas
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Por BENEDITO TADEU CÉSAR* Sob o pretexto de comemorar o Dia do Marinheiro (13 de dezembro), a Marinha do Brasil divulgou vídeo nesta semana com indireta ao governo federal e ao pacote de ajuste fiscal divulgado pelo ministro Fernando Haddad, da Fazenda. Com a possibilidade de serem alteradas regalias atualmente privativas dos militares, a Força se incomodou e foi à luta e, o que é pior, o fez com aval da alta cúpula, incluindo o Comandante da Marinha Almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen, segundo informação divulgada pelo site UOL. Se a informação for correta, o vídeo vai além do mero equívoco ou da defesa de privilégios. Ele expressa um desafio da Marinha do Brasil à iniciativa do governo federal de fazer com que as Forças Armadas colaborem com os cortes de gastos públicos, assim como os demais trabalhadores brasileiros. O vídeo aposta na ironia, mostrando a vida dos marinheiros como muito difícil e a vida dos cidadãos brasileiros em geral como muito prazerosa e, diante desta diferença, lançando a pergunta: “Privilégios? Vem para a Marinha.”. Um desafio deste teor representa uma insubordinação com a autoridade maior do país e chefe supremo das Forças Armadas, ao qual os militares devem constitucionalmente obediência. Sobre privilégios, é bom que se lembre que, diferentemente dos paisanos brasileiros (ou seja, dos cidadãos não fardados), os militares de todas as Forças se aposentam com vencimentos integrais após 35 anos de trabalho sem idade mínima; os paisanos só podem se aposentar após 35 anos de contribuição (homens) ou 30 anos de contribuição (mulheres) se tiverem 65 anos de vida (homens) ou 62 anos (mulheres). Além disso, os militares mantêm pensões integrais para seus dependentes e, pasmem, também para “mortos vivos” - militares afastados por irregularidades que são considerados mortos para que suas “viúvas” e seus “filhos órfãos” (e ele próprio, claro, já que permanece vivo) continuem a receber seus soldos (até o salário de militar tem outro nome!). Privilégio como este só se assemelha ao dos magistrados que, se punidos por irregularidades na aplicação das leis e sentenças proferidas, são aposentados com vencimentos integrais! Diferentemente dos paisanos, a contribuição previdenciária dos militares de todas as Forças atualmente é de 10,5% do soldo, enquanto a dos trabalhadores assalariados civis chega a 14% do salário e a 20% dos vencimentos dos autônomos e entre os servidores públicos federais alcança até 22%. Diferentemente dos paisanos, que precisam recorrer ao SUS ou a convênios particulares, os oficiais e seus dependentes têm direito a assistência médica, hospitalar, odontológica, psicológica e social ao custo de 3,5% do soldo, o que lhes garante acesso a uma rede hospitalar privativa e de uso vedado aos civis e a clínicas e hospitais conveniados. Têm também uma rede escolar própria e hotéis de trânsito, que servem para as atividades de serviço e para as de lazer extensivas aos seus familiares. Diferentemente dos paisanos, os militares têm moradia gratuita ou recebem indenização dos valores gastos com habitação, em caso de não possuírem residência própria. Recentemente foi divulgado o valor de 3,6 milhões de reais  para a construção de uma casa para um oficial do Exército em Brasília. O pacote anunciado por Fernando Haddad prevê que os militares passarão a se aposentar com vencimentos integrais “apenas” aos 55 anos, ainda que, cauteloso, o ministro, em nome do governo, tenha proposto que esta alteração só comece a vigorar em 2032. Enquanto isso não ocorre, em caso de aposentadoria haverá um pedágio de 9% sobre o tempo que faltar para o militar passar para a reserva. Destaque-se que parte dessas regalias foram obtidas durante o governo de Jair Messias Bolsonaro e o mais notável é que elas foram implantadas concomitantemente às reformas previdenciárias que retiraram direitos historicamente conquistados pelos trabalhadores civis brasileiros, sejam eles servidores públicos ou da iniciativa privada. Naquele momento, esses trabalhadores viram aumentados o tempo de serviço e a idade mínima para aposentadoria, bem como as alíquotas de contribuição previdenciária. Juntamente com a reforma previdenciária realizada por Bolsonaro, os militares de todas as Forças foram agraciados com aumentos salariais significativos, ao mesmo tempo em que os demais servidores públicos federais