De ROBERTO E. ZWETSCH*
Não existe um voto evangélico. Esta é uma afirmação falsa porque torna homogêneo um voto complexo, que vem de milhões de pessoas espalhadas pelo país e que se identificam com diferentes igrejas oriundas da Reforma Protestante do século 16. O que temos – na verdade – são pessoas ou cidadãs de tradição “evangélica” que votam e não o contrário. Não fosse assim, teríamos um “voto de cabresto”, o que as pessoas provavelmente não aceitam nem nele se reconhecem. Respeitar as pessoas e seu direito de voto é uma atitude democrática das mais elementares.
É verdade, porém, que nesse âmbito difícil de avaliar, como pesquisadoras do campo religioso vêm afirmando, existe um potencial conservador expressivo e que tende a votar em candidatos conservadores ou de direita. No caso das atuais eleições, milhares dessas pessoas vêm afirmando que votaram ou votariam no atual presidente. Mas aí é que está o problema. Se existe este conjunto enorme de votantes, também existe um outro conjunto expressivo – e que cresce a cada dia – que NÃO VOTA no atual presidente. E por razões explícitas. É o que denomino de voto consciente, livre e fundamentado. São pessoas que prezam o Estado Democrático de Direito, confiam nas eleições e na urna eletrônica, apoiam movimentos de luta por direitos humanos e sociais, se posicionam pela defesa das mulheres e contra a violência que elas sofrem diariamente, lutam por educação pública e de qualidade para crianças e jovens, por saúde pública gratuita e eficaz, portanto, em defesa do SUS, e muitos outros direitos assegurados pela Constituição de 1988.
Essas razões demonstram o outro lado da questão: o fato de que temos um voto anti- evangélico. Ele cruza diferentes igrejas, comunidades de fé e de tradições religiosas, como também as “pessoas de bem”. É, pois, importante considerar o seguinte: o voto anti-evangélico é aquele que:
- apoia a política de armar a população como solução para a criminalidade que grassa
no país. Armar as pessoas significaria mais segurança. Ora, isto é um erro fatal! Mais
armas só fortalecem grupos criminosos como os milicianos que dominam muitas áreas
periféricas de certas capitais, contribuindo para mais violência e feminicídios. Jesus foi
muito claro a respeito: “Deixo a vocês a paz, a minha paz dou a vocês. Não a dou como
a dá o mundo” (João 14.27) ; - assume sem reflexão que a corrupção é o mal maior do Brasil, quando o que se vê é
um presidente que engana sistematicamente as pessoas, afirmando sua moralidade, mas
apoiando e praticando as formas mais explícitas de corrupção, junto com empresários e
outros grupos poderosos. Jesus jamais se iludiu: “Vocês não podem servir a Deus e ao
Dinheiro” (Mateus 6.24); - pauta seu posicionamento social por práticas discriminatórias, intolerantes e
agressivas contra pessoas e grupos que não se alinham com suas concepções morais,
sociais ou espirituais. São como os sepulcros caiados da crítica de Jesus aos religiosos
do seu tempo: “Hipócritas, cegos guias de cegos” (Mateus 23.24ss);
Este tipo de voto não cabe na mensagem de Jesus de Nazaré que ensinou o amor como critério maior para qualquer pessoa de fé. Ele defendeu a mulher marginalizada e o pecador que assumiu seu erro contra os moralistas de plantão. Ele preferiu comer com pecadores e prostitutas do que aceitar os vendilhões do templo. Pensemos nisso para votar bem e assim ajudar a reconstruir um país entregue à rapina.
*pastor luterano, professor de Teologia e membro da PPL – Pastoral Popular Luterana.
Imagem em Pixabay.
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