CORRESPONDENTE POLÍTICO: Tentativa de golpe: desvio ou doutrina militar?

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Por RUDOLFO LAGO*, do Correio da Manhã

Parece haver uma estratégia dos advogados dos militares do chamado “núcleo operacional” da tentativa de golpe para que seus clientes digam no Supremo Tribunal Federal (STF) que os planos que redigiram eram meras conjecturas, exercícios de estratégia. Assim ensaiou primeiro o general da reserva Mário Fernandes, ao dizer que seu plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva era um “pensamento digitalizado”. E, na segunda-feira, o “kid preto” Hélio Ferreira Lima, ao dizer que o plano para prender “juízes supremos”, ou seja, os ministros do STF, era mera “ferramenta de cenário prospectivo”. Um militar ouvido pelo Correio Político reza com força para que esses argumentos fracassem de maneira retumbante.

Golpe

Quer dizer, então, que “Como dar golpe” consta do currículo das academias militares? Vale estudar como assassinar o presidente da República? Vale estudar meios de prender ministros do Supremo Tribunal Federal? Não deveria ser exatamente o contrário?

Prevenção

Segundo esse militar, seria legítimo estudar planos no sentido oposto. Como estar preparado para proteger autoridades em caso de golpe de Estado. Como evitar que “juízes supremos” sejam vítimas de um ato que atente contra o Estado Democrático de Direito.

Problema é reforço de uma cultura nociva

Lima: exercícios sobre como dar um golpe? | Foto: Reprodução/Redes sociais

Ao tentar transformar planos de golpe em exercícios militares, os réus no STF reforçam que esse tipo de intervenção política pela força faz parte da cultura dos quarteis. Se, de fato, simulam como dar um golpe, isso significaria que as Forças Armadas consideram normal essa possibilidade e que preparam a corporação para essa hipótese. De dar um golpe, não de como evitá-lo. No fundo, algo arraigado na cultura. A República foi um golpe militar. Consolidou-se uma ideia de que os militares devem ser chamados para consertar momentos graves. O problema é que depois da ditadura, trabalha-se para eliminar esse tipo de intervenção.

Lott

O que valeria a academia militar estudar? Como o Marechal Henrique Teixeira Lott evitou o golpe que impediu a posse de Juscelino Kubitschek em 1960 ou como o general Olímpio Mourão Filho teve sucesso ao liderar as tropas que deram o golpe em 1964?

Democracia

A nova ascensão militar à política, lembra esse general, foi anterior à posse de Jair Bolsonaro. Começou a se esboçar ainda no governo Michel Temer, quando estava no comando do Exército o general Eduardo Villas Bôas. Mas alguns imaginavam outro caminho.

Inserção

Esse general afirma ter imaginado, no começo, que por ali se daria o caminho de inserção militar como força importante de apoio aos governos civis no regime democrático. Militares mostrando a força que poderiam ter como linhas auxiliares dos governos.

Erro

Após Bolsonaro, percebeu que essa não era a ideia, infelizmente, de muitos. Agora, prega, as Forças Armadas deveriam entender finalmente o seu papel numa democracia. Tirar definitivamente as quarteladas dos seus sonhos de consumo. E, claro, dos seus currículos.


*Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congreso e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade.

Publicado originalmente no Correio da Manhã.

Foto de capa: Fernandes: “pensamento digitalizado” constrange | Isac Nóbrega/PR

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