brasileiros (civis) foram privados de reajustes salariais durante todos os quatro anos de seu governo. Ofendidos pela “ameaça” de cortes de privilégios provinda do governo Lula, a Marinha divulgou o vídeo de 1 minuto e 15 segundos mostrando os contrastes entre a “boa vida” dos paisanos e a “vida dura” dos integrantes da Marinha. No vídeo, são alternadas atividades rotineiras e difíceis da vida dos marinheiros (notadamente dos Praças, ou seja, dos não oficiais) com as atividades prazerosas da vida dos paisanos civis. De acordo com o vídeo, enquanto os integrantes da Marinha “ralam” os civis paisanos vivem surfando, frequentando praias e festas. De acordo com a argumentação corrente entre os militares, as atividades por eles exercidas ocorrem em condições distintas das realizadas pelos civis, ou seja, pelos paisanos. Segundo a argumentação, não obstante eles arrisquem a vida para defender a Pátria, não lhes é garantido o direito à greve, os direitos políticos, de horas extras, de adicional de periculosidade etc., além disso, eles não se “aposentam”, mas se “reformam”, o que significa que eles passam para a reserva da Força a que serviram e podem ser reconvocados em caso de necessidade, sem pagamento adicional. A série de equívocos é gritante. Em primeiro lugar, em nenhum país democrático do mundo militares têm direitos políticos ou de organização para exercer pressão sobre o Poder Civil, seja salarial ou de qualquer natureza. Esta é uma necessidade para refrear o poder daqueles que detêm a força bélica e é a fórmula possível para mantê-los sob o controle da sociedade civil desarmada. Em segundo lugar, desde a Guerra contra o Paraguai (1864/70) o Brasil não se envolveu em nenhuma guerra externa, não obstante a participação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Segunda Guerra Mundial (1939/45) ao lado das Forças Aliadas, durante o período de agosto de 1943 a janeiro de 1945, e das Forças Armadas Brasileiras em operações internacionais de manutenção da paz patrocinadas pela ONU e na Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustha), de 2004 a 2017. Todas essas ações foram realizadas por militares da ativa. As grandes ações militares brasileiras ocorreram majoritariamente no interior do próprio país e contra cidadãos brasileiros – o que contraria as funções de quaisquer Forças Armadas de países democráticos, que existem para defender a Pátria e os compatriotas ou paisanos contra agressões externas, ficando as funções repressivas internas a cargo das forças policiais. Sem esgotar a lista, pode-se lembrar das ações militares contra os Cabanos (1832/35), os Farroupilhas (1835/45), os Praieiros (1848/50), os Muckers (1873/74), os sertanejos de Canudos (1896/97) ou, mais recentemente, os “subversivos” que se insurgiram contra o domínio dos próprios militares durante a ditadura militar (1964/1985), seja no extermínio dos combatentes das guerrilhas do Caparaó (1966/67) e do Araguaia (1972/74), seja na repressão, tortura, assassinato e “desaparecimento” de participantes das lutas (armadas ou não) de resistência democrática. Sem a existência de guerras externas há exatos 154 anos, os militares da “reserva” não são convocados para defender o território da Pátria há mais de um século, ou seja, desde o final da Guerra do Paraguai. Não obstante este fato, eles exerceram e exercem funções caracteristicamente civis ao longo deste longo período, seja em órgãos da administração direta do Estado ou em agências e empresas públicas, e sempre foram renumerados adicionalmente por essas atividades. A título de exemplo, relembre-se que o general Ernesto Geisel, que depois viria a ser o quarto ditador presidente, foi, antes, Presidente da Petrobrás, e durante o governo Bolsonaro entre 2 mil e 4 mil militares da ativa e da reserva exerceram funções tipicamente civis remuneradas adicionalmente. Além do “soldo” eles receberam “salários”! Os equívocos do vídeo do Dia dos Marinheiros são reveladores, além disso, de quão descolada da realidade é a visão que os militares (ao menos os da Marinha do Brasil) têm do país em que vivem e da população que deveriam defender de possíveis agressores externos. Será que os oficiais da Marinha do Brasil sabem como exercem suas funções profissionais e como vivem os/as trabalhadores da construção civil, os/as motoristas de caminhão ou de ônibus, os/as trabalhadores de aplicativos, os/as garis, os/as empregados domésticos, os/as