O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) telefonou nesta terça-feira (2) para o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em uma conversa de cerca de 40 minutos que abordou dois temas centrais da relação bilateral: barreiras tarifárias impostas por Washington a produtos brasileiros e a cooperação no enfrentamento ao crime organizado internacional. As informações foram divulgadas pelo Palácio do Planalto.
Tarifas e negociações comerciais
Segundo o governo brasileiro, Lula classificou como “muito positiva” a recente decisão dos EUA de retirar a tarifa adicional de 40% aplicada a mais de 200 itens exportados pelo Brasil, incluindo carne bovina, café, cacau e frutas — medida anunciada ao final de novembro, após encontro entre o chanceler Mauro Vieira e o secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio.
Apesar do avanço, o presidente brasileiro ressaltou a Trump que outros produtos seguem sujeitados a sobretaxas, e afirmou que é necessário avançar rapidamente nas tratativas para eliminar as tarifas remanescentes. Lula reforçou que o Brasil tem pressa em concluir essa etapa das negociações bilaterais.
O tarifaço havia sido imposto pelos EUA em agosto, sob a justificativa de que ações do governo brasileiro representariam riscos à segurança nacional americana. A medida atingiu também outros países, dentro de uma política mais ampla adotada pela gestão Trump.
Enfrentamento ao crime organizado internacional
Outro eixo da conversa foi a cooperação em segurança. Lula destacou a necessidade urgente de fortalecer ações conjuntas com os Estados Unidos no combate a organizações criminosas transnacionais. O presidente mencionou operações recentes conduzidas pelo governo federal — como as investigações no setor de combustíveis — que buscaram “asfixiar financeiramente” facções e identificaram ramificações atuando a partir do exterior.
O Planalto informou que Trump demonstrou “total disposição” para trabalhar de forma coordenada com o Brasil e declarou que dará apoio a iniciativas bilaterais nessa área. Os dois presidentes concordaram em retomar o diálogo em breve para avaliar o andamento das medidas conjuntas.
Tensão na região e operações dos EUA no Caribe
A demanda brasileira por cooperação ocorre em um contexto de crescente tensão na América do Sul. Desde agosto, os Estados Unidos mantêm uma operação militar de grande porte no Caribe e no Pacífico, com navios, caças, milhares de militares e o maior porta-aviões do mundo, sob o argumento de combater o narcotráfico de origem latino-americana.
Washington tem bombardeado embarcações que, segundo o governo Trump, estariam ligadas ao tráfico de drogas — embora ainda não tenham sido apresentadas evidências que comprovem a relação das vítimas com organizações criminosas. Mais de 80 pessoas teriam morrido nesses ataques.
Caracas afirma que o objetivo real da operação é derrubar o regime venezuelano. A Casa Branca acusa o presidente Nicolás Maduro de liderar o Cartel de los Soles, cuja existência é contestada por especialistas; Maduro nega qualquer vínculo com o narcotráfico.
A tensão já havia sido tratada por Lula na primeira reunião presencial com Trump, em outubro, na Malásia, quando o brasileiro se ofereceu como possível interlocutor no diálogo com a Venezuela. Segundo o chanceler Mauro Vieira, a proposta foi inicialmente mal recebida por Washington, que naquele momento não cogitava soluções diplomáticas.
Mais recentemente, porém, Trump e Maduro chegaram a conversar por telefone, em 21 de novembro.
Contexto político interno: segurança pública e embates
A pauta do crime organizado ganhou centralidade adicional no Brasil após a megaoperação policial no Rio de Janeiro que deixou 121 mortos. O episódio gerou atritos entre o governador fluminense Cláudio Castro (PL) e o governo federal, com Castro alegando falta de apoio de Brasília à segurança dos estados.
Em meio à disputa, o governo Trump chegou a enviar uma carta ao governo do Rio lamentando a morte de policiais e oferecendo apoio — gesto que elevou ainda mais a tensão política interna.
Paralelamente, no Congresso, o Palácio do Planalto buscou acelerar pautas prioritárias na área de segurança, como a PEC da Segurança Pública, que centraliza diretrizes federais e encontra resistência de governadores. Outro ponto de disputa foi o PL Antifacção, objeto de debates intensos após alterações promovidas pelo relator Guilherme Derrite (PP-SP).
Um documento recente da Abin alertou para a interferência externa e a atuação do crime organizado como riscos potenciais para o processo eleitoral de 2026, o que reforça a preocupação do governo Lula com ações coordenadas para enfrentar redes criminosas transnacionais.
Próximos passos
Tanto Lula quanto Trump concordaram em manter uma agenda de diálogo direto, retomando as conversas nos próximos dias para acompanhar a evolução das tratativas sobre tarifas e ações conjuntas contra o crime organizado.
Segundo um auxiliar de Lula, a ligação foi articulada pelos próprios presidentes, por meio da “linha direta” estabelecida após contatos recentes entre os dois mandatários.
Imagem destacada: Ricardo Stuckert/PR




