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Filmes de Janeiro
Filmes de Janeiro
Por LÉA MARIA AARÃO REIS*
Depois da pequena temporada de fim de ano em que as plataformas inundam o mercado com a exibição de produções medíocres e blockbusters modelo-do-passado – hoje reciclados com a ajuda da Inteligência Artificial e de outros efeitos visuais –, a seguir, em janeiro, o quadro deve se alterar para melhor. Pelo menos é o que anunciam plataformas e exibidoras ao prometerem estreias de qualidade que devem seguir também os resultados de filmes superpremiados para turbinar e liberar produções represadas até aqui.
De olho em dois filmes que logo no começo do ano devem chegar, primeiro, certamente, aos nossos cinemas. Um, com cenário no Camboja do ano de 1978, é a coprodução francesa Rendez-vous avec Pol Pot, dirigida por Rithy Panh. O outro é o espanhol Redenção, de Iciar Bollain, baseado no episódio real do atentado ao líder político Juan Maria Jáuregui, morto em 2000 por um grupo do ETA, o partido de esquerda que ainda praticava na época a luta armada pela independência total do País Basco, região situada entre a Espanha e a França.
O primeiro é inspirado no livro When the War Was Over: Cambodia and the Khmer Rouge Revolution, de Elizabeth Becker. Estreou no Festival de Cannes deste ano e entra em cartaz aqui no dia 2 de janeiro. A trama do filme segue três jornalistas franceses convidados pelo Khmer Vermelho para participarem de uma entrevista exclusiva com o sanguinário líder Pol Pot, do então Kampuchea Democrático, como se chamava o Camboja em 1978. Na época, o Vietnã ameaçava invadir o país, cuja economia se encontrava devastada, e o regime de terror precisava de uma vigorosa propaganda positiva no chamado “ocidente” para sobreviver.
Pol Pot entrava em pleno declínio após cometer comprovado genocídio contra seu próprio povo durante três anos. Cerca de dois milhões de cambojanos já tinham morrido e, pesquisando aqui e ali, o grupo começou a conhecer a verdade do regime de terror em que o país vivia. A bela imagem nacional pretendida pelo ditador começou a desmoronar diante dos jornalistas.
O espanhol Redenção mostra a séria fissura que começava a atingir o grupo do ETA, no ano de 2000, com muitos de seus integrantes pretendendo não continuar defendendo suas ideias através da luta armada e assumindo negociações com o sistema vigente, mas sempre em oposição a ele. Era o embrião do Partido Socialista Obrero Español (PSOE), de centro-esquerda, que se encontra no poder até hoje.
Em resumo, a trama de Redenção é a trajetória da dona de casa Maixabel Lasa, mãe da jovem Maria, que perde o marido, Juan Maria Jáuregui, em um atentado. Ela muda sua vida com o choque da perda e se transforma em famosa militante. Onze anos depois do acontecimento, através de uma ONG de assistência a prisioneiros políticos, Maixabel recebe o pedido de dois homens, em momentos diferentes, participantes do atentado e assassinato de Juan, para encontrá-la na penitenciária de Nanclares de La Oca, onde cumpriam longas penas. Maixabel aceita encontrar os dois, que então já haviam rompido com o grupo do ETA, seus companheiros na penitenciária, que permaneciam partidários da luta armada.
“Todos merecem uma segunda chance”, dizia publicamente Maixabel. E acrescentava: “Quero sim encontrá-los. Estou ligada a essas pessoas até a morte”. E seus amigos comentavam: “Maixabel não se transformou em alguém que odeia”.
Sobre Redenção ainda há o que falar e o filme suscitará muitos debates aqui, quando estrear. Não se trata de um filme que prega a anistia nem um perdão impossível cristão. É um bom filme, com mais um emocionante trabalho da atriz Blanca Portillo, de Volver, de Almodóvar. Trata da não violência e da paz da qual estamos tão precisados nesse momento. Estreia no dia 9 de janeiro.
*Léa Maria Aarão Reis é jornalista.
Ilustração de capa: Marcos Diniz
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