professores, os/as agricultores, os/as médicos e demais profissionais da saúde, para ficarmos apenas em alguns poucos exemplos? Não se têm notícia de que eles vivam em festas, nas praias, bebendo ou praticando surf. Soa como escárnio alternar no vídeo as atividades profissionais dos marinheiros de baixa patente (já que os de alta patente raramente as exercem) às imagens de diversões de lazer de parte minoritária dos paisanos. Será crível que a Marinha do Brasil continua sendo tão elitista quanto foi até o final da Monarquia, quando reprimiu violentamente os marinheiros que participaram da Revolta da Chibata (1910)? Os marinheiros rasos, quase sempre negros, eram chicoteados como punição por faltas cometidas e foram duramente punidos quando se rebelaram contra tais práticas, mantidas mesmo após a Abolição da Escravatura. O conservadorismo da Marinha do Brasil é histórico. Ela foi a única Força Armada que se manteve fiel à Monarquia, em 1889. Foram oficiais da Marinha do Brasil que se insurgiram contra as medidas modernizadoras, ainda que autoritárias, adotadas pelos dois primeiros Presidentes da República brasileiros, Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Recentemente, foi o Comandante da Marinha do Brasil durante o governo Bolsonaro, o almirante Almir Garnier Santos, o único (até onde se sabe) dos três oficiais generais integrantes do Alto Comando das Forças Armadas que aderiu ao golpe tramado por Jair Messias Bolsonaro. Ao que parece, e o vídeo reforça esta ideia, o golpismo não se limitou a Garnier Santos. Pelo que se depreende do vídeo, adeptos da intentona fracassada do 8 de janeiro continuam ativos no interior e no comando daquela Força. Assista o vídeo, abaixo. https://youtu.be/wcliGmN-U_Y?si=dCBwqvLZS9rvi63C *Benedito Tadeu César é cientista político, doutor em Ciências Sociais, mestre em Antropologia Social, professor universitário aposentado e Coordenador Geral da Associação de Amigos do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito Foto da capa: Pintura retratando o NAe São Paulo como capitânia da Esquadra Brasileira Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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“90% do Mercado Financeiro Reprova Governo Lula; Haddad Recebe 41% de Aprovação”

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“90% do Mercado Financeiro Reprova Governo Lula; Haddad Recebe 41% de Aprovação”
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"Pacote de Corte de Gastos Desagrada: 58% do Mercado Consideram Nada Satisfatório e 42%, Pouco Satisfatório"   Reprovação ao Governo Lula Atinge 90% no Mercado Financeiro, Aponta Pesquisa A desaprovação ao governo Lula (PT) entre agentes do mercado financeiro aumentou significativamente, alcançando 90%, de acordo com uma pesquisa divulgada pela Quaest nesta quarta-feira (4). Em março, o índice de reprovação era de 26%. Apenas 3% dos entrevistados classificaram o governo como positivo, uma queda em relação aos 6% registrados na pesquisa anterior. Já 7% consideraram a gestão regular, contra 30% no último levantamento. O estudo foi realizado com 105 gestores, economistas, analistas e tomadores de decisão em fundos de investimento localizados em São Paulo e no Rio de Janeiro, entre 29 de novembro e 3 de dezembro. A margem de erro é de 3,4 pontos percentuais, e o levantamento foi encomendado pela Genial Investimentos. Especialistas indicam que os números refletem insatisfação com o recente pacote econômico do governo.   Reação do Mercado a Pacote de Gastos Impulsiona Reprovação ao Governo, Afirma Diretor da Quaest Segundo Felipe Nunes, diretor da Quaest, a forte alta na reprovação ao governo Lula reflete a reação do mercado financeiro ao pacote de corte de gastos apresentado na última semana. Entre os entrevistados, 86% acreditam que o presidente Lula está mais preocupado com sua popularidade do que com o equilíbrio das contas públicas, preocupação apontada por apenas 29%. A avaliação do Congresso também piorou, possivelmente devido à percepção de que a isenção de imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil pode ser aprovada, enquanto o aumento da tributação para rendas acima de R$ 50 mil mensalmente enfrenta maiores resistências. A pesquisa detalhou a percepção de gestores, economistas, analistas e tomadores de decisão sobre o desempenho do presidente e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no cenário econômico atual. Fonte: