A posse de nejar na Academia Riograndense de Letras

translate

arzh-CNenfrdeitjaptruesyi

Por PAULO TIMM*

Significativa e solene reunião da Academia Riograndense de Letras recebeu, no dia 19 deste mês, março de 2025, o grande Poeta Carlos Nejar em seu seio. Luís Carlos Verzoni Nejar, gaúcho, nascido em Porto Alegre em 1939, com vasta obra literária internacionalmente reconhecida, é membro da Academia Brasileira de Letras mas, pelo que ele próprio em seu discurso de posse admitiu, como certo “estranhamento”, estava ausente na própria terra. Faltava-lhe este reconhecimento do mais alto sodalício literário riograndense. Presente ao ato, como representante da Academia dos Escritores do Litoral Norte, ocupante da cadeira cujo Patrono é Ruy Rubem Ruschel, junto com o confrade Poeta Gabriel Fernandes, testemunhei, emocionado, este momento de encontro, sobretudo, de fidalguias. De um lado a Academia Riograndense de Letras batendo à porta do grande Poeta que nos representa no plano literário nacional, chamando-o ao amplexo com a terra natal; de outro, o consagrado imortal que desce do Olimpo das Letras nacionais para confraternizar com seus conterrâneos escritores. Longe do Rio Grande há muitos anos, Nejar na verdade, nunca se apartou das origens e disso deu conta em seus versos quando descrevia na visão das ondas do Espírito Santo as coxilhas do Pampa. Intérprete como poucos da alma pampeana, Nejar foi além da épica gauchesca, procurando no dedilhar de seus poemas,  a transcendentalidade do Homem de todos os tempos e lugares. Assim o definiu Juremir Machado, em sua crônica “A conversão pela palavra”, publicada no livro A NOITE DOS CABARÉS, POA, 1991 – Ed. Pradense:

-”O poeta Carlos Nejar fala como se deixasse escapar da sua boca, a cada momento, a cada palavra, poesias. Os olhos brilham, a cabeça é jogada para trás, o verbo é buscado na alma.”

Recurvado pelos anos e pelas dores do poeta, Nejar, do alto de sua Poesia, saudado pelo acadêmico Roberto S. Prym, nos abraçou em versos e deixou o seu registro à posteridade, que transcrevo:

Senhores,

Quero, em primeiro lugar, louvar a Deus por este momento. E tomo posse, hoje, nesta Egrégia Academia Riograndense de Letras, como quem retorna para a sua terra. Dirá alguém que já não vou encontrar o mesmo tempo. ‘Mudam os tempo, mudam as vontades” – escreveu Camões. Não irei encontrar o tempo, porque é o tempo que me encontra. Não vou achar muitas pessoas que amei e conheci, o nome de ruas e avenidas terão mudado ou mesmo a rua, onde passei a meninice. Mas os sonhos amadureceram, mas não podem envelhecer conosco. Terão que continuar vivendo além de nós.

O que vi e vivi persistirá existindo na minha sombra, como as árvores do bosque. Minha infância, como a de todos não acabaca.

Lembro Erico Veríssimo, Mário Quinta, Guilhermino César, Manoelito de Ornellas, entre tantos. Não foram um tempo, estão no pampa da palavra, o pampa do universo.

Tenho morado longe do Rio Grande, como no exílio. E como diz Pessoas, “os rios daqui não são como os rios da minha aldeia. Que o digam “O campeador e o Vento”, que o saudoso Wilson Martins chamou de “Os Lusíadas do gaúcho”, generosamente. Ou “Canga”, ou “Miguel Pampa”, ou “República do Pampa”, ou meu romance “Riopampa e o Moinho das Tribulações”. Não parei de amar esta terra por ter-me amado primeiro. E a levo comigo, mesmo me tenha estranhado às vezes por seu acentuado barbarismo. Nos encontramos nas raízes e nos frutos.

Sei que a posse nesta nobre Academia, de tradição e de tantos valores, alguns aqui presentes, repito, é um retorno deste que vos fala. Fui Promotor de Justiça pelo interior, honrado de ser do Ministério Público, servindo a este povo. Vaguei por cidades e plagas. De Procurador de Justiça na capital, tornei-me procurador de almas nos romances que acumulei, com a certeza de que não inventamos as palavras, mas elas que nos inventam.

Portanto, assumo esta cadeira na Sodalício e este lugar como quem assume um sonho que não precisa acordar.

Escreveu Napoleão Bonaparte que após as batalhas, apreciava ver o rosto dos companheiros. Sem ser Napoleão, apenas um vivente, da “Terra dos Viventes”, agradecendo profundamente a todos os que votaram em mim e a todos que, aqui, me acolhem, fraternos, recobro a cidadania do coração do pampa e reconheço, por estar perto da terra para poder ser plantado, não no ar, ou na vaidade , ou orgulho. E reconheço o rosto dos companheiros, grato por esta honra, das maiores, por ser a da terra” – Carlos Nejar


*Paulo Timm é economista, funcionário aposentado do IPEA, poeta, romancista, professor universitário e editor da Rádio Resumo publicado em A FOLHA, Torres em 31 de janeiro de 2025

Foto de capa: Reprodução

Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia..

Gostou do texto? Tem críticas, correções ou complementações a fazer? Quer elogiar?

Deixe aqui o seu comentário.

Os comentários não representam a opinião da RED. A responsabilidade é do comentador.

Respostas de 2

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

plugins premium WordPress