Susto doméstico de Eduardo Bolsonaro vira discurso político: o crítico da democracia agora teme as sombras que ajudou a projetar
Por CASTIGAT RIDENS*
O “perigo” e sua ironia: quando a vidraça escura vira drama político
Era para ser um susto doméstico: um carro de vidros escuros estacionado perto da casa, pessoas usando celular, e a esposa de Eduardo Bolsonaro, nos Estados Unidos, em alerta. O suficiente para chamar a polícia. Nada de carro-bomba, nada de conspiração — apenas um veículo parado.
O próprio deputado narrou o episódio nas redes sociais:
“Ontem, minha esposa viu um carro em uma postura incomum, quando eu não estava em casa. Ela ficou com muito medo e eu voltei às pressas para casa. Graças a Deus, depois de apuração detalhada, constatamos que não era uma ameaça à nossa família.”
“Contudo, isso me faz pensar na extensão do mal que o regime de exceção fez e faz na minha família. Minha esposa é uma boa pessoa, nunca fez mal a ninguém, não merece viver em estado perpétuo de medo e apreensão.”Pois é. O mesmo Eduardo Bolsonaro que desfilou nos bastidores da trama golpista de 2022, que exaltou a ditadura de 1964 e nunca economizou ameaças à democracia, agora se descobre vítima de um “regime de exceção”. A ironia é quase poética.
O filho do autoritarismo descobre o medo
O homem que já flertou com a ideia de “um novo AI-5” agora se declara traumatizado pelo “mal” de regimes autoritários. A súbita conversão à linguagem dos direitos civis poderia comover — não fosse ela seletiva.
A retórica de Eduardo, construída sobre a exaltação da força e da intimidação, agora se refugia na fragilidade doméstica. É o bolsonarismo em sua forma mais reveladora: o autor do discurso da valentia descobre o terror das próprias sombras.
A contradição em cena
A narrativa serve a dois propósitos: humanizar o protagonista e inverter os papéis — o agressor torna-se o ameaçado. O homem que alimentou o medo coletivo agora pede empatia pelo medo particular.
Fala em “regime de exceção” sem mencionar que o pai, Jair Bolsonaro, idolatra torturadores e que o próprio filho marchou politicamente ao lado dos que sonhavam com tanques nas ruas.
O carro parado, afinal, não era ameaça alguma. Mas revelou o abismo moral entre o discurso e a realidade: o medo que Eduardo diz sentir é o mesmo que seu campo político semeou — nas mulheres, nas minorias, nos jornalistas, nos professores, nos que ousaram discordar.
O espelho do autoritarismo
O episódio vale menos pela anedota e mais pela confissão involuntária. Eduardo Bolsonaro teme o que ajudou a criar: um ambiente paranoico, de desconfiança e hostilidade, onde o “outro” é sempre potencial inimigo. É curioso: quando a política se arma de medo, o medo volta armado.
O clã que naturalizou ameaças e conspirações agora se vê refém delas. Chama-se karma democrático — e ele não poupa ninguém.
Entre o susto e a lição
Nada contra a esposa de Eduardo, que fez o que qualquer pessoa faria diante de algo suspeito. Mas o uso político do episódio — travestido de reflexão sobre “regimes de exceção” — beira o autoengano.
Quem invocou o arbítrio agora clama por tranquilidade. Quem deslegitimou instituições agora confia na polícia. Quem cultivou o medo descobre o desconforto de viver com ele.
Eis a ironia suprema: quando a exceção vira rotina, até os seus arquitetos começam a temê-la.
*Castigat Ridens é um pseudônimo criado a partir da expressão latina ‘Castigat ridendo mores’, que significa ‘corrige os costumes rindo’ ou ‘critica a sociedade pelo riso’, muito usada no contexto da comédia como instrumento de crítica social.
Ilustração da capa: Eduardo olha pela janela – Imagem gerada por IA ChatGPT
Tags: Eduardo Bolsonaro, extrema-direita, democracia brasileira, autoritarismo, vitimização política
Frase-chave de foco: Eduardo Bolsonaro fala em “regime de exceção” após esposa acionar polícia por carro suspeito nos EUA.





Respostas de 2
Muito bom.
O grande tropeço da mulher tão boazinha dele foi casar com uma pessoa tão desqualificada como ele