Por RUDOLFO LAGO*, do Correio da Manhã
A história adora uma ironia. Em 2018, o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva não pôde disputar as eleições presidenciais por um impedimento de uma lei que ele mesmo sancionou: a Lei da Ficha Limpa. O texto tornava inelegíveis políticos que estivessem condenados por tribunais colegiados. A vitória, então, foi de Jair Bolsonaro. Agora, Bolsonaro está prestes a ser condenado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) também por uma lei que ele sancionou. Tentativa de golpe de Estado só passou a ser crime, com pena de até 12 anos prevista, porque assim determinou Bolsonaro em lei sancionada em 2021. E o crime, conforme o texto sancionado pelo ex-presidente, é tentativa mesmo. Tentou dar golpe de Estado, é crime.
Golpe
A lei tem uma lógica fácil de entender. Não há a menor possibilidade de se julgar e condenar alguém por um golpe de Estado que tenha tido sucesso. Golpes abolem, pelo menos por um período, o Estado Democrático de Direito. Essa é a natureza deles.
Confissões
Assim, na visão de um advogado que acompanha o processo de perto, é incrível como a todo momento há, no caso de Bolsonaro e dos demais, confissões do que foi cometido. Nas alegações finais, a defesa do ex-presidente afirma que o que existe é um “brainstorm”.
“Ideias” desde anular eleições até matar presidente
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de janeiro: a busca pela tempestade perfeita | Foto: Joedson Alves/Agência Brasil
O problema é que essas “meras ideias” foram desde anular as eleições de 2022, que deram a vitória a Lula até um plano de assassiná-lo, juntamente com o vice-presidente Geraldo Alckmin e o então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes. Meras conjecturas, dizem as defesas dos envolvidos. Mas essa é justamente a questão que a Primeira Turma do STF irá julgar. Em que momento se deve começar a levar a sério esse tipo de conjectura? Esse tipo de conjectura deve passar pela cabeça de quem respeita a democracia e o Estado de Direito? Quando uma tentativa de golpe se inicia e precisa ser tolhida?
Ensaios
Na acusação e nas suas alegações finais, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, muito bem detalha como foram feitos os ensaios para tentar a tempestade perfeita do golpe de Estado. Se tal tempestade perfeita não houve, a sociedade deve agradecer.
Contestação
Desde sua própria eleição, Bolsonaro tratou de contestar o sistema eletrônico de votação. Criando condições de contestar um cenário eleitoral que lhe fosse desfavorável. Curioso é que, ao final, o PL contestou a eleição presidencial, mas não as que vencera.
Violência
Então, aconteceram os acampamentos em frente aos quarteis. E os atos violentos que visavam levar à decretação de uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e uma intervenção militar. Primeiro, na diplomação de Lula pelo TSE no dia 12 de dezembro de 2022.
Atentado
Depois, na tentativa de atentado a bomba em frente ao Aeroporto na véspera do Natal. Finalmente, na invasão e depredação dos prédios da República no 8 de janeiro. Lula chegou a cogitar a GLO. Foi por outro caminho: a intervenção na Segurança Pública do DF.
*Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congreso e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade.
Publicado originalmente no Correio da Manhã.
Foto de capa: Bolsonaro na sala da Primeira Turma no STF | Valter Campanato/Agência Brasil




