Opinião
O custo ambiental das guerras atuais – e da intensificação das disputas por bens naturais
O custo ambiental das guerras atuais – e da intensificação das disputas por bens naturais
Por WALTER MORALES ARAGÃO*
As guerras da atualidade (os cerca de vinte conflitos internacionais ainda sem solução, conforme levantamentos por ocasião do início da guerra na Ucrânia, este ano) têm uma dimensão pouco tratada pela grande mídia comercial: a destruição ambiental imensa que causam, além de toda a desgraça humanitária inerente.
Movidas a combustível fóssil ou nuclear e muitas vezes causadas por disputas de jazidas destes insumos, guerras como a movida pela OTAN na Ucrânia contra a Rússia – basicamente para cortar o fornecimento de gás russo à Alemanha e impedir essa iniciativa de integração eurasiana – evidenciam a disputa por jazidas ou estruturas de transporte (gasodutos, portos, rotas marítimas). A Ucrânia, segundo maior país da Europa e possuidor de terras agrícolas excelentes, começou a reprimir a minoria russa do leste do país desde o golpe de 2014 contra o governo eleito de Yanukovich. E cortou o suprimento de água da Criméia após a adesão desta região à Federação Russa no mesmo ano. São exemplos ainda, entre outras, as agressões da Arábia Saudita ao Iemên e ao Bahrein; a presença militar dos EUA em Cuba, no Iraque e na Síria ( de onde os governos locais reconhecidos já solicitaram há tempos a retirada das tropas estadunidenses); as provocações dos Estados Unidos à China no estreito de Málaga, no Mar do Sul da China e no canal de Taiwan; a divisão do Sudão; os ataques de Israel à Síria e o prolongado bloqueio à Faixa de Gaza, incluídas as disputas pela água doce do rio Jordão, da Mesopotâmia e das nascentes nas Colinas de Golan. As armas químicas usadas em massa na Guerra do Vietnã e as bombas atômicas perdidas no acidente aéreo de Palomares, no litoral da Espanha, são exemplos no passado recente, dos perigos advindos da manutenção de estoques, do transporte e do próprio emprego deste tipo de armamento altamente poluente. E ainda há ogivas nucleares dos EUA na Europa, em bases na Espanha, na Itália e na Alemanha – sem esquecer-se as cerca de 250 ogivas, não declaradas, mantidas por Israel.
Além das destruições intencionais, dos acidentes e/ou danos colaterais às infra-estruturas (os russos estão queimando agora na Sibéria o gás que a OTAN os impediu de levar à Alemanha – o que piora enormemente o aquecimento global – e são lembradas as imagens dos poços petrolíferos iraquianos que arderam por meses após a invasão estadunidense de 2003), tem-se o gasto imenso e adicional do uso de combustíveis pelas próprias máquinas de guerra em movimento. Tanques, aviões, submarinos, navios e caminhões militares em regra gastam muito mais combustível do que seus similares civis para percorrer a mesma distância. É outro adendo expressivo ao aquecimento global, o qual deveria ser diminuído com afinco neste momento e não intensificado como é o caso.
A destruição dos ambientes naturais e construídos, o desperdício e o sofrimento humano adicional causados tornam, portanto, as guerras atuais verdadeiros atos de barbárie também em termos ambientais, além do horror civilizatório implícito em todas as guerras. O que é ilustrado no aumento massivo das migrações em decorrência das guerras – as quais se somam aos ditos exilados ambientais, que fogem das regiões atingidas pelas mudanças climáticas extremas.
Esta interface do avanço furioso que o capitalismo mundial em crise realiza atualmente sobre os recursos naturais, a expressa pelo belicismo, lança também uma perspectiva alternativa às políticas governamentais brasileiras, privatistas ou permissivas do saque às riquezas naturais: as queimadas na Amazônia, no Cerrado e no Pampa e as privatizações anunciadas dos serviços públicos de água no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre não seriam, por outros meios e vistas deste ângulo, verdadeiras ações de guerra de rapina sobre os recursos do povo brasileiro, gaúcho e porto-alegrense? As empresas privadas que eventualmente assumam este serviço essencial (que talvez tenha as tarifas dolarizadas, como a gasolina atualmente, para acompanhar o “mercado internacional”) irão fazer os mesmos controles rigorosos para detecção de contaminantes químicos ou bacteriológicos, os quais são realizados hoje pelos serviços públicos? Ou as normas sanitárias serão rapidamente alargadas para viabilizar os negócios, como aconteceu na Argentina após a privatização da água nos anos 90? Quem vê o desmatamento triplicando na Amazônia brasileira agora no período eleitoral, percebe que ofensivas também ocorrem neste nosso caso de guerra não declarada à preservação do meio ambiente e ao direito ambiental do povo brasileiro.
*servidor federal, doutor em planejamento urbano e regional pela UFRGS e membro do GRETA – Grupo de Estudos Temáticos em Temas Ambientais.
Imagem em Pixabay.
As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.
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