Por PAULO TIMM*
Não é irrelevante que desde a posse de Trump, os EUA não têm um embaixador em rasília. Não é, também, desimportante que Donald Trump tenha se pronunciado, desaforadamente, no calor do dia da posse, dizendo que o Brasil precisa mais dos EUA que o contrário. Na dimensão estratégica a carta de Donald Trump é um primeiro movimento no curso de hostilidades que vão escalar.
Valério Arcary in Donald Trump ataca o Brasil
“Nesta semana, a decisão de Trump de aplicar justamente ao Brasil as taxas mais elevadas desta fase do seu tarifaço deixou claro, para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o mundo, que a Casa Branca está instrumentalizando o comércio internacional com fins geopolíticos e ideológicos.”
Jamil Chade , in Ideologia, big techs, China: os bastidores da investida dos EUA ao Brasil.
O tarifaço de 50% de Trump nunca teve razões econômicas, eis que há décadas jorram “as veias abertas” do nosso sangue para os Estados Unidos, nem jamais foi só sobre evitar a prisão de Jair Bolsonaro. É o resultado da articulação de poderosos interesses de grupos ideológicos e de empresários de tecnologia naquele país. Já antes das eleições do ano passado, o Itamaraty havia enviado emissários aos Estados Unidos, com vistas a avaliar as projeções, tanto dos republicanos, como dos democratas, concluindo que, no caso dos primeiros vencerem, teríamos que enfrentar problemas em função de nossa Política Externa Independente e da nossa disposição em regulamentar as Big Techs. Com efeito, com a vitória de Trump o comprovaram. O Brics, o avanço do Brasil sobre as plataformas digitais e a pressão de extremistas da direita americano chegaram aos ouvidos de Trump convencendo-o a socorrer Bolsonaro com vistas a tê-lo com fiel escudeiros de seus interesses no Brasil. Como destacou Jamil Chade, colunista da UOL, em seu artigo “China & Bigtechs: Os bastidores da investida dos EUA no Brasil “ sobre os objetivos dos americanos: “criar condições para que a eleição de 2026 no Brasil abra espaço para um governo alinhado aos interesses políticos e econômicos de Trump”. Chegamos, enfim, ao século XXI. Agora, trata-se de avaliar as consequências do ultimato de Trump, acompanhado da sanção dos 50% , e já reverberado com nova advertência por parte do Secretário da OTAN.
Como estamos próximos do 14 de julho, data da Revolução Francesa, em 1789, vale lembrar o que aconteceu com o Luiz XVI. O Rei da França, mesmo diante da sangria dos nobres que tingira o Sena de vermelho lá ficara, no seu canto, até que em, 1792, resolveu pedir socorro aos soberanos do resto da Europa. Não deu certo. Foi pra guilhotina como traidor e levou junto Maria Antonieta. O mesmo ocorreu agora com Bolsonaro. Vencido nas urnas, réu em processo que poderá leva-lo brevemente à prisão, resolveu pedir socorro a Trump. Deu uma de Luiz XVI. Também não deu certo. Até os “jornalões” conservadores o condenaram. Vai perder o pescoço , levando sua ala para vala dos derrotados. Lula está sabendo reagir, reconcertando pactos com empresários nacionais do agro e da industrial. Tomou fôlego e se prepara para a campanha eleitoral de 2026. Renasceu. Independentemente dos interesses econômicos advindos com o ultimado, o povo não aceita traição, sobretudo no interesse próprio. É único pecado para o qual não existe perdão.
*Paulo Timm é economista, funcionário aposentado do IPEA, poeta, romancista, professor universitário e editor da Rádio Resumo publicado em A FOLHA, Torres em 31 de janeiro de 2025
Foto de capa: Reprodução
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Este artigo está perfeito.