Quarst e Genial   Aprovação de Haddad Cai no Mercado, e Pacote Fiscal Recebe Críticas A avaliação positiva do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, caiu para 41% entre os agentes do mercado financeiro, uma queda de 9 pontos percentuais em relação a março (50%). Já a reprovação subiu de 12% para 24%, enquanto 35% consideram seu trabalho regular. A pesquisa também revelou que 61% acreditam que Haddad perdeu força política desde o início do mandato (eram 14% em março), enquanto 35% avaliam sua força como estável e apenas 4% enxergam um aumento. O pacote fiscal foi considerado insatisfatório por 58% dos entrevistados, enquanto 42% o classificaram como pouco satisfatório. Em resposta ao anúncio, 67% planejam ampliar investimentos no exterior, 30% manterão o atual nível e 3% pretendem reduzi-los. Quanto à isenção do imposto de renda para rendimentos até R$ 5 mil, 85% acreditam que a medida tende a prejudicar a economia brasileira, enquanto apenas 15% enxergam um impacto positivo. Por outro lado, 99% dos entrevistados aprovam o fim da morte ficta — regra que tributava pensões pagas por empresas no exterior. Fonte: G1     Novo Arcabouço Fiscal é Alvo de Desconfiança no Mercado O modelo de equilíbrio das contas públicas adotado no início do governo Lula (PT), em substituição ao teto de gastos da gestão de Michel Temer (MDB), enfrenta baixa credibilidade entre os agentes do mercado financeiro. Segundo a pesquisa, 58% consideram o novo arcabouço fiscal totalmente sem credibilidade, enquanto 42% o avaliam como pouco confiável.   Mercado Financieiro Avalia Economia e Congresso Nacional com Pessimismo Uma pesquisa revelou que 96% dos agentes do mercado financeiro acreditam que a política econômica do Brasil segue na direção errada, enquanto apenas 4% a consideram no rumo certo. As projeções para 2025 também são sombrias: 88% esperam piora na economia, 10% acreditam que permanecerá estável e apenas 2% apostam em melhora. Sobre a taxa de juros, atualmente em 10,75%, 66% dos entrevistados preveem um aumento de 0,75 ponto percentual, 17% projetam uma alta de 1 ponto e 15% estimam um acréscimo de 0,5 ponto. O desempenho do Congresso Nacional também foi avaliado negativamente. Para 41% dos entrevistados, ele é ruim (em comparação a 17% em novembro de 2023), 38% classificam como regular (antes 45%) e 21% consideram positivo (queda em relação aos 41% registrados anteriormente).     Com informações do G1. Foto de capa: Marcelo Camargo/Agência Brasil Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.    

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Tentativa de Auto Golpe na Coreia do Sul

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Tentativa de Auto Golpe na Coreia do Sul
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Presidente da Coreia do Sul declara lei marcial, mobiliza exército e oposição vota para anular medida. Yoon Suk-yeol suspendeu liberdades civis Segundo notícia publicada pela Folha de São Paulo, o presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, decretou lei marcial nesta terça (3), pegando o país de surpresa em meio a uma grave disputa com a oposição, que denunciou a ação como uma tentativa de golpe de Estado e aprovou moção parlamentar para anular a medida. Atividades políticas e liberdades civis foram banidas, militares tomaram as ruas de Seul e invadiram a Assembleia Nacional, começando a deixar o prédio após o voto contra a medida. Há milhares de pessoas na frente da sede do Legislativo protestando contra Yoon. É a primeira vez que a lei marcial é imposta no país asiático desde 1979, em meio a um dos um dos vários golpes da história sul-coreana. "Eu declaro lei marcial para proteger a livre República da Coreia da ameaça das forças comunistas da Coreia do Norte, para erradicar as desprezíveis forças antiestatais pró-Coreia do Norte que estão pilhando a liberdade e a felicidade do nosso povo, e para proteger a ordem constitucional", disse Yoon. Até aliados de Yoon, como o líder de seu partido, Han Dong-hoon, criticaram a ação. Ele disse que a lei marcial não deve ser respeitada porque é uma decisão "errada". Houve confrontos na frente da Assembleia Nacional e dentro do prédio, onde assessores parlamentares da oposição receberam soldados com jatos de extintores de incêndio. Blindados e helicópteros foram empregados pelos militares. Após muita confusão, mesmo com a presença militar, 190 dos 300 deputados do