Em Temer Não Confiamos

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Por MARIA LUIZA FALCÃO SILVA*

Há algo de profundamente irônico — e perigoso — no retorno de Michel Temer ao noticiário político em meio ao julgamento dos golpistas de 8 de janeiro e ao debate sobre a anistia. Temer, que em 2016 liderou o impeachment de Dilma Rousseff sob o argumento de “pacificar o país”, reaparece agora reunido com Aécio Neves e Paulinho da Força. A mesma tríade que, há menos de dez anos, ofereceu ao Brasil um dos períodos de maior instabilidade política da história recente.

A Promessa de Pacificação que Nunca Veio

Quando Temer assumiu o Planalto, prometeu ser o presidente da conciliação, o articulador do “grande acordo nacional”. O resultado foi o oposto: um país ainda mais polarizado, reformas regressivas — como a trabalhista — e um desgaste institucional que abriu caminho para o bolsonarismo. A ideia de que esse grupo poderia, mais uma vez, se apresentar como solução para a crise atual beira o insulto à memória coletiva.

Aécio, Paulinho e a Velha Política

Não custa lembrar que Aécio Neves, derrotado nas urnas em 2014, questionou o resultado eleitoral e pediu recontagem dos votos — um gesto que abriu espaço para o questionamento sistemático da legitimidade das urnas, mais tarde explorado pelo bolsonarismo. Hoje, volta ao centro da cena como se nada tivesse acontecido. Paulinho da Força, por sua vez, segue sendo o porta-voz de uma pauta sindical esvaziada, hoje mais próxima do fisiologismo que da defesa de direitos.

O encontro entre os três é um sinal de que setores tradicionais da política brasileira sentem o cheiro de oportunidade: o julgamento dos golpistas, a condenação de Bolsonaro e a possibilidade de anistia reacenderam as velhas articulações de bastidores.

A Lição de 2016

A sociedade brasileira precisa aprender com 2016: pactos feitos às pressas, sem transparência e sem base popular, apenas aprofundam a crise. Temer e seus aliados não são portadores de um projeto de reconstrução democrática — são, antes, representantes de uma política que cedeu ao autoritarismo sempre que conveniente.

Nenhum “Grande Acordo”

Em Temer não confiamos. A verdadeira pacificação virá quando o país consolidar sua democracia, punir os responsáveis pelo golpe e rejeitar qualquer tentativa de anistia que lave a ficha de quem atentou contra as instituições. O Brasil não precisa de um novo “grande acordo nacional” costurado nos salões de Brasília — precisa de justiça, memória e compromisso real com o Estado de Direito.


*Maria Luiza Falcão Silva é PhD pela Heriot-Watt University, Escócia, Professora Aposentada da Universidade de Brasília e integra o Grupo Brasil-China de Economia das Mudanças do Clima (GBCMC) do Neasia/UnB. É membro da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED). Entre outros, é autora de Modern Exchange Rate Regimes, Stabilisation Programmes and Co-ordination of Macroeconomic Policies, Ashgate, England/USA.

Foto de capa: Antonio Cruz/Agência Brasil

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