Por ANGELO CAVALCANTE*
Não há registro ou precedente na literatura econômica de um cenário tão absurda e originalmente inominável como o que o destemperado governo yankee quer impor ao Brasil.
Aliás, nessa arrasadora batalha tarifária e conduzida por Trump desde o “dia um” do seu segundo governo, o país mais ameaçado com suas alíquotas de morte é, justamente e de longe, o Brasil.
Nem a Rússia, nem a China, tampouco a Índia receberam um petardo tarifário tão grande e comprometedor feito esse.
Em um breviário, em síntese possível, o “plus” de 50% nas exportações brasileiras para os EUA, em sua grande maioria, sobre produtos primários, caso de fato, prevaleça, representará o fim – O FIM – do comércio com a potência dos Estados Unidos. Ora, ora… É que ninguém produz para simples e tão somente arcar com taxas e aduanas tão elevadas.
Não faz sentido!
Até vale resgatar o debate promovido pelo brilhante economista inglês David Ricardo (1772-1823) na defesa que fez do livre comércio e é claro, da economia do seu país quando cria, dá forma e forja o curioso e instigante conceito de vantagem comparativa .
Pois muito bem… Nessa altura, a Inglaterra era a principal potência colonial do mundo, como se dizia no período, o país dos saxões era o império onde “o sol jamais se punha” considerando que os braços, os tentáculos do seu imperialismo operavam desde a Jamaica, passando pelos Estados Unidos, trespassando todo o Oriente Médio, Índia e China.
Isso era a Inglaterra e que, não por menos, conduzia uma planetária revolução tecno-sócio-produtiva apartir da indústria.
Certo é que a máquina econômica inglesa precisava funcionar e como se bem sabe, fábricas, indústrias e manufaturas não funcionam sem insumos, matérias-primas, commodities . Precisam de fibras, minérios, cereais, tintas, sementes, óleos e seivas ou… Não giram!
E de onde essas coisas vem? Ora… Daqui, de África, do sudoeste asiático e dos mais remotos rincões do globo.
É nesse quadro que o engenhoso e aristocrático senhor Ricardo sugere, em primeiro, que o mundo é espécie de imensa oficina e que cabe, que admite todos; reconhece que há uma divisão internacional do trabalho onde cada nação participa com aquilo em que é mais especializado, apto e habilitado a produzir.
O Brasil é bom na produção de café? A Malásia, borracha? A Argentina, carnes? A Colômbia, cacau? O Irã com linhas e carpetes? A Índia com suas especiarias?
Pronto… É só seguir produzindo, fazendo tais coisas porque inexoravelmente, a produção global absorve tudo isso e sinceramente, necessita mesmo desses artigos.
A vantagem competitiva ricardiana é a reafirmação produtiva das tradições econômicas próprias de cada localidade, legando a indústria, o cremè de la cremè , da economia global de antanho aos exclusivos da Inglaterra.
Sacaram?
Por fim, a vantagem competitiva de cada país seria o diferencial para o ganho ainda que a respectiva produção se desse de forma artesanal, com baixa densidade tecnológica… Não importa… O mundo produtivo carece e ainda assim, paga, terá que pagar por tais materiais.
Finalmente, para a chantagem “trumpista”, a nossa vantagem competitiva, no seu geral, restrita às commodities , morre, se perde, na exata fronteira com os Estados Unidos.
A boa e larga vantagem de termos terras fartas e férteis, a abundância de águas, o ciclo correto de estações e chuvas mais os vastos e intermináveis incentivos fiscais e orçamentários de feição e sinceridade maternal e que o governo brasileiro concede aos “landlords” do agronegócio são desmanchados, viram poeira e somem na primeira praça aduaneira norteamericana e situada n’algum porto das costas estadunidenses.
A taxação trumpista nos tira competitividade, condição de produção e de efetiva participação no já assimétrico, desigual e perverso comércio internacional.
Ao fim, após essa trágica experiência, as bases e os fundamentos da economia internacional devem ser repensadas integralmente antes que o fim chegue, nos chegue.
Vale recordar, alembrar que o “protecionismo” de Trump sequer é novidade… Esse dispositivo fora o responsável direto por duas guerras mundiais.
E os ventos frios da morte já sopram…
*Angelo Cavalcante_ – Economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Itumbiara.
Foto de capa: Reprodução