De baixo para cima: o desafio à ortodoxia econômica oficial

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Por J. CARLOS DE ASSIS* .

A política econômica brasileira está travando o crescimento do País e estrangulando as políticas públicas. Tenho falado sobre isso de forma insistente, mas, hoje, diante da virtual inutilidade de meus artigos, vou continuar abordando um tema alternativo que me propus junto com o empresário e jornalista Rodrigo Rocha, sócio da Tribuna da Imprensa: como podemos substituir a política econômica absurda e inconsistente que “vem de cima”, por uma iniciativa mais eficaz de baixo para cima?

Primeiro, uma breve descrição e dos efeitos da política macroeconômica em curso: a fiscal resume-se a defender a regra do orçamento primário equilibrado (falam agora na estupidez do orçamento primário superavitário!), que leva inexoravelmente ao congelamento da economia ou à depressão; a monetária baseia-se no fetiche de que taxa de juros (Selic) crescente combate ou estabiliza a inflação. Trata-se de um duplo equívoco, ao qual contraponho uma receita oposta e seus efeitos.

Vejamos. Sustento a conveniência de um déficit orçamentário de até 3% do PIB, como é o caso dos países do euro, que teria como consequência um aumento da demanda global proporcional. Esse aumento da demanda teria de ser contrabalançado por aumento da oferta e, portanto, da produção, para haver estabilidade dos preços. Já o aumento da produção requer condições de financiamento favoráveis do investimento, o que exige taxas de juros civilizadas, e não as taxas estratosféricas da Selic.

O segundo é o cenário ideal. Mas estamos na condição contrária. Não crescemos de forma significativa no ano passado – o aumento de pouco mais de 3% do PIB foi circunstancial e não está se repetindo este ano, como se viu no primeiro trimestre. Assim, o que a política macroeconômica nos reserva é mais estrangulamento do orçamento primário, para o pagamento do serviço da dívida pública. E qualquer coisa vale para efetivar esse estrangulamento, inclusive congelar o salário mínimo e outras despesas vinculadas a ele, como quer Armínio Fraga.

A menção a Armínio é importante porque ele é um dos economistas brasileiros mais influentes na mídia e junto às nossas classes dominantes. E estas, naturalmente, com o poder do dinheiro, subordinam a seus interesses o Congresso Nacional. Portanto sua proposta, inicialmente feita em Harvard, nos Estados Unidos, encontrará bom coro entre os parlamentares, sobretudo quando veiculada, como foi, pelo jornal líder do maior grupo de comunicação do País, O Globo.

Essa longa introdução é para reforçar minha decisão de apontar uma alternativa à política econômica destrutiva a que nos submetem de “cima para baixo” por uma política alternativa “de baixo para cima”, a partir da mobilização de forças produtivas comunitárias regionais. O principal instrumento para isso são os APLs(Arranjos Produtivos Locais). Eles são espécie de célula embrionária de uma nova sociedade, a que chamamos, Rodrigo Rocha e eu, de Sociocapitalismo.

Os APLs não dependem das políticas fiscal e monetária. Se bem articulados regionalmente, integram suas próprias cadeias produtivas através da economia circular. Esta implica que o dinheiro necessário para fazer a produção passar por diferentes etapas do processo produtivo, de mãos em mãos, se torne independente da política fiscal restritiva do Governo e também da taxa de juros arbitrada pelo Banco Central. Na prática, num sistema informatizado, todas as etapas e o resultado final do processo pode ser controlado pelos sócios dos Arranjos em tempo real, através de um token.

Do ponto de vista social, o APL inverte a relação entre o capital e o trabalho. Em lugar de o capital comandar o trabalhador, o trabalhador, como sócio da Sociedade Anônima, é quem controla o capital, junto com outros sócios comunitários que queiram aderir ao sistema e participar de seus resultados pela compra de ações. A integração interna do Arranjo deve articular-se com as comunidades em torno, inclusive com os setores públicos locais e regionais que podem contribuir com a construção de infraestruturas – uma obrigação deles -, bem como com movimentos comunitários.

Calculamos que existem no Brasil, além de quase 90 APLs já em funcionamento, cerca de 340 comunidades locais ou regionais onde será possível organizá-los, a partir da experiência que temos em Santana do Livramento, RS, e Silva Jardim, RJ (a ser iniciado). Nossa intenção é nos utilizarmos intensamente dos recursos de internet para acessar essas comunidades, através de suas lideranças, para despertar nelas um espírito empreendedor que já temos verificado em diferentes municípios, regiões e  comunidades.

Note-se que o APL, mais que um importante meio para incrementar a produção rural no País, contribui para a redução do preço dos alimentos para o consumidor e, portanto, também para a redução da inflação. É que tem baixos custos produtivos assegurados pela alta tecnologia agrícola que nele pode ser adotada e pela eliminação de intermediários, possibilitada pelo uso da internet vinculada a plataformas digitais que acompanham todo o processo produtivo em tempo real, sobretudo no momento da comercialização.  

Portanto, pretendemos, Rodrigo e eu, nos concentrarmos na campanha “Vamos fazer o Brasil grande de vez” para que se expandam APLs e iniciativas produtivas por todo o País, dispensando, o quanto possível, os “favores” da sórdida elite política brasileira. Teremos um sentimento de orgulho se conseguirmos organizar diretamente, ou através de consultorias, trabalhadores, empreendedores e sociedade civil que já não suportam a realidade parlamentar dos conchavos que dão prioridade a emendas políticas suspeitas, de interesse próprio, a iniciativas de real interesse público.         


*J. Carlos de Assis é jornalista, economista, doutor em Engenharia de Produção, professor aposentado de Economia Política da UEPB, e atualmente economista chefe do Grupo Videirainvest-Agroviva e editor chefe do jornal online “Tribuna da Imprensa”, a ser relançado brevemente.

Foto de capa: Reprodução

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