Por ALEXANDRE CRUZ*
Recentemente, a acusação de violência doméstica contra o ex-presidente da Argentina, Alberto Fernández, trouxe à tona um debate complexo e sensível sobre a política, a moralidade e o oportunismo. Fernández, conhecido por sua gestão progressista e pelo fortalecimento das políticas de gênero, como a criação do Ministério das Mulheres, Gênero e Diversidade e a despenalização do aborto, agora enfrenta sérias alegações de violência física e psicológica contra sua ex-mulher. Este episódio expõe não apenas a fragilidade das figuras públicas diante das acusações, mas também a hipocrisia que permeia o campo político.
Fernández se defende alegando que sua ex-mulher está em um estado psicológico debilitado e que sofre de alcoolismo, uma resposta que, à primeira vista, segue o clássico manual de defesa dos acusados de violência doméstica: negação, vitimismo e contra-ataque.
Enquanto a investigação está apenas no início, é inegável que as manchetes já estão sendo usadas como combustível para os debates políticos, expondo a hipocrisia de muitos atores no cenário político.
No campo da direita, a situação é um reflexo claro de oportunismo barato. A direita, que historicamente minimizou a violência de gênero e frequentemente se mostrou indiferente aos direitos das mulheres, agora se apodera do caso para atacar seus adversários políticos. A ironia é palpável: aqueles que passam anos desdenhando das causas feministas e deboche da luta contra a violência de gênero estão agora se colocando como paladinos da moralidade, não por convicção, mas por conveniência política. Esses mesmos atores políticos nunca se importaram genuinamente com os direitos das mulheres e a promoção da igualdade, mas são rápidos em explorar qualquer fraqueza de seus oponentes para ganhar capital político.
Por outro lado, no campo da esquerda, o caso de Fernández traz à tona um problema igualmente preocupante: a exploração da causa feminina como uma ferramenta eleitoral. Muitos líderes e partidos de esquerda, que demonstram publicamente seu apoio às questões de gênero, podem estar mais interessados em garantir votos do que em promover mudanças reais e profundas. A luta das mulheres e a busca por justiça não podem ser reduzidas a uma estratégia eleitoral, e casos como o de Fernández revelam a necessidade urgente de uma abordagem mais autêntica e consistente no tratamento das questões de gênero.
Graças à luta incessante das mulheres e à crescente visibilidade das questões de gênero, casos de violência doméstica estão finalmente ganhando a atenção que merecem. No entanto, é crucial que essa atenção não se converta em um espetáculo político. A verdadeira justiça e a proteção das vítimas devem prevalecer sobre a hipocrisia política e o oportunismo.
Enquanto a investigação de Alberto Fernández avança, é imperativo que o debate se concentre na busca pela verdade e na proteção dos direitos das vítimas, longe das manobras políticas e da exploração oportunista. O caso não deve ser usado como um truque para ganhar vantagem política, mas como uma oportunidade para reforçar o compromisso com a justiça e a igualdade de gênero. É hora de separar a moralidade política da retórica e de avançar em direção a uma sociedade mais justa e igualitária para todos.
*Alexandre Cruz – jornalista político.
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