Por BENEDITO TADEU CÉSAR*
A nova rodada da pesquisa AtlasIntel, divulgada nesta terça-feira (2), reforça uma tendência que se repete nas sondagens mais recentes: Lula mantém a dianteira nos cenários de primeiro turno, mas a direita aparece com força suficiente para manter todos os cenários de segundo turno em empate técnico. A prisão de Jair Bolsonaro não deslocou significativamente o peso do campo conservador, contrariando análises apressadas sobre um suposto esgotamento da polarização ou a abertura de espaço para um voto de centro.
Os números mostram que o país não está caminhando para o centro, porque esse centro simplesmente não existe como força eleitoral autônoma. O que existe é uma esquerda consolidada ao redor de Lula e uma direita multifacetada, que continua numerosa, coesa na prática e eleitoralmente competitiva. A antiga centro-direita tucana foi absorvida pela nova direita e pela extrema direita sem resistência — e não deixou herdeiros moderados.
Primeiro turno: Lula lidera, mas a direita demonstra densidade e capilaridade
Nos cenários de primeiro turno testados pela AtlasIntel, Lula aparece sempre próximo dos 48% de intenção de voto. Mas o elemento mais revelador é a soma dos candidatos de direita. Em alguns cenários, este bloco alcança quase os mesmos percentuais de Lula.Isso mostra que a força da direita não depende de um único nome e que a ideia de desorganização do campo conservador é ilusória. Há múltiplas lideranças possíveis — Tarcísio, Michelle Bolsonaro, Flávio Bolsonaro, Caiado, Ratinho Jr. — e todas ajudam a sustentar um campo eleitoral amplo.
Cenários de 1º turno
Pesquisa AtlasIntel para Presidência da República — 1º turno
| Candidato | Cenário 1 | Cenário 2 | Cenário 3 | Cenário 4 | Cenário 5 |
|---|---|---|---|---|---|
| Lula (PT) | 48,4% | 48,7% | 48,5% | 47,3% | – |
| Fernando Haddad (PT) | – | – | – | – | 44,4% |
| Tarcísio de Freitas (Republicanos) | 32,5% | – | – | – | 32,3% |
| Michelle Bolsonaro (PL) | – | 28,6% | – | – | – |
| Ronaldo Caiado (União Brasil) | 5,7% | 9,4% | 16,9% | 10,2% | 5,6% |
| Flávio Bolsonaro (PL) | – | – | – | 23,1% | – |
| Ratinho Jr. (PSD) | 4,1% | 5,0% | 12,6% | 7,1% | 4,2% |
| Renan Santos (Missão) | 1,9% | 2,1% | 2,6% | 2,4% | 2,0% |
| Romeu Zema (Novo) | 2,3% | 4,4% | 5,0% | 5,0% | 2,9% |
| Brancos/Nulos | 3,2% | 1,4% | 6,4% | 2,8% | 3,6% |
| Não sabem | 1,8% | 0,4% | 3,6% | 1,0% | 2,2% |
Cenários de 1º turno e soma da direita
| Cenário | Lula (PT) | Soma da direita* | Fonte |
|---|---|---|---|
| Com Tarcísio, Caiado, Ratinho Jr., Renan Santos e Zema | 48,4% | ~47,6% (Tarcísio 32,5% + Caiado 5,7% + Ratinho Jr. 4,1% + Renan 1,9% + Zema 2,3%) | AtlasIntel / IstoÉ |
| Com Michelle Bolsonaro, Caiado, Ratinho Jr., Zema e outros | 48,7% | ~49,5% (Michelle 28,6% + Caiado 9,4% + Ratinho Jr. 5,0% + Zema 4,4% + demais) | AtlasIntel / IstoÉ |
| Com Caiado, Ratinho Jr. e outros (sem Tarcísio ou Michelle) | 48,5% | ~39,5% (Caiado 16,9% + Ratinho Jr. 12,6% + demais) | AtlasIntel / IstoÉ |
| Com Flávio Bolsonaro, Caiado e outros | 47,3% | ~36,3% (Flávio 23,1% + Caiado 10,2% + demais) | AtlasIntel / IstoÉ |
*Somatórios aproximados conforme dados divulgados; incluem apenas candidatos identificados como de direita.
O dado central é que, mesmo com a dispersão natural de uma eleição ainda distante, a direita conserva uma base sólida, frequentemente variando entre 36% e 50%. Não se trata de fragmentação: trata-se de amplitude.
Segundo turno: equilíbrio absoluto e polarização estável
Se o primeiro turno mostra uma disputa com Lula à frente, o segundo turno mostra um país rachado ao meio. Lula lidera em todos os cenários, mas sempre dentro da margem de erro. Desse modo, a vantagem é estatisticamente irrelevante.
Cenários de 2º turno
| Segundo turno | Lula | Adversário | Situação |
|---|---|---|---|
| Lula × Tarcísio de Freitas | 49% | 47% | Empate técnico |
| Lula × Michelle Bolsonaro | 49% | 47% | Empate técnico |
| Lula × Flávio Bolsonaro | 49% | 47% | Empate técnico |
A direita, portanto, não depende de Bolsonaro para ser competitiva. Ela se sustenta eleitoralmente por conta própria, com forte aderência entre públicos urbanos e rurais, entre setores de renda média e alta e entre eleitores que consolidaram uma identidade conservadora ao longo da última década.
Por que a direita continua tão forte?
1. O bolsonarismo virou identidade, não candidatura.A prisão de Bolsonaro não destruiu o movimento, porque ele se enraizou como projeto cultural e político. Há uma agenda, uma comunidade simbólica e novas lideranças disponíveis para representá-la.
2. A direita tomou o espaço do PSDB e ampliou sua influência.A centro-direita que existiu entre os anos 1990 e 2014 desapareceu como força organizada. Seu eleitorado migrou para a direita mais dura — e não há sinais de retorno.
3. O eleitor conservador está mobilizado e não oscila.As pesquisas mostram estabilidade no voto conservador, enquanto o voto de centro e de centro-esquerda se comporta de maneira mais volátil.
4. Lula tem teto alto, mas conhecido.A esquerda chega com força ao segundo turno, mas não tem espaço estrutural para crescer além de seu núcleo tradicional. Isso coloca a eleição sempre na margem estreita.
5. A polarização não cansou o eleitor — ela organizou a política.O discurso de que “o eleitor quer o centro” ignora o que os números demonstram: os polos se consolidaram como referência de identidade, valores e pertencimento.
Polarização estável como novo normal
O quadro que a AtlasIntel apresenta não é de transição, mas de consolidação. A polarização é estável, os dois blocos são robustos e o eleitorado está distribuído de forma relativamente simétrica entre esquerda e direita.
O centro político, tão mencionado em análises de desejo e não de realidade, não aparece nas pesquisas. E a disputa de 2026 se anuncia tão acirrada quanto a de 2022 — talvez até mais.
*Benedito Tadeu César é cientista político e professor aposentado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Ilustração da capa: Imagem gerada por IA ChatGPT.




