Ecos de tempos sombrios: o bolsonarismo em Santa Catarina

translate

arzh-CNenfrdeitjaptruesyi
manifestacao-ato-pro-bolsonaro

Por MICHEL GOULART DA SILVA*

O estado de Santa Catarina parece ser uma espécie de local privilegiado para os experimentos políticos da extrema direita. Em poucos dias foram divulgadas duas de suas ações de perseguição e coerção, tanto atacando os movimentos sociais como a autonomia das universidades.

A primeira dessas ações foi a lei em torno do chamado “Abril Amarelo”, por parte do governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL). Essa iniciativa, em oposição à campanha Abril Vermelho organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) em defesa da reforma agrária, coloca em foco “ações de conscientização sobre a importância da defesa da propriedade privada”.

A lei, oriunda de um projeto de lei apresentado pelo deputado Oscar Gutz (PL), vai além da mera propaganda ideológica de defesa da propriedade privada. Em um de seus artigos, fala da “importância da união de proprietários de terra, produtores vizinhos, amigos e família para montar acampamento permanente para evitar a invasão”. A lei também indica a “conscientização quanto a comunicação das autoridades policiais no caso de avistar movimentações de invasão de propriedades privadas”.

Concretamente, travestido de uma efeméride, sugere-se à população agir no sentido de combater eventuais ações que atentem contra a propriedade privada, seja comunicando a polícia, seja estabelecendo locais de vigília por contra própria. O decreto apenas não fala em armamento dessas milícias, mas por certa deixa subentendo que as pessoas têm direito a proteger, da forma que for, sua propriedade.

O outro experimento autoritário passa pela perseguição franca e aberta à liberdade de cátedra das universidades. Em evento de formatura dos cursos do Centro Educação da UDESC, o paraninfo, professor Reinaldo Lohn, fez alusão em seu discurso aos “tempos sombrios” que se tem vivido nos últimos anos e chamou de golpe a intentona bolsonarista de 8 de janeiro de 2023.

Essa fala levou a que fosse enviada para a UDESC, por iniciativa do deputado Alex Brasil (PL), uma correspondência da Assembleia Legislativa questionado sobre medidas a serem adotadas “em virtude da conduta do professor”. O documento ainda fala em respeito à “pluralidade de opiniões e o caráter apartidário da instituição”, o que soa no mínimo hipócrita vindo do representante de um partido que não respeita o resultado das urnas da eleição de 2022.

Essa ação do parlamentar busca atentar contra a autonomia da universidade, um espaço plural em que as posições divergentes são expostas e discutidas aberta e respeitosamente e na qual nenhuma das opiniões pode ser tolhida. O professor em questão, reconhecido pesquisador do tema a que fez alusão, em seu discurso não emitiu opiniões sobre o assunto, mas expôs conclusões de suas pesquisas realizadas há décadas. Essas pesquisas são respeitadas e reconhecidas em âmbito nacional e internacional, mesmo que talvez o deputado ignore esse fato e se limite a emitir falácias oriundas do senso comum.

Reinaldo não fez outra coisa a não ser um historiador que, vivendo seu tempo, analisa os processos em curso, como parte do campo da chamada do Tempo Presente. Não há nenhuma dúvida sobre o uso do termo golpe para se remeter à articulação bolsonarista que visava manter no poder o então presidente Jair Bolsonaro. As provas levantadas na investigação dão mostras de uma evidente tentativa de criar instabilidade nas instituições. O termo golpe está correto para a articulação bolsonarista, tanto no que se refere à conspiração do ex-presidente quanto ao ataque da turba descontrolada em 8 de janeiro.

O bolsonarismo vem mostrando suas garras contra os trabalhadores, construindo atos em defesa da anistia dos golpista, do qual participou inclusive Jorginho Mello, ou tentando aplicar sua pauta reacionária no parlamento. Os trabalhadores, por meio de suas organizações, precisam se mobilizar, seja para derrotar em definitivo a extrema direita, seja para construir alternativas que vão para além das eleições.


* Michel Goulart da Silva é doutor em história pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e técnico-administrativo no Instituto Federal Catarinense (IFC)

Foto da capa: Manifestantes se deslocaram para a sede da Polícia Federal *: Marcos Schmitt/ NSC TV

Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia..

Gostou do texto? Tem críticas, correções ou complementações a fazer? Quer elogiar?

Deixe aqui o seu comentário.

Os comentários não representam a opinião da RED. A responsabilidade é do comentador.

Uma resposta

  1. Some-se a isso medidas de “higienismo” em cidades catarinenses com retirada da população de rua sem considerar os aspectos humanos e de respeito ao indivíduo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

plugins premium WordPress