Por ALEXANDRE CRUZ*
Em 1978, em meio ao silenciamento imposto pelos anos de chumbo da ditadura militar, surgia em Porto Alegre uma chama de resistência e expressão: a Revista Tição. Idealizada por um grupo de jornalistas negros visionários, a publicação se destacou como o primeiro periódico negro no Brasil em mais de três décadas. Mais do que um simples registro jornalístico, a Tição foi um grito contra o racismo, a violência policial e as desigualdades que atravessavam a sociedade brasileira, ao mesmo tempo em que exaltava a cultura, a estética e os valores afro-brasileiros.
A Tição nasceu das mentes e corações de Jorge Freitas, Emílio Chagas, Jeanice Ramos e Vera Daysi. A eles se juntaram, em uma verdadeira confraria de luta, o poeta e pesquisador Oliveira Silveira, o socólogo Edilson Nabarro e o militante Valter Carneiro. Com o avançar das edições, o jornalista Jones Lopes também integrou o grupo, fortalecendo ainda mais o coletivo que ousou desafiar as barreiras impostas à liberdade de expressão da população negra.
Quase cinco décadas depois, a Revista Tição renasce como um símbolo de memória e resistência. Em um Brasil onde as tensões raciais persistem, especialmente no Rio Grande do Sul, a reedição histórica da revista se torna um ato de afirmação e luta antirracista. A edição comemorativa de 45 anos não apenas celebra o legado da publicação, mas também estabelece um diálogo entre os desafios enfrentados no passado e as lutas do presente.
Com 60 páginas, a edição especial traz análises comparativas entre os temas abordados nas edições de 1978, 1979 e 1981, explorando o avanço e as permanências de questões como racismo, mercado de trabalho e violência policial. Histórias narradas por jornalistas, pesquisadores e remanescentes fundadores enriquecem a publicação, que será distribuída gratuitamente, alcançando novos e antigos leitores.
O marco da reedição será celebrado em grande estilo. No dia 28 de janeiro de 2025, às 18h30min, na Biblioteca Pública Estadual do Rio Grande do Sul, a Tição será relançada com uma roda de conversa e um debate sobre a questão racial. O evento contará com as participações especiais da cantora Maguerite Silva Santos e da poeta Naiara Oliveira, declamando versos do pai, Oliveira Silveira. Será uma noite de memória, resistência e arte.
O retorno da Tição é fruto do trabalho de uma equipe comprometida, liderada por Emílio Chagas e Jeanice Dias Ramos. Com o apoio de parceiros como a ADUFRGS, CPERS, FETRAFI e SINPRO, a revista reforça a importância da solidariedade na promoção da diversidade cultural e na luta contra o racismo.
A Tição permanece como um farol para a resistência negra, conectando gerações e mostrando que a luta pela igualdade é permanente. Como disse Oliveira Silveira, um dos fundadores: “A chama nunca se apaga”. Que a reedição da Tição inspire novas gerações a manter essa chama acesa e a lutar por um Brasil mais justo e igualitário.
*Alexandre Cruz é jornalista piolítico.
Foto de capa: Divulgação
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