O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quarta-feira (3) que apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) poderá apresentar ao Senado denúncias por crimes de responsabilidade contra ministros da Corte — condição necessária para a abertura de um processo de impeachment.
A medida altera de forma significativa o rito previsto na Lei do Impeachment e limita a possibilidade de que cidadãos, parlamentares ou entidades ingressem diretamente com pedidos de afastamento de magistrados do Supremo.
O que muda com a decisão
Até então, a legislação permitia que qualquer cidadão — incluindo deputados e senadores — apresentasse denúncias para abertura de processos contra ministros do STF. A partir do entendimento de Gilmar Mendes, essa prerrogativa passa a ser exclusiva do procurador-geral da República.
Segundo afirma o ministro na decisão, essa mudança busca evitar o uso político do instrumento:
“A intimidação do Poder Judiciário por meio do impeachment abusivo cria um ambiente de insegurança jurídica, buscando o enfraquecimento desse poder, o que, ao final, pode abalar a sua capacidade de atuação firme e independente.”
Gilmar Mendes afirma ainda que juízes não podem atuar sob o temor de represálias políticas:
“Os juízes, temendo represálias, podem se ver pressionados a adotar posturas mais alinhadas a interesses políticos momentâneos, em vez de garantirem a interpretação imparcial da Constituição e a preservação dos direitos fundamentais.”
Na prática, a decisão cria uma trava institucional a pedidos de impeachment motivados por divergência política, retaliação ou insatisfação com o teor de decisões judiciais.
A decisão é monocrática — tomada individualmente — e ainda será analisada pelo plenário do STF, que poderá confirmá-la ou modificá-la.
O impacto sobre o papel do Congresso
Com a nova interpretação, deputados e senadores não podem mais apresentar denúncias contra ministros do STF, embora continuem sendo os responsáveis por julgá-las no Senado, caso a PGR decida apresentar uma acusação formal.
A decisão também fecha a porta para que o mérito de decisões judiciais — isto é, o entendimento jurídico adotado pelo ministro — seja usado como argumento para acusação de crime de responsabilidade.
Dessa forma, divergências sobre posicionamentos jurídicos deixam de justificar pedidos de afastamento.
O que diz a Constituição e a Lei do Impeachment
A Constituição determina que cabe ao Senado processar e julgar ministros do STF por crimes de responsabilidade. A Lei do Impeachment, por sua vez, estabelece quais condutas se enquadram nessas infrações, como:
- participar de atividade político-partidária;
- agir com desídia no exercício do cargo;
- ter conduta incompatível com a honra, o decoro ou a dignidade das funções;
- julgar processos nos quais seja legalmente suspeito.
As punições previstas incluem perda do cargo e inabilitação por até cinco anos para funções públicas.
A decisão suspende justamente o trecho da lei que permitia que qualquer pessoa apresentasse denúncias com base nessas regras.
Segundo apuração do G1, o entendimento do ministro é de que o modelo anterior facilitava a apresentação de denúncias sem fundamento técnico, motivadas por interesses partidários ou como resposta a decisões judiciais que desagradassem determinados grupos políticos.
Outras alterações definidas por Gilmar Mendes
A decisão também atinge outros pontos da legislação:
1. Novo quórum para abertura de processo
Gilmar Mendes substituiu o quórum de maioria simples por maioria qualificada: agora são necessários dois terços dos senadores para autorizar o andamento de um processo de impeachment contra ministros do STF.
2. Mérito das decisões não poderá ser usado como acusação
O conteúdo de decisões judiciais — mesmo que impopular ou controverso — não pode fundamentar denúncia de crime de responsabilidade. O objetivo é impedir que a independência judicial seja confundida com infração funcional.
3. Fim da garantia de retorno ao cargo após absolvição
A decisão retira da lei o dispositivo que determinava a reintegração automática do ministro ao cargo, com pagamento retroativo dos salários, caso fosse absolvido em processo de impeachment. O retorno deixa de ser automático.
Ações que motivaram a decisão
O caso julgado por Gilmar Mendes reúne duas ações: uma proposta pelo partido Solidariedade e outra pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Ambas contestavam dispositivos da Lei do Impeachment e pediam maior proteção institucional para o Judiciário diante do uso político do instrumento.
Imagem destacada: Nelson Jr./SCO/STF




