Opinião
Uma ministra para a saúde do Brasil
Uma ministra para a saúde do Brasil
De ISABEL LUSTOSA*
Depois dos anos de angústia e medo em que os destinos do Brasil entregue às mãos de um governo sem qualquer empatia com o sofrimento e as dificuldades do povo brasileiro, foi com verdadeira emoção que recebemos a notícia que o Ministério da Saúde teria como titular Nísia Verônica Trindade Lima.
Emoção provocada pela certeza de que essa grande especialista em saúde coletiva do Brasil; profunda conhecedora das políticas de saúde implementadas desde o começo da nossa história republicana; uma mulher, enfim, que soma ao elevado brilho intelectual uma notável capacidade de gestão, seria a grande chance de salvação da saúde dos brasileiros.
Foi uma notícia que nos encheu de esperança, pois conhecíamos a sua firmeza de caráter e a sua bravura experimentada em tantas batalhas à frente da Fundação Oswaldo Cruz que presidiu por oitos anos difíceis, mantendo a integridade e os propósitos que orientam essa instituição centenária.
Só conhecendo os problemas do Brasil e dos brasileiros, em sua diversidade e complexidade é possível traçar uma política que, de fato aponte para a solução dos problemas que só se agravaram durante os anos dos governos Temer/Bolsonaro.
O Ministério da Saúde ficou então entregue a interesses mesquinhos, indiferentes e até mesmo perversos ao especular com recursos que deveriam ser destinados aos doentes e ao desguarnecer as áreas vitais de saúde coletiva como o Mais Médicos que levara atendimento às populações mais isoladas.
Uma política de saúde nacional, no estado em que o Ministério da Saúde se encontrava naquele momento, exigia a produção de um diagnóstico profundo do amplo espectro de problemas que abrangem suas funções.
Esses problemas são objeto da área dedicada à saúde coletiva, na qual Nísia vem trabalhando desde seu ingresso nos quadros da FIOCRUZ.
Uma política de saúde coletiva carece de uma ‘estratégia’ para ser compreendida e implementada, implicando numa relação de interdisciplinaridade entre vários campos do conhecimento.
Trata-se de um tema complexo para o qual nenhuma disciplina específica tem suficiente resposta.
Desde o final da Segunda Guerra Mundial, antropólogos e sociólogos passaram a integrar programas de saúde em todo o mundo.
Consolidou-se desde então o entendimento de que o êxito dos programas de saúde dependeria do concurso de cientistas sociais.
A ausência de estudos socioantropológicos bem fundamentados e, quando eles eram realizados, de sua não incorporação ao processo de definição de programas de saúde está na origem da permanência de problemas sanitários que desde sempre atormentam o Brasil.
Em artigo acadêmico publicado em 2022, Nísia já recomendava que ao lado do direito universal à saúde, fosse estimulado “o desenvolvimento consistente de um sistema de ciência, tecnologia e inovações” e que fossem enfrentadas as questões ambientais em seu impacto sobre a saúde das pessoas.
A seu ver, muitas doenças poderiam ser prevenidas pelos avanços tecnológicos, pela universalização do saneamento básico e, particularmente, pelo desenvolvimento de antibióticos e vacinas.
Segundo a ministra, o conhecimento da doença requer, além de análises especializadas sobre o vírus, o estudo do ecossistema de transmissão, no qual variáveis sociais têm importância acentuada.
Uma política voltada para a saúde coletiva não pode prescindir da atenção primária como a principal fonte de acesso para cuidados integrais, envolvendo prevenção, diagnóstico, tratamento e cuidados paliativos no SUS, ideal que sempre orientou o pensamento de Nísia Trindade.
As ações conduzidas pela atual ministra apontam no sentido da integração das informações de saúde disponíveis e bancos de dados de diferentes fontes, garantindo um monitoramento permanente das ameaças à saúde pública.
Em parceria com o Ministério da Educação, vêm sendo articuladas políticas para alinhar a formação técnica, graduação, residência e pós-graduação de acordo com as necessidades do sistema de saúde.
Também foi criado uma Secretaria para desenvolver competências em tecnologia digital para toda a força de trabalho da saúde.
O trabalho da FIOCRUZ, órgão do Ministério da Saúde inclui o fortalecimento de políticas para o aumento da produção farmacológica nacional, reduzindo a dependência externa.
O papel insubstituível do Estado no enfrentamento da pandemia reforçou a consciência da interdependência social motivada pelas doenças transmissíveis.
Com isto um conjunto de ações partem da premissa de que ciência, tecnologia e inovação em saúde sejam reconhecidas como parte constitutiva e crucial para o desenvolvimento socioeconômico sustentado do País.
Como diz Nísia no artigo acima citado: essas medidas devem combinar “poder de compra do Estado, capacidade de transferência tecnológica e acesso aos produtos por meio do Sistema Único de Saúde (SUS)”.
Com uma visão tão clara e abrangente do que o Brasil precisa para enfrentar a curto, médio e longo prazo os problemas da saúde, Nísia Trindade é o que de melhor a sociedade brasileira produziu em termos de quadros para ocupar essa função.
Ao longo de sua carreira, ela construiu uma imagem de competência e seriedade reconhecida em organismos internacionais.
Ela impõe respeito e qualifica a administração pública brasileira diante do mundo em um momento em que, os problemas da saúde podem ser ainda mais agravados se o Ministério voltar a ser conduzido por interesses mesquinhos que tantos danos já causaram. É contra suas sequelas que Nísia trava uma luta sem quartel para a qual precisa do apoio e da ajuda de todos os brasileiros.
*Cientista política/Social do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.
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