Cop 30: Sucesso ou Fracasso?

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Por LISZT VIEIRA*

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), entre 10 e 21 de novembro próximo em Belém, representa um momento importante na luta pela sobrevivência da humanidade no planeta Terra. O encontro ocorre em um contexto de agravamento da crise climática, com eventos extremos cada vez mais frequentes —, secas prolongadas, enchentes, ondas de calor e incêndios florestais devastadores. Ao mesmo tempo, cresce a desconfiança pública em relação à eficácia das COPs, que, apesar de avanços pontuais, têm sido incapazes de reduzir substancialmente as emissões globais de gases de efeito estufa.

Da mesma forma que o Secretário Geral da ONU, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) reconheceu oficialmente que o planeta vai exceder a meta de aquecimento de 1,5 °C prevista no Acordo de Paris em 2015. Se continuarem as políticas atuais, o planeta verá uma alta das temperaturas globais de 2,8º C de hoje até o fim do século, segundo a ONU. As 20 maiores economias do mundo respondem sozinhas por 77% das emissões globais.

Esse é o maior desafio a ser enfrentado pela COP 30 que, ao que tudo indica, terá uma participação menor do que as anteriores. Na COP29 (Baku, 2024) participaram 197 países, com mais de 75 mil participantes. Na COP28 (Dubai, 2023) participaram 198 países, com mais de 90 mil participantes. Na COP 30 (Belém), devido às dificuldades e alto preço de alojamento, espera-se um número menor de países, no máximo 170 países, segundo informações oficiais, e um número bem menor de participantes. E o número de NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) até agora confirmadas pelos países está muito aquém do que seria de esperar. E as NDCs são a matéria prima das COPs.

No site oficial do Governo agência.gov, de 5/11/2025, o Ministro Celso Sabino afirma que mais de 160 delegações já confirmaram presença na COP 30. Esse número muda a cada dia, e há indicações de que a Presidência da COP 30 está esperando receber as NDCs da China e da União Europeia para anunciar números oficiais. De qualquer forma, já se pode afirmar que o número de países e de participantes será bem menor do que nas COPs precedentes. Vários países mais pobres, assustados com o elevado preço das hospedagens, não virão e, os que vierem, tanto os governos quanto as entidades da sociedade civil desses países, virão com delegações menores que o habitual,

O sucesso ou fracasso da COP 30 dependerá, sobretudo, de três aspectos centrais: a capacidade de promover o abandono dos combustíveis fósseis e acelerar a transição energética para fontes renováveis; a efetividade das medidas de combate ao desmatamento, causado principalmente pela agropecuária; e a concretização de mecanismos de financiamento climático para apoiar os países mais vulneráveis na adaptação aos impactos ambientais. Esses três eixos constituem os pilares de uma política climática global justa e eficaz.

  1. Transição Energética: o Combate aos Combustíveis Fósseis

O primeiro teste da COP 30 será a disposição dos países em reduzir drasticamente a dependência dos combustíveis fósseis. Desde o Acordo de Paris, em 2015, ficou estabelecido que o aumento da temperatura média global deve ser limitado a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. No entanto, as emissões continuam crescendo, impulsionadas principalmente pelo petróleo, gás natural e carvão. A Agência Internacional de Energia (AIE) alerta que, se as políticas atuais forem mantidas, o planeta caminhará para um aquecimento de 2,7°C até o final do século — um cenário catastrófico.

A transição energética enfrenta obstáculos estruturais e políticos. De um lado, grandes produtores de petróleo e gás, como Arábia Saudita, Rússia e Estados Unidos, resistem a compromissos de eliminação gradual (“phase out”) dos fósseis. De outro, países em desenvolvimento, dependentes da exportação de energia fóssil, temem os efeitos econômicos dessa mudança. A COP 28, em Dubai, reconheceu pela primeira vez a necessidade de “transição para longe dos combustíveis fósseis”, mas sem prazos ou metas concretas. A COP 30 precisará transformar essa declaração genérica em compromissos vinculantes, acompanhados de cronogramas nacionais verificáveis.

Por outro lado, há sinais de esperança. A queda no custo da energia solar e eólica, o avanço da eletrificação dos transportes e a expansão de investimentos em hidrogênio verde e biocombustíveis sustentáveis indicam que a transição é tecnicamente possível. O Brasil, sede da COP 30, poderia desempenhar papel estratégico como potência em energia limpa, combinando matriz renovável com liderança diplomática no Sul Global. Se conseguir impulsionar uma coalizão de países em defesa de metas concretas de descarbonização, o país poderia contribuir para que a COP 30 seja lembrada como o ponto de virada na transição energética mundial. Ocorre, porém, que importantes sinais apontam para outra direção: a aprovação pelo Congresso da PEC da Devastação que estraçalhou o sistema de licenciamento ambiental e a aprovação pelo Governo da exploração de petróleo na Margem Equatorial na foz do Amazonas.

  1. Combate ao Desmatamento e à Expansão Agropecuária

O segundo eixo decisivo é o enfrentamento do desmatamento, especialmente nas regiões tropicais. O desmatamento responde por cerca de 15% das emissões globais de gases de efeito estufa e tem forte ligação com a agropecuária, sobretudo a expansão de pastagens e plantações de soja. Na Amazônia, embora as taxas de desmatamento tenham caído recentemente no Brasil, continuam elevadas em países vizinhos, como Bolívia e Peru, e no Cerrado brasileiro, ameaçado pelo avanço do agronegócio.

