Por RUDOLFO LAGO* do Correio da Manhã Brasília
O deputado Otoni de Paula (MDB-RJ) puxou a oração. Com as mãos levantadas, como fazem nas situações de louvor, os evangélicos presentes oraram, com Lula, de olhos fechados, bem no meio da roda. A solenidade de sanção da lei que cria o Dia Nacional da Música Gospel é o primeiro ato político concreto desde que, no início do ano, o governo fez mudanças na sua estratégia de comunicação para se aproximar do mundo evangélico. Na ocasião, mudou o slogan do governo para “Fé no Brasil”, e a aproximação se iniciou. Um dos grandes articuladores desse movimento é o advogado-geral da União, Jorge Messias, que é da Igreja Batista. Messias é um dos responsáveis pela aproximação com Otoni de Paula.
Boa vontade
Otoni de Paula ainda não se declara da base do governo. Mas foi mais do que nítida a boa vontade demonstrada por Otoni de Paula agora com Lula. Que já tinha ficado sinalizada quando declarou no Rio de Janeiro apoio à reeleição de Eduardo Paes, do PSD.
Senha
Na solenidade, Otoni deu a senha de por onde o governo pretende se aproximar da comunidade evangélica, especialmente daquela mais carente, que vive nas periferias. Será pela economia. Por uma forte estratégia que traduza os avanços para a rotina das pessoas.
Avanços para os “mais pobres e necessitados”
Evangélicos são maioria entre os mais pobres | Foto: Igreja Evangélica Deus das Nações
De acordo com uma pesquisa feita pelo Datafolha em 2020, o percentual de evangélicos na população que ganha até dois salários mínimos é maior que a daqueles que se declaram católicos. Segundo o dado, 48% dos que vivem nessa faixa de renda pertencem a alguma igreja evangélica. É, portanto, exatamente por aí que Otoni de Paula deu a senha. “A maioria dos evangélicos não votou no senhor. E o senhor sabe disso. Mas talvez estejamos entre os brasileiros mais contemplados pelos programas sociais do seu governo, já que os mais pobres e necessitados (…) formam a maioria esmagadora dos nossos irmãos”, disse o deputado.
Tradução
A ideia agora é fazer um grande esforço para transformar números em coisas palpáveis que a população consiga enxergar e entender os benefícios. Pouco adianta dizer simplesmente que o PIB subiu ou somente índices de inflação. Encontrar um discurso é o desafio.
Briga
Se vai conseguir, é algo difícil ainda de dizer. Mas Lula está disposto a comprar a briga com setores de esquerda para frear um pouco o discurso identidário, que não é bem compreendido pelos evangélicos de baixa renda. A ideia é retomar mais as pautas sociais.
Família
Algumas avaliações que têm sido feitas no governo buscam demonstrar que a ideia de família tradicional adotada pelos evangélicos é, de certa forma, um mecanismo de proteção. Os mais pobres são muito pressionados e vivem uma grande situação de risco cotidiano.
Crime
É claro que famílias estruturadas não precisam ser somente as formadas por pai homem, mãe mulher e seus filhos. Mas é esse o discurso feito. E ele faz sentido para uma população que vive onde o crime tenta se beneficiar de famílias desestruturadas para aliciar pessoas.
*Rudolfo Lago é jornalista do Correio da Manhã / Brasília, foi editor do site Congresso em Foco e é diretor da Consultoria Imagem e Credibilidade
Artigo originalmente publicado no Correio da Manhã / Brasília
Foto: Ricardo Stuckert/PR
Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.