Gaza Tropical

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Por ANGELO CAVALCANTE*

Na manhã de 4ª feira, o Brasil e o mundo despertaram com imagens chocantes, horripilantes e sangrentas de dezenas e dezenas de cadáveres perfurados, trespassados e desfigurados por projéteis devastadores, fatais e advindos de pistolas, carabinas e fuzis da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Os mortos eram, no seu geral, homens, jovens, negros (é claro!) e moradores das vastas periferias de morros e colinas da cidade do Rio de Janeiro, destaque às comunidades da Penha e do Alemão.

Aos não sabedores, a Penha ou o Complexo da Penha é um conjunto de treze favelas ou comunidades e situado na assim dita zona norte da cidade; por ali habitam, vivem aproximadamente cem mil pessoas.

O Alemão ou o bem mais conhecido e anunciado Complexo do Alemão por sua vez, é um combo, um combinado irregular e acidentado de cerca de dezessete comunidades. Isso representa, implica em cerca de cinquenta e quatro mil pessoas (IBGE/CENSO 2022).

Em perspectiva, vejam… Se o Alemão fosse uma cidade seria maior do que 89% das cidades brasileiras. Apenas e somente 593 cidades país afora seriam maiores do que o “Alemão”.

Pois sim, este largo coletivo periférico está posto e situado também, na zona norte do Rio de Janeiro e dramaticamente, possui o pior – o pior! – IDH da capital fluminense. Isso quer dizer que essa gente sofre diária e cotidianamente com problemas sérios de moradia, transporte, renda, de acesso à educação o que, por óbvio, agrava e compromete mais ainda a já baixa e miúda qualidade de vida desse povo.

Tento situar e clarear um pouco mais essa informação… Das 1724 favelas/comunidades da cidade do Rio de Janeiro (IBGE/2024), o Complexo do Alemão está, se acha em pior situação no que se refere ao seu IDH.

Então… O que a Penha e o Alemão tem em comum?

Bom… Essas localidades abrigam representações importantes e orgânicas da facção criminosa Comando Vermelho (CV).

E é precisamente nesse turvo, denso e inflamável caldo social, político e territorial que a Policia Militar do Rio de Janeiro, sob o comando do infame e obscuro governador Claudio Castro, na 3ª feira, 28 de outubro de 2025, adentrou essas micro-regiões urbanas ou suburbanas com 2.500 militares onde, buscando cumprir cerca de cem mandados de prisão, deu forma para o principal e mais brutal massacre urbano da história brasileira.

Não há precedente para o que acaba de acontecer no Rio de Janeiro. Nem no período, no “topos” mais vil e sangrento da ditadura militar brasileira viu-se algo dessa monta e gravidade.

Eram incontáveis os corpos dilacerados, despedaçados e os números nunca batem, jamais coincidem, o que, por sinal, é indicativo do tamanho da tragédia social e pública e que acaba de nos acontecer.

Em dado momento, os mortos estão em sessenta; em outros, são oitenta, noventa, cem, cento e vinte, cento e trinta e já se cogita para mais de duzentos desses seres humanos assassinados.

Nesse moedor de carne humana o marcador civilizacional, básico e binário do “culpado/inocente” já não faz a menor diferença.

A “eficiência” dessa operação, ora pois, teve como base e fundamento justa e objetivamente a assumida e criminosa indiferença institucional ante a qualquer tipo de mediação, condicionante legal ou jurídica no que respeita a “bobagens e excentrismos” afeitos com a dignidade humana.

Na Vila Cruzeiro, na Praça da Penha, os corpos eram amontoados e em seguida, enfileirados e homiziados sob lençóis das mais diferentes cores e tonalidades, em um mix insultoso e deletério de coloração como que anunciando um tipo próprio e macabro de carnaval a envolver gritos, ordens de comando, rajadas, disparos, fumaça, brados de desespero, torrentes de sangue e ao fim, o desfecho anunciado e previsível com a apresentação da imensa “ala dos abatidos e combalidos” como derradeiro ato dessa tragédia épica e colossal.

Nesse quadro dantesco, enquanto o sangue de culpados e inocentes escorria sobre batentes e calçadas, a política subterrânea do Brasil fazia das suas e impulsionada pelo já esperado e catártico ódio dos fascistas brasileiros.

Bolsonaristas da Câmara dos Deputados atingiram espécie de orgasmos incontindos e coletivos com a “soberba e exitosa” obra dos pretores fluminenses.

Os parlamentares da ultra-direita, bestas humanas, com intimidades já molhadas, umidificadas com o gozo da pantagruelesca necro-paisagem de tanta gente morta e destruída sentiram-se motivados estimulados, excitados para níveis e patamares jamais vistos e depois disso… Claro, sorriram, cantaram, renderam graças ao “êxito” da mais desgraçada e chocante operação militar brasileira desde o destempero indescritível de Canudos (1896-1897) nos confins do sertão baiano.

O provinciano governador de Goiás, o caudilho Ronaldo Caiado, pretendente ao governo da União não perdeu tempo e em demagogia corriqueira e estapafúrdia já se dispôs para, reparem bem, ofertar efetivos da desassistida e mal paga PM goiana para o auxílio ao seu correlato corporativo do Rio de Janeiro.

Vejam…

É como se o problema, a questão da segurança pública do Rio de Janeiro fosse a falta de contingentes, de efetivos em sua PM; equivocado e pueril, Caiado busca com isso nos fazer crer de que a questão a envolver esse drama é a falta de profissionais da segurança, de armas ou de uma expertise na inteligência a monitorar as giras e dinâmicas do crime organizado no estado do Rio de Janeiro.

Não é só demagógico… É absurdo!

Reparem bem…

A PM do Rio de Janeiro conta atualmente com 42.000 militares a envolver oficiais e a soldadesca; a PM de São Paulo possui 82.500 militares; a PM de Minas Gerais, 37.500; a PM da Bahia, 33.000; a PM do Rio Grande do Sul, 33.650; a PM de Pernambuco, 21.500 e, por fim; a PM goiana, com 16.000.

Nesse sentido, a PM do Rio de Janeiro, junto a seus correlatos paulista e mineiro, se apresenta com os maiores quantitativos militares de toda a América Latina.

O “gêmeo”, o “outro” político dessa tragédia é essa mentirama que afronta a inteligência e a sensibilidade alheias.

O Rio de Janeiro possui as forças necessárias, os equipamentos e a inteligência política, policial e corporativa para enfrentar o crime organizado em suas mais distintas manifestações e isso não está em causa!

O que importa é que o estado policial e neofascista do Rio de Janeiro e gerido por um criminoso vaidoso e inconsequente abriu mão do seu efetivo papel de combater quem deve, de fato, ser combatido, para, ao contrário disso, explodir com a vida de pobres, pretos e marginalizados.

Afinal, são só pobres e pretos… Quem se importa? Podem, sem maiores problemas, ser confundidos com o banditismo já consolidado, profundo e nacionalizado do Comando Vermelho.

Afora isso, é o velho “MiMiMi” dessa gente chata e que não para de falar em dignidade, respeito às pessoas, direitos humanos e “bobagens” desse tipo.

Não parou!
Não vai parar!
Seguirá!


*Angelo Cavalcante é economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Itumbiara.

E-mail : angelo.cavalcante@ueg.br

Foto de capa: Reprodução

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