Por J. CARLOS DE ASSIS*
Não estou brincando quando sugiro que o Brasil faça um acordo de segurança recíproca com outros países do BRICS, notadamente Rússia e China. Ninguém sabe até onde vai a paranoia de Donald Trump. Ele apelou para a guerra tarifária a fim de sujeitar o mundo a seus caprichos hegemônicos, mas, diante do evidente fracasso dessa estratégia, e sua falta de escrúpulos em violar a soberania de países que resistem a obedecer a suas ordens, pode recorrer à velha prática norte-americana de intervenção militar direta para forçar a rendição deles.
O que pode barrar Trump na era nuclear é se defrontar com outro país também nuclearizado. O Brasil renunciou a construir a bomba atômica há décadas, e inseriu esse compromisso em sua Constituição. Portanto, não tem, sozinho, poder de dissuasão diante de um louco como o presidente norte-americano. O que pode defendê-lo de uma intervenção militar convencional, com o propósito de apoiar golpistas como Bolsonaro, é um pacto de defesa mútua que implique o risco do confronto nuclear direto com superpotências aliadas do País.
A dissuasão nuclear funcionou muito bem na Guerra Fria. De certa forma, está funcionando também agora, já que o conflito na Ucrânia não se tornou, e provavelmente não se tornará, uma Terceira Guerra Mundial generalizada. Caracteriza-se, sim, como uma guerra “por procuração”, limitada, entre Estados Unidos, seus vassalos europeus, e Rússia. A dissuasão também funcionou na medida em que Joe Biden não teve coragem de levar avante seu propósito de “destruir a Rússia”, conforme disse ao presidente Lula que era preciso fazer.
Portanto, temos que buscar nosso guarda-chuva nuclear entre parceiros estratégicos, já que não construímos o nosso. Será mais eficaz e menos oneroso. A Organização de um Tratado do Atlântico Sul, similar à Organização do Tratado do Atlântico Norte, com que os Estados Unidos reuniram os países subalternos da Europa para confrontar uma suposta ameaça russa, nos colocaria ao abrigo de qualquer ameaça vinda de líderes tresloucados norte-americanos, como Donald Trump. Não seria para fazer guerra, mas para garantir a paz.
O Irã tem todo o direito de tentar fazer a bomba atômica, pois Israel, seu inimigo histórico, a tem. Se os dois países estivessem em paridade no campo nuclear, a busca da paz seria mais fácil e um imperativo comum. Mas Teerã, sem a bomba, se tornou um refém permanente de Israel que, a qualquer hora e em qualquer tempo, pode atacá-la, como acabou de acontecer. Isso, sem medo de retaliação, usando seu forte aparato militar convencional, um dos maiores do mundo. É fato que Índia e Paquistão, nuclearizados, estão sujeitos a escaramuças militares. Porém, até hoje, sem maiores consequências. É que a dissuasão funciona.
Essas questões colocam no epicentro das preocupações internacionais o papel que simples indivíduos, pela força da demagogia e do dinheiro, exercem postos de responsabilidade em países que possuem arsenais nucleares. É aí que alguma dissuasão interna, somada à externa, deveria desempenhar uma ação moderadora. Porém, quando se toma por base a situação atual norte-americana, é difícil acreditar que seus cidadãos, elegendo Trump, tenham tido plena consciência do risco em que estavam lançando o planeta, não só na área militar, mas inclusive na área ambiental. Parecem analfabetos desinformados.
No primeiro mandato, Trump se retirou do Acordo de Paris, fato que repetiu agora. Antes, não havia escondido suas intenções contra imigrantes, que cumpre com evidente desprezo pelos direitos humanos, muitas vezes esmagando direitos constitucionais do próprio povo norte-americano. O estrago que está fazendo no setor de saúde não tem paralelo histórico. Nesse contexto, não surpreende a bagunça que está fazendo na economia mundial, com suas iniciativas unilaterais no campo das tarifas de importação, assim como a impertinência, no campo político, com que trata países soberanos como o Brasil e seu Presidente.
A esperança é que, em algum momento, diante dos estragos extremos que o Presidente está provocando em seu próprio País,o povo veja nisso uma espécie de pedagogia da realidade, e tome iniciativas para removê-lo da Casa Branca. Não será preciso esperar por outra eleição presidencial. As parciais, em fins de 2026, caso os eleitores exerçam seu direito de voto com o mínimo de consciência crítica, poderão remover do Congresso parte da maioria com que Trump mantém hoje sua liderança interna. Aí fica aberto o caminho do impeachment, pela força do voto contra a força do dinheiro dos comparsas bilionários de Trump.
Uma derrota fragorosa do Partido Republicano, que se pode esperar no próximo pleito, terá repercussões mundiais extremamente positivas, especialmente pelo que significará no impedimento do avanço da direita e da extrema direita no planeta. No Brasil, em especial, isso implicará o sepultamento definitivo do bolsonarismo, já que terá seu líder interno na cadeia, e o apoio externo enfraquecido pelo inexorável fracasso de Trump.
Tudo isso se dará no contexto de crises políticas domésticas sem precedentes, provocadas sobretudo pela cobiça do Congresso em fazer prevalecer os interesses pessoais de deputados e senadores sobre os interesses do povo. Com a competente vigilância do ministro Flávio Dino, e as investigações rigorosas da Polícia Federal, muitos deputados corruptos, algumas dezenas deles já indiciados por manipulação de emendas parlamentares, poderão parar na cadeia antes de irem para as urnas. Revoltados, voltam-se contra o Governo, provocando crises falsas entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Quem paga a conta, no fim, é o povo!
Para afastar de vez a ameaça fascista o País deve se dedicar, em 2026, a mobilizar a opinião pública na busca de medidas concretas para atacar os principais problemas que afetam o povo, principalmente o povo pobre. Nosso lema, no âmbito do movimento Vamos Fazer o Brasil Grande de Vez, será apontar, como metas políticas prioritárias, garantias reais e não demagógicas de trabalho, casa, comida, roupas, saúde e educação para todos. Nessa altura, já estará em pleno movimento o instrumento a ser usado para assegurar a conquista dessas metas, a saber, os arranjos produtivos locais, regionais e vocacionais.
Acredito, assim, que, a despeito de todas as crises, 2026 venha a ser o ano da verdade. O realismo objetivo dos arranjos produtivos prevalecerá sobre a demagogia dos que pregam o ódio e a mentira em nome de ideologias ultrapassadas. Uma vez provavelmente deposto e sem os privilégios presidenciais que até aqui o livraram da cadeia , Trump terá o mesmo destino de Bolsonaro, e os dois poderão curtir, juntos, seus sonhos imperiais de dominar o Brasil e o mundo na base de ataques à democracia e aos direitos humanos, e da defesa de golpes de Estado.
*J. Carlos de Assis é jornalista, economista, doutor em Engenharia de Produção, professor aposentado de Economia Política da UEPB, e atualmente economista chefe do Grupo Videirainvest-Agroviva e editor chefe do jornal online “Tribuna da Imprensa”, a ser relançado brevemente.
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