CORRESPONDENTE POLÍTICO: Como os caciques aprisionaram as eleições

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Por RUDOLFO LAGO*, do Correio da Manhã

O advogado e ex-juiz eleitoral Márlon Reis não tem dúvidas. São muito poucos os eleitores brasileiros que compreendem como funciona o sistema proporcional com lista aberta a partir do qual elegemos os nossos deputados, estaduais, distritais e federais. Muito poucos compreendem que em boa parte das vezes votam em determinado candidato para eleger outro. Há, porém, um seleto grupo que sabe muito bem como tudo funciona. Tão bem que prevê com impressionante precisão quem será eleito. Esse seleto grupo é formado pelos caciques partidários. “Esses dirigentes excluíram o povo da escolha”, afirma Márlon, com segurança. ‘E essa é hoje a raiz dos nossos maiores problemas políticos”.

Não transparente

“É um sistema que não é transparente, mas que é totalmente controlado pelos dirigentes partidários”, resume Márlon Reis. Para Márlon, esse controle atingiu tal ponto que os mecanismos existentes de fiscalização na Justiça Eleitoral perderam a sua importância. Isso gera todas as demais distorções.

Verbas

Então, a partir desse controle quase absoluto do processo de eleição dos deputados, toda a discussão passa a girar em torno de distribuição de recursos financeiros. Fundo Partidário. Verbas de emendas parlamentares ao orçamento. Verbas de gabinete. O modelo virou uma usina de escândalos.

Jabuticaba

Márlon não é contrário ao sistema proporcional. “Ele é um grande avanço democrático”, afirma. Mas é totalmente contrário ao sistema proporcional brasileiro. Esse é uma jabuticaba. Nenhum outro país tem o sistema proporcional com lista aberta como é o brasileiro desde 1932.

Ficha Limpa

Com o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que integra, Márlon foi o idealizador da Lei da Ficha Limpa, um dos maiores avanços legais brasileiros dos últimos tempos. Avanços que tiveram grande recuo recentemente, quando o Congresso alterou pontos da lei reduzindo as possibilidades de inelegibilidade. O MCCE ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mudança

Assim, o MCCE tem uma proposta de mudança. Na verdade, ela foi elaborada ainda antes do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. “A partir daquele momento, congelamos esse movimento porque caímos na necessidade do controle de todos os problemas mais graves que vieram daquele episódio”. Agora, será retomada.

Dois turnos

O sistema proposto pelo MCCE tira a formação da lista das mãos dos caciques. Propõe a eleição para deputado em dois turnos. No primeiro turno, o eleitor votaria somente no partido. E esse voto formaria uma lista inicial de cada partido proporcionalmente ao número de votos obtido.

Decisão do eleitor

Então, os nomes dessas listas partidárias iniciais seriam submetidas ao eleitor em um segundo turno. E, nesse segundo turno, seria o eleitor, e não mais o cacique, quem decidiria quem tem mais votos e seria eleito. O MCCE já obteve um milhão de apoios ao projeto. Irá atrás agora dos outros 500 mil.

Ação tentará retomar a Ficha Limpa

Para além de contestações no texto, a ação ataca um ponto: o Senado modificou o texto que veio da Câmara, e ele não retornou para nova apreciação dos deputados. “Houve uma pressa para aprovar tudo a tempo de valer nas próximas eleições que vai custar caro”, disse Márlon ao Correio Político. “Mas a verdade é que não vamos conseguir corrigir o atual quadro de escândalo de desvio de verbas públicas de emendas parlamentares e outros desmandos sem mexer no sistema eleitoral”, diz ele. E esse deverá ser o próximo passo do MCCE.

“Me dá 10 mil votos”

“Você me dá 10 mil votos que eu te dou uma verba”. Essa frase resume como se dão os acertos dos caciques com prefeitos e outras autoridades. É assim que esses caciques vão tendo o controle absoluto das suas listas partidárias, sabendo com grande grau de precisão quem elegerão em cada estado. “Elegemos pessoas em um modelo extremamente caótico”, diz Márlon Reis.


*Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congreso e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade.

Publicado originalmente no Correio da Manhã.

Foto de capa: Márlon: “Eleitor está excluído do processo” | Divulgação

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