país conseguiram se reunir no prédio e aprovaram de forma unânime uma moção declarando a lei ilegal, já na madrugada de quarta (4, tarde de terça no Brasil). Ainda não há uma manifestação do Judiciário sobre a crise, mas a Constituição prevê que o Executivo respeite a decisão do Legislativo. Às 2h (14h em Brasília), redes de TV relataram que os militares na Assembleia começaram a deixar o prédio. Segundo o Comando de Lei Marcial, instituído por Yoon e com o chefe do Estado-Maior do Exército, general Park An-su, à frente, liberdades civis estão restritas. Todos que desrespeitaram regras poderão ser presos, segundo divulgou o Exército, e a as atividades políticas de partidos dentro e fora do Parlamento estão proibidas por ora. O comitê diz ter colocado a usualmente vibrante imprensa do país sob seu controle, mas não está claro como isso será imposto até aqui. Lei marcial geralmente é evocada em tempos de guerra, como na Ucrânia. Nela, poderes discricionários são passados para as Forças Armadas, com ou sem controle civil delas —no Brasil não há tal instrumento na Constituição. A rigor, Seul está num conflito congelado com Pyongyang desde o armistício que pôs fim a três anos de combate em 1953. Yoon, do conservador Partido do Poder do Povo, tem enfrentado resistência do Congresso, que é controlado desde abril deste ano pelos liberais do Partido Democrático —a agremiação oposicionista soma 170 dos 192 assentos contrários ao governo, que tem 108 deputados. A mais recente querela é sobre o orçamento do ano que vem, que adversários dizem ser uma cortina de fumaça para tirar foco de escândalos envolvendo aliados e até mesmo sua mulher, criticada por aceitar uma bolsa de luxo e acusada de manipular o mercado de ações. Para ter acessos à matéria compela, acesse a Folha de São Paulo de 03/12/204, edição eletrônica Foto da capa: O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, declara a lei marcial em pronunciamento na TV - Junt Yeon-je/AFP https://www.youtube.com/watch?v=XwzJqng1HQ0

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CORREIO POLÍTICO | A lealdade à democracia e a nossa tragédia

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CORREIO POLÍTICO | A lealdade à democracia e a nossa tragédia
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Por RUDOLFO LAGO* do Correio da Manhã Brasília Autores de Como as Democracias Morrem, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt retornaram com Como Salvar a Democracia, livro igualmente fundamental para entender os complicados tempos em que vivemos, no planeta inteiro. No nosso caso específico, ajuda a acender luzes sobre nossa tragédia particular. E não apenas no prefácio específico que escreveram para a edição brasileira, sobre o qual já falamos por aqui. Mas em toda a extensão da obra. Leitura durante esse período de férias, me socorro do livro para avaliar questões que emergiram depois da divulgação do impactante inquérito da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe no país, que imputa responsabilidade direta ao ex-presidente Jair Bolsonaro e outros. Brasil No prefácio à edição brasileira, naturalmente escrito antes que o relatório da PF fosse conhecido, Levistky e Ziblatt avaliam que o meio político do Brasil teria se saído melhor na defesa da democracia que o dos Estados Unidos, especialmente com relação ao Partido Repúblicano. Semileais Talvez tenha havido aí certa precipitação. Os autores apontam muito no segundo livro para o papel dos que são "semileais" à democracia. Aqueles que não apoiam declaradamente a ruína da democracia, mas também nada fazem, ou pouco fazem, para defendê-la. Colapso começa quando não se reconhece a derrota Contestação da derrota por Aécio foi primeiro esboço | Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil   Levitsky e Ziblatt apontam no livro para a existência de alguns compromissos básicos que precisam ser mantidos quando se é democrata. E um deles é o reconhecimento da derrota. Em democracias saudáveis, os grupos reconhecem quando não vencem, e procuram compreender as razões dessa derrota. Quando assim não agem, contestando as regras que até então sempre aceitaram somente porque ela deixou de favorecê-los abrem espaço para a ruína da democracia. É também aí que está a origem dos riscos brasileiros. Quando o PSDB contestou a vitória de Dilma Rousseff em 2014. primeiro esboço que radicalizou. Violência O segundo ponto que leva à ruína