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Opinião

Jornalismo, cada vez mais necessário, mas em queda livre

Jornalismo, cada vez mais necessário, mas em queda livre

Artigo por RED
05/06/2023 05:30 • Atualizado em 07/06/2023 09:55
Jornalismo, cada vez mais necessário, mas em queda livre

De EDELBERTO BEHS*

Depois de sofrer pressões de todo tipo por parte do governo guatemalteco, o El Periódico fechou as portas em 12 de maio passado. Seu fundador e diretor José Rubén Zamora está preso, acusado de lavagem de dinheiro, sem qualquer comprovação. Anunciantes deixaram de publicar seus reclames no veículo de comunicação para evitar problemas com autoridades levando-o à falência comercial.

Por que Zamora está preso e o periódico deixou de circular? A última diretora do veículo, Julia Corado, dá a pista: “Nós denunciamos mais de 200 casos de corrupção do governo de (Alejandro) Giammattei”.

O consultor sobre liberdade de expressão, Carlos Lauría, constatou que governos autoritários adotam um padrão: jornalistas não são imputados por crimes vinculados à informação, manipulação, deturpação, “mas são acusações em geral fabricadas”, com a agravante de que fica difícil articular uma defesa para libelos tão complexos como espionagem, traição, influência estrangeira, delitos cibernéticos, terrorismo, falcatruas financeiras, desacato, sedição…

A ONG Repórteres Sem Fronteiras aponta, na Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa ao analisar o quadro nas Américas, o Haiti como um dos países mais perigosos para a atuação de jornalistas. A desestabilização provocada pela crescente influência de organizações criminosas também afeta o trabalho de jornalistas no Equador. No México, cartéis do tráfico atemorizam comunicadores.

Mesmo em países que historicamente estavam bem pontuados no levantamento da Repórteres Sem Fronteiras quanto à liberdade de expressão, retrocederam no último levantamento, no qual Venezuela, Cuba e Nicarágua aparecem com destaque negativo. Até mesmo no Canadá e na Guiana foram relatados casos de assédio digital, de modo especial contra mulheres jornalistas.

“Há um ambiente bastante adverso para o exercício do jornalismo, que não começa necessariamente com leis ou pressões diretas a jornalistas e meios de comunicação, mas com um clima que procura deslegitimar o trabalho”, em que a idoneidade ou a legitimidade de jornalistas são colocadas em dúvida em países da América Latina, arrola o diretor executivo da Fundação para a Liberdade de Imprensa (FLIP), Jonathan Bock.

Jornalistas não se debatem apenas com restrições à atividade e sofrem censura, mas também correm risco de vida. No ano passado foram assassinados 37 jornalistas nas Américas Central e do Sul, o que representou 55% dos casos no mundo. A impunidade é uma marca desses crimes. Segundo a Unesco, dos 891 jornalistas assassinados entre 2006 e 2021, apenas 13% encontraram justiça.

Talvez em nenhum outro período da história recente o jornalismo se mostra tão necessário, importante e fundamental na defesa dos direitos humanos, na promoção da cidadania, da paz e da democracia no continente como na atualidade. Se profissionais da imprensa são assassinados, se governos, milícias, gangues, matam ou perseguem jornalistas, é uma demonstração de que estão “incomodando” o poder, estão trazendo a público o que delinquentes querem manter debaixo do tapete. Lamentável o tratamento dado por gorilas de Maduro a profissionais da imprensa, em Brasília!

No entanto, a profissão está desprestigiada, mal paga, sobrecarregada, desgastada e… ameaçada. Quando a sociedade mais precisa do trabalho apurado, ético e responsável de jornalistas, esse ministério está em decadência, quando não em descrédito. Diminui a cada ano os terceiranistas candidatos a uma vaga aos cursos de Jornalismo.

No Brasil, então, depois da queda da exigência do diploma para o exercício profissional, vige o vale tudo. Qualquer pessoa pode ser “jornalista”. As próprias empresas de comunicação pressionaram para a exclusão do diploma, sob a perspectiva de que pagariam menos a seus empregados. Não calcularam o quanto perderam em apuração da informação, edição, reportagem…

Admitir que um trabalhador da imprensa que não tem curso superior na área tenha o mesmo preparo, condições éticas e estéticas de alguém que passou pelo ensino superior é um descalabro. Em outros países, onde não existe a exigência do diploma de curso de comunicação, o profissional de imprensa deve ter, contudo, um curso superior. Aqui, não. Quem perde é a cidadania.

Na passagem do Dia Nacional da Imprensa, em 1º de junho, a Federação Nacional dos Jornalistas emitiu mensagem defendendo a adoção do diploma de curso superior para o exercício da profissão. Também reconhece que o jornalismo, como atividade essencial à democracia, “foi esvaziado nos últimos anos pela falta de investimentos financeiros”.

Não é, pois, de espantar que a imprensa comercial entrou em parafuso com a dinâmica espalhada pela internet, com o surgimento de sites e portais informativos, muitos deles tocados por jornalistas profissionais que encontraram uma alternativa digna para o seguimento da sua vocação. Profetas do desespero já anunciaram a extinção de jornais e revistas impressas. Vejamos se vão sobrar impressoras…


*Professor, teólogo e jornalista.

Imagem em Pixabay.

As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.

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