Contra a Anistia, mas a Favor da Luta pela Anistia

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Por JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ*

Diante da condenação de Jair Bolsonaro, os Bolsonaristas decidiram lutar no Congresso Nacional pela anistia aos crimes cometidos pelo agora condenado, sob forte reação das forças progressistas, tanto no Congresso Nacional, quanto na opinião pública. E no tom dessa reação reside uma armadilha.

Que políticos de esquerda acusem a oposição de golpista por fazer política no Parlamento em favor da anistia, uma oposição legitimada pelos milhões de votos que efetivamente recebeu, é até compreensível. Faz parte do jogo político, ainda mais nesse momento, tentar caracterizar o adversário como violento, corrupto e contrário aos interesses do país.

Mas que isso seja feito pela análise política, ou seja, que pessoas eleitas sejam acusadas de golpistas por esta razão, é algo muito mais complicado. Uma atitude como essa tende a gerar um quase uníssono na fração progressista da opinião pública (ao menos é assim que o fenômeno aparece aos olhos da extrema direita), o que pode contribuir para deslegitimar a política. E para reforçar a visão de mundo dos extremistas: não adianta votar e exercer nosso poder legítimo, para mudar as coisas será preciso usar a força física.

Vale observar que, nesse momento, a ultradireita foi encurralada pelas instituições, mais especificamente, pelo STF, e está sendo obrigada a brigar por dentro delas. Não era esse o plano. O plano era que o governo Trump fosse capaz de mudar o jogo por fora dele, promover uma mudança de placar no STF a golpes de sanções econômicas ao país e a autoridades. Isso não aconteceu (ainda?).

Sabemos que há forças de ultradireita que pretendem perverter as instituições ao utilizá-las, ou seja, que pretendem transformar as instituições por dentro. Mas fazer isso exige poder de caneta, exige ter o domínio dos mais altos cargos, como aconteceu na Rússia, na Hungria e está acontecendo nos EUA.

Na posição em que se encontram, no corner do ringue, sem controlar diretamente nem o Executivo, nem o Legislativo, nem o Judiciário, a ultradireita possui, ao menos temporariamente, menor poder destrutivo. A isso podemos somar o crescimento da popularidade do atual governo brasileiro, que parece abrir boas perspectivas eleitorais.

A meu ver, o movimento a ser feito, nesse momento, é enredar essas forças políticas nas instituições para tentar desramar seu discurso antissistema e arrefecer a tentação de adotar a ação direta, ou seja, partir para a violência física. Ao ganhar poder na operação das instituições, muitos elementos, hoje extremistas radicais, podem decidir conter o seu ímpeto e terminar contribuindo para a continuidade da democracia.

Por isso mesmo, não me parece razoável deslegitimar a luta pela anistia, sustentada pelos milhões de votos que a ultradireita efetivamente recebeu. Nota bene, cabe lutar sim contra a anistia, combatê-la com todo os meios políticos e jurídicos disponíveis (essa é a minha posição pessoal), mas sem negar o poder político de quem efetivamente o possui por força do voto popular.

Nesse registro, o debate é sobre os limites de ação dos diversos poderes, especialmente, Legislativo e Executivo, poderes legitimados diretamente pelo voto popular. Por isso mesmo, a resposta para o impasse deve resultar da negociação direta entre esses dois poderes, sem que a bola seja chutada, novamente, para o Judiciário.

O Judiciário já fez sua parte e não seria bom que ele tivesse a última palavra nesse caso. Todos os esforços devem ser feitos para evitar esse desfecho. Seria desgastante demais para o STF, além de uma estratégia que desvia o foco do verdadeiro problema: como fazer Pra derrotar os golpistas no voto, não nos tribunais.

O direito não tem como função resolver conflitos. Ele é capaz de geri-los, como se apresentam em uma determinada sociedade. Em interação contínua com eles, o direito pode até mesmo almejar contribuir para a invenção de soluções não violentas e participativas para gerir os problemas sociais.

Mas, no limite, ou mudamos a sociedade ou ela termina mudando o direito por si mesma, seja à direita, seja à esquerda. As revoluções violentas ocorridas ao redor do mundo evidenciam isso. E, nesse caso, estamos, de fato, lidando com um grupo extremista de direita que nutre claras pretensões revolucionárias.


*José Rodrigo Rodriguez é professor da UNISINOS e Pesquisador do CEBRAP

Foto de capa: Elineudo Meira /@fotografia.75

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