democrática é quando se começa a admitir o uso da violência. Nos EUA, levou à invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021. Aqui, à invasão dos prédios dos três poderes em 8 de janeiro de 2023. O próximo passo é a não condenação. Pano Os republicanos passaram pano quanto às responsabilidades pelo 6 de janeiro. Não permitiram uma investigação mais aprofundada. Por aqui, hoje se cobra dos partidos que fazem oposição ao atual governo uma posição mais clara sobre o relatório da PF. Risco "O comportamento semileal quase sempre parece benigno", escrevem. "Afinal, costuma ser adotado por políticos (…) que não participaram diretamente de qualquer ataque (...) à democracia". Mas alertam: "Trata-se, no entanto, de uma percepção profundamente equivocada". Conveniência "A história nos ensina que quando políticos tradicionais tomam o caminho mais conveniente da semilealdade, tolerando ou justificando extremistas antidemocráticos, estes se fortalecem, e uma democracia aparentemente sólida pode desabar sobre si mesma", concluem.   *Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congresso em Foco e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade Artigo originalmente publicado no Correio da Manhã   Foto de capa: Não aceitar o resultado eleitoral é o primeiro risco |Paulo Pinto/Agência Brasil Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

Economia

Cadê o corte nos juros?

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Cadê o corte nos juros?
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Por PAULO KLIASS*  Muitas vezes na política a sincronicidade de alguns acontecimentos pode ser fatal. O encadeamento recente de fatos, a partir da decisão do governo de anunciar a divulgação das medidas para resolver a suposta dificuldade na questão fiscal, terminou por escancarar os equívocos cometidos desde o começo do terceiro mandato na área econômica. Assim, de trapalhada em trapalhada, de concessão em concessão ao financismo, o governo revelou sua incapacidade em sair por cima da iniciativa política, justamente na semana em que o noticiário estava dominado pelas revelações dos crimes praticados por uma parte da elite das Forças Armadas em sua tentativa golpista em 2022 e mesmo no início de 2023. Após muito tempo de indefinição e indecisão, Lula parece ter se resolvido a não apresentar aquilo que seus assessores da área econômica tentavam empurrar como fato consumado goela abaixo do chefe. Desde o início do ano passado, uma série de assessores e secretários das pastas da Fazenda e do Planejamento anunciavam publicamente a suposta necessidade de serem promovidas medidas para conter as despesas de forma estrutural. Há poucas semanas, Fernando Hadad e Simone Tebet passaram a verbalizar, em nome do governo, tais intenções. Ambos foram explícitos na defesa do fim dos pisos constitucionais para saúde e educação, além da eliminação da paridade entre os benefícios previdenciários em relação ao valor do salário-mínimo. Uma loucura! À medida em que avançava o calendário, tudo indica que Lula tenha se dado conta dos riscos políticos envolvidos em tal aventura irresponsável que seus assessores lhe propunham. Assim, o formato do pacote fiscal que foi finalmente anunciado deixou de fora as mudanças constitucionais, que retirariam a segurança de conquistas que até o momento ainda não haviam sido retiradas da Constituição Federal nem mesmo pelos governos de Temer e Bolsonaro. Ocorre que a lógica de impor sacrifícios à grande maioria da população se mantém nas medidas apresentadas. A estratégia envolveu a separação do conjunto de proposições em 2 trilhas. De um lado, as medidas envolvendo as receitas e de outro lado, aquela destinadas às despesas. Tudo se justifica por uma verdadeira obsessão que acomete, ao longo dos últimos 2 anos, o Ministro da Fazenda. Além de ter convencido o Presidente da necessidade de uma lei complementar tratando do Novo Arcabouço Fiscal (NAF), Haddad também impôs a meta de zerar o déficit fiscal primário.   