Da REDAÇÃO
O Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito divulgou neste domingo (30) uma nota pública denunciando uma escalada autoritária na condução da Câmara Municipal de Porto Alegre. O documento reage à iniciativa da presidente da Casa, vereadora Nádia Gerhard (PL), que pediu a cassação de sete vereadores da oposição por terem realizado uma coletiva de imprensa no Plenário — prática corriqueira em parlamentos de todo o país.
Cassação por coletiva: medida excepcional aplicada sem justificativa
A crise começou quando parlamentares do PT, Psol e PcdoB tentaram convocar a imprensa para tratar da CPI do Desmonte do Dmae. Impedidos de usar a sala de imprensa sob a alegação de que não haviam solicitado o espaço com 48 horas de antecedência, decidiram dar a coletiva no Plenário, ambiente institucional de uso dos vereadores.
Apesar de nenhuma norma interna — nem a resolução de mesa nº 643, nem o regimento da Câmara — vedar entrevistas no Plenário, a presidente Nádia caracterizou o ato como “uso irregular” das dependências legislativas e encaminhou um pedido de cassação à Comissão de Ética. Juristas ouvidos pelo Comitê classificam a iniciativa como desproporcional e contrária às práticas usuais do Legislativo brasileiro.
Ainda assim, a Comissão aceitou a representação e notificou os sete parlamentares.
Repressão a movimentos sociais: o episódio de outubro
A nota recorda que este não é um caso isolado. Em 15 de outubro de 2025, em sessão que tratava de projetos com forte impacto social — incluindo mudanças no Dmae, políticas de limpeza urbana e medidas que afetavam catadores de materiais recicláveis —, a presidente determinou a atuação da Guarda Municipal para conter manifestantes que tentavam acompanhar os debates no Plenário.
A ação utilizou gás lacrimogêneo, spray de pimenta e balas de borracha, deixando feridos inclusive parlamentares no exercício do mandato. Para o Comitê, o episódio marcou um “ponto de inflexão” no uso da força como ferramenta de controle político dentro da Câmara.
Projeto que pune quem alimenta pessoas em situação de rua
O Comitê também critica o projeto de lei apresentado por Nádia Gerhard que impõe regras rígidas e autorização prévia para voluntários, entidades ou grupos que desejem distribuir alimentos à população em situação de rua. As multas podem chegar a R$ 2,9 mil.
Especialistas citados na nota apontam que, num contexto de aumento da pobreza e retração das políticas assistenciais, a proposta funciona como criminalização da solidariedade. A retórica oficial da presidente — centrada em “organização do espaço público” e “ordem urbana” — seria, segundo o Comitê, uma forma de mascarar o caráter punitivo da medida.
Perseguição política e desvirtuamento da função do Legislativo
Para o Comitê em Defesa da Democracia, a condução da Câmara sob a atual presidência revela um padrão de ações que viola princípios democráticos básicos. Em vez de servir como espaço de debate plural e de mediação de conflitos, o Legislativo estaria sendo utilizado como plataforma de intimidação contra opositores políticos.
“O parlamento exige respeito à diversidade e compromisso com o diálogo. O uso abusivo da força e a tentativa de silenciar adversários são incompatíveis com a democracia”, afirma o texto.
Alerta e defesa dos princípios republicanos
A nota conclui com um apelo para que a escalada autoritária seja interrompida e que a Câmara volte a ser administrada com o espírito democrático que marcou a trajetória política de Porto Alegre, historicamente reconhecida por seus processos de participação popular.
Datada de 30 de novembro de 2025, a manifestação do Comitê reforça o alerta para o crescente uso de métodos de coerção institucional em um dos parlamentos mais importantes do Sul do país.
Leia a íntegra da nota do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito
NOTA DE REPÚDIO À ESCALADA AUTORITÁRIA NA CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE
O Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito vem a público manifestar profundo repúdio à iniciativa da presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, vereadora Nádia Gerhard (PL), de pedir a cassação de sete vereadores da oposição (quatro do PT, dois do Psol, um do PcdoB), por terem realizado uma coletiva de imprensa no Plenário da Câmara sobre a CPI do Desmonte do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), depois de terem sido impedidos de realizá-la na sala de imprensa, por não terem solicitado o espaço com 48 horas de antecedência.
Apesar de nem a resolução de mesa nº 643, que trata da cedência de espaços da Câmara, nem o regimento interno da Câmara versarem sobre os espaços em que podem ou não ser realizadas entrevistas de imprensa, a presidente Nádia encaminhou o pedido de cassação dos sete vereadores da oposição à Comissão de Ética da Câmara – tradicionalmente destinada a avaliar condutas parlamentares em situações excepcionais e de caráter grave – com a justificativa de “uso irregular” das dependências da instituição.
A acusação foi considerada desproporcional por juristas e especialistas em direito parlamentar, que apontam o plenário como um espaço institucional dos vereadores, e a prática de coletivas nesses locais como corriqueira em legislativos de todo o país. Apesar disso, a Comissão de Ética aceitou a representação da presidente da Câmara e enviou notificações aos parlamentares, estabelecendo prazo para sua defesa.
O autoritarismo da presidente da Câmara com um pedido de cassação de vereadores da oposição sem razão de gravidade que o justifique, já se manifestou em eventos anteriores. Em 15 de outubro de 2025, em sessão que trataria de temas sensíveis – propostas relativas ao DMAE, alterações na política de limpeza urbana e medidas que impactavam diretamente catadores de materiais recicláveis -, a presidente Nádia deu ordem para acionar a Guarda Municipal de Porto Alegre que, para conter os representantes de movimentos sociais, servidores e cidadãos que tentavam entrar no Plenário, utilizou gás lacrimogêneo, spray de pimenta e balas de borracha, ferindo parlamentares no exercício de suas funções.
O autoritarismo da presidente Nádia expressou-se também em seu projeto de lei para regulamentar a distribuição de alimentos às pessoas em situação de rua, que obriga qualquer grupo, entidade ou voluntário que deseje oferecer comida a seguir regras rígidas e obter autorização prévia do município, sob pena de multas que podem chegar a R$ 2,9 mil. A justificativa oficial recorre ao vocabulário sanitário e administrativo: “organização do espaço público”, “controle de fluxo”, “ordem urbana”.
Em um cenário de aumento da população em situação de rua e de retração de políticas públicas de assistência social em Porto Alegre, a proposta foi considerada por especialistas como uma inversão de prioridades: ao invés de enfrentar as raízes do problema, pune quem tenta mitigá-lo, criminalizando a solidariedade.
A presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, ao perseguir e buscar intimidar vereadores que considera adversários, expõe seu autoritarismo, sua violência e incapacidade de compreender que o parlamento, numa sociedade democrática, é o espaço de manifestação, de debate e de negociação entre diferentes de visões de mundo, o que exige o respeito à diversidade e a capacidade de mediar conflitos e não a intolerância e o uso abusivo da força que a instituição lhe proporciona.
Na firme defesa da democracia, o Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito alerta e repudia a escalada autoritária da presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, na expectativa de que essa postura seja eliminada e que o espaço parlamentar municipal venha a ser presidido com o espírito democrático que historicamente caracterizou nossa cidade.
Porto Alegre, 30 de novembro de 2025
Foto da capa: Fernando Antunes/CMPA- Uso público




