Da REDAÇÃO
A ascensão da extrema direita no Brasil tem forte relação com a mobilização política de evangélicos. É o que revela o artigo “Evangelicals and the Far Right in Brazil: Political Attitudes”, publicado na Revista Mexicana de Opinión Pública em 2025 e assinado por Silvana Krause, Helcimara Telles, Joscimar Souza Silva e João C. L. Camargos. O estudo analisa como esse grupo se tornou protagonista na radicalização ideológica e na difusão de desinformação.
O artigo baseou-se em uma combinação de bases estatísticas nacionais e em métodos quantitativos de análise comparada e entre as principais fontes estão: Pesquisas da ABRAPEL/IPESPE – “Termômetro da Campanha 2022”, que mediu percepções políticas, recepção de fake news e identificação ideológica por religião; Levantamentos da UFRJ (Fonseca & Brasil, 2021), que examinaram o uso de grupos de WhatsApp para disseminação de informações e desinformações entre evangélicos e Dados de opinião pública coletados em diferentes estados, que permitiram comparar tendências entre evangélicos e demais religiões.
Evangélicos mais alinhados à direita
O levantamento mostra que 52% dos evangélicos se identificam com a direita contra apenas 18% que se dizem de esquerda. Na população geral, os números são bem diferentes: 34% se posicionam à direita e 28% à esquerda. Essa diferença estatisticamente significativa ajuda a entender por que o segmento foi peça central nas vitórias eleitorais da direita.

WhatsApp como canal de influência
Outro dado relevante é o uso intensivo do WhatsApp. Enquanto 92% dos evangélicos participam de grupos religiosos na plataforma, apenas 71% dos católicos e 57% dos espíritas têm esse hábito. Isso amplia a circulação de mensagens políticas e de fake news entre evangélicos, com alto grau de confiança nos conteúdos.

Fake news: fraude nas urnas e fechamento de igrejas
As eleições de 2022 foram marcadas por uma onda de desinformação. O estudo mostra que evangélicos foram mais propensos a acreditar em fake news do que outros grupos religiosos.
- Fraude nas urnas: 50% dos evangélicos acreditaram na narrativa, contra 36% dos demais.
- Fechamento de igrejas por Lula: 31% acreditaram, mesmo que apenas 28% tenham recebido a notícia.

Esse resultado revela um dado curioso: entre evangélicos, o número de pessoas que acreditou em determinada desinformação foi maior que o de pessoas que receberam a mensagem — um sinal de confirmação de crenças prévias.
Teologias e política: a batalha do “bem contra o mal”
Os pesquisadores destacam a influência da Teologia do Domínio e da chamada Guerra Espiritual no discurso político evangélico. Essas correntes difundem a ideia de uma batalha entre o bem e o mal, em que adversários políticos como Lula e a esquerda são retratados como inimigos da fé cristã.
Embora apenas 21% dos entrevistados afirmem conhecer a Teologia do Domínio, o estudo mostra que suas ideias influenciam fortemente a retórica política evangélica, integrando outras doutrinas e reforçando posições conservadoras.

Da fé à política institucional
A entrada dos evangélicos na política se intensificou desde a Constituinte de 1986, quando o lema “irmão vota em irmão” ganhou força. Nos anos 2000, a mobilização se ampliou com a criação da Frente Parlamentar Evangélica, hoje uma das bancadas mais influentes do Congresso.
Durante os governos Bolsonaro, o segmento se consolidou como pilar do bolsonarismo, sustentado por pautas conservadoras e narrativas religiosas que legitimavam a perseguição a minorias e a resistência a políticas de igualdade de gênero e diversidade sexual.
Impactos eleitorais e sociais
Mesmo com Bolsonaro inelegível, o artigo mostra que sua base evangélica continua mobilizada. O PL, partido do ex-presidente, elegeu a maior bancada da Câmara em 2022, com forte presença de evangélicos. Essa influência tende a se manter no cenário político, ampliando a força da extrema direita no Brasil.
Segundo os autores, a disseminação de fake news entre evangélicos não é apenas um problema de comunicação, mas parte de uma estratégia política que explora valores religiosos para legitimar posições autoritárias.
Conclusões: um desafio para a democracia
A pesquisa conclui que os evangélicos foram o grupo que mais aderiu proporcionalmente à extrema direita no Brasil. Mais engajados em pautas transversais do que na política partidária, tornaram-se fundamentais para a ascensão e sustentação do bolsonarismo.
Os autores defendem que futuras pesquisas aprofundem o impacto das correntes teológicas sobre o comportamento político, especialmente em contextos de polarização. E alertam: o uso de valores religiosos para fins políticos ameaça a democracia brasileira ao transformar adversários em inimigos e alimentar desinformação em larga escala.
Fontes: Silvana Krause, Helcimara Telles, Joscimar Souza Silva e João C. L. Camargos. Evangelicals and the Far Right in Brazil: Political Attitudes, Revista Mexicana de Opinión Pública, n. 39, 2025.
Ilustração da capa: Imagem gerada por IA ChatGPT
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evangélicos, extrema direita, fake news, bolsonarismo, religião e política, Teologia do Domínio, Guerra Espiritual, eleições 2022, democracia no Brasil