As armadilhas de Haddad: arcabouço e zerar o déficit E justamente por ter imposto tal armadilha de zerar o déficit ao governo a curto prazo é que ele está correndo atrás do tempo para propor medidas de corte de gastos a todo o custo. É bem verdade que Lula exigiu a inclusão de uma promessa antiga de elevar a isenção de Imposto de Renda (IR) para quem recebe até R$ 5.000. E Haddad buscou encontrar uma fórmula para compensar essa perda de arrecadação com uma intenção vaga de uma tributação de IR para quem recebesse acima de R$ 50 mil reais por mês. A intenção é boa, mas ainda não se conhecem os detalhes da medida e se haveria efetiva capacidade de promover a arrecadação desejada. De todo modo, tudo leva a crer que tais proposições só terão impacto econômico a partir de 2026, uma vez que os Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal não pretendem colocar o assunto em votação ainda em dezembro. Desta forma, as maldades passariam ter validade a partir de 1 de janeiro próximo, ao passo que as medidas que poderiam significar maior justiça tributária ficam para depois. A conhecida tática que muitos pais aplicam aos filhos - “na volta a gente compra”. De qualquer forma, o que temos para o momento são propostas que afetam os mais pobres, a exemplo da redução dos ganhos do abono salarial, o endurecimento das regras para o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e as mudanças nas regras do salário-mínimo para reduzir os ganhos reais acima da inflação. A pergunta que não quer calar é: por que Haddad insiste em deixar de lado qualquer inciativa que signifique buscar receita ou reduzir despesas envolvendo os setores do topo de nossa pirâmide da desigualdade? Para cumprir com a meta de zerar o déficit primário, bastaria editar uma Medida Provisória eliminando a aberração da isenção que faz com os beneficiários de lucros e dividendos não sejam atingidos pela tributação de IR, assim como acontece com qualquer assalariado ou aposentado/pensionista. Tal medida foi uma generosidade oferecida por Fernando Henrique Cardoso em 1995 e nenhum governo do PT fez nada esse respeito desde 1 de janeiro de 2003.   Pacote de maldades e explosão de juros Há vários estudos com estimativas a este respeito e todos parecem confluir para conclusões de que esta medida promoveria justiça tributária e asseguraria volume de receitas mais do que suficiente para compensar as perdas decorrentes da elevação do limite de isenção para R$ 5 mil. Outro aspecto seria voltar os holofotes para maior rubrica “gastadora” da estrutura de despesas orçamentárias. Refiro-me à conta de juros da dívida pública. E aqui retomo o início do artigo, comentando a sincronicidade das coisas da política. Isso porque no mesmo dia em que Haddad tentava convencer a sociedade a respeito da inevitabilidade de seu pacote e da justeza do mesmo, o Banco Central (BC) divulgava discretamente em suas páginas o Relatório Mensal das Estatísticas Fiscais. E os dados são impressionantes! Durante o mês de outubro, o Brasil bateu um novo recorde de volume mensal de pagamentos de juros. Foram extraídos do Orçamento Federal um total de R$ 111 bilhões para essa rubrica financeira para serem torrados em apenas 22 dias úteis. Como diria o Presidente Lula, nunca antes há História deste País se gastou tanto em um único intervalo mensal com o direcionamento de recurso públicos para os integrantes do topo da vergonhosa pirâmide da injustiça. A bem da verdade, no recente mês de junho outro recorde havia sido estabelecido, quando foi atingido o montante de R$ 95 bi. Mas, como a metodologia adotada desde sempre (e jamais modificada, nem mesmo com Lula ou Dilma) pela área econômica mantém a lógica do ajuste fiscal exclusivamente “primário”, isso significa deixar de lado do cálculo as despesas não-primárias - entenda-se, as despesas financeiras. Para esses gastos considerados como VIP, não há teto, nem limite, nem contingenciamento.   Juros: R$ 111 bi em outubro. Recorde atrás de recorde Ao analisar a série mais alongada das despesas com juros, chegamos ao volume impressionante de R$ 762 bi apenas para os 10 primeiros meses de 2024. A comparação com os valores do mesmo período janeiro/outubro para os anos anteriores revela que o rentismo permanece intocável e segue sendo privilegiado como sempre. Se a intenção for comparar os valores anuais, envolvendo a totalidade de gastos financeiros realizados em 12 meses, a realidade também segue gritando bem alto. Se considerarmos o período de novembro 2023 a outubro 2024, temos um novo recorde atingido. Foram R$ 869 bi gastos com o pagamento de juros da dívida pública, um crescimento de 21% em relação ao que foram gastos ao longo dos 12 meses do ano passado. É importante registrar que nenhuma outra rubrica orçamentária teve tamanha elevação de valores dispendidos. O gráfico abaixo exibe os números já corrigidos