Por CELSO JAPIASSU*
Os movimentos totalitários nazifascistas que agitaram o século XX constituem um dos capítulos mais sombrios da história humana. Caracterizados por um controle absoluto do Estado sobre todos os aspectos da vida social, política e econômica, deixaram uma marca indelével e um legado de sofrimento e destruição. E agora voltam a ameaçar a Europa. E não apenas a Europa.
Na Europa, Itália, Hungria, Países Baixos, Finlândia, Suécia, Eslováquia e Croácia já caíram nas mãos da extrema direita e outros partidos neofascistas nas cercanias do poder espreitam o governo de seus países prontos para atacar. Além desses, a extrema direita tem ganhado força a cada eleição na Alemanha e na França, os países que lideram a União Europeia. “É o futuro da Europa”, disse Viktor Orbán, da Hungria, referindo-se ao sucesso eleitoral dos partidos da extrema direita.
Do outro lado do Atlântico, um movimento de matiz nazifascista chamado MAGA estabeleceu-se no governo dos Estados Unidos e pelas mãos de Donald Trump ampliou internacionalmente a sombria ameaça.
O totalitarismo que a extrema direita representa é um sistema político em que o Estado procura estabelecer o controle total sobre a vida dos cidadãos. Seus pilares são o culto à personalidade do líder, uma ideologia única, que reprime qualquer dissidência, e o controle dos meios de comunicação.
O militarismo é exaltado, o Estado mantém um forte aparato repressivo, há um culto às armas e a violência é utilizada como instrumento de controle social. Impõe uma ideologia oficial abrangente que visa controlar todos os aspectos da vida: economia, educação, arte, ciência e valores morais dos cidadãos.
Surgido na Itália com Benito Mussolini, o fascismo exalta a nação, o Estado e o líder. Serviu de modelo ao nazismo de Adolf Hitler, a forma mais radical e violenta do fascismo. Pregava a superioridade da raça ariana e a perseguição aos judeus, culminando no Holocausto.
Tragédias
Guerras mundiais, genocídios, repressão política e crises econômicas são alguns momentos trágicos da humanidade que tiveram em sua origem a ideologia nazifascista.
A palavra genocídio, que voltou a ser tão usada atualmente referindo-se ao tenebroso crime que está sendo cometido em Gaza por Israel, foi criada em 1944 pelo advogado judeu polonês Raphael Lemkin, combinando a palavra grega “genos”, que significa raça ou grupo, com a raiz latina “cide”, que significa matar. Ele buscava uma palavra que pudesse descrever as políticas nazistas de assassinato sistemático que incluiu a destruição dos judeus europeus. Winston Churchill, três anos antes, havia declarado que o mundo estava a testemunhar o que ele definiu como “um crime sem nome”. Lemkin lhe deu o nome.
Em 2025, existem 58 países classificados como tendo regimes de extrema direita a caminhar em direção ao nazifascismo. Todos eles têm restrições à liberdade de imprensa, perseguição política e rigoroso controle social.
A Coreia do Norte mantém um controle rígido sobre todos os aspectos da vida dos cidadãos, com forte culto à personalidade do líder e restrições severas às liberdades individuais. No Turquemenistão, há repressão generalizada e censura enquanto a Eritreia convive com forte repressão política e população frustrada com a situação econômica.
A Arábia Saudita apresenta severas restrições às liberdades civis e direitos políticos e na Bielorrússia, governada por Aleksandr Lukashenko, há forte repressão a qualquer oposição política. No Irã, um país de cultura milenar, o regime dos aiatolás exerce forte repressão aos movimentos que possam representar algum sonho de liberdade. A viver neste mesmo clima encontrar-se-iam também China e Rússia. E nos EUA Donald Trump e seu movimento MAGA são representantes desse mesmo tipo de pensamento.
O discurso populista diz falar em nome do povo contra as “elites corruptas”, e promete uma sociedade melhor e mais justa. Explora a desconfiança nas instituições muitas vezes agravada por escândalos de corrupção. O uso das novas mídias e das redes sociais ampliam o discurso, espalha notícias falsas e mantem constante a atenção do público-alvo. Canalizam protestos populares que possam levar à polarização. Exploram o medo econômico e o temor do desemprego, da precarização do trabalho e o aumento da pobreza.
A crise econômica poderá provocar o fortalecimento e a instalação de novos regimes autoritários, principalmente nos países em desenvolvimento e com democracias frágeis. Asseguram os estudiosos que em países com renda per capita abaixo de US$ 1.000, a probabilidade de uma democracia resistir é muito baixa.
As crises
As crises econômicas geram insatisfação e desconfiança na população e criam terreno fértil para líderes autoritários que oferecem soluções simplistas para questões complexas. Os líderes autoritários apresentam-se como solucionadores de problemas urgentes e prometem rápidas melhorias econômicas. A pobreza, por seu lado, vai destruindo a confiança nas instituições democráticas.
A crise econômica costuma criar uma crise política que, por sua vez, aprofunda a crise econômica, criando um círculo vicioso a favorecer regimes autoritários. E nos países pobres as pessoas sofrem o medo de se opor aos regimes autoritários pelo temor de represálias. Embora crises econômicas facilitem a ascensão de regimes autoritários, o crescimento econômico por si só não garante a transição para a democracia. Países como Taiwan, Espanha e Coreia do Sul ficaram ricos sob ditaduras e não transitaram automaticamente para a democracia.
Os partidos de extrema direita nazifascistas capitalizam o sentimento antiestablishment, aproveitando o sentimento da insatisfação popular com as elites políticas e econômicas tradicionais. Apresentam-se como outsiders em luta contra o “sistema”. Oferecem respostas aparentemente fáceis e diretas para uma população frustrada com a situação econômica.
O momento que o nazifascismo protagonizou representa um dos períodos mais sombrios da história da humana. Mas não ficou no passado histórico. Suas ideias estão presentes e, como os vampiros dos contos de terror, despertam nas trevas do momento político.
*Celso Japiassu é autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).
Foto de capa: IA




