Por LENIO LUIZ STRECK*
Lendo o livro best seller de Levitsky e Ziblatt, intitulado “Como Salvar a Democracia”, há uma parte fascinante em que parece ter sido feita e escrita para o Brasil pós-Bolsonaro e pós-8 de janeiro.
Levitski e Ziblatt denunciam os SEMILEAIS (pensemos na grande mídia), dizendo:
“Além de proteger extremistas antidemocráticos, os semileais legitimam suas ideias. A semilealdade protege as forças antidemocráticas.
A semilealdade não apenas normaliza as forças semidemocráticas, ela as incentiva, e talvez até as radicalize. É a banalidade do autoritarismo.”
Facilmente é possível identificar alguns veículos de comunicação do Brasil na sua relação com o pós-8 de janeiro. Durante o período de 2021 e 2022, nada fizeram de concreto para repudiar e denunciar os discursos claramente incentivadores da tomada do poder pelos militares. Jornais, TVs e rádios estavam lotados de emissores dizendo que o artigo 142 da Constituição permitia a intervenção.
E tudo isso vitaminou os terraplanistas que se acotovelavam na frente dos quarteis, bulindo com os granadeiros (para usar uma frase famosa dita por um ditador) para que tomassem o poder.
Até mesmo houve um manifesto assinado pelos comandantes das armas no dia 11 de novembro de 2022, pelo qual diziam, em torta interpretação da Lei de Defesa do Estado Democrático, que o parágrafo único do artigo 359 dava legitimidade aos manifestantes, quando, na verdade, o dispositivo dizia o contrário. Resultado: o 8 de janeiro de 2023.
Passados esses meses todos, o sistema de justiça falhou em não processar os mandantes, os financiadores e os incentivadores da tentativa de golpe. E a grande mídia ficou silente.
Agora, parte dela, em especial a Folha de São Paulo, a partir de mensagens retiradas de telefones celulares de auxiliares de Alexandre de Morais (como se deu isso até agora não sabemos), incendeiam a república. Pregam até absolvição dos condenados pelo 8 de janeiro.
O mote: que Morais teria usurpado de suas funções. Morais conspurcou o rito, bradam as manchetes. Pois, juridicamente, Morais usou os poderes que a legislação eleitoral dá aos juízes. Não inventou fatos. Mandou investigar. Os que são contra devem brigar contra a Constituição e a lei. O máximo que ocorreu – e serve para fazer blague – é que Morais presidente do TSE fez “conluio” com Morais ministro do STF.
Os jornalistas do grande jornal deveriam ter consultado um advogado eleitoral. O resto? O resto é a semilealdade para com a democracia. Como bem assim denunciam os autores do livro Como Salvar a Democracia. E sabemos quem quis acabar com a democracia e quem ajudou a salvá-la.
*Lenio Luiz Streck é jurista e professor universitário.
Foto da capa: Forças Especiais do Exército Brasileiro (Kids Pretos) – Pinterest.
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