pela inflação para os últimos 4 exercícios. São valores crescentes, em um período em que os gastos da área social e dos investimentos públicos estavam submetidos ao Teto de Gastos de Temer e ao NAF de Haddad mais recentemente. Se a intenção for comparar os valores anuais, envolvendo a totalidade de gastos financeiros realizados em 12 meses, a realidade também segue gritando bem alto. Se considerarmos o período de novembro 2023 a outubro 2024, temos um novo recorde atingido. Foram R$ 869 bi gastos com o pagamento de juros da dívida pública, um crescimento de 21% em relação ao que foram gastos ao longo dos 12 meses do ano passado. É importante registrar que nenhuma outra rubrica orçamentária teve tamanha elevação de valores dispendidos. O gráfico abaixo exibe os números já corrigidos pela inflação para os últimos 4 exercícios. São valores crescentes, em um período em que os gastos da área social e dos investimentos públicos estavam submetidos ao Teto de Gastos de Temer e ao NAF de Haddad mais recentemente. Ora, parece mais do que evidente que os supostos problemas fiscais do Brasil não podem ser atribuídos àquilo que os grandes meios de comunicação chamam de “gastança” destinada aos setores do andar de baixo da sociedade. Afinal, em um único mês o governo gastou apenas com o pagamento de juros mais do que o triplo do que os R$ 31 bi que Haddad pretende economizar ao longo de todo o ano de 2025. E o que é pior: o discurso da Fazenda se assemelha à narrativa das elites da Faria Lima que buscam criminalizar as políticas sociais. Afinal, chamar de “fraude” algumas irregularidades que eventualmente podem ser encontradas em casos de pagamento do BPC é um completo despropósito. Esse benefício destina-se aos mais miseráveis de nossa sociedade. Trata-se de famílias em que um único membro recebe um salário-mínimo para sustentar 4 pessoas. Caso exista uma pessoa no núcleo familiar que seja portador de deficiência ou um idoso que nunca tenha contribuído para previdência social, a família faz jus à “fortuna” de um benefício de valor equivalente a um salário-mínimo.   Austeridade para os mais pobres e facilidades para os ricos Quem conhece minimamente a estrutura de nossas agências do INSS ou dos postos de assistência social conhece bem o drama vivido pelas famílias para levar as pessoas para fins de comprovação da deficiência, para passar por consulta de perícia médica ou mesmo para realizar a tal da prova de vida. Assim, eventuais dificuldades para cumprir com tais exigências são fácil e maldosamente qualificadas como fraude. No entanto, não se vê um esforço similar desenvolvido pelo governo para cobrar as verdadeiras fraudes bilionárias envolvidas nos conhecidos mecanismos de sonegação tributária. Estimativas do instrumento chamado de “sonegômetro”, organizado pelas entidades de servidores da Receita Federal, avaliam que o valor total da sonegação tributária em 2022 teria atingido mais de R$ 626 bi. A prática sistemática da austeridade fiscal remonta há muito tempo. Uma primeira tentativa de sistematização no ordenamento jurídico e de imposição de punição aos agentes públicos veio com a Lei de Responsabilidade Fiscal em 2000. Em seguida o Teto de Gastos de Temer e agora o NAF de Haddad. Ao longo de todo esse período tem imperado a lógica de concentrar o esforço fiscal exclusivamente sobre as contas de natureza social. Assim as próprias estatísticas divulgadas pela Secretaria do Tesouro Nacional nos informam de como foram deixadas de lado e beneficiadas as despesas financeiras. Entre janeiro de 1997 (início da série de informações de forma consolidada) e setembro de 2024 foram destinados R$ 10,1 trilhões para o pagamento de juros da dívida pública. Lula costuma chamar a atenção para o fato de que ele considera os valores alocados no orçamento para saúde e educação como investimento e não como despesa corrente. Seria o caso de também chamar a atenção para que seja alterado esse privilégio injustificável para o tratamento da despesa financeira. Enquanto houver austeridade fiscal imperando nas regras das finanças públicas, o dispêndio com juros não pode ficar sem controle, sem teto ou sem limite. Afinal ele é o pior gasto de todos: regressivo, parasita e concentrador de renda.     *Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal. Foto de capa: Divulgação Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.  

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