Espera-se que o Brasil apresente resultados concretos de redução do desmatamento e políticas de incentivo à produção agropecuária sustentável. Isso exige o fortalecimento da fiscalização ambiental, a valorização das terras indígenas e a implementação de cadeias produtivas livres de desmatamento. Entretanto, há risco de retrocesso se prevalecerem pressões do agronegócio exportador, contrário a compromissos de proteção ambiental. O desafio global é conciliar segurança alimentar com preservação ambiental. A COP 30 pode avançar se consolidar acordos que vinculem o comércio internacional à sustentabilidade, punindo produtos associados à destruição de florestas e recompensando práticas de baixo carbono. O combate ao desmatamento não é apenas questão ambiental, mas econômica e social: envolve reforma agrária, inclusão de comunidades tradicionais e reconhecimento de que o futuro da agricultura depende de ecossistemas equilibrados.

Se a COP 30 conseguir estabelecer mecanismos internacionais de verificação e financiamento para conter a devastação florestal, poderá transformar o eixo Amazônico num laboratório mundial de soluções sustentáveis. Caso contrário, continuará a retórica vazia de conferências anteriores, incapazes de conter a destruição que acelera o colapso climático.

  1. Financiamento Climático e Apoio aos Países Vulneráveis

Nenhuma transição energética ou política de conservação será viável sem recursos financeiros adequados. O terceiro pilar do possível sucesso da COP 30 é, portanto, o financiamento climático. Desde 2009, os países desenvolvidos prometeram destinar US$ 100 bilhões por ano para apoiar nações em desenvolvimento em suas ações de mitigação e adaptação. Essa meta nunca foi integralmente cumprida, e os fluxos de recursos permanecem insuficientes e desiguais.

Em 2023, foi criado o Fundo de Perdas e Danos, destinado a compensar países vulneráveis por desastres climáticos. Contudo, o fundo ainda é pequeno, com poucos compromissos efetivos de aporte. Na COP 29, foi aprovado um financiamento aos países vulneráveis de 300 bilhões de dólares, quantia muito inferior à importância de 1,3 trilhão de dólares estimado pela ONU como o mínimo necessário para a adaptação às mudanças climáticas.

Espera-se que a COP 30 defina regras claras de governança, fontes de financiamento permanentes (como taxas sobre combustíveis fósseis ou transporte aéreo) e critérios justos de distribuição. A credibilidade do sistema multilateral depende desse ponto: sem apoio financeiro, os países pobres não terão meios de se adaptar ao aumento do nível do mar, às secas ou à destruição de suas infraestruturas. É necessário também garantir transparência e equidade — evitando que os recursos fiquem concentrados em projetos de grande porte e não alcancem comunidades locais. Se o financiamento climático for ampliado e democratizado, a COP 30 terá dado um passo importante em direção a uma transição justa. Caso contrário, persistirá a sensação de que o fardo da crise climática recai de forma desproporcional sobre quem menos contribuiu para causá-la.

Conclusão: Sucesso ou Fracasso?

A COP 30 será julgada não pelos discursos, mas pelos compromissos concretos que produzir. O sucesso dependerá da capacidade coletiva de enfrentar interesses econômicos poderosos, romper com a dependência de combustíveis fósseis, deter o desmatamento e garantir financiamento robusto aos países mais pobres.

Se essas metas forem alcançadas, Belém poderá entrar para a história como o marco do recomeço — a conferência que devolveu credibilidade ao regime climático internacional. Mas, se prevalecerem as ambiguidades e promessas vagas, a COP 30 poderá simbolizar o esgotamento de um modelo de negociações que, há três décadas, fala muito e faz pouco.

O tempo está se esgotando. O planeta já ultrapassou vários limites ecológicos e sociais. A humanidade precisa de ações imediatas e corajosas. A COP 30 é, talvez, uma das últimas oportunidades de transformar compromissos em resultados — e garantir que o século XXI não seja lembrado como a era do colapso climático, mas como o momento em que a cooperação global venceu a inércia e salvou o futuro comum.

O Homem é o único animal que destrói seu habitat. Os cientistas já alertaram que já é visível no horizonte o colapso da civilização humana em nosso planeta. Mas, até agora, prevaleceram os interesses da produção econômica capitalista visando a lucro. E os lobistas das grandes empresas de combustível fóssil e do agronegócio estarão presentes na COP 30, como estiveram em todas as COPs anteriores. Também presente estará a sociedade civil organizada na Cúpula dos Povos, envolvendo principalmente ambientalistas e cientistas. Breve saberemos se houve avanço, pelo menos parcial, em alguma das agendas da COP 30.


*Ļiszt Vieira é integrante da Coordenação Política e Conselho Editorial do Fórum 21 e do Conselho Consultivo da Associação Alternativa Terrazul. Foi Coordenador do Fórum Global da Conferência Rio 92, secretário de Meio Ambiente do Estado do Rio de Janeiro (2002) e presidente do Jardim Botânico fluminense (2003 a 2013). É sociólogo e professor aposentado pela PUC-RIO.

Foto de capa: Ilha do Combú, banhada pelo Rio Guamá | Fernando Frazão/ Agência Brasil

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