PCC com pequi

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Por ANGELO CAVALCANTE*

Como é aquele discurso do clímax da segurança pública em Goiás?

Aquela ladainha mídio-televisiva, um mantra discursivo contado, recontado, dito e re-dito em prosa, verso e intermináveis cantilenas pelo caudilho que governa a fronteira?

E ouvimos brados e sentenças efusivas e repetitivas ao estilo: “bandido em Goiás não se cria!” ou “com minha polícia, a bandidagem não tem vez!” ou ainda, “somos o Estado mais seguro do Brasil”.

Não fosse o peso sumário e definitivo dos acontecimentos, esses arroubos performaticos, quem sabe, fariam algum sentido.

Todo o país, em espanto único, assistiu na última quinta-feira, a uma das mais importantes operações policiais e conduzida pela Polícia Federal, a Receita Federal e o próprio Ministério da Justiça. O alvo certeiro e preciso da ação fora a garbosa e imponente Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, um estiloso corredor urbano onde estão situadas as principais financeiras, mega-corporações do dinheiro e administradoras dos principais bancos e fundos do Brasil e da América Latina.

Pois bem…

O que essa Operação descobriu e desbaratou foi uma fina tessitura, uma harmônica muito bem concertada a envolver parte dessas empresas e o mais rasgado e escancarado dos crimes e cometidos pela principal facção criminosa do Brasil, o Primeiro Comando da Capital, o bem mais conhecido PCC.

Em rapidelas, o PCC é fina e sofisticada inteligência administrativa de um largo, um imenso combo de crimes e que envolve desde o tráfico internacional de drogas, armas e seres humanos, passando pela “toma”, a apropriação de bens e recursos alheios pelo uso direto da força até ao assassinato de concorrentes ou opositores.

Essa facção administra, manda e comanda, reparem bem, a maior parte das “bocas” e “biqueiras” da cidade de São Paulo e da Grande São Paulo onde toda sorte de drogas é distribuída; desde pontas e picados de maconha até a cargas de cocaína fina e pura e advindas dos cartéis e produtoras da Colômbia, da Bolívia ou do Peru.

O PCC é um gigante! É técnica, militância e gestão territorial a envolver pelo discurso, pelo aliciamento, o suborno e a violência mais brutal e abjeta, praticamente todos os cárceres, presídios e cadeias do Brasil.

Ocupa periferias, conforma organizações, elimina resistências e afirma seus propósitos; com seu crescimento, complexifica a gestão de sua rede, aprimora discursos e aprende a ser e estar em locais mais elaborados e higienizados do que periferias rotas e medonhas.

Faz política, financia políticos, estabelece pautas, exige unidade, discrição e fidelidade. Em plena conformidade com os fazeres das principais máfias do mundo, passa a existir nas próprias fissuras e contradições de um Estado débil, enfraquecido e neoliberal.

Aliás, a intensificação do neoliberalismo e o consequente enfraquecimento do Estado como razão, ação e capacidade de regulação é o próprio princípio e fundamento para a inacreditável expansão do PCC.

Na citada operação policial fora constatada a movimentação de cerca de 140 bilhões de reais de recursos internalizados pelo PCC em ações e investimentos sugeridos pelos yuppers da Faria Lima, com destaque às ditas fintechs ou os tais bancos eletrônicos.

É como se essas empresas “lavassem”, justificassem, dessem sentido ético, jurídico e legal para os dinheiros do PCC, capitais advindos, é claro, de uma saraivada, de uma constelação de crimes.

E Goiás com isso?

Ora… Depois de “lavado, limpinho e cheiroso”, esses recursos, para o caso goiano, viraram postos de gasolina e espalhados em Goiânia, Anápolis ou Aparecida de Goiânia.

Mais ainda… Viraram usinas de álcool e implantadas na banda sul dos Guayazes; foram tornados, convertidos em maquinários caros, tratores, caminhonetes e toda sorte de implementos.

O PCC em Goiás virou terra, latifúndio e cerca; nessa onda, se converteu em força e influência política a operar em pleitos eleitorais e eleger prefeitos, vereadores e deputados estaduais ou federais.

O PCC virou poder provinciano, culturalizado; aprendeu a roer pequi, comer pamonha, estalar catira e por óbvio, sempre rendendo loas e graças ao governo de Ronaldo Caiado e que, de forma benevolente tratou de homiziar toda essa potência política e econômica perversa com o mais cínico e degenerado discurso negacionista de que Goiás é espécie de “sucursal do paraíso” e absolutamente livre do aço e da lâmina da violência e que devora o Brasil.

Em outras, esse tipo de discurso favorece a própria capilarização e o aprofundamento do crime organizado “by PCC” na vida, no fluxo e no cotidiano de milhões de cidadãos decentes e honrados desse estado.

Pois é… Enquanto Caiado, sempre vaidoso e irascível, vendia que estávamos no Nirvana ou em algum outro paralelo celestial, um colosso incontrolável se erguia potente e soberano nas nossas paragens de Cerrado.

É isso!



*Angelo Cavalcante é economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Itumbiara.

E-mail : angelo.cavalcante@ueg.br

Foto de capa: Policiais fazem busca e apreensão em um dos prédios alvos da Megaoperação na Avenida Brigadeiro Faria Lima | David Irikura/TV Globo

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Respostas de 3

  1. Pura verdade. Os que bebem nas águas neoliberais adoram pregar a eliminação de bandidos, da violência e tal. Mas se esquecem da facilidade que o próprio neoliberalismo oferece para todos os esquemas criminosos através do sistema financeiro totalmente livre do controle estatal.

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