Soberania aqui e acolá

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Por NUBIA SILVEIRA*

Soberania significa o direito das nações de continuarem sendo livres, decidirem sobre seus próprios rumos políticos e econômicos e terem seus direitos respeitados internacionalmente. No Brasil, no entanto, a soberania é combatida pela oposição, que a coloca na conta de campanha eleitoral. São personagens daqui, que defendem a soberania de acolá. Vejamos: Chris Pavlovski, CEO da plataforma Rumble, festeja a decisão da Justiça americana que “decidiu rapidamente que as ordens de (Alexandre de) Moraes não têm força legal nos Estados Unidos”. Em seu artigo publicado na Folha de S. Paulo, no último dia 7, Pavlovski justifica o resultado da ação impetrada pela Rumble e pela Trump Media and Technology, dona da Truth Social, do presidente norte-americano: “As ações do ministro Moraes não são apenas ilegais—elas são um ataque direto à soberania americana. A ideia de que uma autoridade estrangeira dite o que os americanos possam dizer, ouvir ou postar em plataformas baseadas nos EUA viola todos os princípios da Primeira Emenda”. Discurso apoiado pelos defensores brasileiros da soberania norte-americana e não de sua pátria.

Me questiono: se os Estados Unidos podem declarar que as empresas norte-americanas, sediadas no Brasil, não devem obedecer as leis brasileiras, o que é visto como um ataque à sua soberania, por que o Brasil deve aceitar de cabeça baixa a intervenção do governo Trump na política brasileira? Por que a soberania vale para os norte-americanos e não vale para nós? Por que o filho Zero Três do ex-presidente apoia a soberania alheia e não da sua pátria, que segundo a família Bolsonaro, estaria “acima de tudo”?

Se o governo brasileiro fala em soberania e em defender as instituições brasileiras de ataques estrangeiros, os bajuladores do mito (?) logo acusam o presidente Lula de estar cutucando Trump e, portanto, colocando o país em perigo. Esquecem que, sob a orientação do pai, o filho deputado desfila por gabinetes da administração Trump e do Capitólio implorando por sanções contra o Brasil. A cada vitória contra nossa soberania, ele posta mensagens em suas redes sociais se vangloriando de ter sido o responsável pela sanção da hora. Aproveita para fazer ameaças às autoridades e aos seus próprios eleitores: se o STF não encerrar o processo contra o pai, ele vai “dobrar a aposta”. Ou seja, influenciará seus amigos além-fronteiras para que estrangulem a economia e a política brasileiras como já fizeram com Cuba e outros países.

O Zero Um afirmou, na sexta-feira, 15, que o Brasil terá um destino trágico se seu pai não for candidato em 2026 (e, provavelmente, também, se não for eleito). A consequência trágica será, segundo o senador, o não reconhecimento do resultado das eleições brasileiras pelo governo norte-americano. Esta ameaça traz subentendida a possibilidade de intervenção direta dos Estados Unidos no Brasil para recolocar Jair Bolsonaro no Planalto e, consequentemente, receber de presente as nossas riquezas. Tanto o pai quanto os filhos (e muitos de seus seguidores no Congresso e nas ruas) agitam a bandeira do medo. Em cada bravata contra a soberania do nosso país, está implícita a lembrança do golpe cívico-militar de 1964, em que os generais contaram com o apoio dos Estados Unidos para derrubar o presidente João Goulart. Foram 21 anos de opressão, que os democratas, ao contrário dos Bolsonaro, não querem reviver. Não esqueçamos que o ex-capitão sempre defendeu, abertamente, a ditadura e os torturadores. A única crítica que ouvimos dele aos ditadores foi a de que deveriam ter matado mais 30 mil brasileiros. Ao atacar a soberania pátria pensam em criar um ambiente que transforme a polarização em confronto para matar os que os generais deixaram vivos? Quem duvida?

Os filhos do “imbrochável, imorrível e incomível” têm sorte de viver sob um regime democrático. Se, ao contrário, vivessem sob o governo de 1964 e agissem como fazem agora, não haveria nenhuma discussão sobre qual legislação poderia ser usada para julgá-los como traidores da nossa soberania e defensores da de um país estrangeiro. Eles já teriam sido presos e estariam sofrendo torturas em alguma cela do Doi-Codi – Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna ou do Exército. Talvez, devido à covardia, comportamento que une pai e filhos, eles mantivessem a boca fechada ou, por outra, ajudassem a torturar os críticos do autoritarismo.

A covardia ficou muito clara na quarta-feira, 20, quando a Polícia Federal indiciou Jair e Eduardo Bolsonaro por coação e obstrução da ação penal que tramita no STF – Supremo Tribunal Federal. A Corte julga os envolvidos na tentativa de golpe, ocorrida em 8 de janeiro de 2023. Entre eles, o líder do quinta coluna.  O Zero Três, indiciado por seu “trabalho” em solo norte-americano, tão propagado e festejado nas redes sociais, não teve vergonha em afirmar que sua “atuação nos Estados Unidos jamais teve como objetivo interferir em qualquer processo em curso no Brasil”.  Na caradura declarou: “Sempre deixei claro que meu pleito é pelo restabelecimento das liberdades individuais no país por meio da via legislativa, com o foco no projeto de anistia que tramita no Congresso Nacional”. Ahn ahn! Acreditamos nesta lorota. Somos todos idiotas. Não vimos e ouvimos o que ele disse nas redes sociais. Se só defende o projeto de anistia, por que não ficou no Brasil para cumprir a sua obrigação de parlamentar?

No momento em que nossa soberania sofre ataques do governo Trump, o mais triste é ver que figuras públicas já normalizaram as sanções, que estamos sofrendo, patrocinadas pelos Bolsonaro. São pessoas que alegam que o Brasil não pode fazer nada para preservar seus direitos, pois os Estados Unidos são mais poderosos do que nós. A solução, segundo esta gente, é ficar calado, aceitar o que vier pela frente. Se os mais poderosos saíssem sempre vitoriosos, a Bíblia e a História não registrariam casos em que os mais fracos venceram os mais fortes. Exemplos: a bíblia registra a história da batalha entre o gigante Golias e o pastor David, que com uma funda e cinco pedras derrotou o filisteu, inimigo de Israel. A História mostra como, no século XX, um país pobre, o Vietnã do Norte, derrotou as poderosas tropas dos Estados Unidos do Vietnã do Sul e unificou o país.

Para finalizar, pergunto: temos ou não temos o direito de defender a nossa soberania? Temos ou não temos o direito de punir os brasileiros que atuam como inimigos do país? Ou devemos respeitar a soberania do agressor e esquecer a nossa?


*Nubia Silveira é jornalista

Foto de capa: Flicker/Bolsonaro

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Uma resposta

  1. Muito bom. Para que não exista risco da direita voltar em 2026, o governo precisa parar de errar e buscar a união da esquerda para vencer as eleições e tentar eleger maus deputados e senadores. É preciso trabalhar forte e certo desde já.

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