Por CASTIGAT RIDENS*
Donald Trump, em seu segundo mandato, decidiu que fazer política é pouco. Ele quer dirigir, produzir, estrelar e, se possível, receber todos os prêmios. Se for Nobel da Paz, melhor ainda. A recente sucessão de eventos que envolvem o presidente dos Estados Unidos é tão surreal que nem roteirista da HBO ousaria tanto: tropas federais em Washington, tarifas de vingança, interferência em eventos culturais, ligações diplomáticas inusitadas e elogios à Rússia dignos de desfile em Moscou.
D.C. ocupada: tropas nas ruas, números em baixa e histeria em alta
No último dia 11 de agosto, Trump invocou um dispositivo raramente usado para assumir o controle da polícia de Washington, D.C. O motivo? Uma suposta explosão de criminalidade — que, segundo os próprios dados federais, não existe. A cidade vive um de seus períodos mais tranquilos em décadas. Mas quem precisa de estatística quando se tem narrativa?
A prefeita Muriel Bowser chamou o ato de ilegal. Trump respondeu com mais agentes federais nas ruas. Afinal, nada diz “liberdade” como tanques passeando pela capital.
Brasil: “amizade” com Bolsonaro vira punição tarifária
Em um gesto de pura solidariedade entre líderes que se sentem injustiçados pelo sistema judicial, Trump impôs tarifas de 50% a quase todos os produtos brasileiros no início de agosto. A justificativa? Defender Bolsonaro da “caça às bruxas” promovida pelo governo Lula. Um argumento sólido como uma tapioca recheada de fake news.
Mas, claro, como o protecionismo só vale até afetar o bolso americano, Trump publicou um novo decreto retirando 694 produtos da lista de taxados — antes mesmo das tarifas começarem a valer. Nem os exportadores sabiam se riam ou choravam. No final, o Brasil prometeu retaliar, e o governo americano deu de ombros.
Canadá e México no mesmo barco (com vazamentos)
Trump também teve um surto protecionista contra Canadá e México. Impôs tarifas de 25% sobre quase tudo, depois suspendeu algumas, depois voltou atrás, depois ameaçou taxar laticínios canadenses em 250%, e por fim, sugeriu — com a sutileza de um rolo compressor — que os EUA poderiam “anexar o Canadá economicamente”. Se foi piada, não ficou claro. Se não foi, a gente entende por que Ottawa começou a revisar os mapas.
Kennedy Center: o Oscar da vaidade
E como ninguém vive só de tarifas, Trump decidiu que também entende de cultura. Assumiu o controle do Kennedy Center Honors, um dos mais respeitados prêmios artísticos dos EUA, e se autoproclamou apresentador da cerimônia. Escolheu ele mesmo os homenageados — todos cuidadosamente selecionados para não contrariar suas crenças. A lista inclui KISS, Stallone e Gloria Gaynor. Gente que, segundo ele, não “ofende os valores americanos”. Nem os dele, é claro.
Boatos indicam que o nome do centro cultural pode mudar para “Trump Cultural Hall of Fame”. Afinal, modéstia nunca foi seu ponto forte.
Nobel da Paz: uma ligação, uma ameaça e um delírio
Trump ligou pessoalmente ao ministro das Finanças da Noruega, Jens Stoltenberg, para dizer que gostaria de ganhar o Nobel da Paz. E, como bom negociador, sugeriu que, caso isso não acontecesse, tarifas sobre produtos noruegueses poderiam entrar na pauta. Diplomacia, no caso, é apenas uma palavra difícil de soletrar.
Não se sabe se Stoltenberg achou graça. Mas a notícia rodou o mundo e reforçou o que já se suspeitava: Trump quer o Nobel como troféu pessoal. Que paz ele promoveu? Ainda estamos investigando.
Ucrânia: Rússia é potência, Ucrânia não — simples assim
No capítulo geopolítico da novela, Trump encontrou-se com Putin no Alasca, em 16 de agosto, e saiu de lá convencido de que a Ucrânia deveria ceder território à Rússia. O motivo? “A Rússia é uma potência. A Ucrânia, não.” Fim do argumento.
Putin pediu formalmente o controle total de Donetsk como condição para congelar o conflito. Zelenskyy rejeitou na hora. Mas Trump, agora em modo consultor de imóveis, acha razoável ceder um pedaço aqui, outro ali. Afinal, que mal pode haver em redesenhar fronteiras em pleno século XXI?
Trump 2.0: um governo em tempo real (e roteirizado)
O que se vê não é exatamente um governo. É mais uma espécie de “Trump Show — segunda temporada”. Com direito a elenco rotativo, crises roteirizadas, arcos dramáticos e plot twists semanais. Do controle da polícia à busca por prêmios, das tarifas improvisadas à defesa de ditadores, Trump segue seu roteiro favorito: manter o mundo girando ao redor de si.
*Castigat Ridens é um pseudônimo criado a partir da expressão latina “Castigat ridendo mores” que significa “corrige os costumes rindo” ou “critica a sociedade pelo riso”, muito usada no contexto da comédia como instrumento de crítica social.
Ilustração da capa: Galinha vaidosa – Imagem gerada por IA ChatGPT
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Trump, Brasil, Bolsonaro, tarifas, Kennedy Center, Nobel da Paz, Ucrânia, Putin, Washington DC, autoritarismo, política internacional, ironia política, segunda temporada




